Arq Bras Cardiol volume 75, (nº 6), 2000 Zornoff e cols Artigo Original Efeito do losartan na remodelação ventricular Efeitos do Losartan sobre a Remodelação Ventricular no Infarto Experimental em Ratos Leonardo A. M. Zornoff, Luiz S. Matsubara, Beatriz B. Matsubara, Sergio A. R. Paiva, Joel Spadaro Botucatu, SP Objetivo - Avaliar os efeitos do losartan sobre a remodelação ventricular (RV) e a sobrevida, após o infarto agudo do miocárdio (IAM), em ratos. Métodos - Após a oclusão cirúrgica da artéria coronária esquerda, 84 ratos machos Wistar foram divididos em 2 grupos: LO, tratado com losartan (20mg/kg/dia, n=33) e NT (n=51), não tratado. Após 3 meses, foran analisados: mortalidade; relação massa ventricular e massa corpórea (PV/PC); concentração miocárdica de hidroxiprolina (HOP); pressão sistólica isovolumétrica, +dp/dt, -dp/dt e relação entre volume diastólico e massa do ventrículo esquerdo (VO/VE). Resultados - A mortalidade foi: LO = 22% e NT = 47% (p<0,05). As massas ventriculares, (PV/PC, mg/g) foram 4,14 ± 0,76 e 3,54 º 0,48 nos grupos NT e LO, respectivamente (p<0,05). A mediana da HOP foi 4,92 υg/mg para o grupo LO e 5,54 υg/mg para o grupo NT (p>0,05) . A mediana do V0/VE foi 0,24 ml/g para o grupo LO e 0,31 ,l/g para o grupo NT (p<0,05). A pressão isovolumétrica do grupo LO foi superior (p<0,05) ao do grupo NT. As variáveis +dp/dt e -dp/ dt não foram diferentes entre os grupos. Conclusão – 1. O losartan, pós IAM, atenua RV, promove aumento da sobrevida, atenua a hipertrofia e a dilatação ventricular e melhora da pressão sistólica isovolumétrica; 2. O tratamento não modifica a concentração miocárdica de colágeno. Palavras-chave: fibrose, função ventricular, angiotensina II As alterações da arquitetura ventricular que podem ocorrer após infarto agudo do miocárdio são conhecidas com o nome de remodelação ventricular, pós-infarto agudo do miocárdio 1. Seguindo-se a oclusão coronariana, podemos observar dilatação ventricular aguda, caracterizada por adelgaçamento e distensão da região infartada. Esta alteração é denominada expansão do infarto e resulta do deslizamento de grupos musculares necróticos em conseqüência da desintegração do colágeno interfibrilar. Na fase tardia, observaram-se diferentes graus de dilatação cavitária. Este fenômeno é resultado do processo de hipertrofia que envolve ambos ventrículos e parece se manifestar como resposta a um aumento do estresse parietal. Paralelamente, foi demonstrado que há acúmulo anormal de colágeno (fibrose) nas áreas viáveis do miocárdio, tanto no ventrículo infartado como no outro ventrículo 1. O processo de remodelação ventricular está associado, geralmente, a um pior prognóstico, pois sua presença está relacionada a maior incidência na formação de aneurismas, ruptura cardíaca, fibrose, piora funcional, arritmias e maior mortalidade 2. Como estratégia para prevenir ou atenuar a remodelação ventricular, diferentes classes de drogas vêm sendo utilizadas. Nos últimos anos, o uso dos bloqueadores de receptor AT1 da angiotensina II vem ganhando aceitação em várias doenças. Os efeitos da administração desta nova classe de drogas no processo adaptativo, que ocorre após o infarto, entretanto, não estão completamente esclarecidos. Assim, o objetivo deste trabalho foi analisar os efeitos da administração de losartan, um bloqueador seletivo dos receptores AT1 da angiotensina II, sobre as variáveis da remodelação ventricular, pós-infarto agudo do miocárdio. Métodos Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP Correspondência: Leonardo A. M. Zornoff - Depto de Clínica Médica – Faculdade de Medicina de Botucatu-UNESP – Rua Rubião Júnior S/N - 18618-000 Botucatu – SP Recebido para publicação em 1/9/99 Aceito em 29/3/00 Foram utilizados 238 ratos Wistar, machos, pesando entre 200-250 gramas, provenientes do Biotério do Câmpus de Botucatu, da UNESP. O infarto agudo do miocárdio foi produzido de acordo com método descrito previamente 3 e já padronizado em Arq Bras Cardiol, volume 75 (nº 6), 459-464, 2000 459 Zornoff e cols Efeito do losartan na remodelação ventricular nosso laboratório 4. Resumidamente, após anestesia