o compartilhamento de saberes na construção da experiência inicial

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O COMPARTILHAMENTO DE SABERES NA CONSTRUÇÃO DA
EXPERIÊNCIA INICIAL E CONTINUADA DOS PROFESSORES:
QUALIFICANDO O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE
Rita de Cacia Borges LIBERALESSO
Neiva Maria Frizon AULER
Patricia Fantinel BAECHER
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha, Campus São Vicente do Sul
RESUMO: Essa comunicação retrata uma investigação que tem evidencia a formação docente.
Assim, nos interessa desvelar a formação inicial dos professores, focando o contexto disciplinar das
Práticas de Ensino do curso de Ciências Biológicas, bem como a formação continuada dos professores
regentes das turmas que os acadêmicos têm inserção, e o compartilhamento de saberes entre esses
sujeitos. São objetivos: investigar quais saberes estão implicados na/para a qualificação da experiência
inicial e continuada dos professores, e apontar a possibilidade do compartilhamento destes saberes no
desenvolvimento profissional docente. Esta investigação caracteriza-se como qualitativa; serão usados
o diário de campo individual, as atas de reuniões, os materiais produzidos a partir dos estudos. A
entrevista semi-estruturada será desenvolvida a partir de um esquema básico para todos os
entrevistados, permitindo-se adaptações no momento da abordagem. Por isso, o que buscamos nessa
investigação constituirá o retrato de uma possibilidade, construído coletivamente em um determinado
momento histórico.
PALAVRAS-CHAVE: formação inicial, formação continuada, práticas pedagógicas.
1. Introdução:
Apresentando essa proposta investigativa, cabe reportarmo-nos a Marques (1996a)
quando aborda a questão da formação do profissional da educação. O autor destaca diversos
desafios, e aponta a necessidade da formação articular-se com a atuação profissional. Para
Marques (1996a, p. 73),
divorciados do exercício efetivo da profissão, os processos formativos revelam-se incapazes de
responder aos desafios postos pelas tarefas concretas emergentes sempre com face nova; menos
ainda conseguem levar sangue novo ao desempenho e às organizações profissionais. A articulação
da formação com a atuação não pode dar-se senão no relacionamento, sempre conflitivo porque
dialético, das agências formadoras com as organizações profissionais flexíveis, abertas e críticas, de
maneira que se cumpra a valorização profissional na reflexão crítica, no acompanhamento do estado
das ciências concernidas, no rompimento com os fetichismos ideológicos e com o dogmatismo das
teorias. Depois, ao assumir o exercício autônomo da profissão, o profissional não interrompe sua
formação, antes a retoma em outras bases, em desafios outros e em nível de mais estreita vinculação
entre prática e teoria. A construção da experiência é, então, o novo nome da formação
Nesse sentido, essa proposta investigativa tem como foco a qualificação da formação
profissional, e assumimos como premissa a necessária articulação entre a formação inicial e
continuada dos professores. Ainda, nos associamos a Rios (2006, s.p.) na compreensão de que
(...) a melhor qualidade não é sinônimo de "qualidade total". O ensino da melhor qualidade é aquele
que cria condições para a formação de alguém que sabe ler, escrever e contar. Ler não apenas as
cartilhas, mas os sinais do mundo, a cultura de seu tempo. Escrever não apenas nos cadernos, mas
no contexto de que participa, deixando seus sinais, seus símbolos. Contar não apenas números, mas
sua história, espalhar sua palavra, falar de si e dos outros. Contar e cantar - nas expressões políticossociais, nas criações artísticas, nas manifestações religiosas, nas múltiplas e diversificadas
investigações científicas
Assim, nos interessa desvelar o processo de formação inicial dos professores, focando
o contexto das Práticas Pedagógicas do curso de Ciências Biológicas do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha, campus São Vicente do Sul, bem como a
formação continuada dos professores regentes das turmas que possibilitam aos acadêmicos a
inserção no campo profissional, e o compartilhamento de saberes entre esses sujeitos.
