Projovem_Adolescente_Adolescencias Juventudes

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ADOLESCÊNCIAS, JUVENTUDES
E SOCIOEDUCATIVO:
Concepções e Fundamentos
1ª Edição
Brasília
2009
Expediente:
Esta é uma publicação técnica da Secretaria Nacional de Assistência Social.
Secretária Nacional de Assistência Social: Ana Lígia Gomes
Diretora do Departamento de Gestão do SUAS: Simone Aparecida Albuquerque
Diretora do Departamento de Proteção Social Especial: Valéria Maria Massarani Gonelli
Diretora do Departamento de Benefícios Assistenciais: Maria José de Freitas
Diretor-Executivo do Fundo Nacional de Assistência Social: Fernando Antônio Brandão
Diretora do Departamento de Proteção Social Básica: Aidê Cançado Almeida
Coordenadora-Geral de Regulação das Ações de Proteção Social Básica: Mariana López Matias
Assessor Técnico do Departamento de Proteção Social Básica: Alexandre Valle dos Reis
Colaborador: Jeison Pábulo Andrade.
Consultoria*:
Dra. Silvia Helena Simões Borelli (Coordenadora);
Dra. Raquel Raichelis Degenszajn;
Dra. Rosangela Oliveira Dias Paz;
Dra. Abigail Silvestre Torres;
Alex Fabiano de Toledo;
Dra. Isaura Isoldi de Mello Castanho e Oliveira;
Dr. Pedro de Carvalho Pontual e
Stela da Silva Ferreira.
*Equipe de pesquisa e elaboração do Instituto de Estudos Especiais/
IEE da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).
Tiragem: 30.000 exemplares
Projeto Gráfico: Grafix Dourado & Souza Ltda CNPJ: 02.341.721/0001-90
Impressão: Gráfica Brasil
Coordenação da Publicação: Departamento de Proteção Social Básica.
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
Secretaria Nacional de Assistência Social
Esplanada dos Ministérios, Bloco C, 6° andar, sala 641
CEP: 70.054-900 –Brasília – DF
Telefone 0800 707 2003
http://www.mds.gov.br
Adolescências, juventudes e socioeducativo : concepções e fundamentos /
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. – 1. ed. –
Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
2009.
56 p. (Projovem Adolescente : Serviço Socioeducativo)
ISBN 978-85-60700-20-2
ISBN 978-85-60700-21-9
1. Juventude. 2. Assistência Social. 3. Políticas Públicas. 4. Serviço socioeducativo. 5. Programa Nacional de Inclusão de Jovens – PROJOVEM.
I. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. II.Título.
PROJOVEM Adolescente
Apresentação
O tema da juventude ocupa um lugar de destaque na Agenda Social do Governo Federal, cujos objetivos gerais
são a redução da pobreza e da desigualdade, a erradicação da fome e a promoção da autonomia e da inclusão social das
famílias brasileiras em situação de vulnerabilidade.
Com igual ênfase política e de maneira complementar ao Plano de Aceleração do Crescimento – PAC, a Agenda
Social enuncia prioridades e organiza as ações que vêm demonstrando, na prática, ser possível promover o crescimento
econômico aliado ao desenvolvimento social.
No processo de construção da Agenda Social, sob a coordenação da Secretaria-Geral da Presidência da
República, os Ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – MDS, do Trabalho e Emprego – MTE,
da Educação – MEC, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos – SEDH e a Secretaria Nacional de Juventude
– SNJ constituíram um Grupo de Trabalho com a tarefa de discutir a integração de programas governamentais
voltados aos jovens – Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano, Saberes da Terra, Projovem, Consórcio
Social da Juventude, Juventude Cidadã e Escola de Fábrica. O objetivo foi elaborar uma estratégia que articulasse
intersetorialmente as políticas públicas e os respectivos programas, conferindo-lhes escala, otimizando ações e
potencializando resultados.
Como resultado dessa iniciativa, optou-se pela reformulação do Programa Nacional de Inclusão de Jovens –
Projovem, criado em 2005, ampliando sua faixa etária para o público de 15 a 29 anos e criando quatro modalidades:
Projovem Adolescente – Serviço Socioeducativo, Projovem Urbano, Projovem Trabalhador e Projovem Campo –
Saberes da Terra. O novo Projovem foi lançado em setembro de 2007 pelo Presidente da República, Luís Inácio Lula
da Silva, e posteriormente regulamentado pela Lei nº 11.629, de 10 de junho de 2008.
A intersetorialidade na concepção e implantação do Projovem vai além da sua gestão compartilhada e busca
alcançar a efetiva integração de programas e ações promovidos por cada um dos ministérios parceiros. Sua lógica visa
assegurar um atendimento integral e contínuo aos jovens dos 15 aos 29 anos de idade, oferecendo-lhes a possibilidade
de participação nas diversas modalidades do Programa.
O Projovem Adolescente, coordenado pelo MDS, é voltado para jovens de 15 a 17 anos de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família e jovens vinculados ou egressos de programas e serviços da proteção social
especial, como o Programa de Combate à Violência e à Exploração Sexual e o Programa de Erradicação do
Trabalho Infantil – PETI, ou ainda jovens sob medidas de proteção ou socioeducativas previstas no Estatuto da
Criança e do Adolescente. Como forma de promover e garantir a intersetorialidade na modalidade Projovem
Adolescente foi constituído um comitê, sob a coordenação do MDS, com representantes dos ministérios e secretarias parceiros, a saber: Ministérios da Cultura, do Esporte, da Saúde, do Meio Ambiente, do Trabalho, da
Educação, Secretaria Especial de Direitos Humanos, Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade
Racial e Secretaria Nacional de Juventude.
Um importante avanço na concepção da política de proteção e promoção social para os jovens e suas famílias é o
aprofundamento da integração entre as transferências de renda e os serviços socioassistenciais. A alteração dos critérios
de concessão dos benefícios variáveis do Programa Bolsa Família, estendidos às famílias com jovens de 16 e 17 anos que
frequentam a escola, foi articulada à modalidade Projovem Adolescente, como parte de uma acertada estratégia de promover a integração das políticas sociais voltadas à juventude, público mais exposto à violência e ao desemprego.
PROJOVEM Adolescente
O Projovem Adolescente – Serviço Socioeducativo configura-se, assim, como mais um passo importante na consolidação da rede de proteção e promoção social que estamos construindo de forma republicana e pactuada no Brasil.
Ele é mais um componente do processo de construção do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, implementado
com a atuação solidária do Governo Federal, de Estados, de Municípios e do Distrito Federal.
Desde a criação do MDS, em janeiro de 2004, temos trabalhado vigorosamente pelo fortalecimento e institucionalização das políticas de proteção e promoção social, promovendo a estruturação de uma rede articulada de políticas de Assistência
Social, de Segurança Alimentar e Nutricional e de Renda de Cidadania. Estamos ainda ampliando e integrando as ações de
geração de oportunidades para a inclusão produtiva voltada às famílias em situação de pobreza e vulnerabilidade social.
Nosso compromisso é consolidar essas políticas no campo das políticas públicas de garantia de direitos de cidadania,
regulamentadas com padrões de qualidade, critérios republicanos de alocação de recursos, transparência e controle social.
No Projovem Adolescente, esse compromisso está expresso neste conjunto de publicações. Aqui são apresentados os fundamentos, a concepção, os referenciais e princípios metodológicos estruturantes e norteadores das ações
integrantes do Projovem Adolescente – Serviço Socioeducativo.
Mais do que superar a fome e a miséria – estabelecendo um patamar mínimo obrigatório de dignidade humana
– é necessário garantir a todos as oportunidades para desenvolverem plenamente suas potencialidades e capacidades e,
assim, viverem de forma digna e autônoma. Esse é o propósito que une as pessoas de bem, comprometidas com a justiça social, que tratam as políticas sociais de forma republicana e suprapartidária, como uma responsabilidade do poder
público com a melhoria da qualidade de vida de nossos cidadãos, principalmente daqueles historicamente alijados do
processo de desenvolvimento do País. O investimento que estamos fazendo hoje em nossa juventude seguramente
trará frutos não apenas para seus beneficiários diretos, mas para toda a nação brasileira.
Patrus Ananias de Sousa
Ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
PROJOVEM Adolescente
O Projovem Adolescente na Política Nacional
de Assistência Social – PNAS
O Projovem Adolescente – Serviço Socioeducativo integra a Política Nacional de Assistência Social, política pública de proteção social de caráter universalizante, que se materializa por meio do Sistema Único de Assistência Social –
SUAS, composto por uma rede articulada e orgânica de serviços, programas, projetos e benefícios socioassistenciais.
A política de assistência social, desenvolvida no âmbito da seguridade social, juntamente com a saúde e a previdência social, organiza-se em proteção social básica (que visa a prevenção de situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições em várias dimensões e do fortalecimento de vínculos familiares e comunitários)
e em proteção social especial (que visa a proteção a indivíduos e famílias em situação de risco pessoal e social, em
decorrência de abandono, maus-tratos, exploração sexual, envolvimento com atos infracionais, trabalho infantil, entre
outras). A intervenção de cada forma de proteção, ou de ambas, depende das necessidades dos contextos de prevenção
ou da ocorrência de riscos e da complexidade dos danos sociais e do comprometimento do direito à vida e à sobrevivência que envolva indivíduos, famílias ou grupos sociais.
Na Política Nacional de Assistência Social (PNAS/2004), a concepção de proteção social amplia o campo da
assistência social pelo significado preventivo incluído na ideia de proteção. “Estar protegido significa ter forças próprias
ou de terceiros, que impeçam que alguma agressão / precarização / privação venha a ocorrer, deteriorando uma dada
condição.” (SPOSATI, 2007, p. 17).
A PNAS, nessa perspectiva, organiza sua rede socioassistencial não mais em função de públicos, mas de seguranças que respondam às necessidades e assegurem direito, dentre os quais:
(a) segurança de renda, cujo objetivo é garantir que todo cidadão brasileiro, independentemente de ter vínculos ou não com trabalho, tenha acesso à provisão material necessária para suprimento de suas necessidades básicas,
por meio do acesso aos benefícios socioassistenciais e a outras formas de transferência de renda. A segurança de renda
também se materializa por meio da realização de projetos de enfrentamento à pobreza;
(b) segurança de acolhida, que visa garantir o direito das pessoas ao atendimento, por profissional qualificado, para
obter informações sobre direitos e como acessá-los. Em casos de abandono, fragilização ou perda de vínculos familiares ou
em situações que impeçam a convivência e a permanência na família, os serviços de acolhida operam na atenção às necessidades humanas de abrigo, reforço (ou construção) de vínculos familiares, proteção à vida, alimentação e vestuário;
(c) segurança do convívio, que tem por foco a garantia do direito constitucional à convivência familiar e à
proteção à família, com vistas ao enfrentamento de situações de isolamento social, enfraquecimento ou rompimento
de vínculos familiares e comunitários, situações discriminatórias e estigmatizantes, por meio de ações centradas no
fortalecimento da autoestima, dos laços de solidariedade e dos sentimentos de pertença e coletividade. Alguns autores1
se referem às relações de convivência como uma rede de apoios de sociabilidades, capaz de oferecer um ambiente educativo e emocionalmente seguro às pessoas em sua convivência social.
O Projovem Adolescente articula um conjunto de ações dos dois âmbitos da proteção social – básica e especial – e
busca desenvolver seguranças sociais de acolhida, convívio familiar e comunitário. Destina-se a jovens de famílias em condi1. Entre os quais, Aldaíza Sposati (2007) e Maria do Carmo Brant de Carvalho (2003).
PROJOVEM Adolescente
ções de extrema pobreza e àqueles marcados por vivências resultantes de diferentes circunstâncias de riscos e vulnerabilidades
sociais – retirados de situações de trabalho infantil, abuso e exploração sexual, violência doméstica, abandono, negligência e
maus-tratos – e alguns em situação de conflito com a lei, cumprindo medidas socioeducativas em meio aberto ou egressos
de medida de internação – Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
De forma preventiva e potencializadora do papel de referência e contrarreferência do Centro de Referência de
Assistência Social – CRAS, o Projovem Adolescente visa contribuir para fortalecer as condições de autonomia das
famílias e dos jovens, para que possam gerir seu processo de segurança social.
O Projovem Adolescente, como serviço socioeducativo, apoia-se em dois importantes pilares do SUAS:
1) matricialidade sociofamiliar: que considera a capacidade protetiva e socializadora da família (seja ela biológica ou construída) em relação aos jovens em seus processos peculiares de desenvolvimento, assim como leva em conta
a necessidade de que as políticas públicas compreendam a família como portadora de direitos e de proteção do Estado,
bem como assegurem o seu papel de responsável pelo desenvolvimento dos jovens e garantam o exercício pleno de
suas funções sociais;
2) territorialização: o serviço deve ser ofertado próximo à moradia dos jovens e suas famílias, no território de
abrangência do CRAS. Define-se aí um universo cultural e histórico e um conjunto de relações e interrelações a serem
considerados, bem como situações a serem objeto da ação articulada das diversas políticas públicas.
Outro fato a destacar é a intersetorialidade dos serviços socioassistenciais que diz respeito à:
a) oferta tanto do Serviço Socioeducativo do Projovem Adolescente, como de outras políticas públicas básicas (Saúde, Educação, Meio Ambiente, Assistência Social, Trabalho, Esporte e Lazer, Cultura, Direitos Humanos e
Segurança Alimentar);
b) socialização e democratização do acesso a esses serviços e benefícios; e
c) articulação e funcionamento intersetorial dos serviços, como condições para sua universalidade de acesso e de
ampliação dos direitos de cidadania das pessoas.
O conjunto de necessidades decorrentes da pobreza e dos processos de exclusão social e vulnerabilidades sociais,
aliado às necessidades peculiares do desenvolvimento dos jovens em seu ciclo de vida, exigem ações que vão além da
transferência de renda e bens materiais. Trata-se de associar serviços e benefícios que permitam a prevenção de riscos
e contribuam para o reforço da autoestima dos jovens, o desenvolvimento de sua autonomia e capacidade de sobrevivência futura, bem como para a ampliação de seu acesso e usufruto à cultura e aos bens sociais.
As ações de proteção social que viabilizam um conjunto de bens sociais, serviços e benefícios não-materiais
situam-se no arco dos serviços socioeducativos que se constituem no caráter principal do Projovem Adolescente e
estarão refletidas no Traçado Metodológico.
O Serviço Socioeducativo do Projovem Adolescente integra-se a outras estratégias de ação voltadas para as famílias, tais como o Programa Bolsa Família – PBF e o Serviço de Proteção e Atenção Integral à Família – PAIF, implementados no Centro de Referência de Assistência Social – CRAS, e aos programas e serviços de proteção social especial
executados pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS, voltados aos jovens, às famílias e
PROJOVEM Adolescente
à comunidade. Essa integração se dá de forma complementar e não substitutiva, de modo a proporcionar alternativas
emancipatórias para o enfrentamento da vulnerabilidade social decorrente das condições de pobreza e de desigualdades
sociais, as quais afligem milhares de famílias nas diversas regiões do Brasil.
Decerto os problemas sociais estão arraigados profundamente na vida dos homens e mulheres desse país. São
problemas complexos e de difícil solução. Atuar em escala e preventivamente junto à juventude, abrindo-lhe oportunidades de desenvolvimento humano, inserção social e participação cidadã, como propõe o Projovem Adolescente, é
um passo importante que se dá rumo à sociedade que almejamos construir.
Secretaria Nacional de Assistência Social
PROJOVEM Adolescente
Sumário
1. Juventudes, adolescências........................................................................................................................................................15
1.1. Jovens e juventudes ...................................................................................................................................................15
1.1.1 Coletivos juvenis e redes de socialidades ..................................................................................................17
1.1.2 Nomadismos e gregarismos ........................................................................................................................18
1.1.3 Inclusão produtiva/mundo do trabalho ......................................................................................................19
1.1.4 A criminalização e o estigma da violência .................................................................................................20
1.1.5 Temporalidades ............................................................................................................................................21
1.1.6 Tensões geracionais .....................................................................................................................................21
1.2. Adolescentes, adolescências .....................................................................................................................................22
2. Políticas públicas, adolescências e juventudes: a concretização do direito..........................................................................31
2.1 O direito de jovens e adolescentes à assistência social ............................................................................................35
3. O socioeducativo em questão: formas de potencializar a convivência e a participação.....................................................41
3.1 O socioeducativo como direito à assistência social .................................................................................................47
4. Bibliografia................................................................................................................................................................................50
PROJOVEM Adolescente
Introdução
É preciso compreender o presente não apenas como presente de limitações, mas como
presente de possibilidades. (PAULO FREIRE)
A Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004 – vive um presente de intensa ebulição. O processo
de definição de um novo arcabouço político-institucional que assegure a ação pública comprometida com direitos socioassistenciais tem requerido debates constantes, revisões de práticas historicamente instaladas e definição
de pactos de corresponsabilidade. Tal dinâmica tem oferecido inúmeras possibilidades e desafios que requerem
um alinhamento de todos os sujeitos envolvidos, de modo a construir coletivamente um outro patamar de atenção às necessidades sociais.
O convite agora é para o diálogo entre a Política Nacional de Assistência Social e a proposta de firmar-se uma
Política Nacional para a Juventude que articule diferentes setores e distintas áreas do saber. Esta interlocução deve ser
pautada por uma compreensão dos jovens como sujeitos de direitos, o que requer posturas que favoreçam e estimulem
o protagonismo juvenil, valorizem saberes adquiridos, respeitem a diversidade de culturas e valores; que assegurem,
enfim, o acesso a políticas de proteção social com a participação ativa de adolescentes e jovens em todo o ciclo de seu
desenvolvimento.
