Texto Complementar de Estudo Direito Constitucional (Comentado) TEMA: A Natureza do Poder Constituinte Prof. Felipe Vieira Prezado Candidato. O tema Poder Constituinte é de fundamental importância nas provas aplicadas em concursos públicos, especialmente sob a modalidade de múltipla escolha. Trata-se de um assunto eminentemente doutrinário e que, por isso, pode ser abordado com grande versatilidade pelas bancas. Desde formulações mais suaves, diretas e objetivas até aquelas mais complexas, capciosas e de elevado grau de conhecimento teórico, o candidato deve estar preparado para enfrentar as questões sobre o tema. Nos concursos públicos, são propostas questões clássicas sobre o assunto Poder Constituinte, tais como: espécies, limitações, cláusulas pétreas, titularidade e exercente do poder constituinte. Pouca atenção é dada para um item doutrinariamente intitulado natureza do poder constituinte. A despeito da pouca freqüência com que o item natureza do poder constituinte vem caindo nas provas, entendemos que é importante o candidato não negligenciar o seu teor, pois pode ser exatamente esse assunto o responsável por um diferencial de pontuação importante no seu concurso. Transcrevemos abaixo as lições de autores constitucionalistas renomados pela comunnis opinio doctorum (doutrina) nacional. Manoel Gonçalves Ferreira, Curso de Direito Constitucional, editora Saraiva, 1992, 19ª edição, SP. “Qual é a natureza do Poder Constituinte? É ele um poder de fato, isto é, uma força que se impõe como tal, ou um poder de direito, ou seja, um poder que deriva de regra jurídica anterior ao Estado que funda? Essa questão, na verdade, é o próprio problema do fundamento do Direito. De fato, o Direito positivo (no sentido de direito posto pelo Estado) se subordina à Constituição, de modo que o fundamento desta é o fundamento de todo o Direito positivo. Para quem entender que o Direito só é Direito quando positivo, a resposta é que o Poder Constituinte é um poder de fato, no sentido de que se funda a si próprio, não se baseando em regra jurídica anterior. Para os que admitem a existência de um Direito anterior ao Direito positivo, a solução é que o Poder Constituinte é um poder de direito, fundado num poder natural de organizar a vida social de que disporia o homem por ser livre. Na realidade parece preferível a segunda tese. O Direito não se resume ao Direito positivo. Há um Direito natural, anterior ao Direito do Estado e superior a este. Deste Direito natural decorre a liberdade de o homem estabelecer as instituições por que há de ser governado. Destarte, o poder que organiza o Estado, estabelecendo a Constituição, é um poder de direito.” Rosah Russomano, Curso de Direito Constitucional, editora Freitas Bastos, 1997, 5ª edição, RJ. “Natureza do poder constituinte – No plano doutrinário têm sido travadas discussões sobre a natureza do poder constituinte. Discute-se sobre se o mesmo é um poder de fato – sendo, pois, força e, como tal, se impondo – ou se é um poder de direito – provindo, assim, de noção jurídica anterior ao Estado que estrutura. Os que defendem a primeira tese apresentam inúmeras argumentações. Frisam, v.g., que a primeira organização de um Estado encarna simples fato, que se não pode imiscuir em qualquer categoria jurídica, eis que escapa à incidência e à dominância de princípios de direito. Ao constituir-se, o Estado é a condição do direito. Este, pois, não o condiciona. Quando o Estado elabora o seu primeiro estatuto fundamental, vincula-se tão-só a um “fato natural”. Acentuam ainda os adeptos dessa corrente doutrinária que, mesmo quando não se trata da primeira Constituição estatal, mas sim, da substituição de uma ordem jurídica já existente por outra – através de movimentos revolucionários ou de golpes de Estado –, o mais forte será o depositário do poder constituinte. A destruição da Lei suprema e o lapso de tempo que medeia entre essa destruição e a elaboração de outra rompem qualquer vínculo jurídico entre ambas. Separam-se, pois, por um intervalo de crise. O Estado, então, vai reconstruir-se, em última análise, em termos muito semelhantes aos de sua primeira Constituição. O poder constituinte não mais é uma questão de direito. É tão-só questão de fato. Os que adotam o segundo ponto de vista observam, com mais propriedade, que o poder constituinte não perde seu caráter específico de poder de direito, pela circunstância de não se alicerçar em preceito jurídico que anteceda ao Estado. Não se condicionando a um estatuto jurídico anterior, é, não obstante, um poder de direito. E isto pelas razões seguintes. O direito não é apenas direito quando se traduz em termos positivos. Anteriormente a essa etapa, sublinhada pela positividade, em todo agrupamento humano há uma idéia sobre o que seja direito. Essa idéia, pois, antecede a formulação de regras escritas, sendo-lhe corolário a exigência de respeito às normas de conduta pelas quais se manifesta. Os grupos humanos, porém, para progredir e afirmar-se, precisam estar devidamente organizados. Necessitam de um poder que os estruture e que reflita a idéia de direito existente, seja qual for a origem que se atribua à mesma (divina, sobrenatural, costumeira etc). Esse poder (constituinte), em verdade, tem por alicerce um fato: o de que toda coletividade, nesse ou naquele instante histórico, tece, em torno do direito, uma determinada concepção. Justamente por amoldar-se a essa concepção, por estruturar a sociedade visando a vivificá-la, situando-a num encaixe jurídico, é um poder de direito. A tese em pauta, pois, acentua que o poder constituinte não está condicionado pelo direito positivo, embasando-se, porém, no direito anterior ao Estado. Desse direito, na expressão de Burdeau, o poder constituinte é o mais candente testemunho, eis que o mesmo não antecede o Estado, senão porque se lhe impõe.”