Entendemos que as práticas educativas configuram-se como espaços de inserção dos
professores em formação, no qual a concretude das demandas da prática social da educação,
não raro, coloca em xeque a formação desses profissionais (Cancian; Liberalesso; Powaczuk;
Tomazzetti, 2008).
A relevância dessa investigação decorre, além do exposto, de minhas experiências
profissionais, em dois espaços: na Educação Básica, onde trabalhei com a Supervisão
Pedagógica, e na Educação Superior, onde orientei, colaborativamente, o Estágio Curricular do
Curso de Pedagogia. Atualmente, minha inserção profissional se dá na Rede Federal
Tecnológica, atuando como Técnica em Assuntos Educacionais, junto a Supervisão
Pedagógica e Diretoria de Ensino, onde também é possível perceber os desafios colocados à
prática pedagógica, desafios esses de toda ordem. Além disso, os institutos federais de
educação, ciência e tecnologia, instituições que fazem parte da Rede Federal, foram
responsabilizados para oferecer, juntamente com as universidades, cursos de formação de
professores, especialmente nas áreas onde haja defasagem de profissionais habilitados,
geralmente nas ciências naturais e exatas.
Enfocaremos nesse trabalho os limites e possibilidades da formação inicial e
continuada dos professores, portanto, desafios pedagógicos, do domínio de um segmento
profissional, e a necessária articulação desses momentos, visando a qualificação do
desenvolvimento profissional docente.
A partir do que foi apontado, nos pontuaremos em aspectos, que imbricados entre si,
subsidiarão a análise crítica da problemática apontada. Retrataremos as normativas legais que
regem as Práticas de Ensino e as experiências e possibilidades de sua realização no decorrer do
curso, que ainda estão sendo construídas na instituição, bem como as concepções de formação
inicial e continuada. Buscaremos entender os conceitos e os pressupostos da qualidade no
desenvolvimento profissional. Por fim, apontaremos a necessidade da articulação da formação
inicial e continuada, bem como a possibilidade de compartilhamento dos saberes profissionais.
2. Objetivo Geral:
Compreender como se constrói a qualificação do desenvolvimento profissional dos
professores, na sua formação inicial e continuada, a partir do compartilhamento de saberes
entre os sujeitos – acadêmicos, professores regentes, professores formadores.
3. Objetivos Específicos:
Pontuar os saberes profissionais que são mobilizados pelo professor regente de classe
na sua prática pedagógica;
Investigar quais saberes estão implicados na/para a qualificação da experiência inicial e
continuada dos professores;
Apontar a possibilidade do compartilhamento de saberes na qualificação do
desenvolvimento profissional docente.
4. Aspectos fundantes:
Em relação a formação de professores, é importante salientar que somente as
normativas legais nem sempre (quase nunca) dão conta de garantir o desenvolvimento
profissional. Abordando as reformulações curriculares ocorridas historicamente e a
possibilidade/necessidade de uma base comum nacional para a formação de professores,
Marques (1996a, p. 71) destaca
é de fundamental importância que a base comum aponte para uma organização curricular baseada
em uma matriz epistemológica que veja a teoria e a prática pedagógica de forma indissociável e,
portanto, presentes ambas ao longo de toda a formação profissional, incluindo os estágios. É
necessário que se garanta o domínio do conhecimento específico e adequado a cada licenciatura,
que se assegure o domínio do conhecimento pedagógico, bem como se garanta a integração entre
esses saberes
As Diretrizes Curriculares para a formação de professores apontam a necessidade das
instituições formadoras realizarem revisões e mudanças de modo a dar conta de acompanhar
as transformações ocorridas na Educação Básica no país, tanto no quadro legal, como no das
reais necessidades (Cancian; Liberalesso; Powaczuk; Tomazzetti, 2008).
Tem-se percebido e retratado nos estudos a respeito da formação de professores, é que
quando no campo profissional, os acadêmicos acabam por “colar” no discurso escolar, na
rotina em busca de respostas imediatas, que em muitas circunstâncias acabam por calar as
perguntas evocadas do processo de reflexão, tornando a prática pedagógica vazia da melhor
qualidade.
