Bioindicação em ecossistemas terrestres Josanidia Santana Lima

Propaganda
Bioindicação em ecossistemas terrestres
Josanidia Santana Lima
Princípios e Conceitos da Bioindicação
Em um ecossistema, energia, matéria e carreadores de informações interagem em uma intricada
rede de processos. Modificações em um compartimento necessariamente induzem alterações em
outros. A frequência das alterações no sistema , entre outros, é determinada pelo grau de
adaptação e seleção de processos a nível individual e de população. Nossa compreensão dos
processos envolvidos é, na melhor das hipóteses, parcial e as ferramentas que utilizamos na
compreensão foca aqueles poucos aspectos que conhecemos. As dificuldades surgem com o fato
de que um problema pode surgir com significados diferentes dependendo do ponto de vista e da
perspectiva de avaliação. Consequentemente nossa contribuição na solução do problema, incluindo
esforços científicos como os nossos, é inevitavelmente direcionada.
Todo sistema biológico, independente se enquanto organismo, população ou comunidade se
adaptou a um complexo de fatores ambientais ao longo da sua evolução. Na biosfera, ele
conquistou um espaço e um nicho ecológico onde ele encontra as condições necessárias e
favoráveis à sua manutenção e reprodução. Frente a fatores que exercem influência sobre cada
organismo existe um nível específico de tolerância fisiológica, determinada geneticamente e
adquirida filogeneticamente, que regula a capacidade de suportar esses fatores. Se o fator ocorre
em intensidade baixa ou elevada demais, porém em nível suportável, o organismo se encontra em
um péssimo fisiológico. Somente em níveis limitados, nos quais o fator alcança intensidade
especialmente favorável, o organismo atinge seu ótimo fisiológico. A tolerância fisiológica, por
regra, não está presente em todas as fases de desenvolvimento de um organismo, como também
não se apresenta nos mesmos níveis para todos os indivíduos de uma população.
Quanto à amplitude do nível de tolerância conceitua-se os euripotentes como organismos que
apresentam elevada amplitude e os estenopotentes como aqueles que apresentam estreita
amplitude. O desenvolvimento de um organismo depende, com frequência, do fator que ocorre na
amplitude mais elevada ou mais estreita, ou seja, no seu péssimo fisiológico. Alteração desse fator
para um estágio ótimo provoca os melhores efeitos ecológicos, embora o desenvolvimento, como
um todo, resulte da ação combinada de todos fatores atuantes. Fatores isolados podem ser
substituidos entre si até uma determinada dimensão. A combinação de fatores diferentes pode
resultar em um mesmo efeito, sem que haja, contudo, uma substituição absoluta de fatores
específicos. Cada sistema biológico (organismo, população, comunidade) é capaz de indicar o
efeito de fatores ambientais, sejam eles naturais, antrópicos ou modificados antropicamente. A
indicação da fatores ambientais bióticos ou abióticos através de sistemas biológicos é chamada
frequentemente de Bioindicação (lat. indicare).
Bioindicadores são organismos ou comunidades, cujas funções vitais se correlacionam tão
estreitamente com determinados fatores ambientais, que podem ser empregados como indicadores
na avaliação de uma dada área (areal). Esta definição inclui conscientemente a indicação de
comportamentos naturais, como p.ex.: na agricultura, onde podemos inferir sobre características de
uma região apenas pela presença ou ausência de determinadas espécies vegetais. Bioindicadores
são definidos como organismos ou comunidades que respondem à poluição ambiental alterando
suas funções vitais ou acumulando toxinas. Os processos bioquímicos básicos são os mesmos em
muitos organismos e por isso parece ser razoável utilizar organismos como bioindicadores, que
reagem mais rapidamente do que o homem, frente a toxinas ambientais. Estes organismos podem
ser usados para detectar alterações ambientais provocadas pelas atividades humanas, as quais
podem ser perigosas para o próprio homem. A bioindicação envolve a decodificação de
informações de biossistemas com o propósito de avaliar uma dada área ou domínio. Esta definição
falha na menção do fator tempo e da possibilidade de se usar organismos testes. A compreensão
das interações e estruturas dos ecossistemas é a base da prática do uso de bioindicadores e
biomonitores.
