-1- UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Fundada em 18 de fevereiro de 1808 Monografia Análise do Atendimento de Pacientes Politraumatizados no Hospital do Subúrbio Pedro Humberto Félix de Sousa Filho Salvador (Bahia) Agosto, 2016 -2- -3- UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Fundada em 18 de Fevereiro de 1808 MONOGRAFIA Análise do Atendimento de Pacientes Politraumatizados no Hospital do Subúrbio. Pedro Humberto Félix de Sousa Filho Professor Orientador: André Gusmão Cunha Professor Coorientador: Ana Célia Romeo Monografia de Conclusão do Componente Curricular MEDB45/2015.2, como pré-requisito obrigatório e parcial para conclusão do curso médico da Faculdade de Medicina da Bahia da Universidade Federal da Bahia, apresentada ao Colegiado do Curso de Graduação em Medicina. Salvador, Bahia 2016 -4- -5- “Faça o que puder, com o que tiver, onde estiver.” Theodore Roosevelt. -6- Ao meu pai, Pedro Humberto Félix de Sousa, meus avós Agostinho e Maria Angélica Félix de Sousa, à Família LAEME e ao Mestre Gusmão -7- EQUIPE Pedro Humberto Félix de Sousa Filho, Faculdade de Medicina da Bahia/UFBA. Correio-e: [email protected] André Gusmão Cunha, Faculdade de Medicina da Bahia/UFBA Ana Celia Romeo, Faculdade de Medicina da Bahia/UFBA INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA Faculdade de Medicina da Bahia (FMB) Hospital do Subúrbio Hospital do Subúrbio Departamento de Ensino e Pesquisa BANCA REVISORA Paulo Novis Rocha, Professor associado do Departamento de Medicina Interna e Apoio Diagnóstico, Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia. André Rodrigues Durães, Professor assistente do Departamento de Saúde da Família, Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia. Paulo André Jesuino dos Santos, Professor assistente do Departamento de Anestesia e Cirurgia , Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia. FONTES DE FINANCIAMENTO FONTES DE FINANCIAMENTO 1. Recursos próprios. -8- AGRADECIMENTOS Ao meu pai, por ser meu porto seguro nas diversas situações por mim enfrentadas. Ao meu professor orientador, Dr. André Gusmão Cunha, pela presença constante, substantivas orientações acadêmicas e por servir de fonte de inspiração para a minha vida profissional de futuro médico. À minha professora coorientadora, Dra Ana Célia Romeo, pela constante disponibilidade. A Dr. Oddone Braghioli e a Dr. Guilherme Magnavita, pela intensa disposição em ajudar. Aos acadêmicos Victor Nóbrega e Nathalia Souza por estarem comigo nos momentos chave. À Família LAEME, por me ensinar a sair da minha zona de conforto, e me mostrar que o máximo é o mínimo que eu posso fazer para alcançar meus objetivos. -9- SUMÁRIO 1. RESUMO .......................................................................................................................12 2.. OBJETIVOS ................................................................................................................... 14 2.2 Objetivo geral .................................................................................................. 14 2.2 Objetivos específicos ....................................................................................... 14 3. FUNDAMENTAÇÃO TEORICA ................................................................................. 15 4. METODOLOGIA........................................................................................................... 23 5. RESULTADOS..............................................................................................................25 6. DISCUSSÃO...................................................................................................................35 7. CONCLUSÃO ................................................................................................................ 41 8. REFERÊNCIAS .............................................................................................................42 9. ANEXO 1........................................................................................................................45 - 10 - ÍNDICE DE QUADROS E TABELAS TABELAS TABELA I. Perfil demográfico pacientes atendidos pela linha do cuidado ao politrauma no Hospital do Subúrbio. TABELA II. Teste de Mann Whitney demonstrando a relação entre RTS e mecanismo de Trauma GRÁFICOS GRÁFICO I. Relação entre Gênero e idade dos pacientes atendidos no Hospital do Subúrbio GRÁFICO II. Mecanismo de Trauma x frequência dos pacientes atendidos pela linha de trauma do Hospital do Subúrbio. GRÁFICO III. Distribuição dos pacientes vítimas de trauma contuso atendidos pela linha do atendimento ao politraumatizado do Hospital do Subúrbio. GRÁFICO IV. Distribuição dos pacientes acometidos por trauma penetrante atendidos pela linha do cuidado do politrauma do Hospital do Subúrbio. GRÁFICO V. Distribuição Idade x mecanismo de trauma de pacientes politraumatizados atendidos no Hospital do Subúrbio GRÁFICO VI. Comparação do mecanismo de trauma em relação ao gênero dos pacientes atendidos no Hospital do Subúrbio GRÁFICO VII. Comparação do RTS em relação ao Mecanismo de trauma GRÁFICO VIII. RTS x média de permanência hospitalar GRÁFICO IX. Correlação entre RTS x sobrevida e óbitos dos pacientes atendidos pela linha do cuidado ao politrauma do Hospital do Subúrbio. GRÁFICO X. Dispersão entre RTS e Tempo de internamento (logtransformado, base 10). 