O debate sobre a Política Nacional para a Juventude é igualmente recente e avançou significativamente no Brasil
a partir da instalação, em 2004, do grupo interministerial responsável por estabelecer um diagnóstico sobre a situação
da juventude brasileira. Tal grupo gerou a criação do Conselho Nacional de Juventude e, mais recentemente, desencadeou a unificação das iniciativas do Governo Federal para a Juventude por meio do Programa Nacional de Inclusão
de Jovens – PROJOVEM.
Pois bem, é a partir desse presente repleto de desafios e possibilidades que o texto a seguir busca oferecer subsídios para que os gestores e profissionais da assistência social, no âmbito municipal, possam implantar o Projovem
Adolescente – Serviço Socioeducativo, em consonância com as diretrizes nacionais do Sistema Único de Assistência
Social – SUAS e utilizando-se do conhecimento acumulado acerca das juventudes e adolescências no Brasil, em toda
a sua riqueza e diversidades.
Neste texto, o leitor encontrará uma reflexão conceitual que busca favorecer a compreensão acerca de quem
são os jovens e adolescentes brasileiros, as articulações entre a Política Nacional de Juventude e a Política Nacional de
Assistência Social e as dimensões do trabalho socioeducativo, que devem orientar o trabalho com o coletivo juvenil.
Para favorecer a aproximação de elementos conceituais importantes para nortear a atenção a jovens e adolescentes na Assistência Social, a primeira reflexão proposta diz respeito a melhor compreender: de que jovens e adolescentes
falamos? Com quais conceitos de juventude e adolescente trabalhamos?
A particularidade do Projovem Adolescente requer a compreensão tanto de juventudes quanto adolescências,
reconhecendo-se a heterogeneidade de interesses, expectativas e desejos entre adolescentes de 15 e de 17 anos. Aqui se
inserem os debates acerca da diversidade de experiências e presenças dos coletivos juvenis brasileiros nas esferas privada
e pública, que conduzem a vivências cotidianas distintas nos diversos territórios de moradia e de vida em que se situam. O desafio maior é aprofundar o conhecimento das singularidades e das universalidades que os distinguem, para
superar preconceitos e mitos e colaborar para promover sua inclusão social.
PROJOVEM Adolescente
O debate que se segue diz respeito à identificação da responsabilidade das políticas sociais públicas na atenção
a jovens e adolescentes. A reflexão busca explicitar pontos de interseção nos marcos regulatórios das políticas sociais
brasileiras, pós Constituição de 1988, destacando-se os compromissos democraticamente firmados pelos entes federados e por diferentes instâncias político-institucionais, que requerem ações efetivas para a consolidação dos direitos ali
expressos, com destaque especial para os direitos de jovens e adolescentes à proteção social da Assistência Social.
O texto se encerra com as reflexões acerca do trabalho socioeducativo, comprometido com a promoção e o
favorecimento da autonomia, da participação, do convívio com a diferença, a valorização da liberdade e da criação,
dimensões essas que sejam capazes de provocar a reinvenção dos modos de compreender e lidar com jovens e adolescentes no âmbito da Política de Assistência Social.
É a partir dessa concepção de que é possível a reinvenção do trabalho socioeducativo com jovens e adolescentes que
são apresentados, no Traçado Metodológico que integra este material de orientação, as diretrizes e modos de funcionamento do Projovem Adolescente. O objetivo, portanto, é oferecer todos os elementos necessários para que, seguindo as
diretrizes do Sistema Único de Assistência Social, o serviço socioeducativo seja implantado em todo o território nacional
de forma a assegurar sua unidade conceitual e metodológica, respeitadas as diversidades regionais e locais.
A ênfase presente em todo o texto, e que será intencionalmente reiterada por diversas vezes, diz respeito a superar
práticas reiteradoras de subalternidade e de preconceitos contra jovens e adolescentes, substituindo-as por aquelas que
estimulem e favoreçam a presença e a voz, o respeito às diferenças e o exercício da autonomia. O convite é, pois, para
que transformemos nosso tempo presente em um tempo de mudanças, de reflexão sobre os caminhos percorridos e
a projeção de novos rumos, em uma travessia que possibilite novos “olhares e fazeres” no campo das políticas para a
juventude:
Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do
nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o
tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós
mesmos. (Fernando Pessoa)
PROJOVEM Adolescente
15
1. JUVENTUDES, ADOLESCÊNCIAS2
1.1. JOVENS E JUVENTUDES3
A cultura de massa dá forma à promoção dos valores juvenis e assimila uma parte das experiências
adolescentes. Sua máxima é “sejam belos, sejam amorosos, sejam jovens”. Historicamente, ela acelera o vira-ser, ele mesmo acelerado de uma civilização. Sociologicamente, ela contribui para o rejuvenescimento da
sociedade. Antropologicamente, ela prolonga a infância e a juventude junto ao adulto. Metafisicamente,
ela é um protesto ilimitado contra o mal irremediável da velhice (EDGAR MORIN).
A experiência juvenil ou os modos de ser e de viver de jovens no Brasil, América Latina e em muitas partes do
mundo é complexa e encontra-se atravessada por grandes temas e formas de inserção heterogêneas e implica, para
muitos, a vivência cotidiana de dolorosas e por vezes intransponíveis situações de exclusão.
De que jovens falamos? Para responder a esta indagação propomos um caminho de reflexão que nos permita
“pensar juntos” sobre as condições de vida dos jovens referidos ao Projovem Adolescente.
Parte-se da premissa de que ser jovem (BORELLI; ROCHA; OLIVEIRA, 2007) significa responder por inserções singulares e experimentar, de forma conflituosa: a hierarquia de classes; as desigualdades sociais; a maior ou menor
exposição à violência e os limites entre vida e morte; as condições de gênero, etnia, nível de escolaridade, qualidade de
moradia, pertença familiar; a diversidade cultural; o acesso ou a exclusão ao consumo; a participação política, cultural,
comunitária; o protagonismo juvenil.
Tais singularidades expressam-se nas próprias diversidades que marcam a condição juvenil. Publicação da pesquisa IBASE/PÓLIS (2005) aponta que dos 34 milhões de jovens existentes no Brasil, 28,2 milhões (83%) vivem nas
zonas urbanas e 5,9 milhões (17%) na zona rural (IBGE, 2004). Publicação do MEC/Ação Educativa (2007), por sua
vez, mostra que no conjunto da população não alfabetizada no Brasil (estimado em 16 milhões de pessoas no Censo
de 2000), os jovens aparecem como segmento específico que chama a atenção, com um total aproximado de 3 milhões
(IBGE, Censo 2000). Deste total de jovens não alfabetizados, mais da metade encontra-se na região nordeste (60 em
cada 100 jovens), a maioria vive na zona rural (16 em cada 100), enquanto nas cidades, a proporção é de 7 para 100.
As desigualdades também se evidenciam em relação ao gênero e aos diferentes grupos étnicos/raciais: a maior parte dos
não alfabetizados é composta por rapazes e moças negras.
Essa tendência permite conceber jovens e juventudes no plural e construir uma reflexão que seja capaz de responder por este ou aquele coletivo juvenil particular, situado, que constrói relações dentro de seus próprios territórios:
a cidade, o bairro, a rua, a família, a escola, a igreja, os diversos polos de ação das políticas públicas, organizações nãogovernamentais e outras instituições que garantem aos jovens uma designação local, um lugar de origem e de referência para o desdobramento de suas trajetórias de vida. Alguns autores enfatizam que esta singularidade juvenil estaria
diretamente conectada às condições de pertença a esta ou aquela classe social:
2. O perfil do público alvo do Projovem Adolescente, cuja faixa etária varia entre 15 e 17 anos, constitui-se em um segmento híbrido, mesclado
na fronteira entre a adolescência e a juventude. Deste pressuposto resulta tanto uma concepção voltada para os jovens e as juventudes, quanto
outra, referida aos adolescentes e adolescências.
3. Para uma conceituação sobre jovens/juventude ver: BORELLI, Silvia Helena Simões; ROCHA, Rosamaria Luiza de Melo; OLIVEIRA, Rita Alves
et alii. Jovens na cena metropolitana: percepções, narrativas e modos de comunicação. São Paulo: Paulinas, 2009 (no prelo).
16
PROJOVEM Adolescente
Juventude é um conceito vazio de conteúdo fora de seu contexto histórico e sociocultural (...) O conceito de juventude se inscreve nas características fundamentais da classe social
de pertença (...) O estudo dos fenômenos juvenis, portanto, só será entendido no marco geral
das grandes mudanças socioeconômicas e culturais (VALENZUELA, 1998, p. 38-39).
Entretanto, de forma a somar e não excluir, é possível pensar jovens e juventudes não apenas pelas marcas da diferença, mas também pela percepção de que há alguns substratos universais (MORIN, 1984) – que podem ser avaliados
como positivos ou negativos – identificáveis em jovens e coletivos juvenis com visibilidade em todo o mundo: enfrentam
conflitos intergeracionais; inventam e se comunicam por meio de linguagens que lhes são próprias – e isto parece ainda
mais evidente no uso das novas tecnologias, móveis e interativas; assumem certo tom de rebeldia, heroísmo e gosto pela
aventura; aderem ao movimento, ao jogo, às intensas emoções; manifestam forte ligação com o presente – aqui e agora
–, certa dificuldade em equacionar o passado – nem sempre as lembranças são boas – e alguma relutância em projetar
o futuro – há um tanto de vazio na espera; valorizam o novo e a novidade e tendem a desconsiderar a experiência – em
especial, o saber e o conhecimento acumulado pelos mais velhos; buscam a autorrealização, exaltam a vida privada, o
consumo e os ideais de beleza, amor e felicidade (BORELLI; ROCHA; OLIVEIRA, 2007).
Oscilam entre o nomadismo – ganhar a rua, atravessar a cidade, conhecer o mundo para além das fronteiras
territoriais – e o gregarismo – voltar para casa, buscar refúgio e segurança, reconstruir redes de sociabilidade; desfrutam
de alguns gostos culturais e estilos de vida semelhantes no oriente e no ocidente, nos centros e nas periferias das grandes metrópoles, em alguns agrupamentos indígenas e coletivos autorreferidos etnicamente: a música, alguns itens de
vestimenta – como o tênis, por exemplo –, os adereços e acessórios, o uso – ou o desejo de usar – das novas tecnologias
são capazes de fornecer pistas interessantes para a construção destas cartografias de perfil mais universalizante.
Nesse sentido, as alternativas propostas – jovens e juventudes ao mesmo tempo como referências singulares e
universais – devem dialogar entre si de forma a evitar a exclusão ou correr o risco de compreender a juventude apenas
como “etapa, ponte, momento sem consistência ou identidade reduzido a uma mera transição entre grupos de idade”
(MARTÍN-BARBERO, 1998, p. 23).
Vale a pena esclarecer que, quando o conceito de identidade é aqui acionado, ele não supõe, de forma alguma,
qualquer conotação de homogeneidade; pelo contrário, reforça a heterogeneidade, a diversidade cultural e a existência de múltiplas juventudes particulares:
Em nenhuma parte do mundo a juventude representa um bloco homogêneo capaz de
responder por um conjunto de categorias fixas (...) [Os jovens] trabalham, vão à escola, abraçam
algumas causas, mas os referenciais identitários não passam pela fábrica, pela escola, pelo partido. A identidade está em outra parte. São identidades móveis, efêmeras, mutantes, capazes de
respostas ágeis e, por vezes, surpreendentemente comprometidas (REGUILLO, 1988, p. 58).
O que se reivindica do ponto de vista conceitual é que os jovens possam emergir não pela negação, pelo “não ser”
– criança ou adulto – mas por um estatuto afirmativo que procure dar conta daquilo que realmente representam ou, em
outras palavras, da “emergência da juventude como ator social, com estatuto próprio, sensibilidade e expressões próprias,
trânsitos urbanos, apropriações e ressignificações” (CUBIDES, TOSCANO e VALDERRAMA, 1998:X).
Sintetizando este ponto: é fundamental a perspectiva universal e também é imprescindível a compreensão sobre
o caráter singular destas juventudes no plural: o que podemos assumir é que os jovens são, ao mesmo tempo, universais
e singulares e que vivem em situações de fortes tensões entre o seu mundo e o mundo dos outros; mundo de adultos
PROJOVEM Adolescente
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organizado por lógicas institucionais que nem sempre conseguem incorporar outras sensibilidades, novas formas de
relacionamentos, conhecimento, experimentação.
Há um dado interessante a ser considerado e que pode nos ajudar a estabelecer a importância e o significado de
ser jovem no mundo de hoje. A “juvenilização e longevidade juvenil” tornaram-se, historicamente, princípios marcantes na constituição de um modelo de sociedade moderna. E esse modelo não diz respeito apenas a jovens instituídos
em faixas etárias ou situados pelo recorte da geração; ele permite o vazamento das fronteiras:
O novo modelo (...) é o do homem e da mulher que não querem envelhecer que querem ficar
sempre jovens (...) Igualmente, o tema da juventude não concerne apenas aos jovens, mas também
àqueles que envelhecem (...) O adulto juvenil de trinta, quarenta, cinquenta, sessenta anos (...) até
as portas da morte, com a angústia da morte que confere certa febre ao presente (MORIN, 1984,
p. 152-153).
No mercado de bens simbólicos ser jovem é ter prestígio; os que emanam ‘juventude’
têm alta cotação (MARGULIS; URRESTI, 1998, p. 5).
Os jovens aparecem enquanto um coletivo singular se colocados, por exemplo, em contraposição às gerações que
os antecedem. Dialogam com tradições e modelos mais conservadores de conduta e percepção – lógicas institucionais e
familiares; educação oficial e religiosa que, inúmeras vezes, recusam as práticas e os saberes cotidianos, criando tensões
e afastamentos; mercado de bens simbólicos que os transforma em consumidores, ora incluindo, ora excluindo; mas
introjetam, também, outras formas de sensibilidade, adquiridas na relação com a cultura moderna, o consumo cultural
e a cultura das mídias e, em especial, hoje em dia, na forma como se apropriam dos recursos resultantes de suas relações, mesmo que eventuais, com as novas tecnologias. Esse processo não se dá por exclusão entre tradições e rupturas,
mas por conflituosas interações capazes de gerar tensões, mas também sensórios e sensibilidades bastante complexos. É
importante ressaltar que estas tensões entre modelos tradicionais e condutas transformadoras podem ser observadas, ao
mesmo tempo – mesmo que de forma diversificada e em maior ou menor intensidade –, em jovens que habitam grandes centros urbanos ou cidades de menor porte, assim como em jovens que vivem em comunidades indígenas, distantes
dos pólos urbanizados (VITTI, 2005).
1.1.1 Coletivos juvenis e redes de socialidades
É necessário considerar, na compreensão e avaliação dos coletivos juvenis e na implantação de modalidades
de serviços socioeducativos como o Projovem Adolescente, que alguns jovens, em especial aqueles que vivem em
grandes cidades, articulam-se preferencialmente em redes de “socialidades”, buscando formas mais autônomas e,
por vezes, autogestionárias, de “estar juntos”; o objetivo aparente na formação destes coletivos é o de questionar
relações sociais institucionalmente constituídas e imprimir uma marca de independência em relação às organizações formais da sociedade. Enquanto muitas das instituições sociais privilegiam o que tem sido conceituado
como “sociabilidades” – “indivíduos e suas associações contratuais” –, a “socialidade vai acentuar as dimensões
afetiva e sensível, onde se cristalizam as agregações de toda ordem, tênues, efêmeras, de contornos indefinidos”
(MAFFESOLI, 1987, p. 101-102).
Por meio das redes de socialidade – e nem sempre articulados a projetos institucionais –, alguns coletivos
juvenis se tornam atores sociais, participam e intervêm em processos dentro de suas próprias comunidades, assim
como nos espaços públicos das cidades em que residem. Alteram e transformam as estruturas e características ori-
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ginais dos cenários urbanos pela ação da música, teatro, leituras e narrativas, dança e arte popular urbana, entre
elas: grafites, pichações, stickers4 (OLIVEIRA, 2006); intervêm em movimentos voltados para a ecologia, o meio
ambiente, as novas ordens planetárias, entre outras alternativas de participação5 que adquirem um caráter político
por sua intencionalidade e pelas formas por meio das quais se apropriam dos espaços públicos transformando-os,
mesmo que efemeramente, em “lugares seus”.
Dessa forma, seria interessante atentar para os novos sentidos que se pode atribuir ao que, tradicionalmente, consideramos participação ou mesmo participação política: observa-se a emergência de alternativas de participação, novas “artes de fazer”
(CERTEAU, 1994) e conceber o político e a política, em propostas assumidas, inúmeras vezes, por estes coletivos juvenis.
1.1.2 Nomadismos e gregarismos
Um dos elementos que se sobressai na caracterização do perfil da juventude, em tempos modernos ou pós-modernos,
diz respeito a sua condição de mobilidade ou, em outras palavras, ao nomadismo. O nomadismo tanto pode ser entendido
em seu sentido literal – deslocamento espacial e geográfico ou mesmo “des-centramento, des-espacialização” (MARTÍNBARBERO, 1997) – como também o significado se amplia em direção a uma mobilidade temporal – viver tempos de
passagem, de alternância momentânea, de simultaneidades; ou, ainda, supor a existência de um nomadismo de percepção
– absorver fluxos, filtrar, aparar, assimilar, equacionar os inúmeros “chocs” (BENJAMIN, 1989, p. 109-113) que resultam de
uma vida cotidiana tensa e intensa permeada pela relação com a cidade e também conectada a “velhas” e “novas” mídias.