Com frequência, o conceito Bioindicação é usado para definir reações, dependentes de uma
variável temporal, a um fator ambiental antrópico ou modificado antropicamente, manifestadas
através de respostas mensuráveis provenientes de um objeto ou sistema biológico. Essas
respostas têm que ser comparáveis em situações padronizadas.
A bioindicação não trata predominantemente da indicação da existência , do vigor ou da
intensidade de um fator ambiental, mas sim da reação de um sistema biológico. Trata-se do
reconhecimento do efeito de um fator ambiental. Influências antrópicas são, em parte, novos fatores
ambientais, ou elas provocam modificações antrópicas em fatores ambientais já existentes e com
isso modificações em parâmetros do sistema biológico. A bioindicação existe quando valores atuais
ou valores de entrada de um dado sistema se diferem de valores considerados padrões. Nisso
baseia-se a principal diferença entre o monitoramento de parâmetros físicos e químicos da
bioindicação de fatores ambientais. No monitoramento físico-químico aborda-se a qualidade e
quantidade de fatores, podendo-se eventualmente inferir-se sobre os efeitos biológicos, enquanto
que na bioindicação obtem-se informações sobre os efeitos no sistema biológico, podendo-se
eventualmente inferir sobre a qualidade e quantidade do fator estressor. Para se medir a
significância da divergência dos valores de cada fator estressor é necessária a existência de áreas
relativa ou absolutamente comparáveis. Na bioindicação, além de fatores ambientais antrópicos e
fatores internos como nível nutricional, idade, grau de tolerância (determinada geneticamente), etc,
os fatores ambientais naturais também influenciam as reações dos sistemas biológicos, que
respondem considerando a totalidade (sinergismo) do ambiente que lhe circunda.
Existem diferentes formas de bioindicação. A boindicação não específica ocorre quando a mesma
reação pode ser provocada por diferentes fatores antrópicos. A bioindicação específica ocorre
quando somente um fator ambiental provoca a reação. Se o bioindicador reage modificando seu
comportamento com um desvio significante em relação à norma, então ele é um bioindicador
sensível. Se ele, ao contrário, acumula influências antrópicas, sem contudo mostrar danos
passíveis de serem reconhecidos em um curto espaço de tempo, ele é denominado bioindicador
acumulativo. Nestes casos quando existe um acúmulo significativo no organismo e no seu
ambiente, ocorrem alterações de processos fisiológicos e biocenóticos.
Na natureza, por regra, a bioindicação se registra em cadeias de reações ou processos. Se o fator
antrópico atua diretamente sobre o sistema biológico, fala-se em bioindicação direta. Em muitas
situações a bioindicação se manifesta como resultado de alterações de condições ambientais, que
provocam respostas diferentes. Temos então a bioindicação indireta ou bioindicador indireto.
Um organismo pode apresentar em si mesmo uma cadeia de reações a um fator antrópico. A
primeira reação é chamada de bioindicação primária, as demais de bioindicação secundária.
Com frequência é desejável se reconhecer o efeito biológico de um fator antrópico em tempo hábil,
a fim de se poder tomar providências de controle. Uma indicação temporã é possível com
bioindicadores muito sensíveis, quando a reação é provocada já com doses muito baixas, em uma
escala cronológica bastante curta e em níveis de processos moleculares ou bioquímicos.
No que se refere à escala cronológica de reação, os bioindicadores se classificam em seis
diferentes tipos:
Após um determinado período, no qual ele não mostra nenhuma reação (no effect level), o
bioindicador reage com uma única forte resposta voltando a não mostrar nenhuma reação mais
(upper effect level);
Como no caso anterior, a resposta ocorre repentina e intensamente, permanecendo por algum
tempo, desaparecendo rapidamente;
O bioindicador reage desde o início do fator estressor com intensidade contínua durante muito
tempo;
Após uma forte reação imediata, esta apresenta-se cada vez mais fraca;
Reação imediata com o início do estresse, se intensificando continuamente até alcançar o máximo,
reduzindo sua intensidade progressivamente;
O comportamento 5 se repete várias vezes, até que se caracterize uma oscilação na bioindicação
(ciclos)
Um dos mais fundamentais atributos do organismo vivo, incluindo o homem, é a sua habilidade de
responder a estímulos. Estes estímulos ativam processos necessários à sobrevivência do ser vivo.