25 34 26 27 27 28 29 29 30 31 32 33 11 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS RTS – Revised Trauma Score ATLS – Advanced Trauma Life Suport ISS – Injury Severity Score ECG – Escala de Coma de Glasgow PAS – Pressão Arterial Sistólica FR – Frequencia respiratória AIS – abbreviated Injury Scale TRISS - Trauma and Injury Severity Score REA – Sala de Reabilitação PA – Pronto Atendimento HMG – Hemograma TP – Tempo de Protombina TTPa – Tempo Parcial de tromboplastina TCE – Trauma Crânio Encefálico UTI – Unidade de Terapia Intensiva TC – Tomografia de Crânio 12 1 RESUMO Introdução: O trauma é uma doença que acompanha o homem durante toda sua evolução e causa inúmeras perdas perante a sociedade. Mesmo com os altos índices, existem poucos sistemas de trauma organizados com centros de diferentes níveis para oferecer o suporte adequado ao doente politraumatizado. Nessa perspectiva, foi desenvolvida a linha do cuidado ao politrauma no Hospital do Subúrbio (Salvador-BA), a qual visa protocolar ainda mais o atendimento ao trauma e facilitar a comunicação entre os agentes do atendimento ao politraumatizado. Objetivo: descrever o perfil epidemiológico do politraumatizado atendido no Hospital do Subúrbio. Aplicar o índice de trauma revised trauma score correlacionando-o com os desfechos dos pacientes. Metodologia: corte transversal, onde serão coletados dados em prontuário digitalizado da ficha de trauma sobre o atendimento, e desfechos do paciente. Resultados: 818 pacientes coletados ao total onde 77,41% são do sexo masculino e 22,59% do sexo feminino. O trauma contuso foi o predominante (78,2%) e a maioria dos pacientes apresentavam um RTS de entrada dentro do padrão da normalidade (79,6%). Conclusão: Registros de trauma são importantes para a melhoria do atendimento em trauma. O trauma é uma doença que acomete indivíduos adultos jovens do sexo masculino. O score RTS pode ser utilizado no Hospital do Subúrbio. 13 Abstract Introduction and Objectives. To analyze the epidemiologic profile, patient data and outcomes of a newly established trauma registry in a Trauma Center in Salvador (northeastern of Brazil). Materials and Methods. A new trauma record was created in the computerized medical records. Patient data was recorded at arrival, and included cinematics, RTS, ABCDE evaluation and management. Patient hospital outcome included surgical management, hospital stay and survival. Hospital staff was trained for initial major trauma care following ATLS recommendations, and how to record data at a simple form. Those data were imported straight to a Business Intelligence platform, avoiding rework, and analyzed. Results. From July through December 2015, we admitted 818 trauma patients, predominantly young (71.1% up to 40 years-old) and male (78.7%). Blunt trauma was the predominant mechanism (78.2%) and the majority of patients had a normal RTS at admission (79.6%). Global hospitalization rate was 50.1% (average of 10.26 days). Global survival rate was 92.9%; with no survivors for RTS lower than 3, and increasing survival rates up to 99.2% for normal RTS. Penetrated trauma patients were younger (29.3yrs vs. 37.7yrs), mostly male (93.1%), had a worse RTS (7.04 vs. 7.54, p < 0.05), with greater mortality (18.9% vs. 3.9%), and lower hospital stay (7.3 days vs. 11.7 days) compared to blunt trauma patients. Major surgical management occurred mostly in blunt trauma victms (63.5%), with higher RTS (5.72 vs. 3.81) and greater hospital stay (12.6 vs. 3.71) and similar mortality (8.2% vs. 6.3%). Conclusions. Trauma registry is an important tool to understand and manage trauma care for a newly established trauma hospital. Young male victims of penetrating trauma have a great impact on severity, hospital stay and mortality at our hospital. 14 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo geral Analisar os resultados da linha do cuidado ao paciente politraumatizado no Hospital do Subúrbio. 2.2 Objetivos específicos Descrever o perfil epidemiológico do paciente politraumatizado atendido no Hospital do Subúrbio. Correlacionar o índice de gravidade Revised Trauma Score (RTS) com os desfechos dos pacientes politraumatizados atendidos no Hospital do Subúrbio. Avaliar o prognóstico estratificado por tipo de trauma (penetrante x contuso). 15 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 3.1 Panorama sobre o atendimento do trauma O histórico de trauma é tão antigo quanto a história do homem (1). Apesar de não ser considerada uma causa de morte natural, talvez seja a mais natural delas, haja vista que é e sempre foi uma forma comum de óbito durante toda a humanidade e em todas as civilizações. Desde o nomadismo, quando existia uma luta diária pela sobrevivência até o desenvolvimento do Advanced Trauma Life Suport ATLS em 1980, houve inúmeros avanços no cuidado ao politraumatizado (2). As guerras sempre foram o maior “campo de pesquisa” em trauma e, a partir de suas estratégias foram surgindo várias formas de organizar o atendimento ao politraumatizado; foi sendo desenvolvido o conceito de sistematização por prioridades, foco no paciente crítico, tempo limitado de atuação e transporte adequado para o tratamento definitivo (2)(3). Atualmente, a mortalidade decorrente do trauma continua a ser a principal causa de morte em indivíduos jovens, nos países mais desenvolvidos (4). Este indicador tende a crescer nos próximos anos. Estima-se que em 2020 haverá uma elevação de 80% nas mortes, ocasionadas por acidentes automobilísticos, nos países pobres e em desenvolvimento (4). Segundo o Datasus no Brasil houve 156942 mortes por causas externas em 2014 configurando-se como a terceira causa de óbitos no País e a primeira na faixa etária entre 5 e 39 anos. Devido à acometer principalmente indivíduos jovens, é a doença que mais consome anos de vida útil. Diante deste panorama, cada etapa do atendimento (seja préhospitalar ou intra-hospitalar), torna-se fundamental, para um melhor prognóstico do indivíduo politraumatizado (5). No âmbito hospitalar, a qualidade do atendimento depende de uma abordagem que atenda às necessidades individualizadas de cada tipo trauma, em relação a recursos humanos, diagnósticos e terapêuticos (5). Alia-se a