por inalação de éter, era realizada toracotomia esquerda, entre o 4º e o 5º espaços intercostais. O coração era exteriorizado por compressão lateral do tórax e a artéria coronária esquerda ligada a, aproximadamente, 2mm de sua origem, com fio de polivinil (5-0, Ethicon), entre a borda do átrio esquerdo e o sulco da artéria pulmonar. A seguir, o coração era rapidamente recolocado na cavidade torácica, o tórax fechado e os animais eram mantidos em gaiolas, para recuperação. Os ratos eram alimentados com ração comercial e tinham livre acesso à água. Após 12h, que correspondem ao período por nós estipulado de recuperação cirúrgica, os animais sobreviventes (n=84) constituíram 2 grupos: grupo NT (n=51): formado pelos animais infartados que não receberam medicação; grupo LO (n=33), formado pelos animais infartados que receberam, 12h após a cirurgia, losartan (20mg/kg/dia) dissolvido em água de beber, por um período de três meses. O peso corporal e o volume médio de água ingerido pelos animais eram aferidos semanalmente de modo a ajustar a diluição da medicação na água de beber e alcançar a dose desejada. A partir da divisão dos grupos, os animais foram colocados em observação, registrando-se a mortalidade nos dois grupos estudados. Após três meses, os animais sobreviventes (27 no grupo NT, 26 no grupo LO) receberam pentobarbital sódico (50mg/kg) e heparina (1000UI) por via intraperitoneal e ventilados com pressão positiva e oxigênio a 100%. A seguir, o tórax era aberto, as carótidas ligadas e a aorta cateterizada com cânula de metal nº 15, iniciando-se a perfusão miocárdica retrógrada, com solução nutriente de Krebs-Henseleit. Usou-se a seguinte composição, em mmol/L M: 115 NaCl; 5,4 KCl; 1,2 MgSO4; 1,25 CaCl2; 1,15 NaH2PO4; 25 NaHCO3; 11 glicose. A solução acima era acrescida de insulina 10U/l e manitol, na concentração de 8mmol/ L, para assegurar maior preservação miocárdica 5. Os corações eram então removidos da caixa torácica e colocados em aparelho de estudo de coração isolado, tamanho 3 tipo 830 (Hugo Sachs Eletronic - Germany), com pressão de perfusão constante de 75mmHg. A solução nutriente era continuamente oxigenada com mistura gasosa de 95% de O2 e 5% de CO2, mantendo-se a pressão parcial de oxigênio entre 500 e 600mmHg, à temperatura de 37ºC, pH entre 7,3 e 7,4. O átrio esquerdo era aberto e o ápice do ventrículo esquerdo puncionado com agulha, para drenar a cavidade ventricular, evitando-se acúmulo de líquido no seu interior. Um balão de látex, atado a tubo de polietileno PE 90, era colocado na cavidade ventricular. A outra extremidade do tubo de polietileno era conectada a uma torneira de três vias, sendo uma das vias acoplada a um transdutor de pressão (Stathan P23 XL) e a outra, a uma seringa de 1ml, que permitia a variação do volume do balão intracavitário. A musculatura atrial direita, compreendendo a região do nódulo sinoatrial, era extirpada e o eletrodo de marcapasso artificial colocado no miocárdio do ventrículo direito para se manter, artificialmente, a freqüência cardíaca entre 240 e 250bpm. 460 Arq Bras Cardiol volume 75, (nº 6), 2000 Por meio da preparação descrita, curvas de Starling eram obtidas com infusão de líquido no balão, que permitia variar a pressão diastólica do ventrículo esquerdo de 0 a 30mmHg, através de incrementos graduais de 5mmHg, registrando-se a pressão sistólica correspondente a cada variação de volume. Nessas preparações, em que o coração opera em contrações isovolumétricas, a pressão sistólica é aceita como indicadora da capacidade contrátil. Foram registradas também a primeira derivada positiva de pressão (+dp/dt) e a derivada negativa de pressão (-dp/dt). Estes índices serviram, respectivamente, como parâmetros de função sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo. O fator de calibração da derivada do ventrículo esquerdo era obtido segundo a técnica utilizada por Moura Campos 6. Após o estudo funcional, os corações eram retirados do aparelho de perfusão, secos com papel de filtro e, a seguir, dissecados. Os ventrículos direito e esquerdo (incluindo o septo interventricular) eram pesados e preparados para análise