0 BRUNA NATHALY SILVEIRA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA E O SERVIÇO SOCIAL TOLEDO-PR 2012 1 BRUNA NATHALY SILVEIRA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA E O SERVIÇO SOCIAL Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao Curso de Serviço Social, Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharelado em Serviço Social. Orientadora: Profa. Dra. Esther Luiza de Souza Lemos TOLEDO-PR 2012 2 BRUNA NATHALY SILVEIRA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA E O SERVIÇO SOCIAL Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao Curso de Serviço Social, Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharelado em Serviço Social. BANCA EXAMINADORA ________________________________________ Professora Dra. Esther Luiza de Souza Lemos Universidade Estadual do Oeste do Paraná _______________________________________ Professora Ms. Ineiva Terezinha Kreutz Louzada Universidade Estadual do Oeste do Paraná _______________________________________ Professora Dra. Maria Isabel Formoso Cardoso e Silva Batista Universidade Estadual do Oeste do Paraná Toledo, 22 de novembro de 2012. 3 À todos os sujeitos que historicamente lutaram e lutam pelo reconhecimento e garantia de seus direitos. 4 “A Educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo” (Nelson Mandela) 5 SILVEIRA, Bruna Nathaly. Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e o Serviço Social. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Serviço Social). Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Universidades Estadual do Oeste do Paraná – Campus – Toledo-PR, 2012. RESUMO O objeto de estudo do presente Trabalho de Conclusão de Curso – TCC refere-se à Política de Educação Inclusiva no Brasil, implementada a partir de 2008, num contexto histórico marcado pela defesa de direitos das pessoas com deficiência. O interesse pelo tema se deve pela participação em projetos de iniciação científica entre os anos de 2008 a 2012, como estudante do Curso de Serviço Social. A presente investigação tem como problema central a pergunta: quais as interfaces entre a concepção de educação inclusiva expressa na “Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva” e os princípios ético-políticos do serviço social brasileiro? A partir deste problema de pesquisa, o trabalho objetivou analisar as interfaces entre a concepção de educação inclusiva expressa na Política de Educação Especial e os princípios ético-políticos do Serviço Social brasileiro. Para tanto foi realizada pesquisa pesquisa bibliográfica e exploratória, baseada em autores com produção significativa sobre o tema. O procedimento metodológico contou com a seleção bibliográfica das obras dos autores que fundamentam o Serviço Social: Maria Lúcia da Silva Barroco, Marilda Vilela Iamamoto e José Paulo Netto; os autores clássicos que discutem a formação do Estado e a especificidade da política social no Brasil:Florestan Fernandes, Evaldo Vieira, Elaine Behring, Vicente Faleiros; autores que debatem particularmente a Educação Inclusiva: Enicéia Mendes, Maria Teresa Égler Mantoan e Gilberta Januzzi. Além da pesquisa bibliográfica, a presente pesquisa analisou documentação referente a legislação brasileira referente à política de educação e a normatização do Serviço Social. Considera-se que a interface entre a concepção de educação inclusiva expressa na Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e os princípios ético-políticos do Serviço Social brasileiro é a noção de direitos humanos. A política de educação no Brasil tem demandado a inserção do Serviço Social. O presente trabalho permitiu identificar uma área específica que necessita ser aprofundada visando a qualificação da formação e do exercício profissional. Palavras-chave: Educação Inclusiva; Serviço Social; Direitos Humanos. 6 SUMÁRIO INTRODUÇÃO................................................................................................................... 07 1 A POLÍTICA DE EDUCAÇÃO NO BRASIL E A ATENÇÃO AS PESSOAS 10 COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS............................................... 1.1 O ESTADO BRASILEIRO E A POLÍTICA DE EDUCAÇÃO..................................... 10 1.2 OS MOVIMENTOS SOCIAIS NA LUTA PELOS DIREITOS HUMANOS DA PESSOA COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS ................................... 20 2 O SERVIÇO SOCIAL E A CONCEPÇÃO DE DIREITOS HUMANOS.................. 28 2.1 A RUPTURA DO SERVIÇO SOCIAL COM O CONSERVADORISMO................... 28 2.2 A CONCEPÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E O PROJETO ÉTICO POLÍTICO 35 DO SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO............................................................................... 3 A INTERVENÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO ÂMBITO DA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL: A DEFESA INTRANSIGENTE DOS DIREITOS 49 HUMANOS.......................................................................................................................... 3.1 SERVIÇO SOCIAL NO ÂMBITO DA EDUCAÇÃO................................................... 49 3.2 A PARTICULARIDADE DA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA................................................................ 56 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................. 61 REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 63 7 INTRODUÇÃO O Serviço Social é compreendido como uma profissão situada na reprodução das relações sociais, das relações de classes e o movimento contraditório do capital que as produz. Trata-se de uma profissão que se desenvolve a partir da contradição burguesa para intervir no que se denomina “questão social”. Esta é compreendida como a relação contraditória entre capital e trabalho, expressa nas diversas esferas sociais por diferentes manifestações. É a expressão das desigualdades sociais e assume perfis de manifestações diferenciados conforme as particularidades históricas do desenvolvimento do capital. Como o conjunto das expressões da contradição capitalista, a “questão social” não pode ser pensada sem a intermediação do Estado. Não se dissocia do trabalho livre, já que sua gênese reside na produção coletiva e na emergência da classe trabalhadora e sua manifestação e luta por direito e consequente ingresso na esfera política. O reconhecimento da classe trabalhadora e as suas manifestações por direitos resultam numa gama de estratégias governamentais para corresponder a essa necessidade social: serviços e políticas sociais. As politicas sociais, portanto, se configuram ao mesmo tempo como estratégias governamentais para intervenção na sociedade, de modo atender a demanda social imposta pelas expressões da “questão social” e é resultado da luta dos trabalhadores pelo reconhecimento de seus direitos (IAMAMOTO, 2001). Nesse sentido, a “questão social” e suas formas de enfrentamento propostas pelo Estado se colocam na base do Serviço Social, sendo suas múltiplas expressões o alvo da atuação profissional. Tendo em vista o exercício profissional do Serviço Social via políticas sociais para o enfrentamento das expressões da “questão social”, as ações governamentais propostas para a área da Educação, também se configuram como um espaço sócio-técnico de intervenção do assistente social. Tendo em vistas as definições acima descritas, o presente trabalho de conclusão do curso tem como o objeto de pesquisa a Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. O interesse pela área da Educação Inclusiva se deve pela participação da acadêmica no projeto de pesquisa intitulado “Preconceito em relação aos incluídos na educação inclusiva”, iniciado no ano de 2008, no qual a temática da política de Educação Inclusiva começou a ser estudada pela acadêmica. Assim como a participação da mesma em um projeto de iniciação científica durante o período de 2010-2011, denominado “Estudo teórico-bibliográfico sobre a Educação Inclusiva a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9.394/96” e, um segundo projeto de iniciação científica nos 8 anos de 2011-2012 denominado “Pesquisa documental sobre a Política de Educação Inclusiva durante o período de 1996 a 2011”. O desenvolvimento da segunda proposta de iniciação científica citada inquietou a acadêmica sobre a relação entre a Educação inclusiva e o Serviço Social e, sobre isto, fez o seguinte questionamento: quais as interfaces entre a concepção de educação inclusiva expressa na “Política de educação especial na Perspectiva da educação inclusiva” e os princípios ético-políticos do serviço social brasileiro? A partir deste problema de pesquisa, este trabalho objetivou analisar as interfaces entre a concepção de educação inclusiva expressa na Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e os princípios ético-políticos do Serviço Social brasileiro. Definiu-se como objetivos específicos: historicizar a formação social, econômica, política e cultural do Estado brasileiro e a intervenção no âmbito da educação como direito social, particularmente na atenção às pessoas com necessidades educacionais especiais; compreender os princípios ético-políticos que orientam a atuação do serviço social no Brasil; e relacionar os princípios ético-políticos do Serviço Social e a intervenção no âmbito da política de educação especial. Para tanto, esta pesquisa se caracteriza pela pesquisa bibliográfica, exploratória e pela abordagem qualitativa de dados. Para chegar ao objetivo proposto, primeiramente foi realizada a seleção do material correspondente a discussão de autores que fundamentam o Serviço Social, como Maria Lúcia da Silva Barroco, que em diversas obras discute a questão da ética na profissão, Marilda Vilela Iamamoto e José Paulo Netto que também tratam dos fundamentos da profissão. Também foram selecionados alguns autores clássicos que discutem a formação do Estado e as especificidades da política social no Brasil, como Florestan Fernandes, Evaldo Vieira, Elaine Behring, dentro outros. Assim como, os autores que debatem particularmente a Educação Inclusiva, como por exemplo, Enicéia Mendes, Maria Teresa Égler Mantoan e Gilberta Januzzi. Também se realizou uma pesquisa documental com base em documentos de domínio público, como as publicações do Conselho Federal de Serviço Social brasileiro e as políticas dispostas pelos sites do governo federal. Os autores selecionados o foram tendo em vista que suas discussões embasam o campo teórico do Serviço Social, e os materiais utilizados para a pesquisa foram obras publicadas, como livros e artigos científicos e obras não publicadas, como teses e dissertações na área. Foi realizada leitura sistemática do material e fichamento de citação dos mesmos, para posterior análise e redação do texto para responder ao problema de pesquisa. 9 O trabalho foi estruturado em três capítulos. O primeiro capítulo apresenta a construção da atenção às pessoas com necessidades especiais no país, e neste sentido, apresenta-se em dois pontos de discussão, o primeiro aborda especificamente a formação do Estado brasileiro e a construção da política de educação no Brasil, para contextualizar a formação da própria política de educação especial; e apresenta no segundo ponto a articulação destas reflexões com os movimentos sociais que empreenderam a luta pelos direitos humanos, e que tiverem como consequência a formulação da educação especial, e posteriormente da educação inclusiva. Em um segundo momento, o capítulo seguinte discute os princípios ético-políticos que orientam a atuação do Serviço Social no Brasil e os direitos humanos, no entendimento de que a ruptura da profissão com o conservadorismo culminou no compromisso com um projeto ético-político vinculado as demandas da classe trabalhadora, e neste sentido, a profissão assume também o compromisso ético e político, materializado no Código de Ética profissional de 1993, com os direitos humanos. Para tanto, o segundo capítulo apresenta discussão em dois momentos, o primeiro, discutindo o processo de ruptura do Serviço Social com o conservadorismo, e o segundo momento, discutindo sobre o projeto ético-político do Serviço Social e a concepção de direitos humanos defendida pela profissão. E, em um terceiro capítulo, discutem-se as especificidades que envolvem a profissão e a intervenção na educação especial na perspectiva da educação inclusiva. Para isto, a discussão se apresenta primeiramente sobre a construção da atuação do Serviço Social na educação e posteriormente, as especificidades da política de educação inclusiva. Tendo em vista que a intervenção do Serviço Social nesta especificidade da política educacional, que é a política de educação inclusiva, é ainda um espaço emergente, as produções teóricas sobre a temática, que relacionam a profissão com as particularidades desta política também são recentes. Sendo assim, o presente trabalho contribui para ampliar o debate sobre as relações descritas, ampliando também o leque de compreensão profissional sobre este espaço de intervenção. 10 1. A POLÍTICA DE EDUCAÇÃO NO BRASIL E A ATENÇÃO AS PESSOAS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS 1.1 O ESTADO BRASILEIRO E A POLÍTICA DE EDUCAÇÃO No discurso social e político dos dias atuais, a política de educação inclusiva tem sido objeto de inúmeras reflexões, em diferentes áreas do conhecimento. As discussões sinalizam o desenvolvimento de novas alternativas governamentais, que assegurem um sistema de ensino preparado para atender as necessidades educacionais de todos os alunos, ampliando o acesso e qualidade de ensino aos grupos que historicamente estiveram à parte do sistema de ensino. A história da construção da política de educação inclusiva se remete as iniciativas da sociedade civil e posteriormente do governo brasileiro para a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais no sistema regular de ensino. Como proposta assegurada legislativamente, a educação inclusiva se situa no âmbito da política educacional brasileira. E, a própria política educacional é compreendida como setorização do desenvolvimento das políticas sociais no país. Este processo é atrelado à própria formação do Estado brasileiro, dado as configurações e características deste mesmo movimento de construção da nação que tiveram grandes implicações sobre a conquista de direitos sociais, sobre a natureza e organização das políticas sociais, e por consequência, sobre a política educacional e política de educação inclusiva. Portanto, a construção da educação inclusiva advém da história da organização via Estado no contexto brasileiro, já que, a exclusão no campo educacional manifestou-se, sobretudo na figura da pessoa com deficiência. E revelam, ao mesmo passo, a construção da própria política educacional do Brasil. A política de educação inclusiva aponta que as determinações para a organização da mesma proposta não aconteceram de forma arbitrária, mas relacionam um processo de construção humana em dadas condições existentes que possibilitaram sua emergência. Destarte, faz-se necessário, assim como apontado por Januzzi (2006), retomar o passado para compreender o presente e clarificá-lo, dando margem a novas perspectivas de direções para a mesma política. Sobre as políticas sociais, Faleiros (1991) esclarece que de fato, estas não podem ser descoladas da realidade conjuntural nas quais se encontram. Para o autor, elas são: “[...] o resultado de conjunturas e articulações entre classes que expressam forças sociais em dado momento específico, mas que se insere em um contexto mais amplo: o modo de produção capitalista” (FALEIROS, 1991, p. 55). 11 O autor afirma a estreita ligação de causa e consequência entre o desenvolvimento do modo de produção capitalista no país e o desenvolvimento das políticas sociais. Assim como, Vieira (2001) também afirma tal vínculo ao apontar que a política social e a política econômica não podem ser postas em análise separadamente, pois ambas sintetizam-se em uma unidade que exprime a intervenção do Estado nas relações sociais e na produção, sinalizando o avanço das bases capitalistas em dadas sociedades. Sob este pressuposto de indissociabilidade entre política social e política econômica, especificamente nas relações empreendidas pela produção burguesa, Vieira (2001, p. 18) conceitua as políticas sociais como “[...] as estratégias governamentais [que] pretendem intervir nas relações de produção (no caso da política econômica) ou intervir no campo dos serviços sociais (no caso da política social) [...]”. São, portanto, estratégias governamentais formuladas em linhas de programas, projetos e planos, para intervenção em áreas diversas da organização social como a educação, saúde, habitação, assistência social, previdência, e influem direta ou indiretamente na economia que sustenta tal organização. O autor ainda exemplifica tal relação ao afirmar que Por exemplo: nós podemos dizer que a política social se relaciona com a educação pública, com a saúde pública, com a habitação pública, com a previdência social, com o lazer, com as condições de trabalho, mas evidentemente que as questões relacionadas com financiamento têm diretamente vinculação com a política social, embora esteja no campo da política econômica (VIEIRA, 2001, p.18). Se a política social – que aqui é particularizada na reflexão sobre a política educacional, e posteriormente, a política de educação inclusiva – relaciona-se intrinsecamente à política econômica, especificamente ao desenvolvimento das bases da organização da sociedade capitalista, faz-se necessário compreender de que forma o capitalismo esteve entrelaçado à formação do Estado brasileiro, ao desenvolvimento das políticas educacionais, e a construção e caraterização da política de educação inclusiva no país. Sobre a formação do Estado brasileiro, nas suas configurações mediante a entrada da produção e organização capitalista no país, Fernandes (1987) esclarece que é preciso compreender os meandros pelos quais o país transcorreu desde a Independência para o real entendimento de sua formação. Para o autor, a Independência significou um importante momento para a formação do Estado brasileiro na medida em que demarcou o fim da era colonial (embora ideologicamente, as bases coloniais permaneceram a sombra da organização 12 do Estado) e inaugurou o que ele denomina de “época da sociedade nacional” (FERNANDES, 1989, p. 31). É fato que desde a Independência, Portugal havia deixado sob o território brasileiro uma tradição pouco cívica, uma população analfabeta, escravocrata, com base em uma economia latifundiária, monocultural e um Estado absolutista. Pouco ou nada se havia de uma nação, já que a colonização, além da dominação, extermínio e escravização dos povos indígenas que habitavam em território nacional, fundou a colônia brasileira por razões sumariamente econômicas (NOGUEIRA, 1998). Embora não houvesse na historia nacional uma organização das massas para empreender a luta política pela Independência, fazendo desta uma mobilização pacífica e segura, o fato de ter rompido com o estatuto colonial já significou um grande movimento para a formação do Estado brasileiro, já que deixa de colocar-se a mercê das imposições externas para organizar-se por dentro, a partir de sua movimentação interna, condição esta que possibilitou a formação de uma sociedade nacional (FERNANDES, 1989). É importante compreender que, o rompimento com o estatuto de colônia associou-se aos fundamentos do capital por meio