isso, a variabilidade do trauma, que pode ir desde feridas superficiais, sem iminente risco de vida, até lesões que causam a morte imediata (5). Assim, o ponto decisivo para a eficácia no atendimento, é o conhecimento da gravidade do trauma, relevante na orientação não só da conduta, mas do nível hospitalar exigido (5). O conhecimento da lesão, dos mecanimos de trauma e a suas medidas de ressuscitação é, sem dúvida nenhuma, parte essencial no tratamento do indivíduo politraumatizado (6). Para isso, os avanços em diagnósticos por imagem e técnicas cirúrgicas tem melhorado bastante o prognóstico desses pacientes. No entanto, é necessário que antes dessa fase 16 haja um atendimento organizado, sistematizado, rápido e efetivo que, se tratando de trauma, se torna tão – ou até mais – importante que o diagnóstico exato da lesão (7). Algumas situações podem levar um paciente vítima de trauma a deteriorar-se de forma extremamente rápida, sendo que o tempo de latência entre a lesão e o tratamento deve ser, idealmente, não mais do que 60 minutos, tempo após o qual a taxa de sobrevivência de doentes traumáticos é suposto a cair drasticamente. Este conceito foi implementado por Adams Cowley após a primeira guerra mundial, o chamado “Golden Hour”, que diz que a maior quantidade evitável de mortes por trauma acontecem durante a primeira hora (6) (7). Dessa forma, criaram-se os denominados sistemas de trauma que são redes superestruturadas e especializadas no atendimento ao paciente politraumatizado (8). Nestas temos vários centros de tratamento (Centros de Trauma) e compreendem os diversos níveis de complexidade em saúde para o melhor acolhimento do doente. Segundo a portaria 1366 de 8 de julho de 2013 os centros de trauma são estabelecimentos hospitalares integrantes da Rede de Urgências e Emergências que desempenham o papel de referência especializada para atendimento aos pacientes vítimas de trauma cujos objetivos são: 1- A melhoria do atendimento aos pacientes vítimas de trauma com consequente redução da morbidade e mortalidade; 2- Universalização e padronização de um modelo de atendimento ao paciente vítima de trauma em todas as suas etapas. Os centros de trauma são divididos de acordo com o dimensionamento da Rede de Urgência e Emergência e a localização dos pontos de atenção ao trauma, considerandose ainda o número de habitantes com cobertura assistencial e o tempo de deslocamento até o respectivo Centro de Trauma. A portaria que regulamenta o nível de complexidade do Centro de Trauma é a 2395 de 2011, que os subdivide em 3 níveis de complexidade e caracteriza exatamente a quantidade de habitantes que cada um deve abranger, as especialidades de profissionais que devem compor a equipe, a estrutura tecnológica, etc. Nos Centros de Trauma temos equipes multiprofissionais que são constantemente treinadas para lidar com os diversos acometimentos traumáticos ameaçadores à vida (8). Aliado a isso, guiam-se por protocolos uniformizados de atendimento (desde protocolos generalistas, como o ATLS, até protocolos internos de cada hospital) que visam oferecer o melhor tratamento para o doente, que no caso de trauma, seria o acolhimento rápido, 17 eficaz, com identificação de situações ameaçadoras à vida naquele momento e ressuscitação imediata. 3.2 Registros em Trauma “Nunca se sabe o que vai aparecer por aquela porta”. Esta famosa frase, marca registrada do History Channel Trato Feito, traz a ideia de imprevisibilidade, remete ao fato que um atendimento emergencial tem um caráter de surpresa, o médico realmente não sabe o que entrará por aquela porta e no trauma a imprevisibilidade é tamanha, que um capotamento de veículo pode apresentar-se com um indivíduo com algumas escoriações enquanto uma queda de bicicleta pode levar a lesões potencialmente letais e o indivíduo se deteriorar em poucos minutos. Para diminuir essa imprevisibilidade, foram criados Registros em Trauma que são bancos de dados que contemplam características específicas da doença. Neles são registrados dados epidemiológicos, demográficos, mecanismos de trauma, parâmetros vitais, período de internação, procedimentos realizados, etc. Dessa forma, os Registros em Trauma são importantes para o estudo da doença, pois compilam dados referentes ao atendimento e diagnósticos, que se tornam de vital importância para caracterizar melhor os perfis de trauma de cada região (9)(10). Esses dados são importantes para elaborar medidas de prevenção de trauma, conhecer as lesões mais prevalentes em cada mecanismo de trauma, o prognóstico de cada indivíduo, diminuindo, assim, a imprevisibilidade inerente ao trauma (9). Um bom atendimento ao politraumatizado depende muito da preparação antecipada da equipe e da unidade, sendo assim, conhecer o perfil do trauma permite uma melhor preparação da unidade com treinamentos específicos para os funcionários ou com a disponibilidade de recursos para a ressuscitação. Na análise dos dados do trauma são utilizadas escalas numéricas que auxiliam a objetivar e classificar o trauma para simplificar sua interpretação. Os sistemas de pontuação utilizados, para quantificar a gravidade do trauma, são os índices de gravidade do trauma (11). Estes avaliam as alterações fisiológicas, lesões anatômicas e a probabilidade de sobrevida dos politraumatizados, através de cálculos estatísticos (11). Têm diversas aplicações potenciais, como, por exemplo, a capacidade de prever o desfecho no trauma, mortalidade, a lesão mais relevante; qualificação do atendimento; estudo epidemiológico do trauma (11). Dentre tais sistemas de pontuação, destacamos o Revised trauma score (RTS) que consiste em uma relação matemática entre a pressão arterial sistólica, frequência respiratória e a escala de coma de Glasgow (12). 