Esqueçam o que eu defendi Ao lembrar os 20 anos da Constituição de 1988, o presidente reconhece que seu trabalho hoje seria mais complicado se a carta atendesse o que ele pedia quando era deputado “Ainda não foi desta vez que a classe trabalhadora teve uma Constituição voltada para seus interesses. Por isso, o PT votará contra o texto” “Seria muito mais difícil governar o país hoje, se tudo o que o PT queria naquela época tivesse sido aprovado” Correio Qual foi o grande avanço da Constituição de 1988 e hoje qual o desafio para ela? Presidente Lula Tudo que nós alcançamos até agora foi fruto da Constituição de 1988. Ela universalizou direitos sociais, investiu contra a pobreza e a desigualdade, estabeleceu as condições para que possamos viver hoje nosso melhor momento econômico. Mas eu penso que o mais importante é o seu caráter democrático. No Brasil, todo mundo tem o direito constitucional de exercer plenamente sua cidadania, por meio do voto. Não importa a cor, o sexo, se sabe ler ou não. Somos uma das maiores nações democráticas do mundo, realizamos eleições diretas e regulares. É isso que assegura estabilidade institucional ao país, que proporciona o mais longo período de democracia contínua da nossa história e faz com que um metalúrgico possa se eleger presidente da República. O desafio do país é criar condições para cumprir totalmente cada princípio fundamental, cada direito social previsto na Constituição. Estamos evoluindo nos direitos sociais e na economia, mas ainda temos de avançar mais na construção de uma sociedade mais justa e desenvolvida, na erradicação da pobreza, na promoção do bem comum. E isso não se resolve por decreto. O senhor acha que a Carta merece o título de Constituição cidadã? A Assembléia Nacional Constituinte foi o momento mais rico da vida parlamentar brasileira. Houve uma participação popular como nunca se viu no país, com milhares de pessoas indo ao Congresso fazer pressão, reivindicar. Foi graças a esse estímulo, que fizemos uma Constituição extremamente avançada. Hoje, eu repetiria o Ulysses Guimarães naquele pronunciamento às três horas da manhã do dia cinco de outubro: "é a Constituição Cidadã". O senhor defende uma revisão constitucional? Nos últimos 20 anos, a sociedade brasileira evoluiu muito em diversas áreas, como a economia e o comportamento. Se a maioria entender que é preciso adequar a Constituição à nova realidade, não há problema em fazer uma emenda para alterar alguns pontos. O governo defende, por exemplo, a reforma tributária, para simplificar o pagamento de impostos, e a reforma política, para fortalecer os partidos. O que não se pode mudar são os princípios fundamentais da Constituição. Por que votou contra a Carta? Por conta dessa posição, como ele, como presidente, vê a Constituição de 1988? O PT foi para a Constituinte defendendo que os direitos sociais fossem regulamentados de imediato, na própria Constituição, para não acontecer o que aconteceu em 1946, quando o que ficou para ser regulamentado depois, por lei, enfrentou dificuldades para ser implementado efetivamente. Aliás, seria muito mais difícil governar o país hoje, se tudo o que o PT queria naquela época tivesse sido aprovada. Mas o fato é que, por causa da questão dos direitos sociais, a maioria da bancada achou que tinha de votar contra - mesmo sabendo que havia avanços extraordinários -, e nós nos sentimos obrigados a votar contra. Mas, nesse momento, também houve uma discussão sobre assinar ou não. Eu era o líder da bancada e defendi que tínhamos de assinar, porque participamos do processo, trabalhamos três anos naquilo. Era dever de todos deixar o nome na história. E assinamos.