Assim, avaliamos que é imperioso ter a compreensão teórico-prática da natureza do
trabalho docente, de modo que a inserção no campo profissional, ou seja, a intervenção na
realidade educacional, não constitua uma aplicação de saberes, de reprodução de livros, mas o
contrário, que esteja ancorada nos princípios da ação-reflexão sobre a prática e da pesquisa,
bem como no compartilhamento de saberes entre os sujeitos envolvidos.
Essa possibilidade, entretanto, requer uma intencionalidade por parte desses sujeitos e
instituições em que estão inseridos. Ocorre, porém, que nem sempre, as escolas de educação
básica assumem, juntamente com as universidades e institutos, o papel na formação dos
profissionais. De acordo com Terrazzan (2003, p. 78)
tradicionalmente, a formação de professores, sobretudo para o Ensino Médio, é vista como de
exclusiva responsabilidade das IES, que atuam como agências formadoras, sendo que as escolas
costumam esperar que os docentes destas IES, supervisores de estágio, “visitem” os estagiários em
sala de aula, procedendo as correções necessárias para o bom andamento de suas aulas. À escola e
ao professor titular da turma de estágio cabe apenas entregar ao estagiário a lista de regras básicas a
serem seguidas e esperar pelo seu bom desempenho. Com isso, a escola formalmente se
“desobriga” em relação à formação daqueles que serão seus prováveis futuros profissionais
Porém, devemos nos ater ao exposto por Kist (2007, p. 28), que solicita que
não se pode perder de vista que é, sobretudo, através do EC que melhor se configura a relação entre
teoria e prática, já que é com a experiência da docência que o futuro professor poderá conhecer e
experienciar sua futura profissão
Não obstante, devemos considerar também a possibilidade de aprendizagem em todos
os tempos/espaços, e nas especificidades dessa inserção. Tardif (2002, p. 295) retrata que
aprender a profissão docente no decorrer do estágio supõe estar atento às particularidades e às
interfaces da realidade escolar em sua contextualização na sociedade (...) Ao transitar da
universidade para a escola e desta para a universidade, os estagiários podem tecer uma rede de
relações, conhecimentos e aprendizagens, não com o objetivo de copiar, de criticar apenas os
modelos, mas no sentido de compreender a realidade para ultrapassá-la. Aprender com os
professores de profissão como é o ensino, como é ensinar, é o desafio a ser aprendido/ensinado no
decorrer dos cursos de formação e no estágio
Todavia, entendemos que o estágio é campo de atividade teórica, no sentido em que
instrumentaliza a práxis docente, sendo uma atividade de conhecimento, fundamentação,
diálogo e intervenção na realidade (Pimenta e Lima, 2004). Sendo assim, é na articulação e no
compartilhamento de saberes com outros professores que a prática pedagógica de melhor
qualidade pode ser efetivada.
No entanto, consideramos que a formação inicial nem sempre dá conta de garantir
todos estes aspectos; nesse sentido, destacamos a formação continuada dos professores, que
decorre dos processos de interação com outros sujeitos e com o seu objeto de trabalho. Como
aponta Alarcão (2001, p. 107), os indivíduos aprendem
interagindo com os outros (professores, colegas, especialistas presentes ao vivo ou presentes
virtualmente no documento – livro tradicional ou multimídia atual), isto é, escutando, lendo,
dialogando; aprende-se interagindo com os conhecimentos, com as idéias, com as tarefas, com os
processos, com os contextos. Em suma, aprende-se agindo e interagindo com o mundo, com os
outros e com nós mesmos, ou seja, conhecendo, pensando, investigando, refletindo
Assim, entendemos ser de fundamental importância a edificação de tempos/espaços
para a interação entre os diferentes sujeitos práticos. Para tanto, devemos reconhecer nos
professores de ofício a construção do seu conhecimento educativo.