18 O RTS é calculado de acordo com a seguinte fórmula: RTS = 0.9368 x ECG + 0.7326 x PAS + 0.2908 x FR Este Sistema de pontuação tem uma alta relação com prognóstico do paciente. Pacientes com maiores valores de RTS estão relacionados com melhores desfechos e pacientes que possuem menores valores estão relacionados com desfechos mais reservados (12). Outro sistema de pontuação largamente utilizado é o Injury Severity Score (ISS) que fornece uma pontuação global para pacientes com múltiplas lesões (12). Para cada lesão é atribuído um Abbreviated Injury Scale (AIS) que condiz com cada uma das seis regiões do corpo (cabeça, face, tórax, abdômen, extremidades e lesões externas). Apenas a maior pontuação de AIS é utilizada por cada região corporal. As 3 regiões do corpo mais gravemente feridas têm sua pontuação ao elevada ao quadrado e somadas para produzir a pontuação do ISS (12). Outro exemplo de sistema de pontuação é a escala Trauma and Injury Severity Score (TRISS), que determina a chance de sobrevivência do indivíduo correlacionando o ISS (padrão anatômico) com o RTS (padrão fisiológico) (12). 3.3 Funcionamento da Linha do Cuidado ao Politraumatizado do Hospital do Subúrbio Esta Linha do Cuidado consiste em um protocolo elaborado pelo Hospital do Subúrbio que visa sistematizar o atendimento ao politraumatizado, facilitando tanto a comunicação dos membros da equipe de atendimento, como entre os diversos setores de atendimento. Dessa forma, o paciente segue uma trajetória rápida e eficiente por entre os setores do hospital com o atendimento baseado em processos, em que um produto de cada processo de atendimento será o substrato do próximo, e o melhor desfecho só acontece se houver um acolhimento rápido, eficaz e com a menor falha de comunicação. O funcionamento da linha do cuidado é explicado pelos fluxogramas a seguir: 19 20 21 4 3. Justificativa do trabalho O trauma é uma doença extremamente prevalente na nossa população, contudo seu estudo é bastante limitado em nosso meio. Este trabalho vem, portanto, tentar desenhar o perfil do doente acometido pelo trauma, abordando gênero, etnia, faixa etária, mecanismo de 22 trauma e gravidade. Dados que não são fáceis de se encontrar na literatura e que podem ser uteis não só para estudar a doença em si, mas podem traçar um panorama para diretores de hospitais e gestores públicos em medidas de tratamento e prevenção do trauma. Ademais o trauma não só atinge uma grande parcela da população, ele atinge uma população jovem, economicamente ativa, trazendo prejuízos ainda maiores para o País. 23 4 METODOLOGIA 4.1 Desenho do Estudo Série de casos, “outcome´s study”, no qual foi analisado o perfil epidemiológico e os desfechos dos pacientes politraumatizados atendidos no Hospital do Subúrbio. 4.2 Local e População estudada Pacientes admitidos na Linha do Cuidado do Politrauma do Hospital do Subúrbio em Salvador, Bahia. 4.3 Critérios de Inclusão e Exclusão Os critérios de inclusão do estudo coincidem com os critérios de inclusão na Linha do Cuidado do Politrauma onde são incluídos pacientes vítimas de politrauma admitido Sala de Reanimação (REA) da Emergência Adulto do Hospital do Subúrbio. Os critérios de exclusão são 1 – Pacientes que, durante a avaliação, sejam identificados como vítimas de trauma de baixa energia que são encaminhados para a sala de sutura ou a sala de gesso. 2 – Idosos nos quais sejam identificados fraturas patológicas, associadas com suas comorbidades. 3 – Ficha de Politrauma incompleta. 4.4 Seleção da amostra Pacientes incluídos na Linha de Cuidado ao Politraumatizado, com Ficha de Politrauma preenchida, no período de 01 de julho de 2015 até dia 31 de dezembro de 2015. 4.5 Caracterização das variáveis As variáveis analisadas foram: Continuas: Idade, RTS e media de permanência hospitalar. Categóricas: Sexo, mecanismo de trauma e óbitos 4.6 Operacionalização da coleta de dados Serão coletados dados do prontuário informatizado oriundos da Ficha de Politrauma e armazenados no sistema de banco de dados do Hospital do Subúrbio. 4.7 Instrumento da coleta de dados Para os registros das ações, foi elaborada uma Ficha de Atendimento em Trauma no Sistema de Prontuário Eletrônico (Sistema Oracle) do Hospital do Subúrbio. Esta ficha contém um espaço para o Mecanismo do Trauma e as avaliações voltadas para o 24 ABCDE conforme preconizado pelo ATLS. Nesta possuem bem claramente os achados do exame físico e as condutas realizadas pelo cirurgião em cada etapa, que são inseridos de forma categórica (sim ou não), com espaços para especificações adicionais ao caso. Na ficha também existe o espaço para o RTS de entrada, cujos parâmetros são aferidos pela equipe na admissão do doente, e inseridos na ficha, que faz o cálculo automático do valor final, entre 0 e 7,84. Esses dados alimentam o software Qlikview ©, que os estratifica e organiza instantaneamente, fornecendo uma visão gerencial do processo. 4.8 Analise estatística Os dados foram analisados com o auxílio do software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), versão 17.0 (Chicago, EUA). Dados epidemiológicos como gênero, idade e procedência foram analisados quanto a medidas centrais – média e medianas – bem como para medidas de dispersão. A verificação se as variáveis RTS média de permanência hospitalar tem uma distribuição normal foi feita a partir do teste de Wilk Shapiro. Para determinar a associação entre as variáveis RTS e a média de permanência hospitalar utilizou-se a correlação não paramétrica de Spearman. Para determinar a diferença entre RTS e o mecanismo de trauma utilizou-se o teste U de Mann Whitney. Para avaliar os desfechos, em relação a ida para UTI e óbitos, utilizou-se a regressão logística. 