do liberalismo. Fernandes (1989) aponta que o liberalismo forneceu as concepções gerais e as bases de pensamento que fundamentaram a reestruturação sociocultural do país em seu processo de modernização, mas não pôde evitar que a reprodução da dominação escravocrata nas relações sociais da nova nação. O autor ainda destaca que o liberalismo “[...] não afetou (nem poderia afetar) os aspectos da vida social, econômica e política que continuaram a gravitar em torno da escravidão e das formas tradicionais da dominação patrimonialista [...]” (FERNADES, 1989, p. 36). O estatuto patrimonialista anunciado pelo autor constituiu importante característica da formação do Estado brasileiro, e continuou a caracterizar a organização do poder no país não apenas no início de sua formação, mas ressoou e ressoa sobre a intervenção do Estado até os dias atuais. Ao encerramento da colônia brasileira para a formação da nação e do Estado brasileiro, não houve no país o que se compreende propriamente como uma revolução burguesa, que associou as bases da entrada e do desenvolvimento do capital no país ao encerramento do antigo processo de produção. Houve, na verdade, uma transfiguração das antigas estruturas em novas organizações, baseadas no capital (FERNANDES, 1989). Nogueira (1998) esclarece esta questão ao afirmar que 13 A revolução burguesa brasileira esteve categoricamente vinculada à conciliação, à busca de composições e acertos concebidos como forma de compensar os grupos e interesses mais identificados com as fases econômicas sociais que desejavam superar. Nada disso impediu o ‘progresso’, a modernização ou o desenvolvimento, que chegaram mesmo a conhecer extraordinária pujança (NOGUEIRA, 1998, p. 92-93). Os mesmo agentes que impunham dominação durante as oligarquias permaneceram no controle, apenas com nominação diferenciada (FERNANDES, 1989). Isso significa que a organização do poder público no país, desde sua gênese, esteve ligada ao poder privado, que detinham a supremacia sobre a organização da colônia, e permaneceram durante o processo de modernização do país. A subsunção do interesse público ao privado, dadas na caracterização patrimonialista no país, foi a condição de formação do Estado brasileiro. Para Fernandes (1989), os novos cidadãos brasileiros eram os mesmos senhores das oligarquias, que usavam-se da nomeação de cidadão para intervir na ordenação da nova nação; As figuras coloniais se transfiguram nos cidadãos do novo tempo. Mais especificamente, os senhores das oligarquias se caracterizaram como os senhores-cidadãos e empreenderam, com base no liberalismo, a defesa da liberdade, justiça, nacionalidade, combate à escravidão, progresso e causa da democracia (FERNANDES, 1989, p.36). Trabalhavam e sinalizavam o caminho da autonomia e supremacia do povo brasileiro, mas de uma pequena parte que se auto nominou “povo brasileiro”. Mantém-se a dominação da nação por parte daqueles que já o tinham quando as oligarquias imperavam. A organização de um Estado e a aparente revolução burguesa serviram de camuflagem da manutenção do governo brasileiro da mesma classe que o antes detinha o poder político. As elites tendiam a afirmar-se como a sociedade civil na formação do estado brasileiro. Neste sentido, para objetivar-se e agir politicamente, no patrocínio de seus interesses gerais, os estamentos dominantes precisavam do aparato administrativo, policial, militar, jurídico e político inerente à ordem legal. E precisavam dele não privada e localmente, mas no âmbito da Nação como um todo (FERNANDES, 1989, p. 45). A própria formação da política social no país segue este mesmo processo, designada pelas especificidades do desenvolvimento do capital na nação. Já se sabe que no Brasil não houve uma revolução burguesa propriamente dita, tampouco, para a conquista das políticas sociais também não houve grandes manifestação da classe operária que pressionasse a administração pública para a questão. As manifestações populares só iniciaram num período 14 posterior à abolição dos escravos, mas especificamente na primeira década do século XX. Para Behring e Boschetti (2010), [...] a criação dos direitos sociais no Brasil resulta da luta de classes e expressa a correlação de forças predominantes. Por um lado, os direitos sociais, sobretudo trabalhistas e previdenciários, são pauta de reivindicações dos movimentos e manifestações da classe trabalhadora. Por outro, representam a busca de legitimidade das classes dominantes em ambiente de restrição de direitos políticos e civis1 (BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 78) E esta, é outra manifestação da contradição fundante do próprio capital por intermédio das bases liberais. Para esta organização na qual uma classe permanecia na dominação, a educação também se configurava como privilégio destes mesmos “cidadãos”. De certo, a história da política educacional brasileira evidencia que a educação foi alvo das preocupações governamentais sempre nos momentos em que os segmentos dominantes da sociedade manifestaram precisão dela. À medida que um novo modo de produção – o capitalismo – emergiu, exigindo uma nova configuração de mão-de-obra, a educação popular foi sendo articulada para suprir esta necessidade, até o momento em que as reivindicações populares passaram a tê-la como um direito (JANUZZI, 2006). É fato que, pela Independência, passaram a ser meios da burocratização patrimonialista, construiu-se um estado nacional mediante a herança colonial ao mesmo tempo em que se usou do liberalismo se como condição para o rompimento com o estatuto colonial. Assim como afirma Fernandes (1989, p. 68) “[...] o que ocorreu com o estado nacional independente é que ele era liberal somente em seus fundamentos formais, [...] na prática, ele era instrumento da dominação patrimonialista ao nível político [...]”. Enquanto meio de dominação patrimonialista o Estado tratava-se como um Estado nacional preparado para servir os interesses econômicos, sociais e políticos dos dominantes e, enquanto fonte de garantia de direitos, configurava-se como um Estado nacional liberal, democrático e moderno (FERNANDES, 1989). Nesse contexto, o acesso das pessoas com deficiência ao universo escolar foi paulatinamente sendo construído a medida que também se construiu e ampliou o acesso da população em geral ao sistema de ensino. E, ao longo da construção de um sistema de ensino 1 Direito civil e político: direito à vida, à integridade física, ao voto, à liberdade, etc. Direitos sociais e culturais: à saúde, à educação, habitação, etc. Direitos econômicos: ao trabalho e salário digno (PEREIRA; VINAGRE, 2007). 15 regulamentado como uma política educacional, a exclusão apresentou-se, sobretudo na figura da pessoa com deficiência (COSTABILE; BRUNELLO, 2005). Pela análise da construção da educação da pessoa com deficiência – em um contexto nacional e mundial – que se propõe alternativas de questionamento e enfrentamento à exclusão na educação, como a educação inclusiva. Portanto, a educação inclusiva construiu-se a partir do desenvolvimento da educação especial2 no país. Concomitante ao desenvolvimento da política educacional, a política de educação inclusiva também enlaça interesses burgueses, ambas são mediadas pela contradição própria do modo de produção vigente. Para Januzzi (2006) enquanto era conveniente, as pessoas com deficiência continuaram segregados da sociedade, e as iniciativas de construção dos espaços educacionais para estas pessoas foram a princípio, empreendidas em função da necessidade de economizar os fundos públicos com asilos e manicômios, considerando que, se educados, estas pessoas poderiam se inserir no universo de trabalho. E, neste mesmo sentido, a própria escola encarrega-se de selecionar aqueles que consideram anormais, aqueles que não correspondem as expectativas da classe dominante da sociedade, pautadas num modelo de normalidade criado a partir do conjunto de valores que a sociedade obedece em dado momento da história. Os primórdios da construção da educação das pessoas com deficiência remontam ao século XVI. Esse período denota o início da construção de uma intervenção governamental para a educação dos deficientes, embora emoldurada como iniciativa do governo delegada a organizações privadas, caráter próprio da constituição patrimonialista do Estado brasileiro. As primeiras manifestações para a educação das pessoas com deficiência mantinham um caráter institucionalizado e, advieram mediante a disseminação das ideias liberais no país, entre os séculos XVIII e XIX, o que reforça os objetivos de mercado impressos em tais tentativas (JANUZZI, 2006). As mesmas preocupações de elite se manifestaram no âmbito educacional. Suas reivindicações propiciaram a discussão do ensino primário pelo governo, mas foram abandonadas e levaram a organização de algumas poucas escolas, que atendiam apenas um pequeno grupo de cerca de 2% (dois por cento) da população, e ainda eram localizadas em territórios restritos (JANUZZI, 2006). Nesse período, a educação das crianças com deficiência teve poucas manifestações e nas configurações já mencionadas, como empreendimentos de 2 Embora a relação com a educação especial na construção da educação inclusiva, vale ressaltar que a inclusão supera a inserção apenas dos sujeitos da educação especial, considerando que não se remete apenas a educação dos deficientes, mas a todos os grupos marginalizados que não participavam do sistema de ensino. 16 pessoas sensibilizadas a temática que tinham apoio governamental precário, já que a preocupação da nação estava em elevar o país ao progresso dos demais estados liberais. No final do século XIX surgiram as primeiras escolas especiais, destinas à educação das crianças com deficiência. Por educação especial compreende-se “[...] o conjunto de serviços educacionais não disponíveis não disponíveis nos ambientes sócio educacionais ‘normais’ ou ‘regulares’ [...]” (FERREIRA, 1995, p. 17). Portanto, ela abrange todos os serviços, atendimentos e outros procedimentos destinados a pessoa com deficiência, pautada em um currículo diferenciado com conteúdos especiais, com metodologia especial, materiais didáticos especiais e recursos humanos especiais, embora ainda empreendesse os mesmos objetivos da escola regular (idem ibdem). Da França vieram escolas especiais para cegos e surdos, embora o ensino para os deficientes se prolongasse em precariedade até a metade do século seguinte. A precariedade de tais serviços destinados à educação geral e a educação das pessoas com deficiência são decorrentes das já mencionadas características que fundaram o Estado brasileiro. Para Nogueira (1998) o próprio processo de formação do Estado nacional criou e fez com que a administração pública convivesse com grandes déficits nas configurações de gestão pública, reflexo do atrofiamento das relações entre as dimensões do fenômeno estatal e as dimensões da sociedade civil. A isso, o autor também atribui responsabilidade ao caráter patrimonialista da formação do Estado. Estas características produziram uma intervenção estatal compreendida como ineficaz e ineficiente, no sentido de responder as demandas da real sociedade civil brasileira com intervenções mediadas por políticas sociais. Sobre este momento da formação do Estado e da construção de sua intervenção, Nogueira (1998) compreende que, Desde cedo, portanto, o setor público, esteve instrumentalizado pelas oligarquias locais/regionais e pelos grupos econômicos dominantes. Acabou, então, por ser fortemente condicionado por interesses, hábitos e estilos do mundo privado, que buscou formatar o espaço público como uma fonte de privilégios pessoais ou grupais e de distribuição de cargos, benesses e prebendas. Como é evidente, tal intimidade entre o mundo público e o mundo privado dificultou a convivência da burocracia estatal com padrões superiores de racionalidade, eficiência e organicidade (NOGUEIRA, 1998, p. 91). A partir da década de 1920, multiplicaram-se a criação das escolas especiais, dando expressividade ao desenvolvimento da educação especial no país (FERREIRA, 1995). Tal manifestação foi parte de um movimento nacional que impulsionou o avanço na conquista de 17 direitos sociais no país, em um período de grande agitação e fomento da população em resistência ao antigo regime oligárquico, que imperou no país até 1920/1930. O rompimento com as bases oligárquicas possibilitou a emergência de um novo regime de governo, que trouxe consigo significativos avanços nos direitos sociais. Embora ainda marcado pela contradição fundante da própria política social, que parte das pressões populacionais e ao mesmo passo é instrumento de “abafamento” social, o período foi um marco na história do desenvolvimento dos direitos sociais da nação, com importantes rebatimentos sobre a organização da educação geral e da educação das pessoas com necessidades educacionais especiais. Desde 1920, fatores internos e externos começaram a operar grandes transformações no antigo sistema oligárquico brasileiro, com grandes consequências no campo econômico, que favoreceu a eclosão de diversos movimentos operários no país. Depois dos operários, o militares é que empreenderam agitos em função das condições do país. A exemplo destas movimentações, em 1922 os jovens oficiais do Rio de Janeiro revoltaram-se. Novamente em 1924, os militares de São Paulo é que se organizaram e chegaram a governar a cidade por alguns dias. Estes uniram-se com outros militares do sul do país em uma marcha que percorreu vários quilômetros país a fora, conhecido como Coluna Prestes, pela liderança de Luiz Carlos Prestes (CARVALHO, 2002). De certo, os militares detinham grande influência no país durante o início da Primeira República, considerando que foram eles os protagonistas da proclamação da República em 1889. Entretanto, as oligarquias haviam assumido a supremacia de governo nos anos seguintes. Sobre isto, as movimentações militares a partir de 1922 pretendiam recuperar o poder militar perdido. Essa fomentação militar caracterizou movimentos de oposição a estrutura oligárquica até então presente no país, assim como ocorrido em outras áreas da sociedade brasileira, como na cultura. Em 1922, a organização da Semana da Arte Moderna em São Paulo também caracterizou uma movimentação de resistência empreendida por artistas plásticos, músicos e escritores de expressividade nacional, que pelas artes exibiam suas críticas ao mundo cultural dominante na realidade brasileira (CARVALHO, 2002). A década de 1930 no Brasil é considerada por Carvalho (2002) como um período decisório para os direitos sociais, pelas constantes e aceleradas mudanças sociais e políticas do período. No início desta mesma década, encerrou-se no Brasil a Primeira República com a Revolução de 1930 Embora a sumária relevância das conquistas do período sobre a organização da intervenção do Estado brasileiro e o consequente avanço na conquista de direitos sociais, 18 Nogueira ainda aponta as heranças coloniais presentes na estrutura, organização e intervenção do Estado. Ele afirma que, Mesmo mais tarde, já na fase da industrialização e do protagonismo estatal, a burocracia continuaria sentindo os efeitos dessa constituição. Apesar de fortemente estimulada pela Revolução de 30, a burocracia brasileira terminaria por ser ‘vencida’ na sua disciplina pela pressão direta dos interesses econômicos dominantes, a que sempre se manteve muito receptiva, especialmente quando se permitiu ao funcionário público acumular o exercício simultâneo e generalizado da atividade na empresa privada e na pública (NOGUEIRA, 1998, p. 91-92). A Revolução de 1930 instaurou no país um período no qual Vieira (2001) nominou de controle da política. A ditadura instaurada por Getúlio Vargas ao mesmo passo em que manifestou as bases da herança colonial, onde a intervenção estatal assume um padrão assistencialista (já que se configurava como a concessão de “favores” da classe dominante, que se auto denominou de sociedade civil brasileira, fundando e assumindo a administração do Estado), expressa na famosa expressão “pai dos pobres”. Embora neste período, houvesse uma dada ampliação em alguns setores, como os trabalhistas e previdenciários em função da movimentação dos trabalhadores, outras concessões foram realizadas como instrumento de afirmação da administração elitizada operante (BEHRING; BOSCHETTI, 2010). No campo da educação, diversas tentativas de reformas importadas dos Estados Unidos, também tiveram grande influência sobre a organização social do país e, sumariamente sobre a educação das pessoas com deficiência. Neste período, a educação das pessoas com deficiência e a educação geral foram fortemente influenciadas por um discurso médico-pedagógico, que agudizou a exclusão na educação – e a exclusão destas da educação. Este discurso, empreendido por Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo e Lourenço Filho, falava em nome da saúde pública. Pregava-se a necessidade de higienizar a população para que o país se desenvolvesse. Higiene esta que se perpetuava nos corpos e mentes da população, tendo em vista que as pessoas pobres e com deficiência eram responsabilizadas para miserabilidade do país e também por reproduzir um tipo psíquico inferior às demais pessoas – da elite brasileira (PATTO, 1998). As deficiências foram associadas a problemas de saúde como sífilis, tuberculose e doenças venéreas. Articulado a estes preceitos, as escolas especiais foram criadas para propagar a educação das crianças “anormais”, considerando que a educação, juntamente com a saúde, foi considerada instrumento para regenerar a população. A criação e disseminação das escolas especiais neste período não tiveram como motivação a educação destes alunos, 19 mas as preocupações médico-pedagógicos – e em nome da ordem e progresso da nação – que legitimaram a exclusão dos deficientes do sistema de ensino, e da sociedade como um todo, para evitar a germinação dos considerados desajustados sociais (JANUZZI, 2006). Ênfase também foi dada ao estudo das diferenças individuais e características que levam ao apartamento dos “normais” e “anormais”, dos correspondentes ao sistema e dos não correspondentes. O sucesso pessoal foi valorizado, e ideologicamente propagada a ideia de que alguns tipos humanos não são bons em desempenho para a sociedade. Estes tipos humanos são aqueles considerados por Apple (1982, p. 194) como “[...] histórica e ideologicamente condicionados [...]” a tal posição social. A ideologia dominante, categoria associada a estes preceitos, transfigura a educação em reprodutora do modelo social dominante (FERREIRA, 1995). Durante este período, as motivações e interesses para a educação das pessoas com deficiência voltadas ao trabalho e desenvolvimento econômico da nação, configuraram uma intervenção estatal ainda precária, mas assumida e executada pelo governo, em escolas especiais públicas – já que em períodos anteriores a tarefa de educar a pessoa com deficiência era delegada a iniciativa privada. O reformismo empreendido pela educação atingiu também outras áreas como a saúde. As campanhas sanitaristas descobriram um Brasil fundado na miséria e precariedade de vida, portanto, carente de intervenção para atenuar tais condições sócio econômicas. Sobre a educação das pessoas com deficiência, esta permanecia delegada as escolas especiais, que embora assumidas indiretamente pelo Estado, ainda cumpriam sua função de maneira precária, discriminatória e excludente. Mesmo com tantos avanços no campo social imputado pelo populismo, o Estado mantinha-se por duas bases: uma racional-legal e outra patrimonialista. Estas bases alimentavam um Estado macrocefálico, nas palavras de Carvalho (1988), já que tinha uma grande cabeça com braços pequenos: administração restrita à corte e intervenção para as províncias e municipalidades limitadas pela herança social da formação do Estado. O autor ainda afirma que desde o Império ao populismo dos anos 30, este caráter permaneceu ávido na administração pública brasileira. Sobre esta mesma administração, Nogueira (1998) afirma que embora o citado caráter hereditário da formação do Estado brasileiro, os anos 1930 também se caracterizaram pelo amadurecimento do Estado, que passou a se organizar e efetivar como uma instituição “político-jurídico-administrativa”. Veremos a seguir que este processo não foi sem lutas e reivindicações por parte daqueles que detém necessidades sociais. 