É interessante observar que mesmo jovens inseridos em outros lugares que não as grandes cidades, experimentam esta mobilidade temporal e espacial, propiciada, por exemplo, pelo contato com a televisão ou mesmo com a
Internet, quando acessível. Esta relação com as mídias permite que o distante se torne próximo, inserido em seu cotidiano doméstico e familiar, e que a informação possa ser apropriada quase que em tempo real.
O nomadismo torna-se mais claro quando compreendemos que os jovens se percebem situados em um mundo “estranho/estrangeiro” (MAFFESOLI, 2000, p. 152-153) e que sua inserção se dá de forma contraditória: ora respondem de maneira organizada e programada, acatando propostas originadas das instituições – Estado, família, igreja, escola –, atuando no
contexto familiar e comunitário, solidificando a pertença e os laços identitários e reforçando, portanto, sua condição gregária
– viver em grupo e buscar no território o refúgio e a proteção que a família, a igreja, a escola e os projetos de políticas públicas
podem oferecer; ora, contudo, replicam, de tempos em tempos, de forma “insidiosa, desordenada e insolente” expressando
a recusa às imposições de um contexto institucional que consideram “envelhecido” e dele desejam se distanciar. Os jovens,
nessa perspectiva, não estariam propriamente posicionados a favor ou contra as instituições, mas definindo outros lugares por
onde “escapar”, confiando menos nas instituições oficiais e mais em mecanismos próprios, de auto-organização. Nesse sentido,
pode-se afirmar que os jovens são “um objeto nômade, de contornos difusos” (MARTÍN-BARBERO, 1998, p. 22).
São nômades porque, com “rodinhas nos pés”, tomam conta da cidade, numa circulação transversal e desordenada, que explode os limites da espacialidade urbana. São nômades na percepção sobre diferentes temporalidades
e portadores de uma sensibilidade, que Simmel (1973, p. 11) denominaria “vida mental”, capaz de dar conta, por
simultaneidade, de múltiplos influxos, como sons, imagens, palavras: ouvem música, ao mesmo tempo em que assistem a TV, falam ao celular, estudam e navegam pela Internet. O “nomadismo de percepção” caracteriza um tipo de
atenção difusa, capaz de equacionar um grande número de fluxos e atividades, em que se relacionam práticas culturais
tradicionais com outras, que envolvem a televisão, as novas tecnologias e as mídias digitalizadas.
4. Os stickers são pequenos adesivos com imagens produzidas por jovens em diferentes centros urbanos; são em geral colados em postes,
placas de sinalização, muros e paredes, como formas de apropriação e intervenção urbanas.
5. As alternativas de participação dos coletivos juvenis serão analisadas mais adiante no contexto da reflexão sobre o socioeducativo.
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São nômades também em relação ao consumo e aos estilos de vida, às expressões da religiosidade e aos seus posicionamentos diante da vida, da cultura, da política, das instituições em geral.
São nômades na busca por pertença fora do locus de origem e nas cisões dentro do contexto familiar. Nômades nas rupturas com a escolaridade e com a escola oficial, por vezes calcada em normas autoritárias, em um corpo de valores individualistas e
na exclusão do “outro”, do diferente do seu rol de referências (CUBIDES, TOSCANO e VALDERRAMA. 1998:IX).
É importante considerar que as relações entre nomadismo e gregarismo deveriam ser avaliadas, de forma diversificada, dentro do próprio segmento de jovens, entre 15 e 17 anos, público alvo do Projovem Adolescente. A
possibilidade de ser mais ou menos nômade está proporcionalmente vinculada à faixa etária, aos locais de moradia: os
meninos e meninas mais novos apresentam – por razões óbvias –, maior dificuldade em circular pela cidade, ganhar o
mundo; ainda estão na dependência das famílias, quase não saem à noite, e o acesso ao “mundo de fora” é precário e o
nomadismo se transforma em desejo, em horizonte de espera. Já os próximos da faixa etária dos 17 anos circulam mais,
e são depositários de certa autonomia que lhes permite ganhar a cidade e conhecer lugares “estranhos e distantes”:
lugares de ir, circular, encontrar pessoas, ficar; lugares onde as coisas acontecem! Meninos e meninas que vivem em
regiões com carência de infraestrutura restam mais confinados em seu bairro de origem e, consequentemente, restritos
aos precários, e por vezes inexistentes, equipamentos culturais e espaços de lazer.
É preciso considerar, ainda, que a condição de nomadismo se expressa pela diversidade dos contextos territoriais,
das heterogeneidades dos centros urbanos e as dos vínculos familiares.
O nomadismo é um tema de extrema importância a ser considerado nas propostas das políticas públicas e
merece uma atenção especial por parte dos gestores: há uma mudança de sensibilidade em curso e temos que pensar
em saídas e alternativas capazes de dar conta destes desafios. Precisamos, de certa forma, inventar abordagens, atentar
para os novos cenários e dialogar com esses jovens de forma permeável, evitando negar seus modos de ser e de viver e
acreditando em suas propostas de participação.
1.1.3 Inclusão produtiva/mundo do trabalho
É possível detectar uma tendência em várias partes do mundo: os jovens, principalmente os de poder aquisitivo
e capital cultural elevados, têm permanecido na casa dos pais por mais tempo do que as gerações anteriores. Têm a
oportunidade de prolongar o período de estudos, demoram a ingressar no mercado de trabalho6, relutam em assumir
os compromissos e responsabilidades constitutivas do mundo adulto (relações afetivas mais duradouras, filhos) e acabam por usufruir uma série de vantagens inerentes a uma condição de vida dos setores sociais médios e altos7.
Entre os jovens de classes populares, entretanto, a continuidade dos estudos e o adiamento da entrada no mercado de
trabalho formal ou informal passam a ser um horizonte de expectativas e não propriamente uma condição de vida concreta,
passível de realização. Sabemos que o trabalho, para esses jovens e suas famílias, insere-se na vida cotidiana como uma necessidade, nem sempre acessível, e que a perspectiva de continuar estudando é desejável, mas ainda deveras remota8.
6. Segundo IBASE/PÓLIS (2005), dos jovens (15-24 anos) que informaram não estar trabalhando, 62,9% afirmaram estar à procura de trabalho. Se
for considerado, entretanto, o segmento social desses jovens observa-se que há uma significativa discrepância entre os mais ricos e os mais pobres.
Enquanto os primeiros estendem sua entrada no mercado de trabalho, os últimos procuram acelerar esta experiência. Assim, 69,5% dos jovens das
classes D/E e 65,6% da classe C estavam procurando trabalho, enquanto 49,6% das classes A/B se encontravam na mesma situação.
7. O Dossiê Universo Jovem III, MTV (2005), revela que 71% dos jovens entre 15 a 30 anos têm pouca ou nenhuma vontade de sair da casa
dos pais, apesar do índice já ter sido maior em 1999 (82%). O mesmo estudo ainda indica que 23% dos jovens da amostra estão casados e/
ou vivem com companheiro(a), sendo que esse número cai para 7% se for considerada apenas a classe A.
8. Segundo a mesma pesquisa IBASE/PÓLIS, e considerando a faixa etária, 60,6% dos jovens que têm entre 18 e 20 anos e 47,7% dos que
têm 21-24 anos de idade não trabalham. Dos jovens entre 15-17 anos, idade destinada à escolarização, 22,2% estavam trabalhando.
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Os jovens mais pobres falam das dificuldades que enfrentam para acessar o sistema educativo e permanecer até a
conclusão da educação básica. Reivindicam uma formação integral que contemple uma formação cidadã e uma formação para o trabalho. Ainda segundo a pesquisa IBASE/POLIS (2005) o trabalho (ou sua falta) aparece como referência
dominante em suas vidas sendo que a ênfase dos jovens está na necessidade de ampliação da oferta de trabalho, da formação profissional e de estágios remunerados. Os depoimentos apontam para a necessidade de uma compatibilização
entre a qualificação profissional, o primeiro emprego e a garantia da continuidade dos estudos, por meio de horários
mais flexíveis e organogramas educacionais mais abertos.
Entre as políticas recomendadas em relação ao trabalho destacam-se:
• promover garantias para que os jovens estudem e não precisem trabalhar antes dos 16 anos;
• garantir que o trabalho dos adolescentes ocorra estritamente nas condições definidas pela Lei do Aprendiz;
• ampliar o debate sobre mundo do trabalho nas escolas, incluindo este tema nos currículos do ensino
médio, nas redes e nos fóruns juvenis;
• fomentar a educação profissional como formação complementar à educação básica;
• incentivar política nacional de qualificação profissional, articulada a diversos ministérios, empresas, sistema
S, ONGs etc. que considere as especificidades das demandas de públicos distintos, tais como jovens do campo
e das cidades, de comunidades tradicionais como quilombolas e indígenas e jovens com deficiência.
1.1.4 A criminalização e o estigma da violência
Dentre os diversos aspectos que se apresentam à análise desta problemática, chama a atenção, ao confrontarmos
percepções correntes, representações midiáticas e as próprias narrativas juvenis, a tensão entre protagonismo e vitimização (ROCHA, 1999). Assim, embora as estatísticas brasileiras apontem claramente para a quantitativa vitimização
de homens jovens por atos de violência criminal, cristalizou-se um imaginário social no qual se associa o segmento
juvenil – em especial as classes populares – à condição de protagonistas da violência e, mais ainda, à constituição de
uma ameaça indiscriminada a toda a sociedade. A criminalização da juventude toma a dimensão de verdadeiro estigma
social. Perniciosamente, pode-se identificar, em caminho complementar, a adoção por alguns jovens desta atribuição
estigmatizadora como estratégia de afirmação de identidades assumidamente desviantes.
A disseminação da violência, em todas as suas expressões, tem exigido do poder público perseguir novos rumos
que possam dar visibilidade à questão, rompendo o ciclo do silêncio e do medo:
(...) a violência e o medo combinam-se a processos de mudança social nas cidades contemporâneas, gerando novas formas de segregação espacial e discriminação social (CALDEIRA, 2000, p. 9).
O trabalho social cotidiano entra em contato com as vítimas e os praticantes de violência em suas complexas manifestações, sem, frequentemente, estar atento a isso, preocupando-se apenas em atender ao imediato. Muitas vezes se furta
a pesquisar as manifestações de violência, por medo ou por dificuldade objetiva de trabalhar com a questão, até porque as
instituições formadoras nem sempre têm a preocupação de trazer o debate sobre a violência para o interior de seus currículos e as instituições sociais nem sempre aportam a capacitação contínua necessária. A violência aparece, por vezes, como
exterior e alheia ao fazer profissional, ocupando pouco espaço nas reflexões e estudos dos técnicos do social.
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Pesquisas sobre homicídios na cidade de São Paulo (PAVEZ; OLIVEIRA, 1999) têm mostrado que a maioria de suas
vítimas começou a apresentar problemas de comportamento e conduta social na adolescência, no início da atividade sexual e
no início da vida pública, da descoberta e conquista de novos amigos, da participação na vida noturna da grande cidade, através da frequência a bares e danceterias nas proximidades da moradia, ensejando os primeiros contatos e uso de drogas lícitas e
ilícitas e o acesso a meios de sobrevivência muito mais vantajosos e imediatos do que aqueles auferidos por seus pais.
Trata-se, portanto de uma temática da maior relevância para a sociedade, impondo-se como pauta obrigatória do trabalho social, destinada especialmente a grupos operativos de crianças, adolescentes e jovens, de forma contínua e sistemática.
1.1.5 Temporalidades
As diversas concepções de temporalidade dividem as gerações. O presente, para os jovens, vincula-se, no geral ao
aqui e agora. Por outro lado, o tempo para as outras gerações resulta da época em que foram socializados:
A geração remete à história que dá conta do momento social em que um grupo se incorpora à sociedade. Ser integrante de uma geração implica ter nascido e crescido em um determinado
período histórico, com sua particular configuração política, sensibilidade e conflitos (...) Cada
geração é portadora de uma sensibilidade distinta, de uma nova episteme, de diferentes memórias e é expressão de outra experiência histórica (MARGULIS; URRESTI, 1998, 7 e 4).
No relato dos jovens, o passado e o futuro parecem não ter vida própria e quando são referidos, emergem articulados ao tempo presente. Alguns autores têm sugerido que os jovens estariam vivendo uma “multiculturalidade temporal”. Seriam “nativos do presente” (MARGULIS; URRESTI, 1998, p. 4) e perceberiam o passado pela observação
das outras gerações, principalmente pais e avós.
Interessante observar que, no geral, as reflexões sobre o passado, em tempos modernos, preconizam a necessidade do lembrar, do caminhar na contramão do grande risco representado pelo esquecimento. O passado, a tradição
são temas recorrentes nestes cenários de intensa modernidade e de perda de referências. Entretanto, algumas vezes, o
passado diz respeito a algo que precisa ser esquecido.
1.1.6 Tensões geracionais
A tensão entre as gerações emerge como um dos temas polêmicos e delicados de serem tratados. Todos sabem que os
conflitos existem, mas poucas vezes eles são revelados; os relatos sobre conflitos estruturais vêm, no geral, reforçados posteriormente por um discurso sobre as boas relações, a importância de se ter uma família e os bons instantes passados juntos.
Entretanto, muitas vezes a cisão é profunda e os adultos, perplexos diante da rebeldia, dos imponderáveis e do desconhecido,
tendem a identificar os jovens, como “outros”: “aqueles que vivem próximos a ‘nós’, mas nos separam barreiras cognitivas,
abismos culturais vinculados a modos de perceber o mundo que nos rodeia” (MARGULIS; URRESTI, 1998, p. 4). Os jovens
são “outros” e são também e por isto, “rebeldes”. A rebeldia irrompe como um componente universal da condição juvenil:
Os valores de contestação se cristalizam na adolescência: repugnância ou recusa pelas
relações hipócritas e convencionais, pelos tabus, recusa extremada do mundo. É então que
ocorre seja a dobra niilista sobre si ou sobre o grupo adolescente, seja a revolta – revolta sem
causa ou revolta que assume as cores políticas (MORIN, 1984, p. 155).
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Os conflitos entre pais e filhos expressam-se desde os mais usuais – discordâncias em relação à aparência, aos
estilos adotados, às roupas e acessórios, ao tipo de cabelo, piercings e tatuagens, ao excessivo barulho das músicas preferidas, entre outros – até a revelação de questões mais suscetíveis que dizem respeito à sexualidade, virgindade, uso da
camisinha, gravidez na adolescência, álcool, cigarros e drogas ilícitas, rumos profissionais.
Há enfrentamentos, também, entre os jovens e outras gerações ainda mais velhas e muitos destes conflitos se revelam por meio das opções religiosas e, sem dúvida, se exacerbam pelos agudos processos de aceleração e de mudanças,
inerentes aos tempos modernos e que transformam cada geração em um mundo à parte.
As tensões e os conflitos geracionais são elementos que transcendem os espaços das diferenças e das singularidades e se tornam características universais. Em outras palavras, tensões e conflitos geracionais estão em toda parte e
atravessam indistintamente esta ou aquela classe social, esta ou aquela família, os moradores deste ou daquele bairro. Se
comparada, por exemplo, à classe social, a geração remete à história e a classe supõe um horizonte de continuidade:
Nesse sentido, pertencer à outra geração supõe, de algum modo, possuir códigos culturais diferentes, que orientam percepções, gostos, valores e modos de apreciar que geram
mundos heterogêneos com distintas estruturações de sentido (MARGULIS; URRESTI,
1998, p. 7).
1.2. ADOLESCENTES, ADOLESCÊNCIAS
Esclarecendo e retomando um pressuposto: falamos, até então, de jovens e juventudes, coerentes com a compreensão anteriormente explicitada de que o segmento abarcado pelo Projovem Adolescente – faixa etária entre 15 e 17
anos – é híbrido, localizado na fronteira entre ser jovem/ser adolescente. Vamos, então, compreender as singularidades
dos modos de ser e de viver dos adolescentes.
Ao escutarmos o termo adolescência, quais são as primeiras impressões que nos vêm à mente? Rapidamente pensamos em um período de transição, mudanças físicas, espinhas, busca de autonomia, falta de limites, crise existencial,
consumismo, rebeldia, individualismo, alienação, entre outros.
Algumas ideias passam a ser comuns, não apenas para os pais, que sentem dificuldade em lidar com seus
filhos neste momento de suas vidas, mas também para muitas pessoas, formando o que podemos chamar de
uma “imagem da adolescência”.
Quem nunca escutou, leu em alguma revista, ou ainda, viu algum personagem de novela, em uma cena onde
uma pessoa tenta acalmar uma mãe aflita com alguma situação vivida pelo filho, dizendo: “É da adolescência, isso
passa”, “Seu filho está em crise”! “São os hormônios”, ou ainda “São as más influências”.
Essas frases são comumente escutadas e repetidas a tal ponto que poucos questionam se são verdadeiras ou não,
criando assim um modelo/imagem do que é a adolescência.
Mas qual será o grande problema? Os adolescentes não são assim mesmo quando os vemos aparecer nos meios
de comunicação, ou em comerciais cheios de ação, com imagens bonitas, com um tipo padrão de corpos bem definidos, bronzeados, magros, ou sendo vítimas ou agentes de violência nas grandes cidades?
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Manchetes assim tornaram-se comuns em nosso dia a dia: “Dois adolescentes foram assassinados nesta madrugada”;
“Polícia apreende adolescente que roubou celular”; “Pesquisa demonstra os padrões de consumo dos adolescentes”.