4.9 Aspectos éticos Este estudo é derivado de um trabalho mais amplo denominado “Determinação do Perfil Imunológico Inicial Relacionado à Coagulopatia Associada ao Trauma em Pacientes Graves”. O projeto fora aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA sob o número 772.649, no dia 01/09/2014 (ANEXO). O estudo respeitará as diretrizes e critérios estabelecidos na Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), mesmo sendo descritivo, os preceitos éticos estabelecidos no que se refere à zelar pela legitimidade das informações, privacidade e sigilo das informações, quando necessárias, tornando os resultados desta pesquisa públicos, serão considerados em todo o processo de construção do trabalho. 25 5. RESULTADOS 5.1 Análise do perfil epidemiológico dos pacientes atendidos pela Linha do Cuidado ao Politrauma no Hospital do Subúrbio No período de 01 de julho a 31 de dezembro de 2015, 831 pacientes politraumatizados foram incluídos na Linha de Cuidado ao Politrauma, porém 13 pacientes não apresentavam dados completos da Ficha de Politrauma e foram excluídos, totalizando 818 pacientes analisados neste estudo. Os dados de gênero e idade estão demonstrados na tabela 1 . Tabela 1. Perfil demográfico pacientes atendidos pela linha do cuidado ao politrauma no Hospital do Subúrbio Variável Frequência (%) n = 818 SEXO Masculino 634 (77,51) Feminino 184 (22,49) IDADE 15 < x < 20 86 (10,5) 21 ≤ x < 30 260 (32,3) 31 ≤ x < 40 230 (28,4) 41 ≤ x < 50 107 (13,2) 51 ≤ x <60 68 (7,2) 61 ≤ x < 70 40 (5) X > 70 27 (3,4) 26 Gráfico 1. Relação entre Gênero e idade dos pacientes atendidos no Hospital do Subúrbio Após distribuir os gêneros nas faixas etárias, observa-se que a incidência de trauma no sexo masculino é predominante em todas as idades, com menor diferença na faixa etária superior a 70 anos, como demonstrado no gráfico 1. Em relação ao mecanismo do trauma observa-se que 78,24% (639) foram traumas contusos (eventos que compreendem acidentes automobilísticos, motociclísticos, quedas, agressão, etc), 21,39% (175) foram penetrantes (eventos que compreendem perfurações por arma branca ou arma de fogo) e 0,37% (3) não se enquadraram em nenhuma das classificações. 27 Outros 3 (0,37%) Penetrante 175 (21,39%) Contuso 639 (78,24%) Gráfico 2. Mecanismo de Trauma x frequência dos pacientes atendidos pela linha de trauma do Hospital do Subúrbio. Entre os pacientes vítimas de trauma classificado como contuso, 256 foram acidentes motociclísticos, 142 foram quedas de altura, 83 atropelamentos, 67 acidentes automobilístico, 44 agressões, 19 quedas da própria altura e 35 não tiveram interpretação na ficha, como pode ser visto no gráfico 2. Mecanismo de Trauma x Frequência 120,00% 100,00% Fruquência 100,00% 80,00% 60,00% 40,00% 39,55% 21,93% 20,00% 10,34% 2,93% 6,94% 12,92% 5,39% 0,00% Mecanismo de Trauma Gráfico 3. Distribuição dos pacientes vítimas de trauma contuso atendidos pela linha do atendimento ao politraumatizado do Hospital do Subúrbio. 28 Já dentre os pacientes que foram classificados como penetrantes têm-se que 126 (68%) foram acometidos por arma de fogo, 59 (32%) por arma branca, como pode ser visto no gráfico 3. Mecanismo de Trauma x Frequência 32% 68% PAF FAB Gráfico 4. Distribuição dos pacientes acometidos por trauma penetrante atendidos pela linha do cuidado do politrauma do Hospital do Subúrbio. A distribuição dos dados referentes ao mecanismo de trauma de acordo com a idade, mostra que a média de idade dos pacientes vítimas de trauma penetrante em relação aos pacientes vítimas de trauma contuso foi menor (29,34 anos vs. 37,34 anos), conforme demonstrado no gráfico 4. 29 Gráfico 5. Distribuição Idade x mecanismo de trauma de pacientes politraumatizados atendidos no Hospital do Subúrbio Em relação ao mecanismo de trauma comparado com o gênero tem-se que o sexo feminino está relacionado a 163 (25,46 %) dos atendimentos por trauma contuso e 6,85% dos traumas penetrantes (vide gráfico 6). Gráfico 6. Comparação do mecanismo de trauma em relação ao gênero dos pacientes atendidos no Hospital do Subúrbio 30 5.2 Análise do RTS e correlação com o perfil epidemiológico A média geral do escore de gravidade RTS foi de 7,43, sendo mais grave em pacientes com trauma penetrante quando comparado aos pacientes com trauma contuso (7,22 vs. 7,54, p<0,05) (vide gráfico 6). Gráfico 7. Comparação do RTS em relação ao Mecanismo de trauma Analisando o valor do RTS de entrada em relação à média de permanência hospitalar, tem-se que indivíduos com um RTS situado entre 5 e 7,55 apresentam um maior tempo de permanência, como pode ser visto no gráfico 8. 31 Gráfico 8. RTS x média de permanência hospitalar 5.3 Análise do RTS com os desfechos Dos 818 pacientes vítimas de trauma analisados, 50,1% foram internados, 11,4% admitidos em UTI e 7,1% foram a óbito. Há uma relação inversa entre o RTS e a probabilidade de sobrevida (gráfico 9), através da correlação de Spearman com um coeficiente de correlação de -0,264. 32 Gráfico 9. Correlação entre RTS x sobrevida e óbitos dos pacientes atendidos pela linha do cuidado ao politrauma do Hospital do Subúrbio. Observou-se que pacientes que possuem RTS mais baixo, possuem uma baixa média de permanência hospitalar, e que essa média aumenta progressivamente atingindo um pico entre valores de 5 e 7 e novamente há uma queda como pode ser visto no gráfico 10. 33 Gráfico 10. Dispersão entre RTS e Tempo de internamento (log-transformado, base 10). Uma regressão logística univariada mostrou uma relação do RTS com a mortalidade (OR 0.283, IC 95% 0.225 – 0.356). Mostrou, também, uma relação entre o RTS e o internamento em UTI (OR 0.58, IC 95% 0.509 – 0.679). Vale a pena notar que o RTS foi clinicamente mais significante como preditor de óbito do que de internamento em UTI. Por último, existe relação entre o mecanismo de trauma (contuso ou penetrante) e o RTS. Apesar de apresentarem as mesmas medianas, nota-se diferença estatística ao comparar o trauma contuso com penetrante (tabela 3). 