20 1.2 OS MOVIMENTOS SOCIAIS NA LUTA PELOS DIREITOS HUMANOS DA PESSOA COM NECESSIDAES EDUCACIONAIS ESPECIAIS O processo pelo qual o Estado brasileiro organizou-se se fez ao mesmo passo em que sua intervenção no campo educacional e na educação especial foi também se construindo, atreladas às necessidades imputadas pela emergência do capital e pela conquista dos trabalhadores pelos seus direitos. A promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, pela Organização das Nações Unidas no ano de 1948, apresentou alguns princípios que fomentaram os movimentos em prol da educação das pessoas com deficiência. A declaração aponta os direitos inerentes à pessoa humana e amplia a dimensão de direitos que até então eram privativos de determinados segmentos sociais. Neste processo, assegurou à pessoa com deficiência o direito à educação. Também enfatizou a luta contra a discriminação e qualquer outra manifestação de preconceito, características também atreladas à exclusão das pessoas com deficiência da educação (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948). O Artigo XXVI Declaração Universal dos Direitos Humanos afirma tais garantias: 1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. 2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948, p. 1). Embora a Declaração Universal dos Direitos Humanos tenha sido promulgada em 1948, foi somente a partir de 1960 – uma década depois da disseminação acelerada das escolas especiais – que movimentos sociais, fundamentados na própria declaração, fomentaram diversos questionamentos à segregação de modo geral, portanto, também da segregação dos alunos com deficiência do sistema de ensino regular. Tais movimentos empreendiam a luta em função da pessoa humana, questionavam as bases de pensamento hegemônicas e afirmavam-se como organização coletiva. Estes movimentos situam-se como questionamentos a realidade posta, e formam o leque de nuances pelas quais os questionamentos à situação escolar das pessoas com deficiência se construíram. Havia-se instituído uma forma de educar os considerados “ineducáveis”, nas palavras de Mendes (2006), entretanto, pela organização de um sistema 21 paralelo à educação geral/regular. Portanto, embora “educados”, as pessoas com deficiência continuavam segregadas. As respostas a estes questionamentos foram apresentadas por diversos países nas configurações de bases legais3 para assegurar o acesso e permanência dos alunos com deficiência ao sistema regular de ensino (MENDES, 2006). Estava preparado o contexto para a formulação da proposta de integração escolar, disseminada mundialmente a partir de 1970. A integração tem como base o princípio da normalização. Este princípio se originou nos países nórdicos e, pressupõe que as pessoas com deficiência tem o direito de gozar de um estilo de vida considerado normal para a sua cultura, com a mesma oportunidade de participação na comunidade que os demais (MENDES, 2006). Esta mesma ideia é apresentada por Mantoan (1993) ao esclarecer que o princípio da normalização tem como objetivo ampliar o acesso das questões comuns em uma dada cultura às pessoas que por alguma razão foram prejudicadas em seu desenvolvimento. Portanto, a integração pautada na normalização fundamenta a ideia de que todas as crianças devem participar do mesmo ambiente escolar e desenvolver as mesmas atividades. Para Faleiros (1980), este mesmo caráter normalizador está presente na própria constituição e desenvolvimento das políticas sociais em geral, como um caráter ideológico que propaga a estigmatização e controle de uma parte da população. A partir da disseminação do princípio da normalização nos países Europeus e pela América do Norte, diversas ações com o objetivo de integrar as crianças com deficiência possibilitaram a desinstitucionalização destas crianças e sua consequente inserção nas escolas regulares (MENDES, 2006). A integração criou uma inserção parcial dos alunos com necessidades educacionais especiais nas classes regulares, orientada pelo desenvolvimento individual destes alunos, ou seja, o grau de inserção do aluno na classe regular depende exclusivamente do avanço ou retrocesso no desenvolvimento de cada aluno. Esse sistema foi materializado pela criação das classes especiais dentro das escolas regulares. Os alunos com deficiência, ou qualquer outra necessidade educacional especial dividiam a frequência escolar entre os dois espaços, classe regular e classe especial (MANTOAN, 1993). A mesma autora ainda afirma que a integração se organiza com base em um sistema de cascata, com diferentes níveis de inserção na classe regular. Para ela, a cascata possibilitava o trânsito do aluno “da classe regular ao ensino especial” (MANTOAN, 1993, 3 Pode-se considerar que a partir deste momento da historia humana, começou-se efetivamente a construção das bases legislativas que culminaram na política de educação inclusiva. 22 p.4). Mendes (2006) acrescentou ao debate sobre a integração os diferentes níveis desta cascata, apresentando-os como: classe comum, classe com serviços suplementares, classe especial em período parcial ou integral, escola especial, lares e hospitais. Os diferentes níveis de integração nas classes regulares objetivavam oferecer o atendimento conforme a necessidade e desenvolvimento de cada aluno. Nota-se que a tônica da proposta de integração escolar é o aluno. A proposta se desenvolve centrada na adaptação do aluno para corresponder à estrutura escolar. A escola e a classe regular não se modificam em correspondência as necessidades dos alunos, mas os alunos se modificam para corresponder ao que a escola oferece. Ferreira (1995, p. 32) esclarece que neste período, embora a insuficiência da proposta integradora para o enfrentamento da exclusão, houve uma ampliação do acesso à escola com a abertura das classes especiais pelo Estado. Isso significa que o Estado já havia elaborado sua intervenção para a inserção das pessoas com deficiência nas escolas regulares em moldes de uma política social, chamada de política de integração escolar. Durante a década de 1980, esta proposta foi amplamente difundida em esfera mundial. Nesta mesma década, na realidade brasileira, ocorria que o país se organizava a partir do enfrentamento e fim da ditadura militar, imposta desde os anos de 1964. As constantes manifestações da sociedade civil no contexto de encerramento do regime ditatorial apresentavam um cenário propício à ampliação de direitos políticos, civis e sociais. Fruto de intenso debate, em 1988, foi aprovada a Constituição Federal que, formulada num contexto de avanço e consolidação de direitos, também apresentou o direito à educação como afirmação legislativa no Brasil. Sobre a Constituição Federal de 1988, Vieira (2001) esclarece que, Em nenhum momento a política social encontra tamanho acolhimento em Constituição brasileira, como acontece na de 1988 (artigos 6º a 11): nos campos da Educação (pré-escolar, fundamental, nacional, ambiental etc.), da Saúde, da Assistência, da Previdência Social, do Trabalho, do Lazer, da Maternidade, da Infância, da Segurança, definindo especificamente direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, da associação profissional ou sindical, de greve, da participação de trabalhadores e empregadores em colegiados dos órgãos públicos, da atuação de representante dos trabalhadores no entendimento direto com empregadores. O capítulo II, do Título II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais), alude aos direitos sociais, pertencentes à Constituição de 1988 (VIEIRA, 2001, p. 4). Em relação à política educacional, Vieira (2001) ainda afirma que a Constituição de 1988 concedeu amplos direitos neste campo, apresentando a maior importância que área 23 assumiu. A mesma constituição ainda descreve a intervenção no campo da educação assumida essencialmente pelo Estado, em seu Artigo 205, apontando a educação como dever do Estado: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 2012ª, p. 33). Nota-se que a Constituição Federal de 1988 apresenta a educação como direito, descreve o princípio da universalização do acesso à educação pública, gratuita e de qualidade, na medida em que expressa a educação voltada ao desenvolvimento das potencialidades humanas subsidiando o aluno com os recursos necessários para sua aprendizagem. O mesmo artigo faz menção à educação das pessoas com deficiência, afirmando a preferência do atendimento na rede regular de ensino, assim descrito “[...] atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino” (BRASIL, 2012ª, p. 34). Isso significa que, a educação das pessoas com deficiência também passou a ser assumida pelo Estado. Embora tal enunciação no âmbito brasileiro – e a disseminação da proposta de integração escolar no cenário mundial – ainda não se via no país possibilidade de educar ao mesmo tempo e espaço, pessoas com e sem deficiência. O autor ainda aponta que a concepção da educação enquanto direito só pode ser pensada dimensionando-a a partir da Constituição Federal de 1988. No final desta mesma década, algumas críticas começaram a apontar as debilidades do modelo integrador difundido mundialmente. Mendes (2006) aponta que a maioria destas críticas discursava sobre a origem e significado do termo integração, que implicava na sua objetivação de forma equivocada. Para eles, o termo integração designa a união de uma parte ao todo, fazer parte de um todo. A partir deste sentido, a integração escolar apontava como fundamento apenas o acréscimo da pessoa com deficiência ao todo do universo escolar. E, de fato, a base de funcionamento do processo integrador recai sobre a adaptação do indivíduo para pertencer a estrutura escolar, que não se dispõe a nenhuma modificação em função do aluno. Tal impressão também reafirma a ideia de que este mesmo processo impõe uma individualização de um movimento que é social. Ao supor a adaptação do aluno e sua progressiva inserção nas classes regulares, pautadas no desenvolvimento individual do aluno, a integração responsabiliza o aluno por suas mazelas, dificuldades, capacidade de unir-se ao universo escolar regular e, portanto, o responsabiliza pela exclusão que o assola: a exclusão se 24 converte em um “problema individual”. Quando, na realidade, a exclusão se remete à estrutura social, é parte constitutiva de seu funcionamento da sociedade de mercado (SAWAIA, 2010). Tendo em vista os questionamentos apresentado ao processo da interação escolar, no final de 1980, a literatura norte americana apresentou pela primeira vez o uso da palavra inclusão. Dois movimentos de reforma na educação regular dos Estados Unidos resultaram na formulação deste termo, que posteriormente se difundiu para os movimentos europeus e para as demais partes do mundo (MENDES, 2006). O primeiro movimento foi designado de proposta da Iniciativa da Educação Regular. Esta proposta pregava a união dos recursos da escola comum e da escola especial, de forma que os alunos estivessem inseridos nas escolas comuns. Esta proposta não dispensava o uso de serviços da educação especial separadamente, entretanto, assegurava que os alunos fossem apoiados dentro da sala comum, inutilizando a sala de recursos ou classe especial antes pressupostos pela integração. A segunda proposta, a Inclusão Total, posicionou-se de forma radical pela presença em tempo integral dos alunos com deficiência nas classes comuns de acordo com a sua faixa etária. A segunda proposta não tinha a preocupação com o desenvolvimento intelectual do aluno, mas com sua participação, independente das necessidades educacionais dos alunos. Processo este, que reforçava a exclusão em sala de aula tendo como parâmetro para tal as disparidades no desenvolvimento intelectual dos alunos (MENDES, 2006). As duas propostas apresentam algumas concepções comuns e outras divergentes. A partir da convergência destas propostas na ideia da necessidade de unificar o ambiente escolar para alunos com ou sem deficiência, as escolas norte americanos começaram a empreender duas correntes de inserção dos alunos: educação inclusiva e inclusão total. O termo educação inclusiva surgiu nos anos de 1990, com as ideias do termo inclusão, já manifesto em outras áreas de compreensão, mas aplicado ao universo escolar – não na sala de aula ou no aluno (MENDES, 2006). Embora, a origem do termo educação inclusiva esteja ligada a uma reforma do ensino regular norte americano, a ideia da inclusão educacional amplia-se em seu sentido, superando o conceito de reforma. Apresenta-se como um novo paradigma educacional, já que imprime um novo sentido ideológico para a organização da educação. Ao mesmo passo e relevância, alguns movimentos europeus também foram fundamentais para a disseminação da ideia de uma educação inclusiva, como o encontro realizado na Espanha, que resultou na Declaração de Salamanca, em 1994. Este documento foi assinado por diversos países assegurando o 25 compromisso dos mesmas com a luta contra a exclusão na educação e o consequente trabalho para a educação das pessoas com deficiência (JANUZZI, 2006). A educação inclusiva não pode ser considerada uma continuidade da proposta da integração escolar. Diferentemente da integração, a inclusão centra-se na modificação da escola, da estrutura e dos métodos para atender a especificidade do aluno. Neste sentido, a organização escolar é que deve se desenvolver e modificar-se para receber o aluno. A responsabilidade pelo processo educativo e desenvolvimento dos alunos passa a ser da escola. Assim como assegura Januzzi (2006), a educação inclusiva, [...] em vez de focalizar a deficiência da pessoa, enfatiza o sistema de ensino e a escola, bem como as formas e condições de aprendizagem, em vez de procurar, no aluno, a origem de um problema, define-se pelo tipo de resposta educativa e de recursos e apoios que a escola deve proporcionar-lhe para que obtenha sucesso escolar; por fim, em vez de pressupor que o aluno deva ajustar-se a padrões de ‘normalidade’ para aprender, aponta para a escola o desafio de ajustar-se para atender a diversidade de seus alunos (JANUZZI, 2006, p. 188). Os reflexos deste processo começaram a se disseminar na realidade brasileira também a partir de 1990, entretanto, com outras configurações (MENDES, 2006). No país se organizava outros avanços no campo da conquista de direito sociais, embora a conjuntura social pressionasse a organização nacional para o rumo contrário. Em um contexto mundial, a reestruturação produtiva e uma consequente (contra) reforma do Estado imputavam novas configurações às políticas sociais, com refração direta sobre a política educação inclusiva. Este processo assim ocorreu devido a crise econômica vivenciada em escala mundial nos anos de 1980 e 1990. A responsabilidade por tal instabilidade no campo econômico foi atribuída ao Estado e seus gastos com o que se nominava de Estados de Bem Estar Social. Sendo assim, clamou-se por uma nova fundamentação ideológica que ajustasse o Estado as novas necessidades e configurações econômicas. Para isto, as bases neoliberais se apresentaram contundentemente (NOGUEIRA, 1998). Estas novas configurações pressionaram o Estado para reduzir ao máximo sua intervenção na economia. Em contra partida, ao mesmo tempo em que se clamou por tal posição estatal, o acirramento da “questão social” ampliavam suas expressões, aumentando a demanda pela intervenção do Estado (FIORI, 1997). É necessário compreender que neste contexto de restrições da política social, houve no país uma ampliação da conquista destes direitos em diversos campos, como a elaboração da Lei Orgânica da Assistência Social (1993), e a organização do Sistema Único de Saúde (1990) 26 para a área da saúde (NOGUEIRA, 1998). Para a área da educação, nesta década, no campo legislativo brasileiro havia começado a consolidação da proposta da integração 4 escolar, com o documento nominado de Política Nacional de Educação Especial, publicada pelo Ministério da Educação em 1994 (MENDES, 2006). Também no início de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente previu a educação como elemento fundamental e indissociável para o desenvolvimento infantil, assegurando o direito à educação como prioritário (BRASIL, 2012b). O mesmo documento configurou-se como um marco decisório no campo da defesa de direitos da criança e do adolescente, na formulação de uma política social própria para intervir sob este aspecto. Nota-se ainda que neste período, o Estado havia assumido a responsabilidade pela educação das pessoas com deficiência e formulado uma politica própria para estes alunos. A intervenção do Estado para a inserção dos alunos com deficiência na educação regular se formulava legislativamente. Em 1996, foi elaborada pelo Ministério da Educação uma nova lei orientadora para o sistema educacional brasileiro, pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9394/96. Esta lei designa como educação especial a modalidade de ensino oferecida e exercida preferencialmente nas escolas regulares, para os alunos com necessidades especiais, como função imputada ao Estado. Ainda aponta a possibilidade de atendimento especializado e, nas escolas regulares, pressupõe técnicas, métodos, currículos e uma organização específica para atender as necessidades destes alunos (BRASIL, 2012c). É importante clarificar que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 foi criada num contexto de restrição da intervenção do Estado, mas significou uma radical mudança nos rumos da educação nacional, tendo em vista que confirmou os princípios descritos na Constituição Federal de 1988, delegando ao poder estatal a tarefa de empreender o sistema educacional. Vieira (2001, p. 21) aponta tal questão ao afirmar que, “[...] no Direito Educacional, a Constituição Federal de 1988 e, em seguida, a Lei nº 9.394/96 (LDB) mudam essencialmente no campo educacional o regime privado, sujeitando este regime aos princípios constitucionais que guiam a educação brasileira”. No ano de 2001, dois novos eventos demarcaram o avanço do percurso em direção a política de educação inclusiva no campo legislativo brasileiro. O Plano Nacional da Educação 4 No período do auge da proposta da integração escolar em esfera mundial, em 1970 e 1980, ainda proliferavam no Brasil as escolas especiais, e se consolidava as bases para o desenvolvimento de tal modalidade de atendimento as pessoas com deficiência, conforme esclarece Mendes (2006, p. 379) “o início da institucionalização da educação especial em nosso país coincidiu com o auge da hegemonia da filosofia da ‘normalização’ no contexto mundial, e passamos a partir de então a atuar, por cerca de trinta anos, sob o princípio de ‘integração escolar’, até que emergiu o discurso em defesa da ‘educação inclusiva’, a partir de meados da década de 1990”. 