Poluentes ambientais podem se caracterizar como estímulos e provocar respostas nos organismos
vivos. Esta peculiaridade pode ser empregada como um critério ou indicação na determinação da
presença de poluentes no meio ambiente. Quando organismos são usados como bioindicadores
em propostas de monitoramento ambiental, eles funcionam como instrumentos.
O desenvolvimento na área do monitoramento biológico, especialmente na Europa, provocou o
surgimento de inúmeras designações para métodos e enfoques que se desenvolveram em conexão
com diferentes linhas de pesquisas e aplicações práticas. Os organismos são classificados, entre
outros, como indicadores acumulativos, indicadores de respostas, organismos indicadores,
organismos teste e organismos monitores, sendo que os monitores podem ser passivos e ativos.
Os organismos indicadores e o monitor passivo são ecossistemas orientados, enquanto que os
organismos teste e o monitor ativo são mais adequados para acompanhamentos em laboratório.
Organismos indicadores (Bioindicadores) são definidos como indicadores biológicos ou
comunidades de indicadores que podem fornecer informações sobre as condições de um
ecossistema, como por exemplo valor de pH ou a concentração de metais pesados no solo. Certas
espécies vegetais respondem a alterações ambientais, como o surgimento de poluentes,
desaparecendo ou se multiplicando. Em outras palavras, o tamanho e a composição de
comunidades vegetais e animais se alteram. Geralmente o monitoramento realizado
empregando-se vegetais é mais frequente do que usando-se a fauna, uma vez que os vegetais têm
requerimentos ambientais mais fáceis de serem monitorados, permanecem no mesmo lugar e são
mais numerosos. Para se identificar mudanças no ecossistema são necessárias coletas repetidas a
longo prazo. Estudos a longo-prazo permitem a compilação de inventários ambientais
compreensíveis, que podem fornecer informações sobre a extensão de influências antrópicas.
Organismos teste são usados inicialmente em testes toxicológicos de laboratório e para análise de
água. Em geral eles são altamente padronizados sendo, com frequência, usados diretamente para
detectar riscos imediatos para a população humana. Normalmente são empregados organismos
animais para este propósito. Embora nem sempre os resultados desses testes possam ser
diretamente transferidos para o ecossistema, durante os últimos anos esses testes têm recebido
atenção crescente em conecção com a avaliação de poluentes ambientais como pesticidas.
Organismos teste como algas, bactérias e animais superiores produzem informações quantificáveis.
Organismos teste também são empregados no monitoramento e controle da poluição do ar. Isto
significa que amostras de ar poluído ou poluentes são levados para o laboratório e têm sua
toxicidade testada. Testes usando agrião ou cevada são usados frequentemente. Neste teste é
acompanhada a taxa de germinação e/ou o crescimento da parte aérea e da raiz sob influência do
poluente.
Organismos monitor (Biomonitor) inclui todos os organismos vivos que são usados no
monitoramento qualitativo e quantitativo do nível de poluentes no meio ambiente e a sua
repercussão na ecologia. Organismo indicador de resposta ou acumulador pode ser melhor
distinguido nesta categoria do que no caso de organismos classificados como teste. Ambos tipos
de organismos, indicador de resposta e acumulador, podem já estar presentes no ecossistema
(monitor passivo) ou serem introduzidos (monitor ativo). Em ambos casos os danos observados
e/ou análises químicas permitem conclusões mais ou menos acuradas relacionadas à quantificação
de níveis de poluentes específicos, uma vez que metodologias apropriadas já foram estabelecidas.
A expressão Organismo Monitor tem origem anglo-americana "to monitor" que significa controlar,
vigiar, fiscalizar. A diversificação na terminologia encontrada em vários livros e apresentada aqui
sobre diferentes tipos de indicadores pode provocar uma sensação de vazio. Entretanto existe
claramente uma convergência, por um lado, entre organismos indicadores e organismos usados no
monitoramento passivo e, do outro lado, entre organismos teste e aqueles usados no
monitoramento ativo.