34 Percentis Mecanismo N Mediana 90 75 25 10 Contuso 639 7,8408 7,8408 7,8408 7,8408 6,904 Penetrante 175 7,8408 7,8408 7,8408 7,1082 4,0936 Tabela 2. Relação entre RTS e mecanismo de Trauma. 35 6. DISCUSSÃO 6.1 Implantação do Registro de Trauma Um registro é um conjunto homogêneo de informações gerado de forma sistemática e abrangente para servir a um propósito predeterminado (13)(14). Em serviços de saúde, registros têm sido utilizados para servir um número de finalidades, incluindo a melhoria da qualidade do serviço, epidemiologia local, pesquisa clínica e desenvolvimento de políticas públicas (15)(14). A partir destes bancos de dados, com variáveis objetivas a respeito da doença, podemos traçar o perfil epidemiológico local que, por sua vez, tornase ferramenta fundamental para a compreensão da morbidade em estudo e as possíveis estratégias para lidar com a mesma. No trauma não é diferente. É imprescindível que a pessoa que vai lidar frente a frente com o trauma saiba o que vai entrar pela porta da emergência, saiba quais os mecanismos de trauma mais comuns, os tipos de lesões mais frequentes, quais são mais graves. O registro tentar tirar um pouco da imprevisibilidade intrínseca ao trauma. Sendo assim, o gestor do hospital pode ter uma noção maior dos recursos (materiais e humanos) necessários para lidar com cada situação como número de integrantes de uma equipe, salas cirúrgicas que devem estar disponíveis em determinado ponto do dia ou semana, material necessário para um atendimento completo e eficaz, entre outros. Com o registro, o gestor do hospital ganha dados concretos, diminuindo a chance de sub ou superestimar algum fator. O registro não só auxilia no momento do atendimento, mas também pode ser utilizado como ferramenta para criar medidas de prevenção dos principais acidentes, servindo até para o embasamento para políticas públicas. Os registros em trauma são uma realidade nos países desenvolvidos desde os anos 60, quando foi criado o primeiro registro de trauma computadorizado do mundo, no hospital Cook County em Chicago. Ao longo dos anos, foi notório os benefícios de se ter registros em trauma, ao passo que hoje existe o National Trauma Data Bank, um relatório anual envolvendo todas as unidades especializadas em trauma dos EUA e do Canadá, trazendo números anuais para a doença. É também, uma realidade em países como o Reino Unido, países da Comunidade Europeia, Japão, enfim, países desenvolvidos tiveram uma maior facilidade em criar estes bancos de dados para o atendimento em trauma. Isso já não acontece dos países em desenvolvimento. Em uma revisão do ano de 2012, O’Reilly et al. identificaram os trabalhos publicados durante dois anos a respeito de registros em trauma e não foi verificado nenhum trabalho da América do Sul e apenas 18% dos 36 trabalhos não eram de países desenvolvidos (16), mesmo sendo eles os mais acometidos pelo trauma. Recentemente foram publicados dois registros de trauma no Brasil. A Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, com 1344 pacientes, dos quais apenas 292 pacientes com registros completos. As causas dos registros incompletos de pacientes aconteceram, principalmente, devido a um retrabalho no momento de inserir os dados e outras inúmeras dificuldades inerentes ao serviço (17). O Hospital João XXIII, Belo Horizonte - Minas Gerais, onde foi realizado o registro de 1000 pacientes vítimas de politraumatizados. Apesar deste último apresentar um número elevado de pacientes no RT, nota-se algumas limitações, como por exemplo apenas 31% dos pacientes tiveram o índice de trauma (RTS) calculado na entrada (18). Mesmo com suas limitações, estes trabalhos tornaramse marcos para que todos os serviços de trauma se organizem para realizar seus registros. Dentre as principais dificuldades inferidas por O’Reilly et al. como barreiras para a implementação de RT em países em desenvolvimento destaca-se a falta de recursos financeiros, a falta de profissionais capacitados, além de critérios de coleta bem estabelecidos e validados. No Hospital do Subúrbio foi criado em julho de 2015 uma Linha de Cuidado do Paciente Politraumatizado (conhecida como Linha de Cuidado do Trauma), com um registro que pudesse descrever a epidemiologia do paciente politraumatizado atendido no hospital, evitando o retrabalho e garantindo o cálculo do índice de trauma (RTS) na entrada. Foi criada uma ficha informatizada de trauma baseada no ABCDE do ATLS , que o cirurgião geral deve preencher no momento do atendimento. A ficha contém todos os dados importantes para o registro, como o mecanismo do trauma, as avaliações iniciais de cada etapa do ABCDE do ATLS, com suas condutas iniciais, os parâmetros do RTS (escala de coma de Glasgow, frequência respiratória e pressão arterial sistólica), que é calculado automaticamente, além da frequência cardíaca. Todos esses dados alimentam o software Qlikview ©, qual usa da técnica business intelligence construindo uma estrutura multidimensional que fornece uma visão gerencial das variáveis, e assim, tem-se de forma rápida o armazenamento e organização de todos os dados referentes ao atendimento ao trauma. Estas medidas visavam evitar a perda de pacientes com registros completos, apesar de uma aderência incompleta ao preenchimento da ficha de trauma na fase inicial de implantação da Linha de Cuidado do Trauma, ter gerado perdas que não puderam ser estimadas. A promoção de reuniões cientificas e programa de educação continuada, com 37 a explicação da importância do preenchimento completo dos dados, foram fundamentais para melhorar a aderência e diminuir as perdas de dados. Mesmo com estas limitações, conseguiu-se um número significante de fichas completas, se comparado aos 292 do registro da Santa Casa de São Paulo, com aproximadamente 80% de perdas ou com os 31% de fichas completas do RT do Hospital João XXIII. 