27 enunciou diversos aspectos relativos ao desenvolvimento da educação especial nas escolas regulares, entretanto, com os instrumentos da proposta da integração escolar. Tal documento afirmou a participação dos alunos com deficiência na classe regular, com atendimento especializado nas salas de recursos, nas classes especiais ou nas escolas especiais. Também enfatizou a necessidade da formação dos profissionais para atender os alunos com deficiência (BRASIL, 2012d). Em seguida, as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, também apresentaram os aspectos organizativos da educação especial. Expressaram o uso do termo inclusão na legislação brasileira, e reafirmaram as estruturas que operacionalizam a educação especial na educação regular (BRASIL, 2012e). Em 2003 o Ministério da Educação lançou o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, que objetivou orientar os estados e municípios para a implementação da educação inclusiva, prevista para o ano de 2005. O programa se consistiu em um processo de preparação das escolas para a educação inclusiva, por meio da formação de gestores e educadores que atuariam na transformação de sistemas escolares em sistemas escolares inclusivos. O programa foi elaborado para auxiliar municípios pólos na construção de escolas inclusivas, que posteriormente disseminariam as instruções para a implementação do programa nas demais escolas (BRASIL, 2012f). No ano de 2005 foi elaborado o Documento Subsidiário à Política de Inclusão, que apresentou significativas alterações na estruturação da educação inclusiva. O documento previu que as classes especiais, as salas de recursos e as escolas especiais fossem progressivamente extintas para admissão de um novo modelo de atendimento especializado, especificado posteriormente (BRASIL, 2012g). Posteriormente uma série de documentos foram produzidos culminando com a aprovação da Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva no ano de 2008 (BRASIL, 2012h). Desde então, estados e município tem trabalhado na adaptação de suas escolas para transformá-las em escolas inclusivas e fazer cumprir a legislação então aprovada para a questão. 28 2 O SERVIÇO SOCIAL E A CONCEPÇÃO DE DIREITOS HUMANOS 2.1 A RUPTURA DO SERVIÇO SOCIAL COM O CONSERVADORISMO O Serviço Social se configura como uma profissão situada na divisão social do trabalho a partir do antagonismo de classes (CARVALHO; IAMAMOTO, 2008). É, portanto, uma profissão situada na reprodução das relações sociais. Sobre a definição do Serviço Social, o Conselho Federal de Serviço Social brasileiro, após as discussões realizadas na Conferência Mundial de Serviço Social, em 2012, esclarece que a profissão assim se define: O/a assistente social ou trabalhador/a social atua no âmbito das relações sociais, junto a indivíduos, grupos, famílias, comunidade e movimentos sociais, desenvolvendo ações que fortaleçam sua autonomia, participação e exercício de cidadania, com vistas à mudança nas suas condições de vida. Os princípios de defesa dos direitos humanos e justiça social são elementos fundamentais para o trabalho social, com vistas à superação da desigualdade social e de situações de violência, opressão, pobreza, fome e desemprego (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012b, p. 1). A definição de Serviço Social apresentada enfatiza o compromisso da categoria profissional com os direitos humanos e a justiça social, elementos estes que compõem o posicionamento profissional contrária a lógica da desigualdade imputada pelas configurações da produção burguesa. Os princípios que orientam a profissão para o direcionamento acima citado referenciam-se no projeto ético-político profissional, consenso decorrente das lutas da categoria profissional para romper com as bases conservadoras que fundamentavam a profissão. Esse movimento designa o próprio processo de construção da profissão. Para Iamamoto (1994) o Serviço Social emergiu como parte do movimento social empreendido pela Igreja, articulando as bases confessionais e a ação da Igreja a necessidade de formação social e doutrinaria de grupos leigos que se relacionavam com a Igreja, denominados pela autora, de laicato. A autora ainda esclarece que com o fim do sistema oligárquico, a Igreja perdeu o seu poder de dominação, em função da abertura do Estado para a entrada do capital no país, entre as décadas de 1920 e 1930. A relação entre Igreja e Estado ficou tensionada, o que levou a Igreja a se fortalecer na busca de recuperar o sistema hierárquico que lhe conferia poder. Para isto, empreendeu-se veemente em organizar e preparar seus grupos intelectuais laicos para evangelizar a sociedade, reconvertê-la aos princípios que antes governavam a vida em sociedade. 29 Este movimento é denominado por Carvalho e Iamanoto (2008) como Reação Católica, e objetivou recristianizar a sociedade burguesa com base em um comunitarismo cristão, retirando da sociedade tanto princípios liberais como a ameaça comunista. Como recurso a esta missão, a Igreja também trabalhou pelo reconhecimento de suas funções e influência no Estado. Com a entrada do capitalismo e a produção industrial no país, as refrações da “questão social” se intensificaram. As mobilizações da classe operária até 1930 constrangeu a Igreja, o Estado e a classe dominante – que se punha no aparato do Estado formulando sua intervenção – a se posicionarem diante da “questão social”. A compreensão da Igreja sobre as expressões da “questão social” são baseadas nas encíclicas papais descritas na Rerum Novarum5, documento este que também direcionava as ações da Igreja para os chamados problemas sociais. Sobre isto Iamamoto (1994) afirma que, Para Igreja, “questão social”, antes de ser econômico-político, é uma questão moral e religiosa. A sociedade é tida como um todo unificado, através de conexões orgânicas existentes entre seus elementos, que se sedimentam pelas tradições, dogma e princípios morais de que a Igreja e depositária (IAMAMOTO, 1994, p.18 grifo da autora). Para Carvalho e Iamamoto (2008), no seio do movimento da Reação Católica surgiram algumas instituições assistenciais como a Associação das Senhoras Brasileiras, no Rio de Janeiro, e a Liga das Senhoras Católicas em São Paulo, que já apresentavam diferenciações quanto às atividades tradicionais da caridade. Estas instituições tiveram relevância considerando que é a partir de seu desenvolvimento que se colocaram as bases para a expansão do Serviço Social na década seguinte. Os autores ainda destacam que o elemento humano e a base que viabilizou o surgimento da profissão se formularam pelo misto entre a caridade tradicional e o apostolado social, aqueles dirigidos à classe operária. Como consequência deste mesmo processo, em 1932 surgiu em São Paulo o Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo (CEA), apontado por Carvalho e Iamamoto (2008) como a expressão original do Serviço Social no Brasil. Tal centro, assim como outros grupos, impulsionaram a emergência do Serviço Social como 5 Nesta encíclica, o Para Leão XIII descreve a defesa aos trabalhadores, fazendo uma crítica as condições nas quais os trabalhadores eram submetidos nas fábricas. Ainda expõe a defesa dos salários, os deveres do trabalhador e se posiciona contrario ao trabalho de mulheres e crianças e ao marxismo, defendendo também a propriedade privada como direito de garantia de independência. A encíclica aponta que a situação do operário só poderá ser resolvida dentro do catolicismo, e para o conflito vivenciado entre capital e trabalho, Leão afirma a necessidade de harmonizar estas classes que se complementam (SILVA JÚNIOR; BATISTA, 2008). 30 agente para a formação doutrinária e militância dirigidas a resolução dos problemas sociais. Iamamoto (1994) esclarece essa implicação na emergência da profissão ao afirmar, O serviço social aparece aos militantes desses movimentos como alternativas profissionalizantes as suas atividades de apostolado social, num momento de profundas transformações sociais e políticas. A ação social e a ação católica logo se tornam uma das fontes preferenciais de recrutamento desses profissionais (IAMAMOTO, 1994, p. 19). Ao mesmo passo em que Centro de Estudos e Ação Social apresentou tal demanda pela especialização dos agentes por uma formação técnica, também apresentou outras demandas oriundas do próprio Estado. Para Netto (2001), estas demandas decorrem da assunção dos agentes de novas funções, que solicitaram um posicionamento diferente da caridade tradicional que se colocasse ausente das intenções dos agentes. Sobre isto, Netto (2001) aponta que o período descrito situa as determinações sociais, políticas, econômicas, teóricas e culturais de um dado momento histórico que possibilitaram a emergência da profissão. Para o autor, sem que houvesse as condições concretas formuladas pela confluência destes elementos, não seria possível compreender a história do Serviço Social. O autor ainda esclarece que o fato das protoformas do Serviço Social relacionarem-se intimamente à Igreja cria, para alguns autores, o falseamento de que a constituição da profissão se deu por um processo de continuidade da Igreja, como se a profissão se constituísse da filantropia organizada Para o autor, é inegável a relação da profissão com as formas de filantropia e assistencialismo organizadas pela Igreja deste a emergência do capital. Entretanto, esta relação de continuidade coexistiu com uma relação de rompimento, decisiva na constituição do Serviço Social como profissão. Aos poucos, os agentes profissionais assumiram novos papeis em projetos interventivos cuja ação independe da intenção do profissional. E é esta entrada dos agentes em novos papeis que rompem com a caridade, e marca a profissionalização do Serviço Social (NETTO, 2001). Portanto, a profissão emerge de um contexto que demanda sua intervenção, a princípio surge ligada aos movimentos femininos da Igreja, mas rompe com este estímulo ao adentrar em novos campos. Sobre a profissionalização do Serviço Social, Netto (2001) afirma que, O caminho da profissionalização do serviço social é, na verdade, o processo pelo qual seus agentes – ainda que desenvolvendo uma auto representação e um discurso centrados na autonomia dos seus valores e da sua vontade – se inserem em atividades interventivas cuja dinâmica, organização, recursos e 31 objetivos são determinados para além do seu controle. [Os agente ...] passam a desempenhar papeis que lhes são alocados por organismos e instâncias alheios às matrizes originais das protoformas do Serviço Social [...] (NETTO, 2001, p. 71-72). Pela do Centro de Estudos e Ação Social é fundada em 1936 a primeira escola de Serviço Social. A partir da década de 1940, expandiu-se a necessidade de profissionais diplomados. Para Carvalho e Iamamoto (2008) as atividades desenvolvidas pelos profissionais eram restritas, e ainda carregavam os elementos do discurso da doutrina da Igreja. Os autores ainda afirmam que neste período inicial da profissão, a caridade passou a usar os artifícios da ciência e da técnica, desenvolvendo um serviço direcionado à pessoa humana. A caridade passa a utilizar os recursos que a ciência e a técnica lhe oferecem; mobiliza, além dos sentimentos, a inteligência e a vontade para o serviço da pessoa humana. O Serviço Social representa uma evolução dos antigos métodos, favorecida pelas descobertas cientificas, pelo desenvolvimento dos estudos sociológicos e, principalmente, pela intensidade e complexidade dos problemas sociais presentes. Isso o distingue das antigas formas de assistência (CARVALHO; IAMAMOTO, 2008, p. 201). Outro elemento que diferencia o Serviço Social da caridade tradicional é a própria formatação da intervenção, já que propõe uma ação educativa com as famílias operárias, como medidas de prevenção aos problemas sociais – as antigas formas de caridade pautavamse mais especificamente sobre a cura destes problemas (IAMAMOTO, 1994). Neste momento, a profissão ainda desconhecia o caráter de classe destes problemas sociais, como resultado do antagonismo de classes, e atua sob uma perspectiva doutrinária e moralizadora. Tais ações exprimem o caráter conservador que mediatizou a emergência da profissão, laço este que só foi rompido pela categoria após um longo processo de amadurecimento das várias dimensões do Serviço Social. Sobre o conservadorismo, Iamamoto (1994) ainda aponta que a profissionalização e institucionalização do Serviço Social se deram sob a influência de vertentes empiristas das Ciências Sociais, principalmente do pensamento norte americano. Para a autora, o pensamento conservador supõe um modo de vida do passado resgatado para interpretar o presente, como um conteúdo próprio e viável ao capitalismo6. 6 Iamamoto (1994) esclarece a viabilidade do pensamento conservador ao capital ao afirmar que quando se recorre “as categorias típicas do racionalismo capitalista, elabora-se a exaltação deliberada de formas de vida que já foram historicamente dominantes, e que passam a ser consideradas válidas para a organização da sociedade atual” (idem ibdem p. 22). 32 A influência norte americana expressou-se também a partir do 2º Congresso PanAmericano de Serviço Social, em 1945, que reafirmou o peso das bases de discussão norte americana sobre a profissão na América Latina. Com esta fundamentação, a profissão no Brasil caracterizava sua intervenção para os casos individuais (CARVALHO; IAMAMOTO, 2008). O 1º Congresso Brasileiro de Serviço Social se realizou em 1947. Em 1950 já estava se gestando no interior da profissão um processo de erosão das bases tradicionalistas que até então fundamentavam o Serviço Social. Esse movimento se exprime no final desta mesma década, quando movimentos jovens da profissão empreendem questionamentos sobre o histórico de subalternidade da profissão, exigindo novas bases teóricas e culturais. Para Barroco (2001) este movimento já indica uma agitação questionadora ao Serviço Social tradicional. Nos anos seguintes, a ditadura militar imprimiu um conjunto de determinações que possibilitaram a emergência de um processo de renovação no Serviço Social. Netto (2001) compreende que este processo de renovação da profissão se exprime por três vertentes: modernização conservadora, renovação do conservadorismo e a intenção de ruptura. Durante a década de 1960, os marcos da ditadura militar configuraram um período de negação da liberdade, o que propiciou a construção das lutas em função da mesma. Netto (1991) afirma que a inquietação por ruptura com as bases tradicionais da profissão estava ligada justamente ao crescimento e fortalecimento dos movimentos populares democráticos que efervesciam nesta luta em função da liberdade. As incidentes contestações 7 políticas e culturais que enfrentavam a ditadura propiciaram o fortalecimento dos questionamentos aos valores vigentes, ampliando a capacidade de escolha. Momento este que para Barroco (2001) é favorável à ruptura com esses valores dominantes. No período pós 1964, o Estado fez novas demandas à profissão, que consolidam a necessidade de um projeto de renovação em seu interior. Neste período, a necessidade de renovação da profissão e a conjuntura social, política e econômica, que ao mesmo passo celebrava o conservadorismo e vivenciava os questionamentos à ditadura, possibilitaram espaço para a percepção de outros projetos profissionais. No Serviço Social, o processo de renovação da profissão iniciado pela vertente modernização conservadora, se manifestou na mudança de discurso, métodos e no próprio projeto profissional nas estratégias de controle da população trabalhadora. A profissão passou a aperfeiçoar seus métodos, o instrumental operativo e as metodologias de análise. O discurso 7 Barroco (2001) lembra que este movimento de questionamento é vivenciado por outros países da América Latina. 33 profissional se aproximou das Ciências Sociais, assumindo uma perspectiva fundamentada no positivismo, voltada a mudança de hábitos, comportamentos e atitudes do trabalhador para adequá-los ao momento histórico do país. Este diálogo com as teorias das Ciências Sociais se manteve ligado à base tomista8, presente desde a emergência da profissão (IAMAMOTO, 1994). Durante o período em que esta vertente se manteve ávida, a profissão elaborou outros Códigos de Ética, nos anos de 1965 e 1975. Estes códigos permaneceram fieis ao tradicionalismo profissional. Ainda mantinham uma orientação tomista, que reproduz a ideologia centrada na visão humanista cristã, com uma perspectiva acrítica, despolitizada e deslocada das relações sociais (BARROCO, 2001). Embora com a mesma orientação, o Código de 1965 apresentou algumas modificações em relação ao Código de 1948. Em 1948, a profissão foi tratada como um elemento homogêneo, o que em 1965 é rompido para anunciar a existência de várias concepções na profissão, denominada de pluralismo. Em 1975, esta dimensão foi excluída do código formulado neste ano. Assim como neste mesmo código outras dimensões como a democracia também são retiradas, processo este que exibe o movimento da profissão em adaptar-se as demanda da ditadura. Netto (1991) aponta que o Código de 1975 já indicava outra vertente do movimento de renovação da profissão, a reatualização do conservadorismo. Este momento se caracterizou, sobretudo pela assunção da fundamentação fenomenológica para orientar a profissão. Mais especificamente, sobre as concepções do personalismo, que se caracteriza por qualquer doutrina que afirme o primado da pessoa humana sobre os elementos materiais que o sustentam. Portanto, a centralidade da teoria fenomenologia expressa pelo personalismo está na pessoa humana. Para Barroco (2001) o uso da fenomenologia pela reatualização conservadora se apresentou como um método de ajuda psicossocial fundado na valorização do relacionamento humano e inaugurou a perspectiva psicologizante das relações sociais. As mazelas dadas pela “questão social” foram desvinculadas dos processos sociais e individualizadas. A doutrina tomista baseava-se na dimensão humana, mas orientada para a adaptação em função das demandas sociais, assumindo um caráter mais positivo, centrado na sociedade e na harmonia dos indivíduos para o bom andamento da ordem social. Já o personalismo centra-se no ser humano em detrimento à sociedade. E neste sentido, as duas posições 8 Doutrina propagada pela Igreja e advinda das postulações de Tomás de Aquino: centralidade da dignidade humana (SILVA, 2003). 