morfométrica. Para a estimativa do grau de hipertrofia ventricular, foi usada a relação entre a massa do coração, ajustada para a massa corporal do rato (PV/PC). O volume ventricular correspondente à pressão diastólica igual a zero foi denominado de VO e refletiu o volume ventricular quando a pré-carga era, teoricamente, nula. A razão entre o VO e a massa do ventrículo esquerdo (VO/VE, ml/g) foi utilizada como parâmetro de dilatação ventricular. Após manutenção por 24h em solução de formol a 10%, o ventrículo esquerdo era colocado em solução contendo álcool a 70%, onde permanecia por mais de 24h e, a seguir, realizado, em cada coração, corte transversal entre 5 e 6mm do ápice para a base, pelo fato de este corte refletir a média dos resultados de cortes de todo o ventrículo 7,8. O tecido miocárdico obtido era corado em lâmina, com solução de hematoxilina-eosina (HE) e utilizado para análise morfométrica, realizada por meio da medida dos comprimentos epicárdicos e endocárdicos dos segmentos infartados e não infartados, utilizando-se software de análise de imagem SigmaScan (Jandel Scientific, California, USA), obtendo-se, assim, a porcentagem de comprimento infartado em relação ao comprimento total do ventrículo esquerdo. O grau de fibrose miocárdica foi quantificada por meio de dosagem de hidroxiprolina no ventrículo direito, de acordo com a técnica descrita por Switzer 9. O processo de remodelação ocorre no coração como um todo, de maneira que a sobrecarga de volume, assim como estímulos humorais, como ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona e adrenérgico, atuam em ambos os ventrículos de maneira uniforme. A presença de grande área cicatricial, decorrente do infarto do miocárdio, torna a quantificação de hidroxiprolina do ventrículo esquerdo, um índice inadequado para a medida de remodelação miocárdica, uma vez que a fibrose se encontra difusa em todo o ventrículo esquerdo. Assim, recorremos a medida da hidroxiprolina no ventrículo direito como índice de fibrose intersticial em resposta a estímulo humoral local ou sistêmico secundário ao infarto agudo do miocárdio. No estudo estatístico, utilizamos a análise de sobrevi- Arq Bras Cardiol volume 75, (nº 6), 2000 Zornoff e cols Efeito do losartan na remodelação ventricular vência (curva de Kaplan Meyer), para a mortalidade; as diferenças entre as curvas foram analisadas pelo teste LogRank e pelo modelo de regressão de COX. Para função sistólica (PS e +dp/dt) e de hipertrofia cardíaca (PV/PC) utilizamos o teste t de Student. Para função diastólica (-dp/dt), fibrose (HOP) e dilatação ventricular (VO/VE), utilizamos o teste de Mann-Whitney. O nível de significância utilizado foi de 5%. tatisticamente significantes. Os dados relativos à intensidade da dilatação ventricular mostravam que os animais do grupo LO apresentaram relação V0/VE estatisticamente menor que os animais do grupo NT. Em relação ao tamanho do infarto, os animais tratados com losartan apresentaram um tamanho de infarto (39,5±6,2%) cuja diferença não foi estatisticamente significante quando comparada aos animais não tratados (36,65±7,8%). Resultados Discussão Probabilidade de sobrevivência Os dados referentes à mortalidade estão apresentados na figura 1. Verificou-se que, após o período de observação de três meses, a mortalidade entre os grupos estudados foi 22% para os animais do grupo LO e 47% para os animais do grupo NT. Em adição, a razão de risco entre os grupos foi 2,008 (p<0,05). Na figura 2 estão apresentados os resultados do estudo funcional, usando como variável descritiva contratilidade a pressão sistólica. Podemos verificar que a pressão sistólica do grupo LO foi estatisticamente maior do que as pressões obtidas do grupo NT (p<0,05). Em relação à +dp/ dt, podemos observar que os animais do grupo LO apresentaram desempenho que não foi estatisticamente diferente dos animais do grupo NT (fig. 3). Resultados semelhantes foram observados em relação à -dp/dt (fig. 4). Na tabela I estão apresentados os resultados morfométricos dos animais dos grupos LO e NT. Quanto à estimativa de hipertrofia cardíaca, verificou-se menor relação PV/PC