Para Tardif (2002, p. 234)
se assumimos o postulado de que os professores são atores competentes, sujeitos ativos, devemos
admitir que a prática deles não é somente um espaço de aplicação de saberes provenientes da
teoria, mas também um espaço de produção de saberes específicos oriundos dessa mesma prática
Ainda, de acordo com Carr e Kemmin (1988, p. 58, apud Galiazi, 2003, p. 57)
para uma autonomia profissional mais extensa e responsabilidades mais dilatadas, é preciso que
sejam os próprios docentes quem construam a teoria educativa por meio de uma reflexão crítica
sobre seus próprios conhecimentos práticos
Para Galiazi (2003, p. 23), outro dos dilemas a serem superados pelos cursos de
licenciatura é a falta de integração entre a licenciatura e a realidade. De acordo com a autora,
“há pouca consonância entre quem forma o futuro professor e os sistemas que o absorvem
como profissional”.
No entanto, não é a assunção da relevância e especificidade do espaço escolar e da
inserção profissional como produtoras de conhecimento, que alijará a responsabilidade formal
das universidades, por meio dos seus cursos de graduação, de efetivar a formação inicial. Para
Pimenta,
a universidade é por excelência o espaço formativo da docência, uma vez que não é simples formar
para o exercício da docência de qualidade e a pesquisa é o caminho metodológico para esta
formação (2004, p. 41)
Assumindo também a pesquisa como princípio formativo, entendemos o apontado por
Galiazi (2003, p. 25/26),
a pesquisa vem sendo considerada por muitos estudiosos como uma possibilidade para a melhoria
da formação docente. A quantidade e a qualidade das pesquisas em educação têm feito a academia
e o governo prescreverem soluções geralmente ignoradas pelos professores ou implementadas de
forma bastante distinta do proposto. Essa diferenciação encontra razões na distância entre as teorias
subjacentes nas propostas originadas nas pesquisas ou em documentos oficiais, e as teorias dos
professores. Enquanto a pesquisa não for feita pelo professor como prática constitutiva de sua
atividade docente, o afastamento entre teoria e prática vai continuar existindo
Nesse sentido, e buscando a apropriação dos conhecimentos gestados na prática
docente, consideramos a possibilidade do compartilhamento de saberes, situando (sem, no
entanto, polarizar) os sujeitos acadêmicos em estágio curricular – em construção de sua
experiência profissional – e os sujeitos do ofício docente – em consolidação de sua
experiência profissional, incluindo aqui também o professor orientador dos estágios.
Terrazzan (2003) afirma, em relação ao compromisso das escolas de educação básica
com a formação profissional, que essas instituições não têm assumido o seu papel, no que
tange à formação inicial. O autor ainda destaca que essa postura das escolas de educação
básica, de desobrigar-se da formação dos estagiários, não é muito diferente da postura escolar
em relação à formação continuada de seus profissionais.
No entanto, entendemos, nos filiando ao exposto por Marques (1996b, p. 144) “que a
ação humana se efetiva e o discurso torna-se significativo tão-somente graças a essa teia das
relações humanas, contraditórias e intercomplementares”. Assim, avaliamos que as práticas
educativas tornam-se significativas, e, portanto, qualificadas, à medida que são
compartilhadas e refletidas pelos sujeitos. Para o autor,
na reciprocidade em que se exigem e se negam, os interesses e as intenções imbricam-se uns e
outros, quase que forçados à síntese das muitas determinações que os fazem unidade e diversidade
no todo, mas que o fazem também pluralidade de formas de agrupamentos. Concretiza-se, assim, a
presença dos indivíduos no espaço público sob a forma de pertença a determinados grupos sociais.
É na condição de membros de um grupo, ou de um coletivo social, que os indivíduos existem para
a ação e para a palavra, as práticas sociais por excelência (Marquesb, 1996, p. 144)
A partir do exposto, apontamos uma tese que visamos comprovar, ou seja, a
possibilidade de qualificação do desenvolvimento profissional docente a partir do
compartilhamento dos saberes entre os sujeitos.
Como já foi afirmado, o campo de estágio é um campo de inserção profissional, que
desafia a edificação de práticas de melhor qualidade. O que ocorre, de modo geral, é um
descolamento da caminhada realizada no curso de formação, e a ineficácia da ação educativa,
na realidade escolar. Ainda, o apoio buscado pelos estagiários é o recorrente discurso que a
universidade ensina a teoria, e que a prática profissional é outra coisa.