34 colocam-se como opostos. Essas duas vertentes que influenciam o serviço social marcam os projetos de intervenção que marcam o enfrentamento da “questão social” desde o fim do século XIX, até o período posterior as duas grandes guerras mundiais. A erosão do conservadorismo no Serviço Social possibilitou a emergência de um movimento de renovação e o pluralismo que, ao identificar outras perspectivas ideológicas e políticas para a profissão, possibilitou também a manifestação de uma vertente crítica. Nestes mesmos anos, uma parcela dos profissionais faz a opção em participar civil e politicamente do momento do país, ampliando sua consciência crítica. A profissão se aproximou do marxismo e iniciou sua trajetória rumo ao compromisso com a classe trabalhadora. O Serviço Social começou a produzir uma literatura voltada à compreensão do significado da própria profissão, engajando-se nos debates latino-americanos e na busca de elementos que permitisse a superação de seus equívocos (BARROCO, 2001). Em 1980 e 1990, essa vertente se expressou no que Netto (1991) nomina de intensão de ruptura. Esse movimento começou a ser gestado no interior das universidades, e o autor destaca a experiência de Belo Horizonte como um importante momento de fomento desta perspectiva. Nesta experiência, o grupo de jovens da Universidade Católica de Belo Horizonte elaborou o Método de Belo Horizonte9, que se caracterizou por uma critica teórico e prática ao tradicionalismo profissional, propondo uma alternativa para romper com o conservadorismo presente na profissão. O movimento da intenção de ruptura se fortaleceu no âmbito acadêmico, recuperando as postulações do Método de Belo Horizonte. A profissão se engajou politicamente na resistência à ditadura, rompendo com os valores burgueses e assumindo a escolha por valores emancipatórios, movida pela intenção de romper com seus próprios entraves. No fim de 1970, o chamado Congresso da Virada10, do III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS), demarcou a organização da profissão nas lutas dos trabalhadores, a resistência à ditadura, a oposição aos fundamentos conservadores de tradicionalistas da profissão e a defesa da democracia (BARROCO, 2001). Sobre o Congresso da Virada, a autora ainda afirma que, A partir desse marco, no contexto da reorganização política da sociedade civil, em defesa da democracia e da ampliação de direitos civis e sóciopolíticos, os valores ético-políticos inscritos no projeto profissional de ruptura adquirem materialidade, o que se evidencia na organização política da categoria, na explicitação da ruptura com o tradicionalismo profissional e 9 O método foi interrompido em 1975, pela demissão de seus formuladores e gestores (NETTO, 1991). Neste congresso, os profissionais substituíram a mesa de honra, composta pelos representantes da ditadura, por uma homenagem aos trabalhadores que lutaram pela democracia e pela liberdade (BARROCO, 2001). 10 35 no amadurecimento da reflexão de bases marxistas (BARROCO, 2001, p. 167-168). A aproximação da profissão com o marxismo possibilitou a superação de equívocos antes recorrentes no que tange auto representação da profissão, que passou a ser compreendida como pela sua inserção na divisão do trabalho. Mesmo após a clara assunção dos fundamentos marxistas como base para o projeto de ruptura, a profissão continuou seu processo da amadurecimento dentro da sua fundamentação teórica (BARROCO, 2001). Esta questão se evidenciou, por exemplo, em relação aos Códigos de Ética formulados em 1986 e 1993. Ambos exprimiam o projeto de ruptura, entretanto, como momentos diferenciados do processo de amadurecimento da profissão dentro da teoria marxista. O Código de 1986 expressou formalmente a ruptura com o tradicionalismo, afirmando a assunção de uma ética profissional objetivadora de valores anticapitalista. Entretanto, a discussão sobre os fundamentos éticos que embasariam a o projeto de ruptura da profissão permaneceram carente neste período (BARROCO, 2001). A superação destas fragilidades apresentadas no Código de 1986 foi concretizada no Código de 1993, que apresentou o debate ético. Firmou-se neste período o compromisso da categoria com um projeto ético-político de caráter crítico, vinculado às classes subalternas, em defesa a democracia, aos direitos humanos, e orientado para a emancipação humana (idem ibdem). A orientação marxista assumida pela profissão dado o rompimento com o tradicionalismo, com a herança conservadora no Serviço Social, assim como a assunção de novos princípios ético-políticos pela categoria profissional não significa que o conservadorismo foi superado no interior da categoria por completo. Esta superação se coloca como uma luta cotidiana da categoria profissional. 2.2 A CONCEPÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E O PROJETO ÉTICO POLÍTICO DO SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO A história do Serviço Social brasileiro evidencia que o conservadorismo influenciou a profissão fortemente. Os Códigos de Ética profissionais, construídos ao longo do desenvolvimento da profissão, exemplificam esta relação: o primeiro Código organizado, em 1947, assinalou a gênese conservadora da profissão e o Código de 1986, assinalou o rompimento com a concepção tradicional, amadurecido posteriormente no Código de Ética de 1993. 36 Barroco (2009) afirma que a grande particularidade que assinalou o rompimento com a tradição conservadora foi defesa de um projeto ético político vinculado a uma perspectiva de sociedade de enfrentamento as precariedades dos valores éticos da sociedade burguesa. Para compreender de que modo a profissão construiu um projeto profissional pautado em tais configurações, é necessário compreender o que são os projetos profissionais. Netto (2006) esclarece que os homens sempre agem teleologicamente, isto é, as ações humanas são orientadas para um objetivo/fins. Ação humana individual ou coletiva, com base nas necessidades, cria um projeto, com a antecipação de finalidades que se quer alcançar, com a implicação de determinados valores que legitimam tal projeto e os meios para alcançá-lo. Dentre os projetos coletivos, há também os projetos profissionais, que apresentam a imagem de uma profissão, com os valores que a legitimam socialmente, assim como os requisitos teóricos e práticos, os objetivos e as funções para o exercício profissional (idem ibdem). A partir da década de 1980, a profissão iniciou a construção de um projeto profissional de rompimento com as bases conservadoras do Serviço Social. Esse processo se materializou no Código de Ética de 1986. Sobre o Código de 1986, Barroco (2001) esclarece que de fato ele foi a expressão formal da ruptura ética com o conservadorismo no Serviço Social, levando as reformulações que marcaram o projeto comprometido com as classes subalternas, numa nova direção ético-política. O Código de 1986 ainda carecia de amadurecimento dos pressupostos éticos que orientaram o movimento de ruptura e as novas bases da intervenção profissional. Não apontavam uma revisão para as disciplinas que subsidiam esta reflexão, a filosofia e a ética. Embora teoricamente não problematizada, a ética que expressa um projeto de ruptura se manifestou neste código. Nas formulações de 1986, já não se apresentavam valores antes propagadas como orientadores da profissão, como o mecanicismo, o voluntarismo, e o moralismo. Fato este dado em consequência do amadurecimento teórico e político da profissão pela apropriação do pensamento marxista (BARROCO, 2001). Barroco (2001) afirma que para ampliar a reflexão ética ainda carente no referido Código de Ética de 1986, fez-se necessário novas alterações, materializadas no Código de 1993, consolidando o projeto de ruptura profissional. Portanto, as formulações de 1993 apresentavam um novo conjunto de valores e princípios orientadores da profissão, que se coloca na contramão da ideologia dominante e na propagação da ideologia das classes trabalhadoras. A mesma autora ainda esclarece que a ética profissional é uma dimensão característica do Serviço Social. Para ela é a ética profissional que vincula a profissão às determinações que 37 legitimam o Serviço Social na divisão social do trabalho, que a localiza nos marcos da sociedade capitalista, demarcando a partir daí a sua origem enquanto profissionalização do trabalho e sua trajetória histórica. Neste sentido, a ética profissional se objetiva mediante a ação moral, que se dá no exercício pratico da profissão pelas normas, pelos deveres, pelos valores que orientam o profissional via Código de Ética, pelas concepções teóricas que sustentam a profissão e pela reflexão destes aspectos como ação ético-política (BARROCO, 2001). Sob estes valores éticos, Barroco (2009) aponta que a adesão a um projeto profissional e o pertencimento dos profissionais se dá na medida em que o mesmo corresponde às necessidades dos profissionais, aos seus ideais e a visão de sociedade que os mesmos empreendem. Netto (2006) ainda esclarece que dentre os projetos coletivos, os projetos societários são aqueles que reclamam uma dada imagem de sociedade a ser construída, com base em valores que justificam esta imagem de sociedade e determinam a escolha dos meios para sua construção. Os projetos societários elencam propostas macrossociais para o conjunto da sociedade e são, simultaneamente, projetos de classe, que concorrem pela adesão da sociedade, tendo como base a democracia política. Neste sentido, os novos valores assumidos pelo Serviço Social, caracterizados pela vinculação aos interesses da classe trabalhadora e rompimento com a hegemonia da sociedade de mercado, supõe uma nova visão de sociedade. Portanto, a ética profissional do Serviço Social se vincula a novas escolhas políticas, que reclamam outra perspectiva de sociedade: a construção que relaciona ética profissional a uma nova perspectiva societária denomina-se projeto ético-político. Diante destas considerações sobre o projeto ético-político do Serviço Social, construído historicamente num movimento de ruptura com as bases conservadoras que emolduravam a profissão e expresso a partir das postulações do Código de Ética de 1993, é necessário compreender que a ética é elemento integrante da prática social humana, objetivando-se no cotidiano e nas formas de práxis que levam a ampliação da consciência humana (BARROCO, 2008). O desenvolvimento ético do ser humano leva a construção de alguns conceitos que se relacionam intrinsecamente as novas bases éticas assumidas pela profissão. Cabe, portanto, compreender esta construção humana enquanto ser ético para compreender os conceitos que fundamentam o projeto ético-político do Serviço Social. Para Barroco (2001), a constituição ontológica do ser social é que confere sua natureza ética. Ao transformar a natureza em função de suas necessidades, pelo trabalho, o ser humano constitui-se como um ser diferente dos demais existentes. O trabalho, como categoria central para a construção ética do ser humano, instaura um novo ser ao passo que permite ao homem 38 romper com a supressão das necessidades imediatas, como atividade puramente instintiva. Pelo trabalho, o ser humano cria uma atividade, compreendida pela autora, como atividade prática-social: uma práxis social. Para ela, a práxis consiste na transformação da natureza em um produto antes inexistente, produto este em respostas as necessidades sociais de dado momento histórico do desenvolvimento humano. A mesma autora esclarece que, Como práxis, o trabalho é a base ontológica primária da vida social; mediação que efetiva objetiva e subjetivamente o intercâmbio entre os homens e a natureza, pondo em movimento um processo incessante de (re) criação de novas necessidades; ampliando os sentidos humanos, instaurando atributos e potencialidades especificamente humanas (BARROCO, 2009, p. 5). Criar alternativas para supressão de suas necessidades só é possível porque há no homem um salto ontológico, que marca o momento no qual o homem se distancia dos demais seres, iniciando seu processo de construção enquanto ser social (BARROCO, 2008). A capacidade teleológica do ser humano, como já mencionada em Netto (2006), o faz planejar a finalidade sua ação antes que a execute. Essa capacidade, ao aliar-se ao trabalho, faz com que os homens desenvolvam-se como seres conscientes. Portanto, o trabalho é práxis que se coloca como mediação para responder as necessidades humanas, e o faz desenvolver-se como ser consciente, racional levando a transformação de seus sentidos livre e criativamente. A autora ainda esclarece esta questão ao afirmar que, “o homem se desenvolve como um ser consciente, universal e livre, capaz de produzir sem a necessidade física e, de fato, quanto mais dela se afastar, mais livre será sua produção e sua autoconsciência de sujeito transformador da natureza” (idem ibdem p. 21). É nesta construção histórica do ser humano que se criam as possibilidades dele agir como ser ético, já que, enquanto se distancia dos demais seres na sua relação com a natureza, ele cria mediações que ampliam seu domínio sobre a natureza e sobre ele próprio (BARROCO, 2009). A mesma autora ainda afirma que, A ética – entendida como modo de ser socialmente determinado – tem sua gênese no processo de autoconstrução do ser social. Sob este prisma de análise social e histórica, entende-se que o ser social surge da natureza e que suas capacidades essenciais são construídas por ele no processo de humanização: ele é autor e produtor de si mesmo, o que indica a historicidade de sua existência, excluindo qualquer determinação que transcenda a historia e o próprio homem (BARROCO, 2008, p. 20 grifo da autora). 39 A ação transformadora do homem, ao criar alternativas para suas necessidades – alternativas estas que se recriam conforme surgem novas necessidades – abrem possibilidades de escolha entre as alternativas criadas. O desenvolvimento da consciência imputa ao homem a necessidade de decidir conscientemente (BARROCO, 2008). Tais escolhas são baseadas em valorações. A decisão/escolha é feita por meio de juízos de valor. Portanto, a escolha consciente do ser humano contém um posicionamento de valor que o faz decidir entre as alternativas criadas para sua sobrevivência social. Sendo assim, compreende-se que a escolha entre as alternativas criadas não se trata de apenas escolher entre uma ou outra, mas se refere a uma posição de valor, escolher entre aquilo que tem e que não tem valor. Neste sentido, liberdade de escolher entre as alternativas, o valor que as mesmas possuem, a consciência para esta escolha e as próprias alternativas são elementos que se articulam (BARROCO, 2001). Sendo assim, a ética envolve a transformação do ser humano na medida em que exige do mesmo o uso da escolha entre valores, exige posicionamento, portanto, exige o desenvolvimento da consciência humana, e isto se dá pela construção do próprio ser social em seu processo de humanização pela mediação do trabalho. Tudo aquilo que se desenvolveu pelo trabalho é compreendido como riqueza humana, e esta riqueza é que permitiu ao homem criar-se enquanto ser social. O agir eticamente suscita o uso da consciência, e a consciência, como criação do próprio homem mediada pelo trabalho, pertence à riqueza do gênero humano. Portanto, a ética envolve as conquistas humano-genéricas, e faz com que o homem tome contato/se eleve a estas conquistas, com a sua produção. Como categoria transformadora do ser social, ela permite que ele próprio objetive a liberdade, a sociabilidade, a capacidade teleológica e a emancipação do gênero humano (BARROCO, 2009). Na sociedade de mercado, a contradição fundante entre capital e trabalho, a exploração do trabalhador e a divisão entre as classes sociais restringe o agir eticamente, tendo em vista que no processo de produção material e, portanto, do próprio ser, ela o afasta de seu produto, o que se denomina de alienação. O desenvolvimento do gênero humano como produção material e subjetiva do ser social não é apropriado por todos os indivíduos, pelas características da produção burguesa, na qual o trabalhador se afasta de seu produto, que passa a pertencer ao dono dos meios de produção (BARROCO (2008). A partir do exposto, questiona-se então, de que forma se propaga na sociedade burguesa esta perspectiva alienante que limite a realização do agir eticamente? Sobre isto, Barroco (2008) esclarece que a moral é parte da historia do ser social, portanto, ontologicamente o elemento moral é uma mediação entre as relações sociais construídas pelo 40 homem. Ela é o elemento que media a relação do individuo com aquilo que pertence ao gênero humano, é o elo entre o singular e o humano-genérico. É também a moral que regula o comportamento dos indivíduos, participa na formulação das regras sociais, dos costumes, dos hábitos, normas, deveres e de tudo mais que regula a conduta dos indivíduos na vida em sociedade. A moral – assim como a ética – também exige o uso da consciência, é criada pelos homens, mas a escolha destes em relação a moral depende do contexto histórico em que vive. Assim como, o ato moral que supõe a adesão consciente dos homens a valores éticos também depende das condições socais e históricas nas quais esta moral se concretiza. Dependendo do contexto social no qual esta moral se objetiva, ela permite ao ser humano mais contato com questões individuais ou com questões coletivas/humano-genéricas. E como já elucidado, esta segunda dimensão é que permite de fato a expressão ética dos indivíduos enquanto ser social (BARROCO, 2008). Na sociedade de mercado, a moral é responsável por perpetuar ideologicamente os interesses da classe dominante. Na medida em que a moral se expressa como reguladora das relações sociais na sociedade burguesa, imputa aos homens a assunção dos valores da mesma classe dominante, tendo em vista que neste sistema econômico e social a liberdade de escolhas de valores dados pela ética, é restrita em função da alienação, produto do próprio meio de produção (BARROCO, 2001). Para Barroco (2008) na sociedade capitalista a moral contribui para o controle social pela difusão dos valores que objetivam a manutenção desta mesma sociedade. Esta reprodução se faz mediante o cotidiano da vida social dos indivíduos. Neste cotidiano a moral tende a se tornar concreta de modo alienado, reproduzindo os valores e escolhas com base em juízos de valor que atendem apenas as necessidades imediatas do individuo particularizado, singular. As escolhas são acríticas e não se voltam a supressão das necessidades com base na coletividade, não são voltadas ontologicamente as necessidades humano-genéricas, muito menos propiciam o contato com as riquezas produzidas nesta mesma dimensão. Como já elucidado, a moral como laço, como mediação entre o indivíduo singular e a dimensão humano-genérica, não responde apenas aquilo que se coloca como necessidade individual, que representa e reproduz a alienação. A moral envolve também o uso da consciência, de escolhas que se afastem da cotidianidade, e que elevam o indivíduo a sua dimensão humano genérica. Esta outra face permite ao homem agir como um sujeito ético. Na medida em que propicia a crítica ao cotidiano e as formas de reprodução da alienação nele 41 intrínsecas possibilita que o homem ultrapasse sua dimensão particular para o coletivo, para o ser ético. Tal concepção converge para a assertiva de que em dadas condições históricas e sociais que motivem o individuo a escolher por valores emancipatórios, este pode ter a possibilidade de estabelecer outras mediações que rompam ou ultrapassem a singularidade e os faça ascender à condição de ser ético. A reflexão ética propicia a crítica a cotidianidade, a moral nela reproduzida, e leva a ampliação das escolhas conscientes do individuo, agora voltadas a dimensão humano-genérica, que reclamam a riqueza humana, a emancipação, a liberdade e o compromisso com projetos da esfera coletiva (BARROCO, 2009). É com estes valores – liberdade, emancipação humana, riqueza humano-genérica, a escolha consciente – que o projeto ético político do Serviço Social se compromete. Ao vincular-se a um novo projeto societário, a profissão reclama as condições sócio históricas para a efetivação destes valores éticos. Articulada a estes valores, o Código de Ética de 1993 ainda expressa como princípios fundamentais que orientam a profissão: Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas políticas a ela inerentes –autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais. Defesa intransigente dos direitos humanos e recuso do arbítrio e do autoritarismo. Ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa primordial de toda sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis sociais e políticos das classes trabalhadoras (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012a, p. 17). O referido código aponta a categoria trabalho como elemento central na construção do homem como sujeito ético e criador de valores, revelando que em sua construção enquanto ser ético o ser humano articula valores que são ético-políticos como: “[...] a liberdade, a justiça social e a democracia, e ao conjunto de direitos humanos (civis, políticos, sociais, culturais e econômicos) defendidos pelas classes trabalhadoras [...]” (BARROCO, 2009, p. 18). Dentre estas categorias, destaca-se o compromisso do Serviço Social, dado pelas especificidades já apresentadas, com a garantia de direitos e os direitos humanos. Para prosseguir na compreender da relação do Serviço Social com os direitos humanos, faz-se necessário ainda recorrer a história que situa a construção deste direitos e possibilita a compreensão das várias dimensões que o emoldura. É neste sentido que Pereira e Vinagre (2007) afirmam a necessidade de situar o conceito dos direitos humanos nas suas origens, a partir das experiências que lhe deram vida, na historia das sociedades que em dados 42 momentos exprimiram avanços sob a conquista de direitos e em outros momentos, aspirações conservadoras que movimentavam-se na contramão destas conquistas. Para as autoras, a história se situa na antiga Grécia clássica, durante os séculos V e IV antes de Cristo, período este no qual os gregos iniciavam as primeiras formas de participação na esfera pública. Esta participação na organização e formação do governo para os gregos é também, associada a compreensão das raízes da democracia, ideia esta que acompanha o desenvolvimento, afirmação e efetivação dos direitos humanos. Os antigos gregos manifestavam-se por meio das assembleias, nas quais decidiam sobre a vida coletiva e sobre o exercício dos cargos que iriam executar as decisões coletivas. E, embora a participação grega sinalizasse um grande avanço no sentido de construção da democracia para o período em questão, ainda eram excluídos desta atividade os escravos, as mulheres e os estrangeiros. Configurava-se como um exercício seletivo de participação política, portanto, de direito político (PEREIRA; VINAGRE, 2007). Entretanto, antes que se pudesse haver a distinção entre os direitos políticos, civis, sociais e econômicos, as autoras apontam a necessidade de refletir sobre o que se denomina de jusnaturalismo, conceito este que funda posteriormente a doutrina dos direitos do homem. Este conceito foi apresentado por John Locke, ainda no século XVII, para fundamentar seu pensamento sobre os direitos do homem. A tese do autor apresentava a concepção de que existiam direitos naturais dos indivíduos, direitos estes que já nascem com os indivíduos, e por esta razão, independem do lugar que os mesmo ocupam na sociedade. Situou entre os direitos naturais o direito à propriedade, que incluía o direito à vida e a bens materiais, e o direito à liberdade, compreendidos como direitos inalienáveis do ser humano (PEREIRA; VINAGRE, 2007). Esta concepção representava certo avanço em relação às concepções feudais, já que a organização feudal baseava-se numa estratificação social com base no nascimento. Esta trajetória social e histórica, que atribui ao sujeito direitos naturais, caminha no sentido de posteriormente reconhecer os sujeitos diferentes, com foco “na família, nas minorias étnicas e religiosas, na criança, na mulher, no idoso, no doente, no doente mental, nas pessoas com deficiência, inclusive os direitos da natureza que precisam ser respeitados” (PEREIRA; VINAGRE, 2007, p.17). As autoras ainda apresentam a concepção elaborada por Marx a respeito da perspectiva de direito com base no jusnaturalismo. Marx associa a ascensão do modo de produção capitalista, que se apropriou das concepções jusnaturalistas para afirmar-se ideologicamente. Já se tem clarificado que o regime feudal organizava-se por estamentos. 43 Cada estamento exercia uma função política na ordem social francesa – o clero encarregavase das atividades espirituais, a nobreza administrava e defendia o grupo social e na base dessa ordem estavam os pequenos artesãos, produtores, professores e a própria burguesia, todos aqueles que responsáveis pela produção e movimentação econômica (PEREIRA; VINAGRE, 2007). A Revolução Burguesa e a assunção do capital como modo de produção deslocou a antiga ordem social pautada nos estamentos, conforme os privilégios de nascimento, para uma nova organização social, designada pela posição ocupada na produção por classe social. O movimento de base produtiva foi incentivado por moções intelectuais que lhe deram respaldo. O antigo regime feudal legitima-se pelo pensamento religioso, que justificava todas as ações e a forma de organização social vigente. O adentro do capital trouxe novas bases de pensamento, pautadas no racionalismo. O iluminismo e a centralidade no conhecimento e razão humana, do controle sobre a natureza e da cientificidade estava imbuído no decorrer do século XVIII, associado a emergência do modo de produção capitalista. Essa relação revela que a produção burguesa utilizou o jusnaturalismo de base racional para fundamentar sua organização. A razão acentua a liberdade como inerente à natureza humana (TRINDADE, 2002). A compreensão do direito afirmava que qualquer privilegio era antinatural, já que todos os homens nascem iguais – ideias advindas das concepções jusnaturalistas de direitos inerentes à natureza humana. E neste sentido, as bases jusnaturalistas e sua concepção de direito natural foram absorvidas pelo liberalismo, fundamento ideológico que sustentou o a emergência e organização do capital (PEREIRA; VINAGRE, 2007). O liberalismo defendia liberdade econômica, compreendendo que o Estado deveria cumprir o papel de resguardar a liberdade econômica e da propriedade. Para Trindade (2002) o entendimento deste processo se faz necessário tendo em vista que é no contexto da Revolução Francesa – revolução burguesa – que é proclamada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Este documento acolheu da doutrina jusnaturalista quatro direitos naturais: à liberdade, à propriedade, à segurança e à resistência à opressão. Pereira e Vinagre (2007) citam a perspectiva apontada por Marx de que esses direitos revelam claramente o enlace com os interesses de uma classe específica. Os chamados direitos humanos eram compreendidos como direitos dos membros da sociedade burguesa, que atribui ao homem o direito de liberdade, que na verdade se configura como o direito do homem de se separar de sua comunidade, individualizar-se. Esta perspectiva também é apresentada por Trindade (2002) que também esclarece a crítica de Marx ao direito 44 apresentado nos moldes da sociedade capitalista. Como já se esclareceu o processo que individualiza o homem, separando-o da comunidade, é o mesmo processo que na sociedade burguesa limita o ser social de seu agir eticamente. Portanto, restringe também a liberdade de escolha consciência entre valores, e afasta o ser da riqueza humano-genérica, que de fato, é o que lhe é de direito. Portanto, o direito à liberdade na sociedade burguesa é o direito a dissociação do indivíduo da comunidade, de sua limitação em si mesmo. Trindade (2002) amplia a apresentação desta crítica ao afirmar a ausência de sentido em discutir os direitos humanos em uma perspectiva apenas imediatista, sem perceber as diversas determinações que inferem na organização dos mesmos. O que se destaca desta proposição do autor é que os direitos humanos, como construções sócio históricas, decorrem das necessidades provocadas pelas lutas de classes e da manifestação de grupos particulares, como as mulheres, negros, indígenas, etc. Portanto, ao ser postos em análise, os direitos humanos devem ser alocados diante da contradição presente na sua gênese. Representam conquistas ao mesmo passo em que manifestam os interesses da mesma sociedade que esteve na base de sua fundação. As bases do capital representam um embate aos direitos humanos na medida em que levam a produção social para uma apropriação individual, particularizando aquilo que se remete as conquistas do gênero humano. Processo este que, como já esclarecido, afasta o homem da sua dimensão coletiva, de sua ação ética. O grande marco para os direitos humanos no século XX foi a Segunda Guerra Mundial. As atrocidades do período da guerra imputaram ao mundo a necessidade de estabelecer medidas de proteção e, portanto, de regulação das ações dos Estados em relação à pessoa humano. Criaram-se instrumentos internacionais para proteger o ser humano, numa perspectiva de que esta questão não se restringe apenas às decisões de cada Estado nacional em particular, mas se remete a um processo que envolve o ser humano, portanto, o mundo. Neste sentido, o pós-guerra intensificou o processo de tornar internacional a questão dos direitos humanos, manifesto na instituição de estruturas como a Organização das Nações Unidas (ONU) em 1945 e posteriormente a promulgação e adoção dos países da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948 (TRINDADE, 2002). Cabe ressaltar que ao final da segunda grande guerra, o mundo havia-se dividido entre dois projetos societários. A hegemonia da organização burguesa encerrou a guerra e o pósguerra, demarcado pelo encerramento a Guerra Fria. Se a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi promulgada ao final da guerra, concomitante a emergência do capital como organização mundial, novamente se revela na história dos direitos humanos os fundamentos 45 do direito pela perspectiva ideológica do capital. A perspectiva de direitos hoje em vigor se liga, desde a sua gênese, as bases burguesas de pensamento (PEREIRA; VINAGRE, 2007). Por este viés, compreende-se que a questão dos direitos humanos tem uma dupla face. Fundamenta-se ideologicamente na perspectiva do projeto capitalista de sociedade, quando se referem aos direitos inerentes à natureza humana – como já apresentada, esta é uma concepção do universo burguês – ao mesmo passo em que representam um importante instrumento para o reconhecimento e consolidação dos direitos construídos e conquistados pelo homem, numa perspectiva emancipatória. De certo, a Declaração aponta os direitos fundamentais da pessoa humana que são, portanto, universais, inalienáveis, invioláveis e interdependentes. São direitos: civis e políticos, como o direito de igualdade em lei, à vida, à integridade física, de participação política, à liberdade, direito de organização, religião, etc.; os direitos sociais e culturais, como saúde, educação, transporte, habitação, cultura; os direitos econômicos, como o direito ao trabalho, ao salario digno; e os direitos ambientais, como o direito a água potável, ao saneamento, à preservação do meio ambiente (PEREIRA; VINAGRE, 2007). Para o cenário brasileiro, enquanto colônia, o país não tinha nenhuma autonomia enquanto nação. Nos períodos posteriores, entre o Império até a Primeira República, houve contundentes violações dos direitos humanos. No que tange aos direitos políticos no país, estes eram restritos a uma elite. Não se falava de direitos sociais, e o pouco que se fazia neste sentido era realizado por instituições filantrópicas e privadas, reafirmando o laço clientelista e patrimonialista que envolveu a formação do Estado brasileiro (TRINDADE, 2002; VINAGRE; PEREIRA, 2007). Sobre a conquista dos direitos citados, tanto políticos como sociais, a Revolução de 30 foi um movimento de grande expressividade para tal. A partir da revolução deflagrada na década de 1930, o movimento operário ganhou visibilidade e suas reivindicações por direitos políticos e sociais os fizeram aparecer na cena pública como sujeitos políticos – que demandavam principalmente seus direitos trabalhistas. Esse contexto sinalizou avanços em relação as proposições vivenciadas durante a Primeira República, sob a qual a atuação estatal frente a “questão social” se dava pela ação policial. Sobre os direitos políticos, o período da década de 1930, obteve, por exemplo, a conquista do voto feminino (TRINDADE, 2002; PEREIRA; VINAGRE, 2007). Mesmo com esta conquista no campo do direto político, sua efetivação oscilou em maior ou menor escala conforme a conjuntura que cada período histórico permitia. Por exemplo, nos períodos em que a ditadura imperou sobre a sociedade brasileira, os direitos 46 políticos foram brutalmente restritos. Assim como, os direitos civis também sofreram tais repressões. Ao mesmo passo em que se reduziam os direitos civis e políticos, houve uma relativa ampliação dos direitos sociais, principalmente sobre o campo previdenciário. O regime militar, por exemplo, investiu na ampliação previdenciária como direito social ao mesmo passo em que restringiu os direitos civis e políticos. Após 1970, grupos particulares se organizaram para lutar por direitos políticos. Assim como, o sistema religioso empreendeu a batalha pelos direitos humanos. A assunção do Estado brasileiro aos direitos humanos se deu, segundo Pereira e Vinagre (2007) sob alguns marcos específicos11. A homologação de algumas leis específicas e a criação da Secretaria de Direitos Humanos, dos Conselhos de Direitos e as Comissões de Direitos Humanos, também atuaram nesta mesma perspectiva de afirmação dos direitos humanos. Os direitos mencionados na Declaração apresentam conceitos que se remetem ao projeto ético-político do Serviço Social por uma relação particularizada pelos fundamentos da profissão. Como bem esclarecido, a concepção de direitos humanos contém ao mesmo tempo os enlaces de pensamento burguês, dados pela sua construção social e histórica e apresentamse sob outros conceitos que possibilitam sua compreensão como elemento integrante de uma perspectiva que rompe com os mesmos fundamentos do capital que se colocam na sua gênese. A assunção e garantia de direitos inerentes à natureza humana pressupõe alguns elementos para a sua pela efetivação. Já se tem esclarecido que são vários os limites à efetivação destes direitos nas configurações da produção burguesa. Sendo assim, esta garantia só é de fato possível na medida em que o ser humano, enquanto ser singular entra em contato com as conquistas histórias do gênero humano, como a liberdade e universalização da riqueza humana, sendo estes, valores éticos que designam uma nova formação social por um projeto societário distinto do universo do capital. Esta mediação entre o singular e o humano genérico, para Barroco (2001) é dada pela dimensão ético-moral, categorias estas ontologicamente pertencentes e construídas pela formação do próprio ser. O projeto ético-político do Serviço Social direciona-se a esta mesma perspectiva de sociedade e, ao vincular-se as demandas da classe trabalhadora, afirma-se pela perspectiva da realização do ser social enquanto ser ético. A referência do projeto ético político à liberdade 11 “Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, em 01/02/1994; Convenção Interamericana para Prevenir a Punir a Tortura, em 20/07/1989; Convenção Contra Tortura e outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, em 28/09/1989; Convenção sobre os Direitos da Criança, em 24/09/1990; Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em 24/01/1992; Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 24/01/1992; Convenção Inter-Americana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, em 27/11/1995; Protocolo à Convenção Americana referente à Abolição a Pena de Morte, em 13/08/1996 [...]” (PEREIRA; VINAGRE, 2007, p.46). 47 como um valor central alude a projeção profissional à emancipação humana, compreendida como expansão do ser social na defesa de objetivos coletivizados. O compromisso da profissão com a ampliação de direitos aponta os direitos humanos à universalização dos direitos – universalização esta que é valor ético que se desenvolve pela perspectiva de sociedade assumida pelo projeto ético político do Serviço Social (PEREIRA; VINAGRE, 2007). Para Pereira e Vinagre (2007) assumir a questão dos direitos humanos como valor e objetivo profissional não significa assumir uma postura messiânica, mas é compreender que há limites concretos à universalização dos direitos humanos nas configurações sociais, políticas, econômicas e culturais da sociedade capitalista. É compreender que a direção do projeto ético político supõe a crítica aos limites objetivos aos direitos humanos, a partir de suas determinações e possibilidades reais das configurações nas quais o mundo se encontra, no entendimento de que a luta pelos direitos humanos é um instrumento estratégico para uma nova ordem social. As autoras ainda apontam que “[...] os direitos humanos podem ser situados em relação ao projeto ético-político do Serviço Social como um campo de possibilidades de luta emancipatória a ser realizada coletivamente [...]” (PEREIRA; VINAGRE, 2007, p. 55 grifo do autor). A Carta de Palmas, redigida e publicada pelo Conjunto CFESS-CRESS (Conselho Federal de Serviço Social e Conselhos Regionais de Serviço Social) como parte do relatório final do 41º Encontro Nacional CFESS-CRESS, realizada em Palmas/Tocantins em 2012, expressa a concepção da categoria sobre os direitos humanos, que foi a temática discutida durante o encontro. A carta esclarece que para a categoria profissional a luta pelos direitos humanos implica numa luta anticapitalista, e defende os seguintes princípios: 1) A compreensão dos Direitos Humanos como algo que não se restringe aos direitos civis e jurídico-políticos, mas que diz respeito aos direitos econômicos, sociais e culturais; 2) A superação da visão ´legalista` dos direitos, trazendo-os para o âmbito da luta de classes e das contradições inerentes à (re)produção das relações sociais capitalistas [...]; 3) A compreensão crítica radical dos Direitos Humanos na sociedade contemporânea, que instrumentalize uma atuação realista, desmistificando as concepções liberais que naturalizam as desigualdades e as visões abstratas que tratam o homem ou a ´dignidade humana` sem levar em conta as particularidades históricas em que a humanidade se (des)constrói; 4) A necessidade de uma articulação com os movimentos de defesa dos Direitos Humanos, vinculando-a com a ´questão social`, com as políticas públicas [...]; 5) A compreensão das especificidades da luta pelos Direitos Humanos no âmbito das entidades profissionais como o Conjunto CFESS-CRESS, articulando-a com os eixos: fiscalização, capacitação e denúncia (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012d, p. 53). 48 O excerto apresenta claramente que o Serviço Social compreende os direitos humanos criticamente, alocando-os na luta de classes, nas particularidades histórico sociais de sua gênese e da própria construção do gênero humano. Concepções estas que amplia e supera a construção do direito liberal e sua perspectiva mistificada de direitos humanos. O Código de Ética profissional aponta claramente que a defesa dos direitos humanos é elemento constitutivo da profissão e, portanto, do profissional. Quando esta defesa é negligenciada por parte dos profissionais, o próprio código se encarrega de dispor sobre as penalidades cabíveis. Para Pereira e Vinagre (2007), a defesa dos direitos humanos no campo educacional pelo Serviço Social se dá no exercício profissional mediante a articulação da profissão com outros profissionais e com outras áreas do saber, pautada na interdisciplinaridade, com uma práxis voltada à emancipação humana. Desta forma, as políticas que objetivam garantir legislativamente estes direitos, embora os diversos e já elucidados imites, representam grandes avanços no sentido de buscar o reconhecimento da diversidade humana no processo de construção do Ser social. 