O pequeno trecho do poema chamado Noite, de Fernando Pessoa, talvez nos ajude a compreender
melhor sobre o que estamos nos referindo, pois o poema diz: “só alcançamos até onde nosso braço chega, só
vemos até onde chega nosso olhar”.
Cabe neste momento uma pergunta: Quando utilizamos o termo adolescência, a que nos referimos? Quando
estamos frente a frente com um adolescente, o que estamos vendo? O que queremos ver? Ou como diz o poema até
onde nosso braço alcança? Nossa visão está clara ou estamos vendo apenas imagens, sombras e vultos?
Se dermos um passo à frente, na direção destes adolescentes poderemos vê-los e enxergá-los melhor, talvez seja
possível ver e alcançar algo novo, diferente das coisas que estamos acostumados a escutar. A partir deste movimento,
uma nova compreensão poderá ser possível.
Por vezes, a noite nos engana. Nossos sentidos também podem nos enganar. Olhamos, mas não vemos, ou vemos, mas
não enxergamos. Este é um ponto de extrema importância, pois, geralmente, o que não enxergamos com clareza nos é estranho
e, na maior parte das vezes, tememos o que é estranho, pois não entendemos e não sabemos como lidar com o desconhecido.
O primeiro ponto é termos clareza sobre o conceito de adolescência e como ele é utilizado pela ciência e pelo
senso comum, buscando nos aproximar deste conceito tendo claras suas implicações. Para isto, precisamos distinguir
o significado dos termos puberdade e adolescência.
Por puberdade entendemos o conjunto de transformações biológicas surgidas no corpo, ligadas à maturação
sexual, características do desenvolvimento da infância à maturidade.
Modificações biológicas surgidas no corpo como resultado das ações hormonais, desencadeando o desenvolvimento dos testículos nos meninos e dos ovários nas meninas, provocando a
primeira menstruação nas meninas e a primeira ejaculação no menino, indícios biológicos da
capacitação para procriação, que se dá por volta dos 12 aos 15 anos. (JOST, 2006, p. 58)
Esse é um período de rápido desenvolvimento em todos os aspectos – físico, emocional, psicológico, social e espiritual. Fora o período pré e neonatal, a puberdade é apontada como a fase de mais rápido desenvolvimento humano.
A adolescência, categoria mais complexa e controvertida, tornou-se um termo utilizado para designar as transformações psicossociais que acompanham as mudanças físicas na puberdade:
(...) período da vida humana que sucede à infância, começa com a puberdade, e se
caracteriza por uma série de mudanças corporais e psicológicas. (AURELIO, 1988)
O termo adolescência é relativamente novo, uma vez que sua utilização data do fim do século XVIII. “Adolescência
é um termo de origem latina, do verbo adolescere, que significa desenvolver-se, crescer”. (MATHEUS, 2007, p. 18)
Não é por acaso que as imagens que aparecem nos meios de comunicação, por vezes também no meio acadêmico
e em nossas conversas cotidianas sobre a adolescência, trazem em seu bojo o termo associado a “algo negativo”, como
um problema, uma doença, pois sua própria origem guarda proximidade com o termo adoecer.
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O termo adolescência em latim, adolescere, está muito próximo do termo addolescere, este que tem como significado ficar doente (adoecer). Apesar da proximidade dos termos em sua origem, apenas em anos mais recentes que o
uso do termo adolescência tem sido associado a adoecer.
Nas últimas décadas, os jovens vêm sendo objeto dos meios de comunicação com maior intensidade. Por vezes,
são encarados como mercado potencial de consumidores a serem conquistados e em outros momentos ocupam lugares
nas páginas policiais como protagonistas “da escalada da violência” nas grandes cidades.
O espaço dado pelos meios de comunicação, de um modo geral, para questões relacionadas à juventude
e adolescência contribuiu para trazer à tona a importância deste período, mas propiciou também o surgimento
de vários estereótipos sobre esta fase da vida. Estes estereótipos são facilmente reconhecidos, principalmente
na caracterização da adolescência:
(...) o senso comum, que toma os jovens como os principais causadores da violência,
ameaçados continuamente pelo fantasma das drogas, irremediavelmente individualistas, apáticos, consumidores vorazes de produtos ou mercadorias inúteis e desinteressados
das questões públicas. (ABRAMO, 2002, p. 8)
Alguns autores fundamentam suas análises atribuindo um valor apenas negativo a características próprias da
adolescência. Um exemplo é o valor negativo por vezes atribuído a importância do grupo para o adolescente.
Esse período é caracterizado pelo distanciamento afetivo da família, pela busca de
independência e pela forte valorização do grupo formado por seus pares, o que leva à procura de conformização com as normas, os costumes e a “ideologia” desse grupo, trazendo
em seu bojo, muitas vezes, uma rebeldia aos valores estabelecidos pelos pais ou pela sociedade, num conflito entre a independência desejada e a dependência ainda não rompida.
(JOST, 2006, p. 58)
Contudo, o grupo que é apontado como uma característica negativa, por vezes torna-se um espaço de possibilidade, de troca de experiências e amadurecimento, conforme apontam os próprios adolescentes.
Pra mim foi fundamental. Aprendi muito. Saía pras palestras. Tive muita orientação para pensar como pessoa porque se eu não tivesse tido a orientação eu acho que eu não
poderia estar aqui hoje. (depoimento de jovem egresso do Programa Agente Jovem. MDS/
DATAUFF, 2006, p. 34)
É uma questão de você respeitar primeiro, se amar primeiro pra depois você amar
e respeitar as outras pessoas. Mas com a consciência que tem que respeitar as diferenças
pra viver no mundo que vivemos e que o agente jovem passa pra gente este sentimento
de coletivo. (...) de coletivo de você enxergar certos problemas na sua casa e ter opinião
própria pra resolver junto com os pais ou com os irmãos. (...) Aprendi muita coisa boa
e conheci muita gente nova. (depoimento de jovem egresso do Programa Agente Jovem.
MDS/DATAUFF, 2006, p. 49)
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Dentre várias possibilidades, talvez a mais forte característica associada à adolescência seja a ideia de “crise”,
transformada em um traço intrínseco, universal e negativo deste período – “a adolescência como um período de crise”,
a “crise da adolescência”.
A associação entre “crise” e adolescência, além de não ser encontrada nos textos antigos, como aponta Matheus
(2007), pode ser entendida, de acordo com o dicionário Aurélio, como “manifestação violenta e repentina de ruptura
de equilíbrio; estados de dúvidas e incertezas”, o que, no entanto, pode ser considerado um movimento gerador de
mudanças positivas e não apenas negativas.
Ozella (1998, p. 4) questiona esta abordagem da adolescência enquanto período de crise. O autor indaga
se a crise é uma característica da adolescência ou o contexto social de crise em que os adolescentes vivem é o
fator desencadeador de suas próprias crises, de modo que uma sociedade que não esteja em constante crise poderia gerar adolescentes sem crise.
Este não é apenas um jogo de palavras, mas uma perspectiva teórica que concebe a adolescência como fenômeno
historicamente construído pela sociedade.
Buscarmos encontrar as características que são atribuídas à adolescência, na população em geral, talvez seja um
bom exercício para não olharmos para os jovens a partir de preconceitos e estereótipos, por exemplo: a influenciabilidade e o consumismo são apontados como características inerentes a todos os jovens, mas somente os jovens são
influenciáveis? Somente os jovens são consumistas?
As tensões entre infância e vida adulta, tendo como desencadeador o fenômeno da puberdade enquanto momento de transformações biológicas, serão apropriadas pela sociedade pelo viés dos estigmas e preconceitos, estabelecendo uma verdadeira sintomatologia deste período.
Existe um corpo que está se desenvolvendo e que tem características próprias (puberdade), mas nenhum elemento biológico ou fisiológico isoladamente tem expressão direta na subjetividade tendo em vista a mediação de outros
elementos que também são complexos neste processo.
Nesse sentido, para compreender o fenômeno designado como adolescência é necessário inseri-lo na totalidade
sócio-histórica no qual o mesmo foi produzido e constituído, ganhando sentido e significado. Estamos nos referindo
às condições que construíram uma determinada adolescência:
Entende-se assim a adolescência como constituída socialmente a partir de necessidades sociais e econômicas e de características que vão se constituindo no processo. (BOCK, 1998, p. 60).
Isto é, alguém que constrói formas para satisfazer suas necessidades junto com outros
homens. Um ser histórico com características forjadas de acordo com as relações sociais contextualizadas no tempo e no espaço histórico em que ele vive. (OZELLA, 2003, p. 8).
Para que nossa visão alcance um pouco mais longe, precisamos dar um passo na escuridão, e talvez outro,
quem sabe outros em direção aos próprios adolescentes. A cada passo, uma nova visão será possível, mais clara e
precisa, sobre estes sujeitos. Aos poucos, a imagem que tínhamos no início da caminhada poderá ser modificada e,
como uma máquina fotográfica, nosso foco neste percurso poderá ser ajustado, nos mostrando novas imagens, mais
claras, mais nítidas sobre a adolescência.
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O conceito de adolescência é polêmico e aponta para peculiaridades e diversidades de expressão dessa fase da
vida nas diferentes sociedades e culturas. No entanto, como destaca o UNICEF, um consenso tem sido possível em
torno da compreensão da adolescência como momento específico do desenvolvimento humano. É com este espírito
que o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) abordará a adolescência.
Fruto da mobilização dos vários setores da sociedade envolvidos na luta pela defesa dos direitos da criança e do adolescente, até aquele momento sem garantias e sem direitos específicos assegurados, em sintonia com
a Convenção sobre os Diretos da Criança e demais documentos internacionais, o Estatuto da Criança e do
Adolescente garantiu vários avanços para a sociedade brasileira no que se refere ao trato das questões relacionadas à infância e à juventude.
O ECA introduz o Princípio da Proteção Integral em substituição à Doutrina da Situação Irregular e reconhece
a Criança e o Adolescente enquanto sujeitos de direitos e titulares de garantias:
A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes,
por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o
desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de
dignidade. (ECA, 1990, art.3°).
Incorpora o princípio da incompletude institucional quanto à necessidade de um conjunto articulado de ações
governamentais e não governamentais de atenção à criança e a adolescência.
O Estatuto abandona a compreensão das crianças e dos adolescentes enquanto seres incapazes e incompletos e
que, por este motivo, necessitam da tutela e da vigilância, introduzindo o princípio do ser em desenvolvimento, que
deve ser protegido, garantindo-se todas as condições para o seu crescimento integral.
Ao nos aproximarmos das concepções de adolescência, notamos os estereótipos e estigmas construídos sobre um
“adolescente ideal” ou “identidade adolescente”, criados a partir de características que lhes são atribuídas.
A busca de equilíbrio entre o embate da realidade das condições objetivas vivenciadas pelo adolescente com a
“imagem de ideal de adolescência” a ele atribuída pode gerar muitas crises.
Sendo assim, podemos afirmar que os meios de comunicação têm um papel importante neste processo
de atribuição e construção da identidade. A indústria cultural, de um modo geral, descobriu no jovem um
grande mercado consumidor e, por isto, através dos meios de comunicação, tem investido nas propagandas
voltadas ao público juvenil.
Uma imagem de adolescência é transmitida como “padrão” ou “ideal”; esta imagem comporta padrões de
beleza, locais a serem frequentados, roupas a serem usadas e culturas a serem consumidas, entre tantas outras
coisas, sendo transformada em produtos à venda no mercado. Basta ter recursos financeiros para consumi-las.
Como apontam os adolescentes, esta imagem aparece na maioria das vezes relacionada à aparência: “Eles olham
muito pela aparência”. (Depoimento de jovem egresso do Programa Agente Jovem. MDS/DATAUFF, 2006, p. 55):
PROJOVEM Adolescente
27
Se, por um lado, encontramos no Brasil o fenômeno da adolescência prolongada – comum
nas classes média e alta em que a condição de adolescente tende a prolongar-se em função das
expectativas de uma formação profissional cada dia mais exigente e especializada – temos, igualmente, a realidade de um significativo contingente populacional de adolescentes que, pelas condições de pobreza de suas famílias, fica impedido de viver essa etapa preparatória, sendo obrigado a
uma inserção precoce no mercado de trabalho, formal ou informalmente. (UNICEF, s/d, p. 9)
Como aponta o UNICEF, devem ser consideradas no debate sobre a adolescência no Brasil as grandes diversidades e desigualdades existentes, de modo que não se pode abordar a adolescência como uma realidade homogênea em todas as regiões e camadas sociais. Por este motivo, é preciso apontar a existência não de uma adolescência,
mas de “adolescências”.
Compreendendo a importância deste período de transformações e desenvolvimentos, as propagandas
e incentivos ao consumo terão um papel central na formação da identidade dos adolescentes, pois a imagem
transmitida associa o não possuir determinado produto – mesmo que este seja supérfluo – como ausência de
um status, como um não ser.
A violência urbana tem sido associada pelos meios de comunicação à juventude, de um modo geral, e também à
adolescência. Tal associação propicia, em certa medida, o surgimento de vários estereótipos sobre esta questão, inclusive apontando o ECA como um dos responsáveis pelo aumento da violência, associando-o à impunidade.
Mendez (2006, p. 22) afirma que os meios de comunicação têm sido muito “eficazes” em vincular de forma
automática o problema da insegurança pública, com comportamentos atribuídos aos jovens, particularmente aos “menores de dezoito anos”.
Esta associação da violência e da insegurança pública a atos infracionais cometidos por jovens tem produzido
um discurso desqualificador, que acaba por permear e habitar não apenas o senso comum, mas encontra eco em vários
setores da sociedade, reforçando preconceitos e estereótipos, conforme observa Adorno:
Imagens veiculadas pela mídia, impressa e eletrônica, constroem cenários cada
vez mais dramáticos: a de adolescentes audaciosos e violentos, destituídos de quaisquer
freios morais, frios e insensíveis que não hesitam em matar. De tempos em tempos, a
opinião pública é surpreendida com a notícia de homicídio praticado contra algum
cidadão portador de maior projeção social, praticado por um adolescente no curso
de um roubo. Fatos desta ordem têm a propriedade de reforçar apreensões coletivas e consequentemente acentuar preconceitos contra esses seguimentos da população.
(ADORNO, 1999, p. 15 apud FRAGA, 2004, p. 8)
O que os meios de comunicação não apresentam é que, ao contrário das ideias veiculadas, os jovens têm sido as
maiores vítimas da violência nos grandes centros:
Os jovens são, assim, as principais vítimas da violência criminal, seja devido às consequências dos conflitos travados com a polícia, da ação de grupos de extermínio ou de rixas
entre quadrilhas. (FRAGA, 2004, p. 86).
PROJOVEM Adolescente
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Como aponta o UNICEF (s/d, p. 5):
O ECA representa um importante momento de consolidação de uma nova abordagem
da questão da infância e da adolescência, baseada na garantia dos direitos, no estímulo à participação e no desenvolvimento de políticas públicas universais e de qualidade para todos.
Referir-se a crianças e adolescentes a partir do Estatuto implica considerá-las como seres em desenvolvimento
e, por este motivo, devem ter garantidas as condições para que se desenvolvam em todos os aspectos, não restritos a
uma de suas necessidades, mas à integralidade dos seus direitos, de modo que a eles seja possível o desenvolvimento
“físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade” (ECA, 1990, art. 3°).
A mudança de paradigma operada pelo Estatuto é a demonstração da construção histórica da adolescência, propondo um novo olhar para a infância, diverso do olhar presente até aquele momento.
É necessário a todos que trabalham diretamente com as juventudes, e de modo particular com público alvo do
Projovem Adolescente, uma desconstrução dos estereótipos e estigmas, que não nos ajudam a compreendê-las mas,
ao contrário, nos ofuscam a visão.
Em seu relatório “Situação Mundial da Infância 2002”, o UNICEF definiu a adolescência como uma “janela de
oportunidades”, que precisam ser reconhecidas. Esta afirmação é confirmada pelos próprios jovens:
(...) só queremos ser reconhecidos, só queremos ter o direito de você ser o que você é.
(depoimento de jovem egresso do Programa Agente Jovem. MDS/DATAUFF, 2006, p. 54)
É a partir da compreensão dos adolescentes como seres em desenvolvimento e sujeitos de direitos, e do período
compreendido por adolescência como um período de oportunidades, que podemos refletir sobre a importância da
educação como oportunidade de desenvolvimento pessoal e social.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, ao assegurar em seu artigo 53 o direito à educação a todas as crianças
e adolescentes, afirma que esta deve visar o “pleno desenvolvimento de sua pessoa, o preparo para o exercício da cidadania e qualificação profissional” (ECA.199, art. 53).
Contudo, não é possível reduzir educação à escolarização formal através do sistema de ensino.
A partir desta concepção, pode-se compreender que à criança e ao adolescente devem ser asseguradas oportunidades educacionais para o seu desenvolvimento de forma integral. É necessário considerar a importância do trabalho
e da cultura, juntamente com a dimensão educativa, entendida em sentido amplo como um processo continuado de
novas aquisições e apropriações.
Apesar do avanço da legislação presente na garantia do direito à educação, como aponta o CONJUVE, existe
um distanciamento dos jovens e adolescentes do sistema de ensino, com a proximidade da vida adulta:
A maioria dos jovens brasileiros, conforme se aproximam da idade adulta, deixam progressivamente de se relacionar com a educação para se relacionar com o trabalho. (CONJUVE, 2006, p. 24)
O movimento de ampliação do acesso à educação não foi acompanhado pela melhoria da qualidade do ensino.
