“Os fins últimos da razão levam ao estabelecimento de um certo número de interrogações que definem a formulação problemática da filosofia. ‘Todo o interesse da minha razão (tanto especulativo como prático) está contido nestas três perguntas: 1. Que posso saber? 2. Que devo fazer? 3. Que me é permitido esperar? Na Lógica, estas ideias encontram-se muito elucidativamente completadas por uma outra que as precisa e lhes determina o âmbito correcto: 4. O que é o homem? À primeira pergunta responde a Metafísica, à segunda a Moral, à terceira a Religião e à quarta a Antropologia. No fundo, porém, poder-se-ia contar tudo isto como Antropologia, porque estas três referem-se à última.’ Nestas quantas frases, Kant dá-nos, de uma forma esquemática e clara, a chave que permite penetrar na Filosofia, de uma perspectiva não apenas ‘arqueológica’, de mero inventariar de um saber passado, mas temático ou pensante. Qual é o traço de união que permite ligar os vários ramos da investigação filosófica? Na sua radicalidade, o interesse pelo homem. É, na verdade, a preocupação que funda a aquisição de novos saberes na dupla medida em que são do homem. São, por um lado. saberes do homem, no sentido em que dizem, no fundo, algo acerca do homem, falam do homem e do seu mundo, daquele horizonte em diálogo com o qual ele vive e que, (...) kant define como o termo supremo da síntese, ‘o todo que não é parte’. São, por outro lado, saberes do homem, na medida em que o no seu próprio originar-se incluem o homem. Tanto no campo do objectivado, como no plano ético, o homem está presente a título constitutivo, quer como ‘informador categorial’ fautor da fenomenalidade e, portanto, de conteúdos positivos para o conhecimento, quer como ‘agente’ ou participante de uma autolegislação que é índice de autonomia estatuinte de liberdade. O homem encontra-se indissociavelmente ligado ao destino da Filosofia como assunto e como sujeito.” J. Barata Moura, Kant e o Conceito de Filosofia