nos animais tratados com losartan (3,54±0,48mg/g) em relação aos animais não tratados (4,14±0,76mg/g). Em relação aos resultados das concentrações de HOP, os dois grupos estudados não apresentaram diferenças es- Dias Fig. 1 - Efeito do tratamento com losartan sobre a porcentagem de sobrevivência em ratos infartados. Análise de Kaplan - Meyer seguido de teste log-rank de Cox-Mantel. *p<0,05. Os resultados da presente investigação evidenciaram o efeito benéfico do uso de losartan sobre diversos parâmetros deletérios da remodelação ventricular, após o infarto experimental, em ratos. As informações disponíveis sobre a capacidade que os bloqueadores dos receptores AT1 da angiotensina II possuem de interferir na mortalidade, após o infarto agudo do miocárdio experimental, são limitadas. Assim, RicherGiudicelli e cols. 10 demonstraram que a administração de irbesartana aumentou a sobrevida de ratos com infarto, de maneira dose dependente. Milavetz e cols. 11, no mesmo modelo, verificaram que a administração de losartan apresentou o mesmo impacto na mortalidade que o captopril. Por outro lado, Hu e cols. 12 não evidenciaram efeito protetor do losartan na mortalidade de ratos, com oito semanas de tratamento, após o infarto experimental. Em nosso estudo, a administração de losartan resultou em evidente redução da mortalidade. A razão de risco, que define a probabilidade de óbito entre os grupos estudados, estabeleceu que o risco de um animal não tratado morrer foi 100% maior do que no animal tratado. Em relação à estimativa de hipertrofia cardíaca, a razão entre a massa ventricular e a massa corpórea é utilizada em diversos modelos experimentais. Após a oclusão coronariana, instala-se processo inflamatório na região infartada e, a seguir, esta região é substituída por cicatriz fibrosa. No ventrículo direito e nas áreas não infartadas do ventrículo esquerdo ocorre crescimento do miócito e acúmulo de colágeno. Desta maneira, o aumento da massa ventricular não reflete, exclusivamente, o processo hipertrófico. Apesar destas limitações, a relação PV/PC é aceita na literatura como parâmetro de crescimento celular, neste modelo 13-16. Em nosso trabalho, a administração de losartan atenuou o grau de hipertrofia adaptativa pós-infarto agudo do miocárdio, em comparação com os animais não tratados. Apoiando nossos resultados, outros autores identificaram diminuição do processo hipertrófico, após o infarto, com bloqueadores de receptores AT1 da angiotensina II 14,15. Na nossa pesquisa, não podemos descartar a possibilidade de que a atenuação da hipertrofia também seja influência da diminuição da pós-carga, em resposta ao efeito hipotensor do losartan. Uma das principais características da remodelação ventricular, após o infarto agudo do miocárdio, é a presença de dilatação ventricular. Na fase aguda, este processo é re461 Arq Bras Cardiol volume 75, (nº 6), 2000 Prressão Sistólica (mm Hg) Zornoff e cols Efeito do losartan na remodelação ventricular + dp/dt (mm Hg/s) Fig. 2 - Representação gráfica, das curvas individuais e das médias ± desvios padrão, da relação pressão sistólica isovolumétrica e pressão diastólica dos grupos de ratos infartados não tratados e tratados com losartan (20mg/kg/dia). *p<0,05. Fig. 3 - Representação gráfica, das curvas individuais e das médias ± desvios padrão, da relação +dp/dt e pressão diastólica dos grupos de ratos infartados não tratados e tratados com losartan (20mg/kg/dia). 462 Zornoff e cols Efeito do losartan na remodelação ventricular + dp/dt (mm Hg/s) Arq Bras Cardiol volume 75, (nº 6), 2000 Fig. 4 - Representação gráfica, das curvas individuais e das médias ± desvios padrão, da relação -dp/dt e pressão diastólica dos grupos de ratos infartados não tratados e tratados com losartan (20mg/kg/dia). Tabela I - Dados morfométricos nos grupos de ratos infartados não tratados (NT) e tratados com losartam 20mg/kg/dia (LO) Variável PV/PC (mg/g) VO/VE (ml/g) HOP (µg/g) Tamanho do Infarto (%) Grupo NT LO 4,14 ± 0,76 0,31 (0,29 - 0,36) 5,54 (3,34 - 7,49) 36,65 ± 7,8 3,54 ± 0,48* 0,24 (0,20 - 0,34)* 4,92 (4,19 - 5,79) 39,5 ± 6,2 PV/PC- relação entre a massa do