Este fato, somado às situações de vulnerabilidades em que se encontra grande parte da população, tem como consequ-
PROJOVEM Adolescente
29
ência o afastamento de um número expressivo de adolescentes e jovens do sistema de ensino para se inserir no mercado
de trabalho como condição para a sua própria sobrevivência e de suas famílias.
Esta inserção precoce dos adolescentes no mercado de trabalho se realiza, em grande parte, de maneira informal e
precária. O trabalho, que poderia ter dimensões de aprendizado, de realização, de prazer, e representar uma possibilidade de
convivência com pessoas diferentes, passará a significar exploração, alienação e afastamento do mundo escolar:
Hoje o que se tem é uma perversa diferenciação entre jovens que podem combinar
trabalhos criativos e educação de qualidade, e outros que, quando têm emprego e tentam
perseguir alguma escolarização, têm que se engajar em trabalhos exaustivos que tolhem a
possibilidade de dedicação a estudos reflexivos e críticos. (CONJUVE, 2006, p. 27)
Tendo em vista os princípios da Proteção Integral e da concepção das crianças e adolescentes como seres em
desenvolvimento, o Estatuto da Criança e do Adolescente proíbe o trabalho a crianças e adolescentes menores de 16
anos, exceto na condição de aprendiz.
No ano de 2000, a idade mínima para a condição de aprendiz foi alterada de 16 para 14 anos com a Lei do
Aprentdiz nº10.097/2000, que determina que toda empresa de grande e médio porte deve ter de cinco a quinze por
cento de aprendizes em relação ao número total de funcionários.
Vale observar que a condição de aprendiz não se restringe apenas à faixa etária estabelecida pelo ECA para a adolescência, abrangendo também jovens de 14 a 24 anos, que devem cursar o ensino fundamental ou médio e também
um curso de formação técnica.
O objetivo da Lei do Aprendiz, portanto, é o de incentivar os jovens e adolescentes a continuar estudando e aprender uma profissão. Assim sendo, seu foco não se encontra no trabalho propriamente dito, mas
sim na garantia da escolarização, uma vez que a frequência escolar é obrigatória; na qualificação profissional,
com a exigência da frequência em cursos profissionalizantes dos serviços nacionais de aprendizagens ou cursos
oferecidos e registrados por organizações não governamentais registradas no Conselho Municipal da Criança
e do Adolescente; e na preparação para o mundo do trabalho, partindo de uma perspectiva que articula formação e experimentação.
Os programas e ações de preparação para o mundo do trabalho tornam-se fundamentais para a formação e
aprendizado, tendo em vista que possibilitam aos adolescentes a construção de uma trajetória de inserção não apenas
no mundo do trabalho, mas também em relações sociais mais amplas.
As possibilidades de vivências estabelecidas nestas atividades, entendidas como um processo socializador
mais amplo, como aponta o UNICEF, tornam-se de grande importância no processo educativo, ainda como
uma oportunidade de ampliação da socialização dos adolescentes, tendo em vista que o trabalho coletivo e a
possibilidade de convivência democrática com os demais adolescentes e adultos constituem bases fecundas para
a inserção participativa e cidadã na sociedade.
É a partir do processo socializador amplo, vivido na adolescência, que o sujeito é colocado diante da possibilidade de experimentar seu lugar de cidadão na sociedade, em sua
plenitude. (UNICEF s/d, p. 61)
30
PROJOVEM Adolescente
Iniciativas como a Lei do Aprendiz e outras ações e programas governamentais ou não, devem possibilitar aos
adolescentes o desenvolvimento de competências e habilidades básicas, específicas, de gestão e de compreensão sobre a
estruturação e funcionamento do mundo do trabalho. É preciso ter presente, contudo, que escolarização e atividades
de preparação de adolescentes para o mundo do trabalho devem ser vistas como espaços interligados e fundamentais
para o processo de aprendizagem, socialização e construção da identidade pessoal e social dos jovens.
O papel do Estado é o de oferecer essas oportunidades para que os adolescentes possam dar continuidade a sua
trajetória educacional, de educação profissional e preparação para o mundo do trabalho, possibilitando uma posterior
inserção no mercado de trabalho em condições mais adequadas.
A ideia de trabalho presente no Estatuto da Criança e do Adolescente fundamenta-se na garantia do desenvolvimento integral dos adolescentes, que deve ser valorizado e preservado acima de tudo, de modo que as atividades
relacionadas ao mundo do trabalho não prejudiquem seu desenvolvimento físico, intelectual, social e psicológico.
A formação e preparação dos adolescentes para o mundo do trabalho impõem-se como direito e componente
essencial para a sua formação como indivíduo e cidadão.
É a partir da vivência da própria adolescência, enriquecida pela oferta de oportunidades adequadas a sua condição de pessoa em desenvolvimento, que os adolescentes se socializam, colocando-se como sujeitos diante das possibilidades de conhecer e experimentar seu lugar na sociedade.
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2. POLÍTICAS PÚBLICAS, ADOLESCÊNCIAS E
JUVENTUDES: A CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO
O problema fundamental em relação aos direitos humanos, hoje, não é tanto o de justificá-los,
mas de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político (NORBERTO BOBBIO).
Na primeira parte desse nosso texto, compreendemos que, ao falar de jovens e adolescentes, estamos reconhecendo características próprias, mas também e, principalmente, diversidades advindas do contexto social em que vivem
e dos acessos que possuem, portanto, identidades construídas também na relação territorial. O convite agora é para
que nos detenhamos um pouco mais no que está definido na legislação e nas normativas em diferentes áreas para que
percebamos os pontos de interseção dos sistemas unificados de políticas9.
Para tanto, a reflexão a seguir tem como eixo central a articulação entre as políticas públicas e adolescência e
juventude. Partimos da concepção de que são necessárias políticas públicas – ações planejadas de forma democrática,
com recursos definidos, que tenham continuidade e sejam avaliadas em todas as suas etapas – para a concretização do
direito, que só pode ser considerado como tal após o reconhecimento legal. Por outro lado, sem a materialização na
política, o direito torna-se somente declaratório, não exercido e não vivido pelos sujeitos com a perspectiva de certeza
de sua conquista. As leis são, portanto, instrumentos essenciais para que possamos exigir o direito que, uma vez declarado, torna-se concreto, ou seja, gera serviços, benefícios, programas, projetos oferecidos pelas políticas públicas, sob
responsabilidade do Estado.
Nessa linha de raciocínio, é fundamental destacar a Constituição de 1988 e a legislação posterior que regulamenta seus artigos, pois representaram um marco histórico no reconhecimento do papel do Estado na atenção às
necessidades sociais, passando a ser denominada como “Constituição Cidadã”. A base que a fundamenta é a de que as
políticas sociais devem ser realizadas mais próximas do cidadão, com gestão democrática e descentralizada, possibilitando que em todo o seu ciclo de constituição e desenvolvimento haja participação da sociedade.
A partir da Constituição, tivemos a aprovação de leis ordinárias que visam detalhar e concretizar os mecanismos
para cumprimento dos preceitos constitucionais, tais como: Leis nºs 8.080/1990 e 8.142/1990 que estabelecem o
Sistema Único de Saúde; a Lei nº8.069/1990 que cria o Estatuto da Criança e do Adolescente; a Lei nº 9.394/1996
que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB; e a LOAS – Lei Orgânica de Assistência Social
aprovada em 1993, sob nº 8.742/1993.
Para além das legislações estabelecidas, está em curso um intenso debate acerca da necessidade de aprovação de um
marco regulatório voltado às especificidades da juventude brasileira10, tornando-se cada vez mais evidente que há necessidades e dimensões que precisam ser incorporadas às políticas públicas de forma a consagrar os direitos dos/das jovens,
partindo “da própria diversidade que caracteriza as juventudes” (NOVAES, 2006). Não é suficiente, portanto, estabelecer
9. A concepção de sistemas presentes na regulação das políticas sociais, após a Constituição de 1988, prevê um conjunto articulado de ações
governamentais e não governamentais que se estabelecem de forma complementar, com coordenação e comando do poder público em cada
esfera e que se organizam para alcançar objetivos comuns. Para Wehrle (2007) “O conceito de sistema consegue incorporar a noção de
complexidade articulada (...). Os sistemas em questão (SGD, SINASE, SUAS) buscam, exatamente, fazer avançar a luta pela regulação dos
direitos sociais pelo Estado e a efetivação real dos direitos ‘do papel’ como algo impositivo e exigível”.
10. É o caso, por exemplo, do projeto de lei nº 4.530/2004, que está em tramitação na Câmara Federal e estabelece um Plano Nacional de
Juventude.
PROJOVEM Adolescente
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um somatório do que já existe nas diferentes áreas; o desafio é assumir a integração e a transversalidade como elementos fundamentais de todas as políticas públicas de juventude, combinando mecanismos de proteção social, expedientes
que gerem novas oportunidades de inserção profissional e sociocultural e incentivem a participação11 (INSTITUTO
CIDADANIA, 2004, p. 19). Ressalte-se como um desses diferenciais que se trata de uma população concentrada entre
15 e 29 anos12, logo o Estatuto da Criança e do Adolescente não responde suficientemente a essas peculiaridades.
Nesse sentido, e grosso modo, considerando o fato dos jovens comporem o contingente populacional mais vitimizado pelas distintas formas de violência presentes no Brasil; enfrentarem
enormes dificuldades de ingresso e permanência no mercado de trabalho; sofrerem impedimentos no acesso a bens culturais; não terem assegurado o direito a uma educação de qualidade
e não receberem tratamento adequado no tocante às políticas públicas de saúde e lazer, o
reconhecimento de seus direitos deve estar alicerçado em uma perspectiva ampla de garantia
de uma vida social plena e de promoção de sua autonomia. Portanto, seu desenvolvimento
integral é legítimo e de interesse de todo o conjunto da sociedade. (NOVAES, 2006, p. 7)
Para o Instituto de Cidadania (2004) há pelo menos três razões para sustentar que o debate sobre a juventude
deve estar em primeiro plano da agenda nacional. São eles:
(...) o peso numérico do segmento populacional envolvido; a gravidade dos problemas diferenciais enfrentados por ele; e ainda a reconhecida energia, a criatividade
e o potencial de engajamento em mobilizações de cunho cidadão que a juventude já
comprovou na história de nosso país e de outros povos. (op cit, p. 8)
O Plano Nacional de Juventude, em tramitação no Congresso Nacional, propõe o desenvolvimento de ações ao
longo de dez anos, dentre as quais se destacam a elaboração de planos específicos em estados e municípios, pautados na
construção de diagnósticos reais acerca da situação da juventude em cada localidade e, ainda, incluindo a participação
direta dos jovens em sua formulação. A ideia de pactuar uma política específica para juventude busca assegurar a articulação das diferentes iniciativas voltadas a esse segmento e empenha-se, ainda, no enfrentamento de alguns desafios,
destacados à época da aprovação pela Secretaria Nacional de Juventude e que ainda estão presentes:
• ampliar o acesso e a permanência na escola de qualidade;
• erradicar o analfabetismo entre os jovens;
• preparar para o mundo do trabalho;
• gerar trabalho e renda;
• promover vida saudável;
• democratizar o acesso ao esporte, ao lazer, à cultura e à tecnologia da informação;
• promover os direitos humanos e as políticas afirmativas;
11. A participação juvenil será analisada mais adiante.
12. “Este é um padrão internacional que tende a ser utilizado no Brasil. Nesse caso, podem ser considerados jovens os adolescentes-jovens
(cidadãos e cidadãs com idade entre os 15 e 17 anos), os jovens-jovens (com idade entre os 18 e 24 anos) e os jovens adultos (cidadãos e
cidadãs que se encontram na faixa-etária dos 25 aos 29 anos)”. (NOVAES, 2006, p. 5)
PROJOVEM Adolescente
33
• estimular a cidadania e a participação social;
• melhorar a qualidade de vida dos jovens no meio rural e nas comunidades tradicionais.
Reconhece-se, dessa forma, que há uma importante lacuna no debate e na formulação de políticas integradas
para e com a juventude. Todavia, a especificidade do serviço Projovem Adolescente encontra respaldo para sua estruturação nas legislações em vigor por voltar-se à faixa etária de 15 a 17 anos. A esse respeito, torna-se importante destacar
que algumas dessas legislações significaram verdadeira revolução13 – ética, política e na gestão pública – como são os
casos, por exemplo, do ECA e da LOAS. O Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceu uma nova compreensão
desse segmento populacional, reconhecendo-o como sujeito de direitos, requerendo para sua atenção o estabelecimento de um Sistema de Garantia de Direitos compreendendo ações para prevenção, promoção e defesa de direitos. Por
seu turno, a LOAS também representa uma revolução ao declarar a assistência social como uma obrigação do Estado,
rompendo com a trajetória de assistencialismo e tutela, que deve ser desenvolvida por ações articuladas e planejadas
entre o Estado e a Sociedade Civil:
A LOAS é uma revolução do ponto de vista da assistência social, assim como o ECA o é na
política de proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente. Ela é uma revolução porque,
pela primeira vez, deu-se à assistência social o estatuto de política social. (...) A construção do
desenho dessa política social, que teve inicio na década de 90, obedeceu a dois rumos. Um rumo,
que a meu juízo é um rumo menor, seria aquele de só termos uma perspectiva organizativa da
assistência social sob a ótica da lógica do Estado, da lógica da gestão. Outro rumo seria o de
convalidarmos a assistência social como política de direitos sociais, o que supõe enraizar essa discussão no debate da sociedade civil, para que realmente se possa construir a garantia de padrões
de qualidade, de dignidade ou de mínimos de cidadania a todos. (SPOSATI, 1999, p. 123)
Assim, podemos afirmar que, com a aprovação do ECA e da LOAS, a sociedade brasileira passou a ter recursos
jurídicos, políticos e financeiros para garantir e defender os direitos de crianças e adolescentes. São exemplos disso: o
direito à profissionalização e a proteção no trabalho14, os conselhos de direitos e centros de defesa, assim como fundos
vinculados à realização das políticas públicas.
Dentre as definições comuns a todas as legislações citadas está a de que a gestão das políticas públicas no Brasil
é de responsabilidade compartilhada entre a União, os Estados e os Municípios exigindo, em decorrência, redefinições
do pacto federativo. Por esse pacto, as diferentes instâncias devem atuar de forma complementar no financiamento,
execução e coordenação dos sistemas de políticas públicas. Portanto, se a atenção à juventude e adolescência é uma
responsabilidade pública, expressa nos marcos legais e nas diretrizes de diferentes políticas, deve ser realizada tendo
como premissa as responsabilidades e competências das três instâncias governamentais:
A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através
de um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. (ECA, 1990, art.86)15
13. Para Costa (1999): “O Estatuto da Criança e do Adolescente fez três revoluções em termos de política pública. Uma revolução de
conteúdo, uma revolução de método e uma revolução de gestão”.
14. Previsto na Emenda Constitucional nº 20, de 16 de novembro de 1998.
15. Em 19/04/2006, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente regulamentou, por meio da Resolução 113, o Sistema
de Garantia de Direitos e assim o definiu em seu art. 1º: “articulação e integração das instâncias públicas governamentais e da sociedade civil,
na aplicação de instrumentos normativos e no funcionamento dos mecanismos de promoção, defesa e controle para a efetivação dos direitos
humanos da criança e do adolescente, nos níveis Federal, Estadual, Distrital e Municipal” (CONANDA, 2006).
34
PROJOVEM Adolescente
Especialmente na atenção a adolescentes e jovens, dado seu caráter transversal a várias políticas sociais, outra articulação necessária diz respeito ao esforço intersetorial para o conhecimento das reais condições de vida desse segmento social, suas aspirações, necessidades e capacidades de interação social, para formulação de propostas e intervenções
abrangentes e continuadas, que realmente atendam às especificidades desse ciclo de vida.
Reafirma-se, assim, a busca da garantia do direito à proteção integral dos adolescentes e jovens; portanto, não se
trata aqui de propostas reducionistas voltadas à ocupação de jovens e adolescentes para que eles não se envolvam com
os circuitos de violência. Ao contrário, trata-se de garantir que as diferentes dimensões propulsionadoras de condições
de desenvolvimento e de qualidade de vida sejam atendidas. Uma adequada definição da concepção da proteção integral é a expressa nos preceitos constitucionais ao declarar em seu artigo 22716:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao lazer, à profissionalização, à liberdade, ao respeito, à dignidade, à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a
salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Dessa forma, entende-se que a atenção à adolescência e à juventude, pela sua característica de transversalidade, requer ações complementares e articuladas entre si. A dimensão intersetorial passa, então, a ocupar importância estratégica,
visto que nenhuma política será capaz de sozinha atender a todos esses direitos, expressos no artigo constitucional.
A ação do Estado é necessária para que as políticas de juventude, ao invés de intervenções
fragmentadas e pontuais, integrem dimensões como: a) a econômica – contemplando o trabalho, o
desenvolvimento tecnológico, o emprego e os recursos que resultem em geração de renda; b) a social –
contemplando o acesso à informação, ao capital social e à expressão cultural, a diversidade étnica e a
diferença de capacidades, o fortalecimento da participação da mulher jovem no esporte, a juventude
rural, a juventude em conflito com a lei, o meio ambiente, o exercício da cidadania e a possibilidade
de auto-organização; c) a participação da juventude nos processos de tomada de decisões, na elaboração e gestão das políticas públicas de esporte e lazer como direitos sociais (CONJUVE, 2006, p. 51).
A força da concepção da Proteção Integral, presente no Estatuto da Criança e do Adolescente, marca duas diferenças importantes analisadas por Edson Seda (2005, p. 19-21):
Na afirmação de que “a criança tem seus direitos reconhecidos quando nasce e, seus
deveres, segundo o desenvolvimento (Direito do Desenvolvimento Humano) de sua capacidade de formular juízos próprios”.