Ora, temos claro que os inúmeros dilemas enfrentados nos cursos de formação. Da
mesma forma, conhecemos também os desafios da prática escolar. O que nos move é o
entendimento de que é possível configurar uma intervenção pedagógica da melhor qualidade,
e que essa intervenção se constitui a partir de duas premissas: reconhecer no professor de
ofício um sujeito que produz conhecimentos, e situar o campo das práticas pedagógicas,
incluído o estágio, como tempo/espaço de construção da experiência profissional mediada
pelo compartilhamento de saberes com outros profissionais.
Como sujeito, elegi investigar essa problemática fundamentalmente por estar inserida
nesses espaços. Assim, enquanto supervisora pedagógica e orientadora de estágio curricular,
busquei contribuir na superação dos desafios impostos à prática pedagógica, situando, entre
eles, também as demandas apontadas por Rios (2006): a) superar a fragmentação do
conhecimento, articulando estreitamente saberes e capacidades, a partir da contribuição de
todas as áreas do conhecimento, especialmente das ciências da educação, que deveria revisar
seus estatutos científicos, no sentido de ampliar o diálogo com as práticas, com a diversidade
dos saberes da docência; b) perceber claramente as diferenças e especificidades dos saberes e
práticas, não no sentido de afastá-los uns dos outros, ou isolá-los, mas de realizar um trabalho
coletivo e interdisciplinar; c) embate entre a razão instrumental e o irracionalismo; para a
autora, o se requer é a articulação das capacidades dos seres humanos na intervenção na
realidade e na relação com seus semelhantes.
Nesse sentido, avaliamos a necessidade do compartilhamento de saberes entre os
sujeitos, de modo que as demandas apontadas anteriormente sejam superadas, edificando um
desenvolvimento profissional docente da melhor qualidade.
Entendido desta forma, as práticas pedagógicas se configuram como espaços de
formação inicial e continuada, compreendida como a busca de novos caminhos de
desenvolvimento profissional, e assumindo o compartilhamento de saberes como eixo
fundante.
Rios (2006) em sua obra Compreender e Ensinar, por uma docência da melhor
qualidade, defende a idéia de que é necessário qualificar a qualidade, ou seja, refletir sobre a
significação de que ela se reveste na prática educativa.
Nesse sentido, e pensando sobre essa significação, nos questionamos: de que
qualidade falando? Ora, não é nada difícil retratar os conceitos de qualidade, principalmente
na conjuntura atual, onde o discurso do mérito e da competência do processo educativo sai da
escola e perpassa os diversos setores sociais.
Domingos (1997, p. 17, apud Rios, 2006), destaca que
remeter á expressão “qualidade da educação” em vez de a seus diversos conteúdos e significados
para diferentes pessoas ou posições ideológicas, é uma forma de pressionar na direção do consenso
sem permitir a discussão. E evidentemente este é um recurso que pode usar quem tem poder para
utilizar e difundir o slogan como forma de legitimar seu ponto de vista sem discuti-lo (...). Um
recurso que (...) obriga a todos: uma vez que a referência à qualidade se converteu na forma de
falar, ninguém pode abandoná-la, ninguém pode dizer que sua pretensão não é a qualidade da
educação
De fato, quem não tem escutado, nos programas eleitorais, nos jornais, nos encontros
de empresários, o debate acerca da qualidade da educação em nosso país? Não obstante,
desejamos situar o nosso conceito de qualidade, na sua estreita relação com o de competência.
Ou, de acordo com o que e proclamado com muita propriedade por Rios (2006, p.21) “a ação
competente vai se definir como uma ação de boa qualidade”.
A autora defende que é necessário ter a compreensão de que competência é saber fazer
bem o que é necessário e desejável no espaço da profissão, articulando as dimensões técnica e
política, mediada pela ética. Assim, a ética é dimensão fundante da competência, uma vez que
a técnica, a estética e a política ganham significado pleno quando guiadas pela ética.
Assim, entendemos que a formação de professores não deve apoiar-se na racionalidade
técnica, mas na capacidade de decisão. A capacidade de decisão, por sua vez, só é construída
a partir da assunção de que somos sujeitos de nossa formação, e que nosso desenvolvimento
profissional se constrói a partir da síntese das contradições, na articulação com a alteridade.