6.2 Perfil Epidemiológico dos pacientes atendidos no Hospital do Subúrbio No nosso estudo foi encontrado que entre os 818 pacientes atendidos, 77,51% eram do sexo masculino e que 71,2% encontram na faixa etária entre 15 e 40 anos. Comparando com outros registros tem-se que no Hospital João XXIII eles obtiveram um maior número de pacientes do sexo masculino, chegando a 84% dos casos sendo 68,3% da faixa etária entre 13 e 39 anos. Em um estudo realizado em Hospital referência em Trauma em Curitiba obteve-se 78% da amostra referente ao sexo masculino e 65,16% estavam compreendidos na faixa etária entre 15 e 44 anos (20). O NTDB traz o pico acometimento em trauma na faixa etária entre 20 e 25 anos (22). Vê-se então que o trauma continua sendo uma doença do homem jovem, o que traz inúmeros prejuízos à sociedade, visto que esses jovens se encontram na faixa etária da população economicamente ativa. Quando relacionado o gênero com a idade observa-se que o trauma é mais prevalente no sexo masculino em quase todas as faixas etárias, porém no grupo maior que 70 anos de idade os números se equiparam. Essa tendência também é observada na curva do NTDB e no estudo realizado em Curitiba, onde exatamente nessa idade há equivalência dos casos e, após 70 anos há uma inversão da curva, sendo o sexo feminino o mais acometido a partir de então (20)(22). Essa tendência está relacionada a redução de fatores desencadeantes do trauma, como redução da quantidade de tempo no transito, ou viagens longas, maior prudência nesta idade e menor exposição a situações de violência. Como mulheres apresentam maior longevidade que homens, ocorre uma inversão da curva por acabarem mais expostas a eventos como queda da própria altura. Em relação ao mecanismo do trauma observa-se que no HS 78,24% foram traumas contusos 21,39% foram penetrantes. Estes números já tiveram uma divergência quanto ao HJXXIII aonde houve 52,9% de incidentes contusos e 46,7% de incidentes penetrantes; já na Santa Casa de São Paulo tem-se que o número de lesões contusas chegou a 87% dos casos. O NTDB traz um dado de apenas 8,26% dos casos como sendo de trauma penetrante (22). Um registro realizado na Catalunha traz uma cifra de 5,4% correspondente a agressões, porém não especifica quais destas foram por mecanismo de trauma penetrante. Nota-se a disparidade entre a américa do Norte e a Catalunha em 38 relação aos números dos Hospitais JXXII e Subúrbio, onde podemos inferir que a grande disparidade social, geradora de toda esta violência é responsável por estes números. É uma feliz surpresa que na Santa Casa de São Paulo os números se assemelham aos números do NTDB (22). Acidentes motociclísticos se enquadram como a principal causa de eventos no HS. Este foi o dado mais divergente entres o RT que temos acesso, já que na Santa Casa de São Paulo e no NTDB a queda foi o principal motivo de acionamento; já no HJXXIII foram as agressões (47,5%) (22). Na Catalunha e em Curitiba encontramos que a principal causa foram acidentes de transito (não há distinção entre os diversos tipos de acidentes). Novamente encontramos convergência entre números da Santa Casa e o NTDB. No Hospital do Subúrbio esse dado reflete a imprudência de motociclistas, muitas vezes alcoolizados conduzindo o veículo. A incidência de homens jovens talvez seja influenciada pelo comportamento sociocultural. Por serem mais agressivos, impulsivos, imaturos no trânsito associado à pouca experiência para dirigir e a busca de sensações intensas, a motivação e influência do grupo de amigos (20), os tornam mais expostos, além disso a falta de fiscalização no trânsito e falta de medidas educativas refletem esse elevado número de casos. A média de idade dos pacientes vítimas de trauma contuso foi 37,74 e a de trauma penetrante foi 29,34. Quando distribui-se o gênero de acordo com o mecanismo de trauma, observa-se que o sexo feminino é acometido por aproximadamente 37% de trauma contuso e 7 % de trauma penetrante. Mais uma vez os números mostram a disparidade entre o acometimento entre homem e mulher no trauma. Mulheres são menos impactadas pelo trauma que homens, e quando são expostas é menos provável que a causa seja violência (traumas penetrantes) e sim contuso, como acidentes de transito ou queda. Jovens do sexo masculino a cidade de Salvador, estão muito expostos à violência urbana sendo as maiores vítimas de incidentes por arma branca e arma de fogo. 6.3 Relação entre RTS e o prognóstico do paciente Todo paciente admitido na Linha de Cuidado do Trauma teve seu RTS de entrada calculado no momento da coleta dos dados vitais. Esta variável foi uma grande limitação de outros registros já supracitados, haja vista que no RT do Hospital João XXIII, por exemplo, apenas 31% dos pacientes tiveram seu RTS de entrada coletados. O registro da Santa Casa de São Paulo não teve perda nesse quesito, suas limitações foram outras. Neste estudo, obtivemos uma média de RTS de 7,43, porém média de RTS não é uma variável tão esclarecedora haja vista a grande quantidade de traumas de baixa energia que não 39 modificam o padrão fisiológico do paciente, normalmente são médias e medianas acima de 7 em dados da literatura (6)(7)(8)(9). Esta variável analisa o prognóstico do paciente e foi visto neste estudo que pacientes vítimas de trauma penetrante apresentam menor RTS em relação a vítimas de trauma contuso (7,22 vs 7,54). Esses números mostram que um paciente vítima de trauma penetrante teve um prognóstico mais reservado que aqueles acometidos por trauma contuso (21). A análise do RTS em relação à distribuição de idade nos revela que não houve diferença estatística. Isso reflete que o prognóstico do indivíduo não está relacionado com