No reconhecimento de que “o adolescente tem condições de manifestar seu discernimento pessoal (liberdade de pensar, querer e agir)”.
Nesse ponto vamos fazer um destaque para aprofundar um pouco mais nossa reflexão sobre a Política de
Assistência Social. Tal ênfase se faz necessária no contexto do Projovem Adolescente, como:
• um serviço continuado de Proteção Social Básica do Sistema Único de Assistência Social – SUAS;
16. Cabe destacar que a Doutrina da Proteção Integral, expressa nos princípios do artigo 227 da Constituição Republicana, passa a ser direito
e dever de idosos, adultos, adolescentes e crianças, embora estejamos dando ênfase ao campo dos direitos do adolescente em função do
objetivo deste texto.
PROJOVEM Adolescente
35
• com caráter socioeducativo orientado por uma perspectiva universalizante;
• que visa a assegurar atenção a populações vulnerabilizadas pela pobreza, protegendo-as de possíveis incidências de risco e buscando fortalecer vínculos comunitários e familiares.
Pode-se afirmar que a Proteção Social Básica tem, assim, uma dimensão inovadora (SPOSATI, 2006) na
Política Nacional de Assistência Social – PNAS (2004), ao superar a histórica atenção voltada a situações emergenciais, que exigiam ações indenizatórias de perdas já instaladas, mais do que asseguradoras de patamares de
dignidade e de desenvolvimento integral.
Nessa direção, insere-se o debate das ações socioeducativas como um campo de direitos a serem assegurados
também pela política pública de assistência social, pois são entendidas como:
...uma oportunidade de desenvolvimento social e pessoal dos jovens [que] contribui para que estes reflitam e desenvolvam o conhecimento, o compromisso com a
cidadania e a participação social. É importante preocupar-se com a formação do
ser humano em sua totalidade. Formação entendida no sentido amplo, enquanto
exercício das potencialidades básicas do ser humano, tais como: a racionalidade, a
emoção, a criatividade, o afeto, as diferentes formas de linguagem. Espaço de desenvolvimento de competências e habilidades e acesso à construção de valores e visões de
mundo articuladas com seu grupo social. (MDS/SNAS/DPSB, 2007)
Pois bem, a ideia-força aqui expressa é a que reconhece que, para intervir em questões multidimensionais como são as necessidades pessoais e sociais de jovens e adolescentes, a ação pública deve ser igualmente
diversificada. Mas, se há a necessidade de uma articulação intersetorial, qual é a responsabilidade específica
da área da assistência social? Quais são os direitos socioassistenciais a serem assegurados à adolescência e juventude brasileiras? Quais são as seguranças a serem garantidas? Como se dá a articulação da proteção básica
da assistência social com os marcos normativos que se vinculam diretamente à juventude e adolescência? São
algumas das reflexões propostas a seguir, sendo necessário demarcar que não há respostas prontas para várias
dessas questões, mas um convite para que, a partir dessa abordagem inicial, sejam desencadeadas propostas
alinhadas com as normativas recentemente aprovadas17. Dessa forma, o desafio é identificar e aprimorar o
pacto estabelecido, com vistas a apontar alterações a serem adotadas na gestão dos serviços.
2.1 O DIREITO DE JOVENS E ADOLESCENTES À ASSISTÊNCIA SOCIAL
Inicialmente é necessário apontar a relação entre dois importantes marcos regulatórios da atenção a jovens e adolescentes na política de assistência social: o ECA e a LOAS. Uma primeira questão a ser destacada é
a visão de assistência social presente no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, considerando que, até
aquele momento, a assistência social ainda não tinha sido alçada ao status de política pública. A Lei Orgânica
de Assistência Social – LOAS ainda não havia sido publicada e a ideia que predominou no ECA era a de política de assistência social com uma função complementar, supletiva e voltada para necessitados e não para
necessidades sociais.18
17. É o caso, por exemplo, do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) e do Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária.
18. A base para tal afirmativa está no artigo 87 do ECA ao afirmar que: “São linhas de ação da política de atendimento: I – políticas sociais
básicas; II – políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, para aqueles que deles necessitem”.
36
PROJOVEM Adolescente
Ora, podemos afirmar que, ao longo desses quase vinte anos de vigência do Estatuto, a compreensão em torno
da assistência social como uma política pública asseguradora de direitos avançou muito, inclusive com a contribuição
de militantes, profissionais e pesquisadores que atuam no campo da defesa dos direitos de crianças, adolescentes e jovens. Estabelecer esse caráter de política pública para a assistência social requer, dentre outras questões, “superar ideias
tutelares e de subalternidade, que identificam os cidadãos como carentes, necessitados, pobres, mendigos, discriminando-os e apartando-os do reconhecimento com sujeitos de direitos”. (NOB/SUAS, 2005, p. 25)
Trata-se, assim, de compreender e consolidar a assistência social como uma política setorial que possui campo próprio de
intervenção e compromisso com a proteção social, que deve ser assegurada de forma universal na atenção às vulnerabilidades
sociais, considerando as peculiaridades próprias dos ciclos de vida: “Assim, a assistência social tem especializações por segmentos
etários, o que a coloca em diálogo com os direitos de crianças, adolescentes, jovens e idosos”. (SPOSATI, 2004, p. 42)
Afirmar que a Assistência Social é uma política de proteção social de caráter universal, no âmbito da Seguridade
Social, requer reconhecer sua responsabilidade na garantia de vida digna e na atenção aos direitos. Esse padrão de dignidade implica não só o acesso a bens materiais, mas também a padrões de sociabilidade e usufruto de bens culturais e
sociais, fortalecendo a capacidade do cidadão de participar ativamente da sociedade e de suas conquistas civilizatórias,
e de definir objetivos e projetos para si e para aqueles com os quais convive diretamente. Na percepção de Sposati,
esse compromisso da assistência social assim se expressa:
A proteção social na assistência social inscreve-se, portanto, no campo de riscos e vulnerabilidades sociais que, além de provisões materiais, deve afiançar meios para o reforço da autoestima,
autonomia, inserção social, ampliação da resiliência aos conflitos, estímulo à participação, equidade, protagonismo, emancipação, inclusão e conquista de cidadania. (SPOSATI, 2004, p. 43)
Tal concepção do compromisso com padrões dignos para a vida humana adquire especial relevância ao tratarmos de atenção a adolescentes e jovens, dada a sua peculiar situação de desenvolvimento. Nessa direção é que o debate
acerca de políticas para e com adolescentes e jovens tem destacado a importância de assegurar a provisão de acessos
a bens materiais e culturais, mas também que o desenho das ações preveja maior envolvimento e protagonismo do
segmento juvenil como forma de aprendizado participativo e, principalmente, como mecanismo assegurador de que
os seus interesses e necessidades sejam atendidos pela ação desenvolvida. Nesse sentido, fortalecer a participação dos
adolescentes e jovens na formulação, na execução e na avaliação das políticas é uma diretriz que visa a atender aos
princípios da gestão democrática.
O desafio é grande se pensamos na precariedade no processo de socialização do/a jovem
na sociedade (com foco no trabalho e na educação); nos mecanismos inadequados e insuficientes de inserção do jovem (na sociedade, no mundo do trabalho, no estudo etc.); na ausência
(ou não apropriação) de espaços/opções de sociabilidade (com foco na esfera política, religiosa
e do esporte e lazer) para o/a jovem e, finalmente, na carência de espaços de participação da
juventude em políticas voltadas à qualidade de vida. (NOVAES, 2006, p. 69)
A partir da concepção de assistência social como política de proteção social, estabelecem-se seguranças ou garantias que devem ser acessadas nessa política, ou seja, ofertas que a política deve prover para combater inseguranças
que o cidadão enfrenta ao longo dos seus ciclos de vida e, no caso dos adolescentes e jovens, contribuir para o seu desenvolvimento e seu processo de autonomização. Reafirma-se, portanto, com esse entendimento, que cabe ao Estado
desenvolver ações de combate a riscos e vulnerabilidades sociais e que enfrentá-las não é um problema individual e
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sim de responsabilidade coletiva. A esse respeito afirma a Política Nacional de Assistência Social – PNAS: “a proteção
social deve garantir as seguintes seguranças: segurança de sobrevivência (de rendimento e autonomia); de acolhida; de
convívio ou vivência familiar” (PNAS, 2004, p. 31).
Na segurança de sobrevivência inserem-se programas e benefícios de transferência de renda, cujo objetivo é assegurar a todo cidadão brasileiro o acesso à provisão material necessária para suprimento de suas necessidades de
alimentação e vestuário. Para a PNAS: “essa é a garantia de que todos tenham uma forma monetária de garantir sua
sobrevivência, independentemente de suas limitações para o trabalho ou do desemprego” (PNAS, 2004, p. 31).
Na segurança de acolhida encontram-se os serviços, projetos e programas que são desenvolvidos para atender
situações de abandono, fragilização ou perda de vínculos relacionais e familiares, impedimento de permanência na
residência por situação de desastres ou acidentes naturais ou ainda ocasionadas por situações de violência. Um exemplo
de serviços de acolhida são os abrigos para crianças e adolescentes, como medida de proteção aplicável em situação
de vulnerabilidade19. Os serviços e programas de acolhida operam, portanto, na atenção às necessidades humanas tais
como: alimentação, vestuário, abrigo, proteção à vida.
Todavia, é necessário estabelecer e frisar que segurança de acolhida não é sinônimo de institucionalização:
Trata-se de construir espaços de referência que deem a liberdade de a pessoa poder recorrer a eles, reduzindo seu sofrimento e garantindo seu padrão de dignidade e
cidadania. (SPOSATI, 2004, p. 46).
Pode-se afirmar então, que a segurança de acolhida está presente em vários serviços de assistência social e constitui-se em mecanismo garantidor de atenção digna ao usuário da política. Mas é nos serviços e programas da proteção
básica da assistência social que a capacidade de “escuta” e de apoio aos usuários dos serviços em momentos de vulnerabilidade se insere nessa acolhida. Para jovens e adolescentes essa é uma tarefa especialmente importante, visto que
requer capacidade de compreender as contradições e conflitos vividos e que trazem consigo muitas expectativas, mas
também muitas frustrações, especialmente na vivência de um cotidiano cercado de restrições.
É fundamental então, assegurar uma “escuta ativa”, ou seja, aquela que provoca a reflexão crítica sobre a situação
vivida, buscando favorecer movimentos que extrapolem a dimensão individual e busquem compreender a questão da
juventude e adolescência inserida num cenário sócio-histórico mais amplo. As condições para tal escuta devem assegurar respeito na relação, de modo a estabelecerem-se vínculos significativos. (NASCIMENTO, 2007, p. 10)
Nessa direção, o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à
Convivência Familiar e Comunitária – PNCFC estabelece:
Nas situações de risco e enfraquecimento dos vínculos familiares, as estratégias de
atendimento deverão favorecer a reconstrução das relações no grupo familiar e a elaboração de novas referências. Estas estratégias visam potencializar a família para o exercício
de suas funções de proteção e socialização e o desenvolvimento de autonomia, incluindo
as ações que possam levar a constituição de novos vínculos familiares e comunitários em
caso de ruptura dos vínculos originais. (SEDH e MDS, 2006, p. 69)
19. Em seu artigo 98, o ECA estabelece que: “As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos
reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados: I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II – por falta, omissão ou abuso
dos pais ou responsável; III – em razão de sua conduta.”
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Dessa forma, cabe à segurança de acolhida na proteção básica, assegurar espaços de escuta e apoio que fortaleçam os vínculos familiares e comunitários, de modo a assegurar antecipação a possíveis situações de rompimento
de vínculos afetivos, relacionais e de pertencimento social (PNAS, 2004, p. 33). O ECA, em seu art. 90, estabelece a
orientação e apoio sociofamiliar, como uma modalidade de atendimento às crianças e adolescentes, na perspectiva
de mantê-los vinculados a esse núcleo.
Uma terceira segurança a ser provida na política de assistência social é a segurança do convívio. A PNAS (2004)
afirma que o convívio é parte da dinâmica social na qual se desenvolve o sentimento de pertença, a construção das
identidades, o estabelecimento de objetivos, crenças e valores; fixam-se códigos de linguagem, constroem-se, enfim,
singularidades. Em pesquisas sobre as necessidades humanas básicas a serem atendidas pelas políticas sociais, alguns
autores apontam as relações primárias significativas como um aspecto fundamental para que as pessoas possam participar criticamente da sociedade em que vivem, ou seja, para que tenham autonomia. Esses mesmos autores definem
essas relações como “uma rede de apoios individuais que podem oferecer um ambiente educativo e emocionalmente
seguro”. (DOYAL; GOUGH, apud PEREIRA, 2002, p. 79).
O convívio e a socialização são, assim, essenciais para que as pessoas aprendam mutuamente e para que se sintam valorizadas, o que favorecerá sua relação com outros grupos. As habilidades para o convívio são assimiladas desde
os primeiros anos de vida e se constituem em aprendizado constante ao longo de toda vida. O Plano Nacional de
Convivência Familiar e Comunitária aponta como algumas dessas habilidades: compreender e aceitar regras, perceber
os papéis sociais e familiares, controlar a agressividade, aprender a cooperar e a compartilhar.
Quando cheguei, a primeira coisa que teve foi uma roda de conversa onde os meninos da casa explicavam as regras do lugar. Por exemplo, que não podia falar palavrão.
Depois me apresentaram a casa (...). Também serviu para aprender muitas coisas sobre
como conviver com outros e como gostar da Lívia [ela própria]. Lá encontrei muitas pessoas especiais, amigos e educadores! (TRAVESSIA, 2003: 48)
Se o convívio é um aprendizado constante para toda a vida, na adolescência e juventude se estabelecem novos
desafios que, como já analisado, explicitam ambiguidades e contradições (INSTITUTO CIDADANIA, 2004, p.
12). Há um forte desejo de desprendimento institucional, de estabelecimento de novos rumos, novas relações, de
busca de autonomia e emancipação pessoal, mas, ao mesmo tempo, há fortes limitações para a vivência desse desejo, especialmente pela precariedade de acesso à riqueza material e cultural socialmente produzida. O adolescente e
o jovem vivem intensas alternâncias entre o conhecido e o desconhecido, entre o novo e o familiar, independência
e dependência. (SEDH e MDS, 2006).
Nesse sentido, torna-se necessário reconhecer esse movimento de alternâncias e valorizá-lo assegurando,
porém, condições de orientação, construção de valores, fortalecimento da autoestima e combate às desigualdades, de modo que não se introduzam ou se reproduzam relações de subordinação e violência. Fortalecer o
convívio requer, assim, promover referências seguras, acolhedoras, favorecedoras do diálogo e que possibilitem
a construção de autonomia:
Nessa fase, se o adolescente, ao fazer o necessário movimento de afastamento da família, não encontra nas demais instituições sociais um contexto de cuidado e de referências
seguras, o seu desenvolvimento poderá ser prejudicado. A responsabilidade, portanto, é dividida entre a família, o Estado e a sociedade. (SEDH e MDS, 2006, p. 27)
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Ressalte-se que a segurança de convívio tem seu locus privilegiado, embora não exclusivo, nos serviços de Proteção
Básica de Assistência Social, com vistas a expandir as possibilidades de convivência, sociabilidade e participação; e também a defesa e afirmação de direitos, objetivando a emancipação, autonomia e cidadania. Nesse âmbito de proteção,
estabelecem-se ações preventivas, atuando nas fragilidades dos vínculos familiares e comunitários, buscando desenvolver serviços, programas e projetos em localidades socialmente vulneráveis.
Importância estratégica adquire aqui a noção de territorialização20, eixo estruturante para organização dos serviços socioassistenciais no âmbito do SUAS e que, se interpretado de forma limitada, pode constituir-se em uma
perspectiva de segregação e restrição do convívio a determinadas regiões, contrapondo-se ao direito à cidade, a ser assegurado a todos os cidadãos21. Destaque-se, portanto, que as condições de acesso aos equipamentos de cultura e lazer
existentes na cidade devem ser garantidas, sendo que uma política de convívio deve também assegurar o deslocamento
na cidade e a ampliação do universo de informações de jovens e adolescentes.
Outro aspecto central a ser considerado diz respeito à atenção à família, pois, se há uma pretensão de favorecer
o convívio familiar, é necessário o fortalecimento das famílias para que possam assumir esse papel. A legislação define
que as famílias devem prover o sustento, a guarda e a proteção de seus membros; reconhece-se, todavia, que para exercer sua função protetora, a família também precisa ser protegida. A esse respeito cabe lembrar que a PNAS definiu a
matricialidade familiar como um eixo central, na perspectiva de compreendê-la como portadora de direitos, requerendo, portanto, proteção do Estado e negação de práticas controladoras, estereotipadas e autoritárias:
A relação família e Estado é conflituosa desde o princípio, por estar menos relacionada aos indivíduos e mais à disputa do controle sobre o comportamento dos indivíduos. (MIOTO, 2004, p. 45)
Por sua vez, proteger as famílias requer compreender que as inúmeras transformações – econômicas, sociais, nos
hábitos e costumes, avanços tecnológicos, entre outras – vividas na sociedade contemporânea alteram, por consequência, as características do grupo familiar. Sendo assim, as definições tradicionais de família são insuficientes para caracterizar a realidade contemporânea: “o que constitui realmente a família são (...) relações de mutualidade e reciprocidade,
das quais decorrem (...) direitos e obrigações” (CAMPOS, 2004, p. 13).