49 3 A INTERVENÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO AMBITO DA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL: A DEFESA INTRANSIGENTE DOS DIREITOS HUMANOS 3.1 SERVIÇO SOCIAL NO ÂMBITO DA EDUCAÇÃO A construção da educação como espaço sócio técnico de intervenção do Serviço Social remonta o próprio processo histórico de construção do Serviço Social enquanto profissão institucionalizada. A reflexão sobre o campo educacional e a profissão envolve também a construção de uma concepção de educação correspondente ao projeto ético-político profissional, que orienta os debates e as particularidades do exercício do assistente social na política educacional – e nas políticas sociais como um todo – de modo a objetivar e fortalecer a luta em defesa pela educação emancipadora (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012c). Portanto, se a presença do Serviço Social no campo da educação remonta o período de origem da própria profissão, a compreensão da construção deste campo se inicia também pela década de 1930. Durante esta década, a conjuntura social e política do Brasil concentrava na adoção da industrialização para impulsionar o progresso da nação. A recente formação de um Estado nacional assumia o caráter patrimonialista, que qualificava o Estado como instrumento dos interesses da classe dominante no país, a mesma que se mantinha no controle durante as antigas oligarquias, e que neste novo momento, se denominava povo brasileiro, para o qual se dirigia os interesses do Estado (FERNANDES, 1987). O que se releva deste período no campo educacional é que a necessidades de desenvolvimento imputada ao país pela industrialização e o populismo que se iniciava com tais propostas, reclamavam uma reforma no sistema educacional, de modo à preparar o grande contingente populacional a este período e as necessidades econômicas da nação. Foi esta a razão de algumas reformas educacionais ocorridas durante este período (PATTO, 1998). Durante esta década, a educação pautava-se pela perspectiva da burguesia que consolidava seu poder sobre a nação. A escola se configurava como um espaço para poucos, e estes poucos pertencentes a classe dominante. Neste momento da realidade brasileira, a escola passou a ser compreendida como um espaço salvador das condições nas quais se encontravam a maioria da população. O não acesso a escola era, portanto, elemento que gerava ignorância e marginalidade (SAVIANI, 1997). A escola, portanto, foi utilizada como instrumento de ajustamento social e controle da população na medida em que por ela objetivou-se os preceitos da classe dominante em 50 regenerar a população para trazê-las ao novo momento da sociedade brasileira. Para este fim, o movimento da Escola Nova foi apresentado por Anísio Teixeira como uma reforma no sistema educacional que propiciaria tais transformações sociais. A reforma teve como base pensadores da educação norte americana, como John Dewey e Willian Kilpatrick (WITIUK, 2004). A Escola Nova preconizava uma renovação pedagógica na qual o ensino das séries iniciais transformou-se em gratuitos, e destinava-se a educar aqueles considerados delinquentes. Portanto, surgiu como uma ação de médicos juristas destinada a adaptar os homens ao progresso da sociedade e, com base em concepções higienistas, seus objetivos se transfiguravam em xenofobia, racismo e moralismo. A Escola Nova apresenta-se como uma reforma de dupla face: enlaçava os interesses da classe dominante, já que, foi formulada em função da necessidade de industrialização do país; assim como, uma nova educação representa também o rompimento com as bases oligárquicas e sob este enfoque, reivindicava uma nova estrutura educacional, pública, obrigatória, leiga e de responsabilidade do Estado. Sobre esta face do escolanovismo, Wutiuk (2004) esclarece que “[...] este movimento reivindicava uma ação mais decisiva do Estado em prol da educação pública, gratuita, obrigatória e leiga [...]” (WITIUK, 2004, p. 33). Os ideais da reforma foram compreendidos na Constituição Federal de 1934, que dedicou um capítulo à educação. Em oposição aos interesses da burguesia industrial expressos no escolanovismo, a Igreja, aliada aos interesses da burguesia agrária, caracterizada pela antiga oligarquia que ainda detinha o poder, defendiam uma educação voltada à classe dominante, dedicada as famílias mais abastadas. Uma nova Constituição aprovada em 1937 compreendeu ambos os interesses (WITUIK, 2004). Esta cedência aos interesses do movimento laico católico, a associa ao Estado em função da preocupação com a ordem e disciplina social, por meio de um controle social. A Igreja passou a empreender ações tanto para a burguesia industrial como para o proletariado, por meio de associações, e em especial da Liga das Senhoras Católicas. A Liga passou a intervir nas vilas operarias, priorizando a atenção a crianças e mulheres, para minimizar as consequências do desenvolvimento capitalista (WITUIK, 2004). São estas mesmas instituições da Igreja que compreendem as protoformas do Serviço Social. Isso significa que, o Serviço Social sempre esteve ligado ao campo educacional, desde as suas proformas à sua emergência como profissão institucionalizada e compreendida na divisão sócio-técnica do trabalho (IAMAMOTTO, 1994). Portanto, sinaliza-se que a presença 51 do Serviço Social na educação se deu deste a década de 1930, embora sua formalização e discussão dos órgãos que regulamentam a profissão tenha se dado em períodos posteriores. Na década seguinte, 1940, o Serviço Social já caracterizado como profissão dissociada institucionalmente de suas protoformas – calcadas na intervenção da Igreja – iniciou o que Imamotto (1994) denomina de modernização conversadora, que exibe o vinculo ideológico com as bases conservadoras da fundação da profissão. Neste momento, a profissão assume uma perspectiva psicologizante, que responsabiliza o indivíduo pelas suas mazelas, conferindo-lhe também uma capacidade individual de superação de sua condição. Com esta perspectiva profissional, o Serviço Social empreendia uma ação sócioeducativa operada em meio ao proletariado e suas famílias. O exercício profissional tinha funções preventivas e curativas para os problemas sociais individualizados pela perspectiva adotada (WITUIK, 2004). A mesma autora ainda cita Pinheiro (1985) para esclarecer que esta mesma perspectiva pragmática e individualizadora estava presente também no âmbito da política educacional e no cotidiano das escolas. Segundo Pinheiro (1985 apud WITUIK, 2004), o Serviço Social era requisitado a intervir no cotidiano escolar para visitar as famílias dos alunos, a fim de conhecer a realidade dos mesmos e aconselhar os pais sobre os hábitos considerados sadios a criança e a família. Sobre a função do Serviço Social na escola, a autora ainda afirma que, Sendo a escola um dos aparelhos privados significativos para a manutenção da hegemonia, o Serviço Social será requisitado para o exercício de atribuições que harmonizam as relações no processo de vigilância da moral e da sociabilidade das famílias empobrecidas. As modalidades interventivas serão objetivadas para a integração social dos indivíduos no espaço escolar, comunitário e doméstico, reforçando a identidade subalterna por meio da inculcação de valores dominantes e da interferência no seu modo de vida com adoção de condutas comportamentais adequadas aos parâmetros morais (WITUIK, 2004, p. 24). A intervenção profissional do Serviço Social participava na reprodução dos interesses da classe dominante por meio da escola. Seu exercício personificava os laços do controle social imputados à classe trabalhadora para a necessidade da burguesia nacional de industrialização do país. Tal atividade profissional constitui-se pela influencia norte americana. O chamado Serviço Social de caso, grupo e comunidade teve origem nas escolas americanas como modelo a ser implantado no Brasil. Especificamente para o campo da Educação, nos Estados Unidos, o Serviço Social Escolar já vinha se desenvolvendo desde 52 1906, e também foi adotado para emoldurar o exercício da profissão nas escolas brasileiras, também com o método do Serviço Social de casos individuais. A profissão buscava nos atendimentos individuais de crianças, pais e professores, e visitas domiciliares, aplicar instrumentais de investigação para detectar a etiologia dos problemas de aprendizagem. E, era compreendido como o ela entre a escola e a família. Ao Serviço Social Escolar cabe o atendimento, através do Serviço Social de Caso, à população mais empobrecida, dentro da concepção vigente de questão social como caso de polícia e de acesso à educação como forma de repasse de valores e princípios. O Assistente Social atua junto ao educando e sua família identificando os problemas sociais que repercutem no aproveitamento escolar propondo ações ou requisitando serviços que possibilitem a adaptação do escolar ao seu meio e ao ambiente escolar, promovendo o ajustamento social. Percebe-se uma tendência de estigmatização e culpabilização dos indivíduos, sob as bases do funcionalismo que hierarquiza as relações sociais e procura identificar disfunções na sociedade (WITUIK, 2004, p. 26 grifo da autora). O excerto acima destaca a ideia de adaptação dos sujeitos presente no exercício do Serviço Social, sempre dimensionado pela ideia de ajustamento social dos indivíduos em função das necessidades da sociedade de mercado. Destaca-se que naquele período, cabia ao Serviço Social contribuir para curar os desajustados sociais colaborando para que a escola se desenvolvesse como um ambiente harmonioso para a criança, para o seu reajustamento as ordens de sociedade hegemônica. Almeida (2001) esclarece esta questão ao afirmar que “[...] a educação, organizada sob a forma de política pública, se constituiu em uma das práticas sociais mais amplamente disseminadas de internalização dos valores hegemônicos na sociedade capitalista [...]” (ALMEIDA, 2001, p. 12). Ainda durante a década de 1940, novas reformas foram empreendidas no sistema educacional, dadas as necessidades apresentadas pela Segunda Guerra Mundial, que exigia maior contingente populacional preparado ao trabalho. Estas reformas se consolidaram na Constituição aprovada em 1946, que atribui ao governo federal a responsabilidade de legislar sobre as bases da educação nacional, criando também a obrigatoriedade da educação (SAVIANI, 2003). Esta questão reforma a solicitação do Serviço Social na escola, para atuar na busca de permanência dos alunos na escola e consequentemente no trabalho contra a evasão escolar, nos problemas de aprendizagem e nos desvios de comportamento (WITUIK, 2004). Nota-se que as funções delegadas à profissão no sistema escolar reforçam a vinculação da profissão com o projeto político do Estado, portanto, com o projeto de sociedade do 53 capital. De certo, nota-se pelas considerações acima descritas que historicamente, a intervenção do Serviço Social na escola se construiu mediante a intervenção individual, de caso. Até a década o fim da década de 1950, o exercício da profissão se manteve nas mesmas configurações, compreendendo também que a própria profissão, durante este período, permanecia enlaçada ao conservadorismo. Em 1961, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 4024, incidiu sobre o Serviço Social na educação na medida em que institui legislativamente a assistência social escolar, legitimando o espaço da profissão no universo escolar (WITUIK, 2004). Foi somente num período pós a década de 1990, em correspondência ao amadurecimento da profissão, expresso no projeto ético-político do Serviço Social, que se visualizou expressiva ampliação da profissão na educação. Em 1995, os Congressos Brasileiros de Assistentes Sociais referenciaram o grande aumento da produção teórica sobre o Serviço Social na educação (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012c). No ano de 2000, foi apresentado o parecer jurídico número 23/2000, elaborado pela doutora Sylvia Terra, sobre a implantação do Serviço Social nas escolas até o ensino médio. O parecer menciona o direito a educação, acesso e permanência dos alunos nas escolas e como a profissão se insere no contexto educacional em face destes direitos. Em 2001, o Conjunto CFESS/CRESS (Conselho Federal de Serviço Social e Conselhos Regionais de Serviço Social) posicionou-se em relação ao âmbito educacional no 30º Encontro Nacional do referido conjunto. No mesmo ano, o CFESS organizou um grupo de estudos dedicado ao Serviço Social na Educação, que trabalhou para a ampliação do debate sobre a temática objetivando contribuir para a discussão sobre o tema no cenário nacional (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012c). Nos encontros seguintes do Conjunto CFSS/CRESS, realizados em 2001 e 2002, apontou-se a necessidades de mapear as produções sobre a inserção dos profissionais na educação em todo território nacional. No 33º e 34º encontros, ocorridos nos anos de 2004 e 2005, já em posse do levantamento das produções sobre os profissionais no referido campo de atuação, fez-se o indicativo para a elaboração de parâmetros nacionais para regulamentar o exercício profissional no sistema educacional. Neste mesmo período, o professor Ney Luiz Teixeira de Almeida elaborou um parecer sobre os projetos de lei que até então versavam sobre a atuação profissional neste campo (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012c). Em 2007, no 36º encontro, consolidou-se a formação de um grupo de trabalho composto com representantes de todas as regiões para aprimorar as discussões e deliberações 54 sobre o tema. Até o ano de 2009, o Grupo de Trabalho Serviço Social na Educação sistematizou os dados referentes as legislações de todos os estados e municípios sobre a inserção profissional na educação, assim como fez o mapeamento dos projetos de Lei que representavam a questão (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012c). Em 2010, o referido grupo de trabalho apontou a necessidade de assessoria para ampliar e aprofundar o debate sobre o tema, para o qual, o professor Ney Luiz Teixeira de Almeida foi indicado. A partir deste ano, foi realizado novamente um levantamento sobre a inserção profissional nas escolas em todo Brasil, identificado tais profissionais, levantamento da produção teórica sobre a temática, elaboração de um roteiro orientador das discussões e a produção de um documento intitulado “Subsídios para o Debate do Serviço Social na Educação” em 2011 (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012c). O debate dos órgãos que regulamentam a profissão sobre a temática culminou – e se encontra – nos dias atuais, na realização do Seminário Nacional de Educação em 2012. Do processo descrito sobre a inserção do Serviço Social na educação, salienta-se a concepção de educação que norteia a intervenção profissional neste campo, fundamentada pelo projeto ético-político da profissão. Para Almeida (2007), o Serviço Social trabalha com uma perspectiva crítica de educação, dimensionando-a a partir dos determinantes sociais, políticos, econômicos e culturais que se entrecruzam no sistema educacional e, tem como horizonte para sua intervenção uma educação emancipadora. Isto significa que, A educação que se quer emancipadora não se restringe à educação escolarizada, organizada sob a forma de política pública, mas não se constrói a despeito dela, visto que sob as condições de vida da sociedade capitalista é ela que encerra a dimensão pública que mediatiza, de forma institucional e contraditória, o direito ao acesso aos bens e equipamentos culturais de nosso tempo. Por essa razão a educação escolarizada ao passo que se constitui em expressão da dominação e controle do capital é ao mesmo tempo objeto das lutas das classes subalternas pela sua emancipação política. A arena da luta política e da disputa pela direção dos projetos societários e educacionais determina na sociedade capitalista a possibilidade de diferentes contornos da relação do Estado com a sociedade civil (ALMEIDA, 2007, p. 3). Portanto, a educação é compreendida como espaço de reprodução da ideologia dominante ao mesmo passo em que se configura como elemento parte de uma luta das classes trabalhadoras pela emancipação política, na disputa entre projetos societários contrários. Sob esta perspectiva, o autor ainda afirma que o campo educacional torna-se para o assistente social lócus para a concretização dos valores que orientam a profissão (ALMEIDA, 2000). O autor ainda destaca que é necessário compreender e articular um processo que envolva a luta 55 por direitos com base na perspectiva crítica assumida pela profissão, que se diferencia da concepção pedagógica da hegemonia capitalista. A intervenção do Serviço Social na educação contribui para fortalecer a ideia de educação como um direito social. E, dentro da própria política educacional, outras políticas são construídas e com base na compreensão crítica, podem ser objeto e espaço de intervenção profissional do assistente social. Sobre as legislações aprovadas que hoje orientam o Serviço Social na Educação, o projeto de lei apresentado pelo Deputado José Carlos Elias, nº 60/2007 em 2007, dispõe sobre a inserção das áreas de Psicologia e Serviço Social na educação básica do ensino público. Assim como, a aprovação do projeto de lei 3.688/2000, que trata da inserção dos assistentes sociais na educação básica também representou um grande avanço para esta luta da categoria profissional (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012d). Neste sentido, o Seminário Nacional de Serviço Social na Educação realizado em 2012, apresenta o seguinte esclarecimento sobre a inserção profissional neste campo: A presença dos/as assistentes sociais na política educacional remete à reflexão acerca da necessidade do entendimento da educação como um processo social numa dimensão integral, envolvendo os processos sócio institucionais e as relações sociais, familiares e comunitárias que fundam uma educação cidadã, articuladora de diferentes dimensões da vida social como constitutivas de novas formas de sociabilidade humana, nas quais o acesso aos direitos sociais é determinante (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012d, p. 2). Neste sentido, o exercício do Serviço Social na Educação orienta-se na busca de garantia de: acesso da população ao sistema educacional regular (forma e pública); de permanência dos alunos nestas instituições, a garantia de qualidade dos serviços na educação; de gestão democrática e participativa na própria política de educação; e, a articulação com outras áreas para a garantia do direito à educação e outros direitos implicados neste processo (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2012c). E a orientação que seque a inserção do assistente social no contexto da educação envolve ainda a clareza dos processos que envolvem a construção da educação como política mediada pelos interesses de mercado e a compreensão de educação pautada numa perspectiva crítica, que ultrapassa a concepção rasa e imediatista de reprodução da lógica hegemônica e engendra uma educação orientada à emancipação. 