coração e a massa do rato; VO/VErelação entre o volume ventricular correspondente à pressão diastólica igual a zero e a massa do ventrículo esquerdo; HOP- concentração de hidroxiprolina no ventrículo direito. PV/PC e tamanho do infarto - valores da média ± desvio padrão. VO/VE e HOP- valores da mediana, com os percentis 25% e 75%. *p<0,05 vs NT. sultado da expansão do infarto, enquanto que a dilatação ventricular tardia no ventrículo esquerdo é conseqüência da hipertrofia ventricular do tipo excêntrica. Nossos resultados mostram que os animais tratados apresentaram, em relação aos animais não tratados, menores volumes ventriculares normalizados para a massa. Este fato indica que o tratamento com losartan resultou em atenuação do processo de dilatação ventricular que ocorre após o insulto isquêmico. Em relação à estimativa de fibrose miocárdica, utilizamos a concentração de HOP no ventrículo direito como parâmetro. Apesar de ser um método indireto, a concentração de HOP é aceita como variavel descritora da quantidade de colágeno 17,18 . Milanez e cols. 19, trabalhando com infarto em ratos tratados com captopril, observaram que a concentração de hidroxiprolina no ventrículo direito e em área livre de infarto do ventrículo esquerdo, apresentavam relação linear e positiva com o tamanho do infarto. Nesse modelo, não é raro o encontro de infartos comprometendo toda a parede livre do ventrículo esquerdo. Deste modo, há o risco de fragmentos da zona necrótica influenciarem as dosagens realizadas no segmento não infartado. Portanto, decidimos não considerar as dosagens de HOP no ventrículo esquerdo em nosso estudo. Apesar das evidências de que a atividade dos fibroblastos possa ser regulada pela AII e pela aldosterona 20, a capacidade de interferência dos bloqueadores dos receptores AT1 da AII no processo de fibrose é controversa. Alguns autores 21,22 verificaram diminuição do montante tecidual de colágeno com esta classe de drogas, enquanto outros não evidenciaram interferência do tratamento na intensidade da fibrose, em diferentes modelos experimentais 15,23. Em nosso estudo, não observamos diferenças na concentração de HOP entre os dois grupos. Deste modo, nossos resultados sugerem que o losartan não interfere com a quantidade de colágeno, neste modelo. Em relação ao estudo funcional, os nossos dados não foram uniformes. Os ratos tratados com losartan apresentaram melhor desempenho, em relação aos animais não tratados, quando o variavel considerada foi a pressão sistólica. 463 Zornoff e cols Efeito do losartan na remodelação ventricular Arq Bras Cardiol volume 75, (nº 6), 2000 Não ocorreram diferenças significantes entre os dois grupos, entretanto, para a +dp/dt e a -dp/dt. Nossos dados estão em concordância com estudos anteriores, nos quais a capacidade de interferência dos bloqueadores dos receptores AT1 da AII no desempenho funcional foi dependente do parâmetro utilizado 11,24,25. O conjunto dos nossos resultados permite as seguintes conclusões: 1) o uso do losartam, pós-infarto agudo do miocárdio, acompanha-se de modificação na remodelação ventricular com aumento da sobrevida; atenua- ção da hipertrofia cardíaca e da dilatação ventricular. O tratamento não interfere com a quantidade de colágeno mensurado no ventrículo direito; 2) a capacidade de interferência do losartan na função ventricular depende da variavel utilizada, adquirindo relevância apenas para a pressão sistólica isovolumétrica. Agradecimentos À Sra. Valéria Maria Ricarelli de Oliveira pela colaboração prestada. Referências 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. Pfeffer MA, Braunwald E. Ventricular remodeling after myocardial infarction: experimental observations and clinical implications. Circulation 1990; 81: 116172. Pfeffer MA, Braunwald E. Ventricular enlargement following infarction is a modifiable process. Am J Cardiol 1991; 68: 127D-31D. Maclean D, Fishbein MC, Maroko PR, Braunwald E. Hyalunonidase-induced reduction in myocardial infarct size. Science 1976; 194: 199-200. Spadaro J, Hashimoto LM, Franco RSS, Bregagnollo EA, Tucci PJF. 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