Nesse sentido, reiteramos a relevância do compartilhamento de saberes entre os
sujeitos na construção da experiência inicial e continuada, pois é nessa teia de relações que se
configura a formação profissional.
5. Materiais e Métodos:
Considerando o encaminhamento dessa proposta investigativa, nos filiamos ao exposto
por Krug (2001), ao destacar o papel da metodologia. Para o autor, a metodologia auxilia as
pessoas a compreender não somente o produto da investigação, mas principalmente o
processo, ou ainda, “na abordagem da realidade, a metodologia é o caminho do pensamento e
da prática realizada” (p. 9).
O caminho metodológico assume o caráter qualitativo, uma vez que o problema
investigativo, as questões decorrentes dele e, evidentemente, o objetivo do trabalho se pautam
na significação que os sujeitos envolvidos dão aos fatos e fenômenos do qual fazem parte.
Para Demo (1981 apud Triviños, 1987, p. 133) é interessante salientar, uma vez mais,
que o pesquisador, orientado pelo enfoque qualitativo, tem ampla liberdade teóricometodológica para realizar seu estudo. Os limites de sua iniciativa particular estarão
exclusivamente fixados pelas condições da exigência de um trabalho científico; “este,
repetimos, deverá ter uma estrutura coerente, consistente, originalidade e nível de objetivação
capazes de merecer a aprovação dos cientistas num processo intersubjetivo de apreciação”.
Ainda de acordo com Triviños (1987), a pesquisa qualitativa é extremamente
descritiva, pois parte da interpretação dos fenômenos situados em um determinado contexto,
sendo ilustradas com declarações, trechos de entrevistas, diálogos, documentos, etc., buscando
explicar as relações entre os fatos, sua origem e possíveis conseqüências.
Essa ação pauta-se na premissa apontada por Lüdke e André (1986, p. 1) de que “para
realizar uma pesquisa é preciso promover o confronto entre os dados, as evidências, as
informações coletadas sobre determinado assunto e o conhecimento teórico acumulado a
respeito dele”.
Nesse sentido, e compreendendo o enfoque qualitativo como viés nessa investigação,
estamos buscando uma aproximação consistente com os sujeitos envolvidos – acadêmicos do
curso de Ciências Biológicas, professores formadores e professores regentes de turmas. Esta
aproximação se consolidará a partir da inserção dos acadêmicos na escola, que ocorre em duas
situações intercomplementares: a disciplina de Práticas Pedagógicas, e o Programa
Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID/Capes).
A construção metodológica constituir-se em função do problema investigativo. Assim,
reiteramos o papel dos sujeitos na qualificação da formação profissional, como já destacado, e
o compartilhamento de saberes como possibilidade formativa. Desta forma, Chizzotti (2000)
mostra que os pesquisados, ou todas as pessoas que participam da pesquisa, são reconhecidos
como sujeitos que elaboram conhecimentos, produzindo práticas adequadas para intervir nos
problemas que identificam.
Enfatizamos que um objeto de pesquisa nas ciências humanas é histórico, existindo em
um dado momento espaço cuja formação social e configuração são específicas, em um embate
entre o que está dado e o que está sendo construído.
Conforme Gamboa e Filho (1995), a produção científica é inseparável da própria
história humana e de sua produção material. Desse modo, a pesquisa científica está
influenciada pelas condições históricas de sua produção (inter-relações materiais, culturais,
sociais e políticas). Portanto, toda produção que sistematiza conhecimento fundamental para a
transformação da realidade, deve ser constantemente aprimorada pelo progressivo grau de
exigência que essa realidade demanda.
Nessa perspectiva, Minayo (1994, p.13) destaca que “a provisoriedade, o dinamismo e
a especificidade são características fundamentais de qualquer questão social”. Por isso, o que
buscamos nessa investigação constitui o retrato de uma possibilidade, construído
coletivamente em um determinado momento histórico.