56 3.2 A PARTICULARIDADE DA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA Já se tem esclarecido que a inserção do Serviço Social na educação acompanhou o processo pelo qual a própria profissão rompeu com suas bases conservadoras. As primeiras demandas pela profissão neste campo foram acompanhadas de uma intervenção adaptativa, que objetiva readequar os sujeitos à sociedade, como método de cura e prevenção dos problemas sociais. A educação era compreendida como mero instrumento de perpetuação dos interesses da classe dominante, em um país emoldurado pela hegemonia de um único grupo social deste a fundação de seu Estado. O processo de amadurecimento da profissão propiciou a ruptura com o tradicionalismo e a assunção de uma nova perspectiva teórica, fundamentada no marxismo, que conferiu ao Serviço Social a orientação para um projeto ético-político vinculado as demandas da classe trabalhadora, com uma concepção crítica das relações sociais situadas no antagonismo de classes, a defesa da democracia, da liberdade, dos direitos humanos, uma perspectiva emancipatória e particularmente a defesa de um projeto societário anticapitalista. A profissão assumiu também uma concepção crítica da própria educação, compreendida nas suas determinações enquanto produção da ordem burguesa e espaço de reprodução da ideologia hegemônica, mas também como espaço de emancipação e, portanto, como parte da luta trabalhadora pelos seus direitos. Como espaço de reprodução ideológica burguesa, o campo educacional também manifesta ao mesmo tempo diversas expressões da “questão social” e as possibilidades de enfrentamento a elas. A educação é compreendida mediadora de um projeto de sociedade, é situada nos determinantes sociais de cada tempo e espaço, mas engendra um papel estratégico. Dentro de uma perspectiva crítica a educação pode participar para a concretização de um projeto societário que, quando remetido à crítica ao universo produtivo da sociedade de mercado, leva ao desvelamento das contradições da mesma sociedade, situando a educação nesta totalidade e apontando as possiblidades de enfrentamento as expressões da” questão social” nela alocadas. Dentre as possibilidades de enfrentamento às refrações da “questão social” no campo da educação, a Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, foi aprovada em 2008 pelo governo Federal, como uma proposta para lidar com a exclusão no sistema de ensino. A política de educação inclusiva objetiva garantir o acesso ao sistema escolar dos alunos com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e superdotação/altas habilidades. Ainda orienta o sistema de ensino para garantir a qualidade da 57 educação de todos os alunos, de forma que, aqueles que se colocam como público alvo da política tenham os mesmos direitos de participação e aprendizagem garantidos. Assim como também orienta a educação regular para o atendimento educacional especializado, a formação dos professores, acessibilidade, participação da comunidade e família no processo de inclusão escolar (BRASIL, 2012h). A educação inclusiva apresenta a ideia de que o sistema escolar deve estar preparado para atender as especificidades de todos os alunos. A centralidade está na modificação do sistema de ensino para atender o aluno, e não na adaptação do aluno para corresponder à escola, como se viu em outros momentos da educação – como na proposta de integração escolar. A política de educação inclusiva ainda especifica que a proposta de reestruturação que embasa a perspectiva inclusiva na educação é resultado das discussões e estudos no campo da educação e da defesa dos direitos humanos. Sinaliza que a partir da Declaração de Salamanca, produzida em 1994, fica estabelecido o princípio de que o sistema educacional deve atender todos os alunos, independente das suas especificidades, como uma das alternativas de enfrentamento da exclusão na educação (BRASIL, 2012h). Nota-se destas proposições que embora a política de educação inclusiva se configure como uma proposta de enfrentamento da exclusão no sistema regular de ensino, por hora, ela se dirige apenas a um público alvo específico. Considerando que a perspectiva inclusiva foi adotada pela educação especial, a referida política não abarca outras especificações, como a exclusão étnica ou social, por exemplo. Ela se destina ao público alvo da educação especial, para garantir o acesso dos mesmos ao sistema educacional regular. Mas o que se destaca destas proposições é a afirmação de que a educação inclusiva se orienta pela perspectiva de direitos humanos. Em outros trechos da mesma política, o texto identifica e confirma a fundamentação e orientação da política de educação inclusiva nos direitos humanos, assim descritos, A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à idéia de eqüidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola (BRASIL, 2012h, p. 5). O excerto elucida o compromisso da perspectiva inclusiva com os direitos humanos e sinaliza outro conceito fundamental, referindo a compreensão histórica da produção da exclusão na escola e nos demais espaços que a circunda. A exclusão é o que provoca a necessidade de incluir. 58 Sobre a exclusão, Wanderley (2010) afirma que não se trata de um fenômeno recente, muito menos restrito aos países pobres. A exclusão fez-se historicamente presente na realidade social do homem em diversos momentos. Ainda que se observem manifestações da exclusão em períodos que antecedem a emergência da produção burguesa como hegemônica na sociedade, há uma relação específica entre o desenvolvimento da sociedade capitalista e a exclusão, como esclarece o autor a exclusão é concebida como um fenômeno social cujas determinações devem ser buscadas nos princípios do funcionamento da sociedade moderna, ou seja, da sociedade de mercado. A ordem social da produção capitalista pressupõe a contradição entre classe trabalhadora e os donos dos meios de produção e, essa relação de polaridade aponta a exclusão como fundamento do capital. Sawaia (2010) conceitua a exclusão como: [...] um processo multifacetado, uma configuração de dimensões materiais, políticas, relacionais e subjetivas. É processo sutil e dialético que só existe em relação à inclusão como parte constitutiva dela. Não é uma coisa ou um estado, é processo que envolve o homem por inteiro e suas relações com os outros. Não tem uma única forma, nem é uma falha do sistema, devendo ser combatida como algo que perturba a ordem social, ao contrario, ele é produto do funcionamento do sistema (SAWAIA, 2010, p. 8). Para autora, a contradição presente na estrutura do capital revela que a exclusão contém em si sua negação, a inclusão; e não pode existir sem ela. Esta qualidade apresenta a exclusão como idêntica a sua negação, ou seja, a exclusão transmuta-se em uma inclusão social perversa. Portanto, a sociedade exclui para posteriormente incluir de maneira precária, criando o que a autora nomina de uma dialética exclusão/inclusão (SAWAIA, 2010). Esse processo cria uma inclusão ilusória, quando de fato os grupos supostamente incluídos estão excluídos. Como fundamento da produção material e subjetiva da sociedade de mercado, a dialética exclusão/inclusão manifesta-se em diversas instâncias da mesma sociedade. Portanto, apresenta-se também sobre o desenvolvimento do sistema educacional. A educação torna-se um instrumento de reprodução de um tipo humano necessário à produção burguesa. E, conforme esclarece Mézáros, A educação que poderia ser uma alavanca essencial para a mudança, tornouse instrumento daqueles estigmas da sociedade capitalista: fornecer os conhecimentos e o pessoal necessário à maquinaria produtiva em expansão do sistema capitalista, mas também gerar e transmitir um quadro de valores 59 que legitima os interesses dominantes, [...] tornou-se uma peça do processo de acumulação de capital e de estabelecimento de um consenso que torna possível a reprodução do injusto sistema de classes (MÉSZÁROS, 2008, p.15). Sendo assim, a exclusão à qual a política de educação inclusiva se referencia é produtora e produto da ordem burguesa, e sua apreensão histórica designa o movimento descrito de entendimento da alocação da exclusão nos moldes da estrutura burguesa que ela sustenta. Portanto, a compreensão da política de educação inclusiva pautada nos direitos humanos se refere a uma posição contraria à ordem burguesa. Ao refletir sobre a concepção de direitos humanos tem-se um aprofundamento na referência da política de educação inclusiva neste posicionamento político. A concepção de direitos humanos enlaça ao mesmo tempo os interesses burgueses, presentes na sua gênese, mas é compreendida como um conceito/elemento que pode se referir a outra perspectiva de sociedade. Direitos humanos significam para a sociedade burguesa o direito da propriedade privada, apenas de alguns, mas também podem significar aquilo que é do gênero humano e neste sentido referem-se às conquistas humano genéricas, que envolvem a consciência, a liberdade, a universalização, sendo o contato com esta riqueza humana só é possível pelo agir eticamente. A objetivação dos direitos humanos se dá mediante estes elementos. Na ordem burguesa, a efetivação destes elementos é limitada, tendo em vista que os mesmo só se realizam pela mediação do trabalho, como produto concreto da ação humana, e é justamente em relação à categoria trabalho que a ordem burguesa impõem suas limitações ao alienar o ser humano de sua produção (BARROCO, 2008). Portanto, a efetivação de direitos humanos só tem plena possibilidade a medida que o ser social se apropria das suas produções, que o criam enquanto ser consciente. Todos estes conceitos se vinculam ao compromisso assumido pelo Serviço Social a partir de 1993. A profissão é orientada por um projeto ético-político que assume a luta pelos direitos humanos na sua concepção crítica. Pela concepção de direitos humanos o Serviço Social pode se inserir na discussão sobre a política de educação inclusiva, compreendendo a concepção de educação inclusiva também por uma perspectiva crítica, que a coloca nas determinações sócio históricas que a engendram. Esta relação é confirmada por Almeida (2011), que aponta a universalidade do acesso à educação como um princípio dirigido aos segmentos sociais que necessitam de sua garantia, situando-o no campo dos direitos humanos e dos direitos sociais e, ainda acrescenta que a 60 intervenção do Serviço Social neste campo deve pautar-se por esta dimensão da universalização do acesso à educação como direitos humanos e sociais. O autor afirma que, A universalização do acesso à educação se traduz, portanto, em um princípio que ultrapassa a compreensão seletiva e restrita de que as políticas sociais devem ser dirigidas a determinados segmentos sociais, particularmente aos que delas necessitam, situando a educação no campo dos direitos humanos e sociais, concebendo a política educacional enquanto política efetivamente pública que coloca ao alcance de todos os conhecimentos a cultura e a tecnologia socialmente produzidos, como uma herança de nosso tempo. A atuação do/a assistente social na política de educação deve pautar-se neste princípio, já presente em nosso Código de Ética (ALMEIDA, 2011, p. 51). A inserção do Serviço Social nesta política não pode ser deslocada da dinâmica social, política, econômica e cultura que historicamente incidiram sobre o sistema educacional inviabilizando a universalidade do acesso e permanência à educação. Também é imprescindível a análise e compreensão dos discursos que permeiam as diferentes ações dentro da própria política de educação inclusiva de suas vinculações ideológicas e os projetos de educação que competem na sociedade (ALMEIDA, 2011). Especificamente o uso do termo inclusão na educação, se não situado nas condições acima mencionadas pode obscurecer seu significado sócio histórico, e reproduzir o sentido legalista atribuído pela ordem burguesa à política de educação inclusiva, A larga disseminação do termo “inclusão”, que atravessa diferentes políticas sociais e a própria política educacional, tem contribuído, significativamente, para obscurecer essas preocupações, produzindo um discurso que, embora seja bastante receptivo no campo educacional, não se aprofunda nas determinações da não garantia do acesso universal à educação e da dimensão crônica que o fenômeno da evasão assume (ALMEIRA, 2011, p. 52). Para o mesmo autor, o Serviço Social tem o desafio de empenhar-se em decifrar a aparente conformidade criada em torno da educação inclusiva, o que requer desde a compreensão da inserção da profissão neste âmbito, a compreensão da própria educação, da educação inclusiva e de todas as ações que dela partem para garantir o acesso e permanência à educação, no entendimento da sua construção histórica como direito social, portanto, como parte dos direitos humanos. Para Iamamoto (1998) o grande desafio da profissão na sua inserção nas políticas sociais, e aqui, especificamente na política de educação inclusiva, é redescobrir as alternativas para formular sua intervenção com base nas dimensões que sustentam a profissão – teóricometodológica, ético-político e técnico-operativo – para o enfrentamento da “questão social”. 61 CONSIDERAÇÕES FINAIS O Serviço Social é uma profissão que intervém nas relações sociais no contexto da sociedade de classes. Esta gera contradições e diferentes expressões da “questão social”, as quais são mediatizadas pelo Estado e respectivas políticas sociais, dentre estas, encontram-se as políticas educacionais. A área tem demandado a inserção do Serviço Social, neste sentido, o presente trabalho permitiu identificar a Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva como área específica que necessita ser aprofundada visando a qualificação da formação e do exercício profissional. Como proposta recente no campo educacional – aprovada em 2008 – as produções teóricas sobre as relações do Serviço Social e as particularidades desta política são poucas e recentes. Sobre este, um questionamento se salta: quais as interfaces entre a concepção de educação inclusiva expressa na Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e os princípios ético-políticos do Serviço Social brasileiro? Para refletir sobre este enlace, é necessário compreender as configurações que envolvem esta política na sua formulação, e que são decorrentes do processo de construção das políticas sociais em geral no Brasil. A emergência das políticas sociais no contexto brasileiro assume as configurações da formação do próprio Estado da nação, caracterizado, na sua gênese, por um caráter patrimonialista, que mistura os interesses públicos e privadas. A dualidade de interesses personificados na intervenção do Estado perpetua-se até os dias atuais. Sendo assim, a política de educação inclusiva também manifesta esta dupla face: é formulada pelo Estado e expressa os interesses do capital à medida que, apresenta a inclusão sem compreender criticamente os determinantes que a media. A concepção que a legislação traz de educação inclusiva é centrada na adaptação do sistema escolar para atender as necessidades dos alunos, de forma que a escola esteja preparada para lidar com a diversidade que compõe a sociedade. Sob deste entendimento, que dimensão é esta que possibilita perceber este rompimento? A política de educação inclusiva organizou-se a partir dos questionamentos em prol dos direitos humanos, e os tem como base para a sua formulação. Sobre a defesa dos direitos humanos, o Serviço Social expressa por meio do seu Código de Ética de 1993, o posicionamento claro em favor e defesa dos direitos humanos. E, a concepção de direitos humanos assumida pelo Serviço Social possibilita a compreensão do lastro de rompimento com a lógica instrumental da razão capitalista presente na política de educação inclusiva. 62 À medida que a profissão alcança dado amadurecimento, pela sua inserção nos movimentos sociais, a interlocução e assunção da teoria marxista como fundamentação e orientação profissional, ela rompe com o tradicionalismo e o conservadorismo presente deste a sua gênese. O Código de Ética de 1993 materializa este rompimento ao apresentar os valores éticos e políticos que fundamentam a profissão. É neste mesmo código, como já elucidado, que se apresenta a defesa intransigente dos direitos humanos, da democracia, da liberdade, e designa um projeto ético-político vinculado às demandas da classe trabalhadora e comprometido com valores éticos e políticas anticapitalistas. Particularizando a questão dos direitos humanos, na compreensão construída pelo Serviço Social, designa o compromisso com aquilo que é da produção do gênero humano e pela universalização destes direitos. O ser humano se constrói materialmente e subjetivamente pela categoria trabalho. É esta categoria que permite o desenvolvimento da consciência humana e da vida em sociedade, assim como a liberdade, a escolha, a universalização. Compreende-se que estes valores não podem ser efetivados em plenitude nos moldes da sociedade capitalista, considerando que a mesma usurpa o principal mediador da construção humana, que é o trabalho. Nas dimensões da produção burguesa, o processo de trabalho afasta o ser humano de sua produção, o afasta de sua riqueza humano genérica, impossibilitando a realização do ser social e dos valores subjacentes à tal construção. Sendo assim, ao posicionar-se na defesa destes valores, o projeto ético político do serviço social defende também um projeto societário diferente da ordem burguesa. Esta compreensão de direitos humanos que os relaciona às conquistas humanogenéricas e a uma perspectiva societária contrária ao capitalismo tem a possibilidade de serem explicitadas na dimensão da política de educação inclusiva que pode conter um posicionamento crítico às bases do capital. Portanto considera-se que a interface entre a concepção de educação inclusiva expressa na Política de Educação Especial na perspectiva da Educação inclusiva e os princípios ético-políticos do Serviço Social brasileiro é a noção de direitos humanos. De certo, ainda há inúmeras determinações desta relação que necessitam ser investigadas para aproximar os laços entre esta política e o exercício profissional do Serviço Social. O que se apreente desta investigação é que, a ciência do processo que situa o exercício profissional nas dimensões da política de educação inclusiva amplia a compreensão da profissão sobre a temática, que se sabe, ser ainda um campo emergente e carente de produções. Para o exercício profissional, poderá subsidiar a formulação de novas ações para a área fundamentadas no desenvolvimento dos princípios que a profissão defende. 63 REFERÊNCIAS ALMEIDA, Ney Luiz Teixeira. O Serviço Social na educação. Revista Inscrita, nº 6. Brasília: Conselho Federal de Serviço Social, 2000. ALMEIDA, Ney Luiz Teixeira. Apontamentos sobre a política de educação no Brasil hoje e a inserção dos assistentes sociais. In: Subsídios para o Debate sobre Serviço Social na Educação. Conselho Federal de Serviço Social: Brasília, 2011. ALMEIDA, Ney Luiz Teixeira. O Serviço Social na Educação: novas perspectivas sócioocupacionais. In: Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais. 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