a idade e sim com o mecanismo de trauma. Estes números podem estar relacionados a redução da exposição a fatores desencadeantes de trauma com o avanço da idade, desta forma eles se envolvem menos com acidentes e quando se envolvem são traumas de baixa energia. Esta informação é contraditória com informações da literatura, como por exemplo em um registro de trauma da região da Catalunha onde o prognóstico do indivíduo estava diretamente relacionado com o aumento da idade. Muito provavelmente isto ocorreu devido à menor exposição da população a traumas de grande energia e, principalmente, à violência e lesões penetrantes nesta região (19). Dos 818 pacientes vítimas de trauma analisados neste estudo, 50,1% foram internados, 11,4% admitidos em UTI e 7,1% foram a óbito. A taxa de mortalidade foi semelhante aos dados encontrados na literatura. Apenas no Hospital João XXIII encontramos um número maior (13,7%). Esta taxa pode ser entendida como reflexo da facilidade de comunicação existente após a criação da linha de trauma. O paciente triado pela equipe de enfermagem através dos escores de trauma, a comunicação via sistema de som e via campainhas aponta com rapidez quem é o paciente crítico, que necessita de avaliação e/ou intervenção imediata do cirurgião geral. Observou-se uma relação inversa entre o RTS, a probabilidade de sobrevida e o tempo de permanência hospitalar, revelando aqueles que possuíam pior prognóstico. Pacientes com os menores valores de RTS foram aqueles que tiveram um maior tempo de permanência hospitalar e maior número de óbitos. A maior taxa de óbitos foi vista em pacientes que apresentaram RTS menores que 4,3 apresentando 79% de óbitos. Na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo houve maior taxa de óbitos nos RTS menores que 2. No estudo realizado no Distrito Federal obteve-se que a média de RTS nos pacientes que evoluíram para óbito foi de 2,71 (23). O RTS é um escore de trauma universal e, de acordo com os dados no nosso estudo, pode ser aplicado à população vítima de trauma atendida no Hospital do Subúrbio. Já em relação à média de tempo hospitalar foi visto que os grupos compreendidos entre o RTS entre 5 e 7,55 apresentaram a maior média de permanência 40 hospitalar. A média geral de permanência hospitalar do estudo foi de 10,26 dias. Estes dados são semelhantes aos da literatura, como por exemplo em um estudo realizado na Universidade de São Paulo que obteve uma média de permanência hospitalar de 11 dias (24). Os grupos que tiveram maior tempo de hospitalização também foram os que tiveram um RTS nessa faixa mediana. O RTS torna-se uma variável importante para predizer quem será o paciente que mais demandará de atenção da equipe, qual permanecerá mais tempo no hospital e qual será aquele que demandará de mais recursos para a instituição (24). Os dois maiores desfechos com os quais correlacionamos o RTS foram a quantidade de óbitos e as entradas à Unidade de Terapia Intensiva. Ambos os desfechos foram estatisticamente significantes e o evento óbito possuiu uma relação mais sólida do que o evento entrada à UTI. Isso denota a relação do RTS com a gravidade do trauma e provavelmente sua maior relação com os óbitos está relacionado com o estado de entrada do paciente. Essa mesma relação foi vista no estudo do Distrito Federal (23). Infelizmente, não possuímos dados do pré-hospitalar para saber o tempo entre o evento traumático e a entrada do paciente à emergência e tão pouco os dados referentes às medidas realizadas no pré-hospitalar. Assim, pacientes com um RTS muito baixo, menor que 4, a depender do tempo de trauma, chegam em estados já deteriorados que a intervenção não consegue reverter. Aqueles que conseguem chegar a tempo de uma intervenção, a entrada à UTI torna-se fator fundamental para a recuperação. Os números do hospital indicam o papel da UTI, com aproximadamente 50% dos pacientes evoluindo com alta do setor. No entanto, esses pacientes acabam aumentando o tempo de permanência hospitalar do Hospital, o que já era previsto com o valor de RTS (12). O estudo foi importante para traçar um perfil do paciente traumatizdo atendido no HS. Antes não havia nenhum registro de pacientes politraumatizados atendidos no HS, agora já há uma noção de quem é este paciente e, além disso, qual é o paciente mais grave. Foi implantado o escore de triagem, RTS, o qual tem a capacidade de prever qual o paciente com o prognóstico mais reservado e, por conseguinte, qual paciente necessitará de mais atenção da esquipe. Dentre as melhorias estamos planejando incluir o ISS no resgistro de Trauma, haja vista que foi a principal limitação deste estudo e com ele, calcular o score TRISS, dessa forma, haverá um panorama mais completo do paciente atendido no Hospital do Subúrbio em Salvador-BA. 41 7. CONCLUSÃO Pacientes politraumatizados atendidos no Hospital do Subúrbio são predominantemente homens jovens, em idade economicamente ativa. O mecanismo de trauma contuso é o predominante, principalmente relacionado ao uso de motocicletas. Há alta incidência de traumas penetrantes, em comparação com outros registros de trauma do mundo, principalmente devido a agressão por arma de fogo. O RTS associou-se ao tempo de hospitalização, internação em UTI e mortalidade. Pacientes com trauma penetrante apresentaram RTS significativamente menor, com maior taxa de mortalidade. 42 REFERÊNCIAS 1. Costa-Val R, Campos-Christo SF, Abrantes WL, Campos-Christo MB, Marques MC, Miguel EV. 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Caracterização dos pacientes traumatizados atendidos na Unidade de Emergência do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo utilizando os indices de gravidade RTS, ISS E TRISS, em 2006/2007. 2009;6(62):4–11 45 ANEXO 1. FICHA INFORMATIZADA DA LINHA DO CUIDADO DO POLITRAUMA