Para Gamboa (2007, p. 41)
nas ciências sociais como na educação tanto o investigador como os investigados (grupo de alunos,
comunidade ou povo) são sujeitos; o objeto é a realidade. A realidade é um ponto de partida e serve
como elemento mediador entre os sujeitos. Numa relação dialógica e simpática, como é o caso do
processo da pesquisa. Esses sujeitos se encontram juntos ante a uma realidade que lhes é comum e
que os desafia para ser conhecida e transformada
Consoante o que já foi mencionado, os sujeitos envolvidos na investigação são os
acadêmicos do curso de Ciências Biológicas, os professores regentes das turmas, e os
professores formadores do curso.
a) Acadêmicos do Curso de Ciências Biológicas: acadêmicos que fazem parte do projeto de
pesquisa mencionado, bem como os acadêmicos bolsistas do programa PIBID que desejam
articular as atividades de ensino, pesquisa e extensão, do Instituto de Educação, Ciência e
Tecnologia Farroupilha, Campus São Vicente do Sul;
b) Professores regentes das turmas: sujeitos que atuam com classes nas escolas da região;
c) Professores formadores do curso: sujeitos que atuam no curso, no referido período.
Essa investigação se situa no espaço das escolas e do campus. Destacamos que o
espaço poderá ser ampliado e/ou alterado em resposta a dificuldades e/ou demandas
percebidas.
Em relação ao tempo, cada acadêmico mantém-se inseridos no ambiente escolar
durante os semestres do curso, sendo que em cada um dos semestres há um eixo temático que
norteia esta inserção, conforme Projeto Pedagógico do Curso.
Assumindo o enfoque qualitativo, assumimos a possibilidade de ampliar o período de
tempo para coleta e análise das informações, o que penso que não inviabilizará a investigação,
pelo vínculo pessoal dos pesquisadores nesses espaços.
De acordo com Triviños (1987, p. 131), a pesquisa qualitativa não apresenta uma
seqüência tão fechada. A coleta e a análise de dados, por exemplo, não são divisões estanques,
“as informações que se recolhem, geralmente, são interpretadas e isto pode originar a
exigência de novas buscas de dados”.
No que tange a eleição dos instrumentos de coleta de dados, utilizamos o diário de
campo individual, com registros de encontros entre os acadêmicos e os professores regentes,
bem como os materiais produzidos a partir do trabalho realizado pelos professores formadores
na instituição.
Além desses, entende-se que a entrevista semi-estruturada é de grande valia. A
entrevista semi-estruturada, consoante Ludke & André (1986), desenvolve-se a partir de um
esquema básico para todos os entrevistados, permitindo-se, porém, adaptações necessárias,
dependendo do entrevistado, no momento da abordagem.
Conforme
Triviños
(1987),
a
entrevista
semi-estruturada
parte
de
certos
questionamentos básicos, e em seguida, oferece amplo campo de interrogativas, fruto de
hipóteses que vão surgindo na medida em que se percebe os elementos fecundos. Ainda, a
entrevista semi-estruturada, assim como os demais instrumentos, permite que os pesquisadores
realizem focalizações sucessivas, de acordo com os dados que vão sendo levantados.
6. Resultados:
A partir desta investigação, e já no decorrer desta, pontuaremos sobre os aspectos
formativos que os acadêmicos têm vivenciado no curso de Ciências Biológicas. Estes aspectos
poderão nortear novas orientações no Projeto Pedagógico do Curso, bem como nas práticas
pedagógicas realizadas. É relevante pensar que em se tratando de formação inicial e
continuada de professores, todos os sujeitos e situações configuram-se como possibilidade de
problematização, e a partir desta, de diálogo entre os diferentes sujeitos. Desta forma, esperase que a produção de conhecimentos perpasse a dimensão instrumental, ou formal, e articule-se
as experiências dos sujeitos, significando-as e qualificando-as.
A socialização dos conhecimentos será realizada a partir da participação de eventos que
foquem a formação de professores, bem como a publicação de artigos em revistas vinculadas
as instituições que possuem cursos de licenciatura. Ainda, e principalmente, nos espaços de
formação continuada que ocorrem nas instituições, como as reuniões pedagógicas, onde
poderemos subsidiar a edificação de intervenções pedagógicas mais qualificadas.
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