Especialmente no que se refere à relação entre adolescentes/jovens e famílias, essa é uma relação que apresenta conflitos e contradições22. Todavia, sua importância é inegável, visto que há uma conexão direta entre proteção das famílias e
proteção aos direitos individuais e sociais de adolescentes e jovens. Além disso, a família, conforme aponta Baptista, ainda
é o espaço que preserva vínculos, que acolhe o adolescente. É para a família que o adolescente converge ou diverge.
Ela ainda é o espaço que preserva laços, vínculos, que acolhe (ou por vezes rejeita) o
adolescente. É para essa família que os adolescentes convergem ou divergem. É nela que os
sentimentos se expressam e são forjados na relação entre seus membros. Com todos os problemas que a família carrega, é na família que o adolescente espera guarida, acolhida e apoio.
A família ainda é um lugar importante para eles. (BAPTISTA, s/d, p. 85).
20. Trabalhar na perspectiva territorial requer reconhecer as desigualdades intraurbanas e que a presença das políticas sociais reduz essas
desigualdades, pois se constituem em ativos que alteram as condições de vida da população moradora nessas localidades, portanto, trata-se
de ampliar a rede de serviços, em conformidade com diagnósticos que apontem as limitações e potencialidades dos territórios: “As políticas
públicas tradicionais (como saúde, educação, assistência social, esporte, cultura, lazer) também criam e transformam o espaço simplesmente
por sua localização, gerando condições diferenciadas de acesso aos diferentes grupos sociais habitantes do município. Assim, é essencial
entender espacialmente a oferta e a demanda dessas políticas para que uma relação mais justa possa ser estabelecida entre elas, favorecendo
a democratização do acesso às políticas públicas de assistência social”. (Centro de Estudos da Metrópole, 2003, p. 4)
21. Ver abordagem inicial desse texto sobre o nomadismo nessa fase da vida.
22. Ver abordagem das relações intergeracionais na primeira parte desse texto.
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Nesse sentido, reconhecer as contradições e conflitos de interesses, expectativas e necessidades de jovens, adolescentes
e de suas famílias e, ainda, promover reflexões para o enfrentamento de preconceitos e estereótipos sobre a adolescência é essencial para uma intervenção que se proponha a fortalecer a participação ativa na sociedade, a independência para formular
projetos individuais e coletivos e assegurar para a família um espaço de acolhida e convívio: “um lugar de bons encontros,
o que é algo fundamental para que as mulheres deixem de sentir alegria apenas quando se separam dos maridos e para que
as crianças e adolescentes não necessitem ir embora para fugir da violência”. (SAWAIA, 2004, p. 22)
Por fim, é fundamental apontar que o fortalecimento do convívio familiar e comunitário requer a instalação de
condições favorecedoras de acesso a essa segurança, o que diz respeito ao necessário investimento do Estado na provisão de políticas públicas articuladas e complementares.
Os vínculos familiares e comunitários possuem uma dimensão política, na medida
em que tanto a construção quanto o fortalecimento dos mesmos dependem também, dentre
outros fatores, de investimento do Estado em políticas públicas voltadas à família, à comunidade e ao espaço coletivo – habitação, saúde, trabalho, segurança, educação, assistência
social, desenvolvimento urbano, combate à violência, ao abuso e à exploração de crianças
e adolescentes, distribuição de renda e diminuição da desigualdade social, meio ambiente,
esporte e cultura, dentre outros. (SAWAIA, 2004, p. 33)
A definição das seguranças a serem providas pela política de assistência social constitui, assim, aspecto essencial
na legitimação das demandas sociais, visto que, ao reconhecer o direito à atenção às necessidades humanas, há uma
ampliação para além da atenção a situações emergenciais e centradas exclusivamente nas situações de risco social. A
PNAS definiu ainda que a atenção deva se dar no âmbito da Proteção Social Básica e Especial, em conformidade com
o grau de complexidade vivenciada pelos sujeitos usuários da política. O leque de compromissos foi ampliado. Faz-se
cada vez mais necessário introduzir as dimensões de planejamento e avaliação do atendimento socioasssistencial de
modo a torná-los mais próximos das circunstancias reais que afetam a vida dos adolescentes e suas famílias.
Ao invés de metas setoriais a partir de demandas ou necessidades genéricas, trata-se de identificar os problemas concretos, as potencialidades e as soluções, a partir de recortes territoriais que identifiquem conjuntos populacionais em situações similares, e intervir através das políticas públicas,
com o objetivo de alcançar resultados integrados e promover impacto positivo nas condições de vida.
O que Aldaíza Sposati tem chamado de atender a necessidade e não o necessitado. (PNAS, 2004)
Reafirma-se, por fim, o objetivo da reflexão sobre as políticas públicas, adolescências e juventudes, de
desencadear o debate acerca dos desafios que se impõem ao pensar na atenção a esse grupo social, sem mitos
e, principalmente, sem preconceitos, para que a ação alcance o objetivo de ampliar oportunidades, garantir
acessos e promover autonomia. Além de reconhecer que essa é uma tarefa a ser compartilhada entre Estado,
família e sociedade, é fundamental sermos capazes de ouvi-los e ouvi-las, incorporar suas sugestões, promover a
participação em todas as etapas de desenvolvimento das ações, buscarmos saídas conjuntas e assegurar padrões
de qualidade no trabalho socioeducativo:
Se eu me olho no espelho hoje, vejo outra Victória, e me apresentaria pras outras pessoas como eu mesma, uma pessoa ótima. Mostraria tudo o que é meu, o que eu sou, minhas
atitudes. (...) Eu não tenho um projeto muito claro, mas o que vier pela frente, as oportunidades eu vou agarrando. O que vier é comigo mesma! (TRAVESSIA, 2003, p. 33)
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3. O SOCIOEDUCATIVO EM QUESTÃO: FORMAS DE
POTENCIALIZAR A CONVIVÊNCIA E A PARTICIPAÇÃO
E se somos severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte
severina: que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos
vinte, de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte severina ataca em
qualquer idade, e até gente não nascida). (JOÃO CABRAL DE MELO NETO)
Na continuidade da discussão, chama-se agora à reflexão sobre os sentidos e direções do socieducativo, norte e
mote principal do serviço que se oferece no Programa Projovem Adolescente.
Os serviços socioeducativos voltados aos adolescentes e jovens de 15 a 17 anos, pelas características
peculiares do grupo que atende, deverão considerar as vulnerabilidades próprias do ciclo de vida da condição juvenil, das circunstâncias de risco contingencial, da pobreza e da violência que incidem no quadro mais
geral da violação de direitos. Busca-se, contudo, estender as ações da assistência social para além da pobreza,
jogando o foco sobre a ‘turma’ jovem que busca ousar a vida extrapolando os muros da casa e da escola e,
principalmente, driblando a morte severina...
Esta reflexão pretende ajudar a superar a visão reducionista da cidadania que é difundida no Brasil, restrita ao
cumprimento de deveres como votar, pagar os impostos, respeitar as leis e as regras civilizatórias. Os usuários e demandantes dos serviços sociais públicos nem sempre têm clareza de que direitos não são concessão, um favor de quem está
do lado de lá do balcão... Cidadania não é presente, dádiva; é construção, conquista a partir da nossa capacidade de
organização, participação e intervenção social, que supõe a relação entre o público e o privado – no mesmo desenho
ético que inclui solidariedade e democracia.
É necessário, de início, portanto, entender o significado do termo – socioeducativo – o que exige ir à sua gênese
para reconstruí-lo no presente, num novo patamar de entendimento e no contexto de análise do que são direitos,
liberdade e autonomia, no estabelecimento de mediações para compreensão e desembalagem das múltiplas expressões
da questão social trazidas pelos usuários das políticas sociais.
O caráter educativo do trabalho profissional é muito antigo na área da Assistência Social, constituído
com a marca e objetivo de socialização e domesticação do trabalhador pobre no contexto da expansão do
capitalismo urbano-industrial que marcou o país nos idos da década de 1930-1940. As práticas educativas
buscavam “consertar” o que se entendia como problemas morais e religiosos das famílias, desviando seus
membros – especialmente os jovens – dos caminhos do “bem”. Constituía-se, ali, a ideia de culpabilização dos
pobres pela sua situação, entendida como individual, única e, portanto, passível de superação também pela
ação individual, pelo esforço continuado de todos, pelo trabalho desde a mais tenra idade, pelo conformismo
aos desígnios divinos.
O trabalho social assumia, não raras vezes, características de “polícia das famílias” sob a égide da educação disciplinadora voltada para desenvolver habilidades que possibilitassem o enquadramento social dos trabalhadores pobres
às novas necessidades criadas pela modernização capitalista.
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PROJOVEM Adolescente
As discussões teóricas no campo da Assistência Social vieram propondo – formatando, conceituando e ensinando – práticas socioeducativas voltadas à promoção de mudanças de comportamento do trabalhador e de sua família
no sentido de adequá-las aos novos padrões de produção e de relações sociais requeridas pela emergente sociedade
urbano-industrial. A tentativa era a de incentivar – e mesmo exigir – mudanças de hábitos, atitudes e comportamentos
do trabalhador, em atenção às necessidades da política de dominação e controle das classes subalternas, sob a égide do
Estado. Os grupos de mães – intensamente desenvolvidos no trabalho das entidades sociais – constituíam-se sob essa
ótica, do ensinar a ‘ser mãe’, habilitar no tricô e no crochê como forma de sobrevivência e emancipação, exigir presença, porque ali se encontrava a possibilidade de superação da situação de exclusão e pobreza experimentadas.
O trabalho socioeducativo, desenvolvido em todos os serviços voltados aos diferentes ciclos de vida, organizava como
pauta a proposta equivocada de promover consciência – de fora para dentro – em relação aos cuidados com a vida cotidiana,
com a saúde, com os hábitos nutricionais, com o planejamento familiar etc. A intervenção profissional permanecia voltada
ao individuo, deslocada e desfocada de práticas coletivas, como males a serem enfrentados um a um, por cada um...
A discussão de direitos sociais – objetivos e subjetivos – estava submetida ao discurso oficial de oferta de benefícios assistenciais como forma de evitar a desordem, a desobediência civil, a decadência familiar e a organização de
trabalhadores e de estudantes, atendendo as necessidades básicas das famílias, como instrumento de garantia de sobrevivência voltada aos interesses presentes e futuros da ordem estabelecida.
Nas décadas de 1990-2000, retomam-se os debates sobre o trabalho profissional no âmbito das políticas sociais
e a discussão sobre o socioeducativo retorna ao palco central pelas mãos do ECA. Propõe-se que a população de menor
idade – menos de 18 anos – tenha a possibilidade de participar das chamadas medidas socioeducativas como “porta de
saída” da infração cometida e “porta de regresso” à família e à sociedade. De fato, o estudo atento do que foi proposto e,
principalmente, o acompanhamento do realizado, tanto pelo Judiciário como pelas instâncias responsáveis pela execução
e acompanhamento das medidas socioeducativas, tem demonstrado o caráter punitivo e excludente aí contido, a exigir
novas reflexões, superando a ideia de que é possível acolher jovens sem esclarecer intencionalidades e objetivos:
“Reparar”, “corrigir” ou “controlar” correspondem a conceitos negativos como a falta
de saúde e falta de ajustamento. “Promover” e “cuidar” correspondem a uma aspiração
que transcende o mal que se deve evitar em termos de riscos e agravos: implica em aquisições positivas que caracterizem uma boa qualidade de vida em todos os sentidos possíveis.
(COSTA e ASSIS, 2006)
A Política Nacional de Assistência Social vira de ponta cabeça essa discussão, propondo serviços socioeducativos
que tenham a ver com liberdade e cidadania, entendida como:
...estado pleno de autonomia (...) saber escolher, poder escolher e efetivar as escolhas
(...) num trabalho permanente de criação, recriação, de invenção e reinvenção de instituições através das quais se exerce essa autonomia. (OLIVEIRA, 1999)
Os serviços socioeducativos integram a Proteção Social Básica, de caráter continuado, em tempos de existência ainda
de vínculos afetivos e parceiros entre a família e o adolescente/jovem, ainda que desgastados e fragilizados pelos conflitos e
embates da vida cotidiana. A NOB-SUAS prevê a instalação de uma rede de serviços socioassistenciais e socioeducativos
direcionados para grupos geracionais, intergeracionais, grupos de interesse, entre outros, tendo a família como eixo matricial
da proteção social: a pauta de trabalho é orientada pelas necessidades das famílias, seus membros e seus indivíduos, o que significa oferta de programas, projetos, serviços e benefícios, no território, hierarquizados, universalizados e complementares.
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A oferta de serviços socioeducativos para jovens e adolescentes no âmbito da proteção básica tem caráter
proativo, aposta e investe na prevenção (importante componente da proteção social básica), categoria teórica e
metodológica nova no trabalho social direto, a exigir intencionalidade política, clareza teórico-metodológica,
debate e formação.
Referir-se à socioeducação, despertar a capacidade analítica e crítica, bem como o resgate da cidadania
(MIRANDA, 1998), oferecer serviços com essa direção significa decidir avançar para além da escolaridade padrão – e
necessária – apostando no desvelar de interesses e talentos pulsantes na vida adolescente e juvenil, quer dizer incentivar a participação na vida pública, facilitar a convivência e a solidariedade, num movimento dinâmico de rede com
outras políticas setoriais, especialmente aquelas de educação, saúde, cultura, meio ambiente e formação profissional.
Significa, enfim, como propôs Proust, propiciar ao jovem/adolescente “uma verdadeira viagem de descobrimento
(que) não é encontrar novas terras, mas ter um olhar novo” (PRAXEDES, 2001, citando MORIN, 2000, p. 107).
A constituição de um ‘olhar novo’ supõe o desvelamento atento das possibilidades que, de fato, os adolescentes
têm de enxergar no mundo que os cerca, revelando as fortes marcas ideológicas que lhes anuviam o olhar, dando-lhes
instrumentos para realizar, com completude e autonomia, o movimento dinâmico de ver, olhar, para só então enxergar
tomando, como ponto de partida pedagógico, o ensinamento de Saramago “... cada um de nós vê o mundo com os
olhos que tem, e os olhos veem o que querem” (1999: 207). O mote não é conter o jovem em um determinado espaço,
todos os dias, todas as manhãs, todas as tardes (SPOSITO, 2006) com a oferta de atividades de segunda classe, mas, ao
contrário, abrir caminhos para autonomia e liberdade. O desafio pedagógico – no interior do trabalho socioeducativo –
é entender – e fazer entender aos adolescentes – que a construção de um novo olhar – formador de autonomia – supõe
a desconstrução do entendimento e das explicações que se formulam e se aceitam sobre a vida real.
A compreensão de que as ações socioeducativas são, ao mesmo tempo, “sociais” e “educativas” nos lança ao desafio de dar sentido à junção destes termos. Portanto, não é desejável separar o que é “sócio” daquilo que é “educativo”.
Trata-se de buscar sentidos para a combinação de ambos. Assim poderemos tornar mais claros os ganhos e as aquisições
dos cidadãos (jovens, adolescentes, crianças, adultos, idosos) que têm o direito a estes serviços no âmbito da política
pública de assistência social.
Não se trata também de “tomar emprestadas” finalidades próprias da política de educação por meio de ideias
que configurariam as ações socioeducativas como complementares à escola, ou ainda como extensão dela, no caso de
expressões como jornada ampliada. Trata-se de fazer a escolha pela “cabeça bem-feita” em substituição à “cabeça cheia”,
aquela que trabalha com princípios organizadores que lhe permite ligar os saberes dando-lhes sentido; e a outra que
apenas guarda (e decora) o saber, sem competências e ferramentas para lhes dar sentido. (MORIN, 2001, p. 21)
A força da composição destes dois termos está na afirmação da finalidade socioeducativa – criar situações de aprendizagens capazes de ampliar a participação e multiplicar as possibilidades de convivência dos jovens/adolescentes.
Podemos nos valer de um conceito mais ampliado de educação, extrapolando o sentido da política setorial de educação:
A educação pode ser um espaço de integração e criação de novas formas de convívio e de sociabilidade num vasto campo de possibilidades de experiências, aprendizados,
confrontos, confiança, afetos e sentidos, não só em relação ao que sabemos – acumulado e
circulante –, mas do que podemos vir a ser e a saber, e do que precisamos exercitar para
que consolidemos nossa autonomia. A educação, assim, pode ser um lugar das interrogações
sobre o estabelecido, de ampliação dos sentidos de ser e estar no mundo. (LEITÃO, 2004)
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O valor desta concepção consiste em não criar hierarquias entre os conhecimentos relacionais e afetivos – próprios da convivência – e os conhecimentos sobre os objetos – próprios da educação e das ciências modernas. Assim, o
primeiro diferencial que podemos destacar das ações socioeducativas é a valorização dos saberes não formalizados, dos
conhecimentos adquiridos pela experiência de vida, pelos encontros entre as gerações tanto quanto os conhecimentos
formalizados pelas ciências e disseminados nos espaços escolares. Diferencial importante quando se deseja ampliar a
relação dos jovens e adolescentes com outras gerações, sobretudo reconhecendo o potencial educativo das famílias, dos
vizinhos, das lideranças populares, dos amigos, dos artistas populares, dos professores, dos agentes de saúde etc.
O conceito de território pode assim ser ampliado para além dos indicadores de vulnerabilidade e risco, identificando potências socioeducativas na própria convivência comunitária. Assim, as ações socioeducativas podem
indicar algo já mencionado na PNAS 2004:
Uma visão social capaz de entender que a população tem necessidades, mas também possibilidades ou capacidades que devem e podem ser desenvolvidas. Assim, uma análise de situação não
pode ser só das ausências, mas também das presenças até mesmo como desejos em superar a situação
atual. Uma visão social capaz de identificar forças e não fragilidades que as diversas situações de
vida possuam.
