Há muito estigma na depressão

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Infoglobo ­ O Globo ­ 22 mai 2017 ­ ‘Há muito estigma na depressão’
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O Globo CLARISSA PAINS [email protected]
‘Há muito estigma na depressão’
Considerado referência mundial no assunto, o americano David Vincent Sheehan é
criador de uma escala que ‘mede’ os níveis da doença e é defensor de exercícios
aeróbicos e psicoterapia para tratar casos menos graves
“O tratamento correto da depressão severa ‘desliga’ no cérebro o mecanismo que aumenta o risco de suicídio”
Hoje, no mundo, 320 milhões de pessoas sofrem de depressão, segundo a Organização Mundial da Saúde
(OMS). Destas, 11 milhões vivem no Brasil, o país mais deprimido da América Latina. Ex­consultor da OMS e da
Food and Drug Administration (FDA) — agência reguladora dos Estados Unidos equivalente à Anvisa no Brasil —,
o psiquiatra David Vincent Sheehan dedicou toda a sua carreira aos estudos desta doença e às consequências que
ela traz.
MARJAN APOSTOLOVIC/SHUTTERSTOCK
Difícil combate. Número de casos de depressão aumentou 50% entre 1999 e 2013 e problema
atinge com mais frequência mulheres
Sheehan, que participou do Congresso Brasileiro de Psiquiatria este mês, no Rio, falou ao GLOBO sobre este
problema de saúde que já atingiu, atinge ou atingirá de 20% a 25% da população brasileira, de acordo com
estimativas.
Uma pessoa pode ficar deprimida de formas diversas?
Sim, existem tipos diferentes de depressão, entre leve, moderada e severa. Mas o fato é que as pessoas
podem ficar com o humor deprimido ao longo do dia e isso não configurar, necessariamente, depressão. Para se
caracterizar como doença, os principais sintomas são tristeza, ansiedade, perda do prazer de realizar atividades e
pensamentos depressivos como culpa, baixa autoestima e desesperança. Mas há também quase sempre a
existência de problemas de concentração e raciocínio que impactam no organismo: insônia, problemas de apetite
— a pessoa come demais ou muito pouco —, desânimo, cansaço, fraqueza, problemas hormonais, habilidade
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reduzida para se concentrar, falhas de memória e agitação ou apatia psicomotora. E esses sintomas aparecem
quase todos os dias.
Como funciona a escala que o senhor criou para medir os níveis de depressão?
A escala que eu criei, batizada de escala Sheehan, avalia o quão severa é a doença. De acordo com o nível de
severidade, é possível direcionar o tratamento e os cuidados que o paciente deve receber: a frequência com que
deve visitar o médico, se é necessário internação, entre outros.
Usando essa escala, é possível saber a probabilidade de uma pessoa cometer suicídio?
Não. A escala Sheehan avalia somente a severidade da doença. Posso dizer que não é possível avaliar a
probabilidade de uma pessoa cometer ou não suicídio. Geralmente, esta é uma ação imprevisível. Sabemos que
alguns tipos de depressão mais severa podem levar ao suicídio se não tratados corretamente, mas não é possível
prever.
E qual a melhor maneira de intervir quando há risco de suicídio?
Adotar o tratamento adequado. É sabido hoje que o tratamento correto para a depressão severa é capaz de
“desligar” o mecanismo no cérebro que aumenta o risco de suicídio.
Recentemente, houve no Brasil tentativas
de suicídio entre adolescentes possivelmente ligadas ao “jogo da baleia azul”. Como o senhor analisa o
envolvimento de jovens com esse “jogo”?
Este tema é sério. É importante falar sobre depressão e suicídio da forma correta, esclarecendo a população
para que todos possam ter acesso ao tratamento adequado. As famílias precisam estar atentas aos principais
sintomas e procurar profissionais para ajudar. Falar de forma errada sobre o assunto só agrava mais o problema.
Quais os tratamentos mais eficazes?
Os casos de depressão leve podem ser tratados com psicoterapia e exercícios aeróbicos, cinco vezes por
semana. Mas os de depressão moderada a grave precisam envolver antidepressivos. Um dos remédios indicados é
a desvenlafaxina. Hoje, no Brasil, já existe disponível o primeiro similar dessa molécula, com um custo 30% mais
acessível. Este medicamento tem menor interação com outros remédios, o que é fundamental porque,
geralmente, o paciente com depressão toma outros remédios, então é importante que o antidepressivo não
interfira. Muitas pessoas também não se tratam por medo de queda na libido, disfunção sexual ou ganho de peso,
mas este medicamento não afeta isso.
Por que o número de pessoas com depressão tem crescido?
O sistema de diagnóstico melhorou muito. E a vida moderna e o alto nível de estresse podem contribuir para
o aumento da depressão. Acredito que seja por isso que, entre 1999 e 2013, os casos aumentaram 50% no
planeta.
Segundo a OMS, o Brasil é o país com mais depressão da América Latina e o quinto no mundo. Por que somos
um povo deprimido?
Sabemos que crise econômica e política e falta de segurança podem ser o gatilho para disparar um episódio de
depressão em quem é predisposto. Pode estar aí a resposta.
E até 2020, essa doença deve ser a principal causa de afastamento do trabalho no mundo, certo?
Sim. Já hoje, em média, o paciente fica totalmente incapacitado de trabalhar ou conduzir suas atividades
normais durante 35 dias por ano. A depressão acarreta vários custos. Entre eles, perdas financeiras.
O senhor já teve depressão?
Nunca. Não tenho predisposição e não fui submetido a situações que pudessem levar a um quadro depressivo.
Mas tenho parentes e amigos com depressão. Hoje todo mundo conhece alguém que tem ou já teve. E vejo que
há, ainda, muito preconceito e estigma.
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