No monitoramento da poluição do ar, o biomonitor exerce o papel mais importante entre os
indicadores biológicos. Ele pode fornecer dados em diferentes níveis biológicos. Os caminhos
através dos quais um organismo responde à sua exposição a poluentes pode ser observada ou
medida em termos bioquímicos ou fisiológicos. Monitoramento biológico baseado em métodos
ecofisiológicos e que fazem uso de critérios celulares e de tecido também goza aplicações práticas.
Se presume que o surgimento de danos visíveis em uma planta deva ser precedido de alterações
metabólicas, a detecção prévia das alterações metabólicas seria então vantajosa. Infelizmente as
técnicas existentes para se determinar alterações metabólicas (desenvolvidas para aplicações
médicas) são, na maioria, muito caras e extremamente complicadas e não suficientemente
adaptadas para uso em vegetais.
Um número considerável de espécies vegetais são usadas no monitoramento biológico, onde
sintomas visíveis de danos a órgãos e/ou ao organismo como um todo são empregados como
critério. A maioria das plantas monitoras, rotineiramente usadas, pertence a este grupo. Um dos
motivos para isso é que elas atendem as várias demandas que são feitas a um indicador biológico:
Facilidade na manipulação e tratamento
Facilmente padronizáveis
As condições que provocam respostas são bem conhecidas
Não são caros
As respostas são facilmente avaliadas
Os efeitos da poluição são óbvios e quantificáveis
Uniformidade genética pode ser alcançada
As respostas podem ser avaliadas estatisticamente
O biomonitor não precisa necessariamente atender a todas essas condições ao mesmo tempo.
Dependendo dos objetivos, atributos diferentes podem ter mais ou menos importância, ou
requerimentos adicionais podem ser imprescindíveis
No monitoramento, procedimentos devem ser o mais padronizados possível. Infelizmente, na
prática, estes requerimentos não são completamente preenchidos levando-se em consideração o
elevado número de propostas. Entretanto, uma vez que a padronização é um pré-requisito para
procedimentos de rotina, várias propostas de padronização têm sido feitas, em particular aquelas
sugeridas pela VDI (Air Quality Control of the Association of German Engineers). A intenção desses
esforços é essencialmente produzir resultados comparáveis e incrementar a precisão reduzindo
erros marginais. Este intento é alcançado definindo-se cuidadosamente métodos em forma de
manuais de orientação. O exemplo provavelmente mais conhecido é a padronização da cultura de
gramíneas. Este é um indicador acumulativo, que tem sido usado há vários anos como monitor
ativo local e regional. Ele foi desenvolvido originalmente por Scholl (1971, 1972) e pela "State
Institute for Environmental Protection of Northe-Rhine/Westphalia". Todos os aspectos da
metodologia são descritos em detalhes, indo desde a qualidade da semente, cultivo, irrigação,
exposição, à análise de resultados. Nos últimos 20 anos, esse método tem sido empregado com
sucesso em larga variedade de condições e objetivos. Monitoramento ativo com líquens também
tem uma padronização semelhante a das gramíneas. Os princípios envolvidos foram formulados
inicialmente por Brodo (1961), mas foi Schönbeck (1968) quem introduziu esta técnica na Europa
Central e a desenvolveu no grau de sofisticação atual. Outros exemplos podem ser citados, porém
o importante é ressaltar que muitas metodologias requerem certas improvisações antes de
poderem ser aplicadas com sucesso e então padronizadas.
O maior dos pré-requisitos para o uso rotineiro de plantas como bioindicador foi a descoberta de
um sistema automático de irrigação para plantas expostas, desenvolvido por Arndt (1983), que
reduziu problemas e facilitou a manutenção dos vegetais.
Bibliografia Consultada
ARNDT, U; Nobel, W; Schweizer, B (1987): Bioindikatoren: Möglichkeiten, Grenzen und neue
Erkenntnisse, Ulmer.
MARKERT, B (1993): Plants as Biomonitors: indicators for heavy metals in the terrestrial
environment. VHC
SCHUBERT, R (1991): Bioindikation in terrestrischen Ökosystemen. Fischer Verlag
Download