Rosa Maria Torres, educadora equatoriana, formulou o conceito de comunidade de aprendizagem que pode
ser útil para esta compreensão:
A comunidade de aprendizagem adota uma visão integral e sistêmica do educativo, colocando no centro a aprendizagem e a cultura em sentido amplo e articulando educação formal/não
formal/informal; escola/comunidade; política educativa/social/econômica; educação/cultura; saber
científico/saber comum; educação das crianças/educação dos adultos; reforma/inovação/global/local. (...) Assim, a comunidade de aprendizagem não é a resultado da soma de intervenções isoladas, ou mesmo de sua articulação, mas implica a construção de planos educativos territorializados.
(TORRES, 2001)
Na definição das ações socioeducativas a participação é um qualificativo da convivência, remetendo ao campo
ético dos serviços e programas. Isto requer afirmar o sentido de presença, de acolher os jovens e os adolescentes como
estão; reconhecer e valorizar aquilo que podem; o que já sabem e as escolhas que querem fazer. E, sobretudo, acreditar
que eles podem ser mais, que a convivência entre iguais e diferentes pode expandir o sentido da sua existência para
além de estigmas e qualquer outra forma de aprisionamento, seja ele material, relacional ou afetivo. É como ouvir
Eduardo Galeano dizendo que “somos o que fazemos para transformar o que somos”. Explicita-se, assim, uma ética
que valoriza as potências para agir e criar coletivamente. Os projetos a serem desenvolvidos pelos adolescentes e jovens
no âmbito do Programa materializariam esta aposta.
Participar supõe modos de se expor, de ver e ser visto, de criticar e ser criticado, ser capaz de argumentar, colocando em circulação diferentes saberes e modos de produção de conhecimento. Tomados em sua igualdade, estes
conhecimentos podem circular sem reafirmar hierarquias, podem ser questionados sem ser desqualificados.
A ênfase que tem sido dada ao protagonismo juvenil como alvo das ações com adolescentes e jovens ofusca, por
vezes, a compreensão de que há sempre alguém ‘contracenando’ com eles. Assim como no cinema ou no teatro, o ator
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principal só se afirma como protagonista na relação com os chamados atores coadjuvantes. Portanto, o protagonismo
que se busca é resultado possível de um relacionamento entre adolescentes/jovens com o outro, um adulto que tem
por objetivo educá-los e protegê-los.
Protagonista e coadjuvante têm papel ativo. A diferença é que o adulto não dita as regras sozinho, mas ao lado
dos jovens e adolescentes; seu interesse não se sobrepõe ao deles.
A construção deste protagonismo é um exercício que exige negociação, diálogo, disponibilidade para o encontro
e, ao mesmo tempo, um exercício à altura da realização do desenvolvimento das potencialidades, conquista de emancipação e a autonomia dos adolescentes e jovens. Protagonismo, portanto, como a expressão de uma coletividade que,
ao mesmo tempo em que inclui, expande a existência dos jovens/adolescentes.
Essa compreensão supõe uma autoridade do adulto que é negociada, capaz de demarcar com respeito os
limites, de negociar as regras de convivência, apostando que esta negociação é também educativa. Uma disponibilidade tal como definiu Paulo Freire:
Estar disponível é estar sensível aos chamamentos que nos chegam, aos sinais mais diversos que nos apelam (...) É a minha disponibilidade permanente à vida a que me entrego
de corpo inteiro, pensar crítico, emoção, curiosidade, desejo, que vou aprendendo a ser eu
mesmo em minha relação com o contrário de mim. (FREIRE, 2002)
Desse modo, quem pensa decide, planeja, se envolve, mobiliza, faz, avalia, resgatando um tanto daquilo
que Guimarães Rosa pôs na voz de seu jagunço Riobaldo: “Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de
repente aprende”.
Assim, as ações socioeducativas não são mais uma promessa de cidadania, algo que se acena para o futuro
dos adolescentes em expressões como, “vamos formar cidadãos”. Os adolescentes já são cidadãos reconhecidos
pelo ECA, pela LOAS e pela Constituição Federal! Ao garantir sua participação nas diversas situações de convivência – seja no planejamento e avaliação das ações do Programa, seja estimulando sua participação nas conferências e fóruns da juventude, nos grêmios da escola, nas decisões familiares que afetam sua vida, enfim – realiza-se
em ato sua condição de sujeito de direitos.
A formulação de projetos como forma de intervenção na comunidade abre dois desafios ao desenvolvimento
das ações socioeducativas: produzir um saber prático que seja reconhecido e valorizado pelos próprios adolescentes e
jovens, assim como pelo mundo adulto, e fomentar a atuação de adolescentes e jovens nos espaços públicos.
O primeiro desafio implica produzir com os jovens um saber prático, um modo de intervenção na realidade
capaz de gerar mudanças na coletividade. Por meio de projetos voltados à comunidade, podem ser articulados diversos campos de conhecimento, técnicas, saberes profissionais capazes de configurar para os jovens as relações entre
saber e intervenção; conhecimento, técnica e trabalho. Este exercício é fundamental para suas escolhas profissionais,
pois estimula a busca de novas capacidades. Os aprendizados socioeducativos de jovens e adolescentes podem, portanto, ampliar seus saberes práticos, tanto do ponto de vista do conhecimento de técnicas específicas, quanto dos
aprendizados necessários à pesquisa e acesso às informações em sentido amplo. Ao lado disto, os aprendizados socioeducativos no âmbito relacional também são fundamentais para lidar com conflitos, conviver com as diferenças,
expor ideias, sustentar decisões coletivas.
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Reconhecer os saberes envolvidos na formulação e implementação de um projeto contribui para que adolescentes e jovens possam ter um papel mais ativo na escolha e adesão aos cursos profissionalizantes, saindo da condição
de destinatários de propostas frequentemente descontextualizadas de seus interesses, das demandas e dos potenciais
econômicos do território em que vivem.
Lidar com este desafio contribui também para que adolescentes e jovens possam ser vistos pelos seus pares, pela
comunidade e até mesmo por aqueles ‘de fora’ do seu convívio cotidiano. Ao expor sua produção, sua capacidade
de proposição, distanciam-se dos estigmas de apatia, desinteresse, ausência de talentos. Isto requer, muitas vezes,
deslocar a imagem que se tem dos adolescentes como aqueles a quem o trabalho serve apenas como disciplina e
‘adestramento’ de comportamentos.
A interface entre a ação socioeducativa e a dimensão do trabalho afirma o sentido de desenvolvimento da autonomia. Portanto, implica não tomá-lo como disciplinador dos jovens pela via da subalternidade, do não questionamento das normas, da dissociação de projetos pessoais e coletivos (sejam eles familiares, comunitários, culturais).
O desenvolvimento de projetos, no âmbito da ação socioeducativa, permite que adolescentes e jovens vivenciem e
reconheçam limites, lidem com eles, os questionem. Assim, serão capazes de afirmar uma atitude de corresponsabilidade
pelas suas escolhas. Esta responsabilidade compartilhada expressa o reconhecimento de que o campo para as escolhas dos
jovens é marcado por limitações estruturais ou conjunturais (como, afinal, também o são as escolhas dos adultos). No
entanto, o efeito destas limitações não deve ser de vitimização nem de elogio ao protagonismo dos jovens. Suas escolhas
precisam ter visibilidade como um campo de responsabilidade compartilhada com os adultos, que planejam e realizam
programas que criam determinadas configurações para que os jovens possam fazer suas escolhas.
O segundo desafio diz respeito à dimensão da convivência e participação como exercício da vida pública.
Diferentemente do público infantil, adolescentes e jovens podem usufruir mais do direito de expressão e manifestação
de interesses na esfera pública. Por meio de sua própria circulação pela cidade e suas redes, a produção cultural dos
jovens ocupa diferentes espaços públicos, como lugares para lazer e manifestação cultural. Na perspectiva socioeducativa é desejável ampliar a circulação de adolescentes e jovens pela cidade, promovendo maior interação com diferentes
grupos, acesso e usufruto de direitos culturais. Disso decorre a exigência de que os gestores de programas socioeducativos invistam em ações intersetoriais e criem condições concretas para fortalecer e ampliar o campo de aprendizagens
nos territórios e interterritórios.
O exercício de cidadania para os jovens está posto tanto em canais mais formalizados, como grêmios estudantis, conselhos de escola, conselhos de juventude23, quanto em espaços informais, como grupos culturais, conselhos
consultivos, associações comunitárias e demais associações por interesses comuns. A participação dos adolescentes e
jovens no planejamento e avaliação dos programas e serviços no âmbito da política pública de assistência social não
está formalizada em conselhos de unidade ou equivalentes. Portanto, está colocado o desafio de abrir e sustentar canais
de manifestação de interesses destes cidadãos no cotidiano do trabalho socioeducativo.
Ampliar a circulação e acesso de adolescentes e jovens aos diferentes espaços da cidade é uma estratégia potente
no campo das ações socioeducativas. A cidade é o lugar das produções humanas mais complexas e ricas para o aprendizado da cidadania. Num pequeno trajeto pelas ruas é possível ver as marcas inscritas pelos direitos à liberdade, cultural,
política, religiosa, direitos de acesso a serviços e bens públicos, direitos econômicos, direito à habitação, à educação, à
saúde, direito à informação. Marcas que podem expressar o acesso ou a violação a estes direitos.
23. A partir dos anos 90, a participação dos jovens na formulação de políticas públicas vem ganhando espaço, a exemplo da criação do
Conselho Nacional da Juventude, em 2005, que tem inspirado correlatos em nível municipal.
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O direito à memória e à vida da cidade conecta adolescentes e jovens às heranças deixadas pelas gerações anteriores, assim como os convida a intervir na vida da cidade, a conhecer suas potencialidades e suas contradições.
Participação e convivência na esfera pública supõem conhecer a história escrita e também a história vivida; supõe viver
o presente e projetar o futuro coletivamente.
Na perspectiva socioeducativa, a cidadania não é conteúdo formal, que se apresenta em palestras. Cidadania é
exercício de convivência, formulação e defesa de interesses; a participação é:
...um processo de compartilhamento das decisões que afetam a vida de determinada pessoa a vida da comunidade na qual ela vive. Constitui o meio pelo qual
a democracia é construída e o padrão com relação ao qual democracias podem ser
avaliadas. (MELO, 1992, apud Roger A. Hart, em Children’s participation: from
tokenism to citizenship, Ensaios Inocenti n.º 4, Unicef, 1992)
3.1 O SOCIOEDUCATIVO COMO DIREITO À ASSISTÊNCIA SOCIAL
Trabalhar com jovens e adolescentes numa perspectiva socioeducativa, que tenha como horizonte a liberdade
e não a punição, significa oferecer serviços que respondam a necessidades e interesses reais – objetivos e subjetivos –
manifestados por eles em discussões coletivas e individuais: família, escola, trabalho, prazer, esporte, lazer, sexo, arte,
literatura, violência, drogas, cidadania, meio ambiente, saúde etc.
O socioeducativo assume, conceitualmente, uma nova dimensão, pautada no planejamento e desenvolvimento
de atividades que sejam libertadoras dos potenciais criativos da adolescência, incentivando a independência, recuperando a autoestima, a capacidade transformadora, a discussão das possibilidades de inserção no mundo do trabalho,
que tem o conhecimento produzido pela humanidade como mediação fundamental, articulado à riqueza dos saberes
advindos da experiência individual e coletiva.
A frequência ao serviço deve ser prazerosa – especialmente porque compulsória – pautada na acolhida e no
convívio construído com o profissional orientador e com os pares do grupo. Desse modo, o ato de pensar o fazer
educativo, especialmente em torno de conteúdos, significa pensar a construção da liberdade do homem, da luta por
igualdade e da defesa da solidariedade:
(...) liberdade que recupera todo o processo de garantia dos direitos individuais e
das liberdades públicas, a igualdade no sentido do reconhecimento da igualdade intrínseca de todos os seres humanos em relação aos direitos fundamentais para uma vida digna e a solidariedade no sentido de que a sociedade é esse sólido que deve estar interligado
por laços de apoio, de convivência etc. (BENEVIDES, 2000)
Nessa perspectiva, oferecer serviços públicos de caráter socioeducativo significa:
• conhecimento e apropriação do território como espaço de relações; de encontros e confrontos; de acesso/expulsão da escola; de acolhimento/expulsão da família e da turma; de atração/fuga do consumo e do
tráfico de drogas;
• desvelamento da demanda e desejos dos adolescentes e jovens, criando e fortalecendo o corredor de
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confiança entre eles e o serviço socioeducativo;
• utilização de métodos e técnicas participativas que contribuam para a construção coletiva de conhecimentos e ações;
• aproximação aos arranjos familiares constituídos, construindo e negociando canais efetivos de participação da família na construção do ser adolescente/jovem;
• incentivo à participação dos jovens nos movimentos voltados aos interesses da juventude, à promoção e
defesa de seus direitos sociais básicos e daqueles decorrentes de suas necessidades específicas como pessoas
em desenvolvimento, com um conjunto de necessidades diferenciadas;
• incentivo também à participação ativa dos jovens nas relações comunitárias constituídas nos diferentes
territórios onde tecem relações cotidianas e em novos territórios nos quais possam experimentar novas
inserções e apropriações;
• articulação dinâmica com as escolas, constituindo canais de compartilhamento;
• conhecimento, atenção e denúncia da violência vivida pelos jovens e adolescentes; cuidados e reflexões
sobre a violência por eles praticadas, assegurando proteção social;
• discussão sobre o mundo do trabalho, suas transformações e novos requerimentos, e das relações sociais
que o permeiam, desenhando possibilidades reais de formação;
• desenvolvimento de atividades culturais que viabilizem o exercício da criação e da produção cultural;
• desenvolvimento de atividades de lazer e esportivas que proporcionem a integração grupal e os valores
da cooperação solidária;
• desenvolvimento de atividades ligadas ao meio ambiente na perspectiva da melhoria da qualidade de vida.
Exatamente porque o adolescente jovem está submetido a processos informativos e formativos veiculados na
mídia, no mercado de trabalho, na comunidade e, principalmente, na escola, os serviços socioeducativos devem contar
com profissionais que contribuam para a formação do espírito crítico (que rejeitem espíritos adestrados pelo mundo
dos interesses externos e exteriores); seu trabalho objetiva, antes, ajudar a forjar jovens que descubram, criem e estimulem seus talentos, capazes de enfrentar as adversidades da vida com dignidade e autoestima. A ação profissional precisa
ter caráter proativo, propondo e negociando a participação dos jovens, indo ao seu encontro nas ruas, nas portas das
escolas, nas praças, nos pontos da “turma”. Nesses termos, entende-se que:
...não basta formar indivíduos; é preciso saber para que tipo de sociedade, para que tipo de
prática social o educador está formando indivíduos (DUARTE, 1996, p. 51 apud MIRANDA).
O trabalho socioeducativo contém, no mesmo movimento contraditório, a possibilidade de dominação e de
emancipação, ferramenta de controle e de libertação. Envolve, portanto, dinâmicas pessoais e sociais de construção e
reconstrução, continuidades e rupturas, características de processos de formação e desenvolvimento, mais ainda quando se trata de jovens e adolescentes.
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Trabalhar na perspectiva do convívio, da segurança de acolhida, do enfrentamento das dificuldades de frequência à escola, do destemor e da esperança peculiares aos jovens, da descoberta do sexo e da necessidade de atenção às
armadilhas contidas nas promessas de consumo, são alguns dos principais desafios que se apresentam à construção e
fortalecimento de serviços socioeducativos parametrados pela certeza de que:
...objeto do olhar e modo de ver são fenômenos de qualidade diversa; é o segundo que
dá forma e sentido ao primeiro. (PRAXEDES, 2001, apud BOSI, 1999, p. 107)
Ao romper com as referências da tutela e com a visão que destaca apenas a ausência dos adolescentes e jovens, as ações
socioeducativas configuram um horizonte que convida os adolescentes para a construção de um mundo mais diverso e menos
desigual, mais participativo e menos autoritário. Um horizonte que coloca todos nós na linda condição de penínsulas:
(...) Nenhum homem é uma ilha, disse John Donne, nesta frase maravilhosa, mas
eu humildemente ouso acrescentar isto: nenhum homem e nenhuma mulher é uma ilha,
mas cada um de nós é uma península, metade ligado à terra firme, metade contemplando
o oceano. Uma metade conectada à família, aos amigos, à cultura, à tradição, ao país, à
nação, ao sexo, à linguagem e a muitos outros laços. A outra metade quer que a deixem só
contemplando o oceano. E acho que deveria ser permitido que continuássemos sendo penínsulas. Todo sistema social e político que transforma cada um de nós numa ilha darwiniana
e todo o resto da humanidade num inimigo ou rival é uma monstruosidade. Mas, ao mesmo tempo, todo sistema social, político e ideológico que quer transformar cada um de nós
em apenas uma molécula da terra firme também é uma monstruosidade. A condição de
península é a própria condição humana. É o que somos e o que merecemos continuar sendo.
Assim, num certo sentido, em toda casa, em toda família, em toda conexão humana o que
realmente temos é uma relação entre uma série de penínsulas. Precisamos lembrar disso,
antes de tentar modelar-nos, obrigar-nos uns aos outros a mudar de posição e fazer a pessoa
ao lado adotar nosso modo de ser, quando ela realmente necessita contemplar o oceano por
um momento. (Oz, 2004)
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