PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP KEIJI NAKAMURA CONJUNTO DOS NÚMEROS IRRACIONAIS: A TRAJETÓRIA DE UM CONTEÚDO NÃO INCORPORADO ÀS PRÁTICAS ESCOLARES MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE MATEMÁTICA São Paulo 2008 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP KEIJI NAKAMURA CONJUNTO DOS NÚMEROS IRRACIONAIS: A TRAJETÓRIA DE UM CONTEÚDO NÃO INCORPORADO ÀS PRÁTICAS ESCOLARES Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE PROFISSIONAL EM ENSINO DE MATEMÁTICA, sob a orientação da Prof(a). Dr(a). Ana Lúcia Manrique. São Paulo 2008 Banca Examinadora ________________________________________ ________________________________________ ________________________________________ Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos. Assinatura: _______________________________________ Local e Data: ______________ Este Trabalho é dedicado a todos aqueles que tiveram a sorte de encontrar nesta linguagem da ciência um número chamado irracional. AGRADECIMENTOS Deus, família, Professor e amigo existem. Pela humildade, competência, paciência e apoio decisivo, a minha gratidão à Professora Doutora Ana Lúcia Manrique, orientadora deste trabalho. Lembrarei com carinho dos momentos de orientação, muito obrigado. Ao Professor Doutor Bendito Antonio da Silva, que aceitou participar da banca examinadora deste trabalho e, assim trouxe observações e sugestões pertinentes para a finalização do estudo. A cada cruzamento na PUC, um incentivo, obrigado por tudo. Ao Professor Doutor Antonio Sérgio Cobianchi que aceitou participar na Qualificação deste trabalho e, assim trouxe observações, sugestões, indicações bibliográficas e contribuições de forma valiosas para a conclusão deste trabalho. A cada momento de sua preocupação no meu trabalho, fluíram novas idéias. Jamais vou ser suficientemente agradecido, muito obrigado mesmo. Aos Professores Doutores: Ana Paula Jahn, Célia Maria Carolino Pires, Cileda de Queiroz e Silva Coutinho, Laurizete Ferragut Passos, Leila Zardo Puga, Saddo Ag Almouloud, Sandra Maria Pinto Magina, Sônia Pitta Coelho, Vincenzo Bongiovanni, muito obrigado. Aos colegas Professores: João Batista de Andrade, Mirtes Fátima Pasini, Ângela Maria dos Santos. A primeira viagem era um sonho de Euclides. A segunda viagem era o sonho de Descartes. Outras viagens eram o sonho de Nicolas Bourbaki. Enfim chegou o sonho da Professora Ângela, Professor João Batista e da Professora Mirtes. F. Pasini. A Scelisul pela ajuda financeira nesse Mestrado. A todos os funcionários do Programa, em especial ao Francisco Olímpio da Silva, Secretário do Programa de Estudo de PósGraduação em Educação Matemática da PUC/SP que sempre se dispôs a ajudar quando necessário. A Professora Heleni Sousa pela colaboração na revisão dos textos matemáticos. A Professora Elizabeth Kozikoski pela colaboração no abstract. A Professora Simone da Silva Dias Caetano pela colaboração, incentivo e apoio moral. A minha família: Teresina (esposa), Claudia (filha) e Ricardo Nakamura (filho) pela compreensão e carinho. A todas as pessoas que de alguma forma contribuíram para a realização deste trabalho. O Autor RESUMO O objetivo principal deste trabalho é investigar as dificuldades que surgiram ao longo da história para o desenvolvimento do conteúdo matemático números irracionais e quais a abordagens estão presentes nos livros didáticos. O assunto números irracionais é considerado importante na escolaridade básica de Matemática e apresenta-se para os alunos, nos livros didáticos, como um obstáculo a sua plena compreensão. Um dos aspectos que pode justificar tal situação é a complexidade com que esse assunto se manifesta. No entanto, o número irracional pode ser trabalhado em um processo histórico-epistemológico, fazendo-se um estudo de como se tem processado a transformação de objeto científico a objeto de ensino em uma organização praxeológica. Essa organização é o resultado final de uma atividade matemática que apresenta dois aspectos inseparáveis: a prática matemática, que consta de tarefas e técnicas, e o discurso fundamentado sobre essa prática, que é constituída por tecnologias e teorias. Nossas análises apontam que existem fatores os quais interferem no processo de ensinoaprendizagem de números irracionais relacionados com a organização praxeológica desse conteúdo nas coleções dos livros didáticos dos anos 70, 90 e 2000. A prova da irracionalidade com abordagem tradicional euclidiana serviu de parâmetro para avaliar o grau de dificuldade e analisar o tipo de tarefas, técnicas e o discurso teórico-tecnológico para a demonstração do número irracional. A organização aponta que a maior dificuldade está no sistema axiomático que deve satisfazer a duas condições: ser consistente, quer dizer, os postulados não podem contradizer uns aos outros por si mesmos ou por suas conseqüências; ser completo e suficiente, no sentido de se ter condições para provar verdadeiras ou falsas todas proposições formuladas no contexto da teoria em questão. A prova da irracionalidade em uma abordagem moderna dedekindiana analisada pelo tipo de tarefas, técnicas e pelo discurso teórico-tecnológico amplia o domínio numérico, juntando aos números racionais uma nova categoria de números irracionais que vêm preencher as lacunas da reta numérica. Construir técnicas para modificar e ampliar o conceito de irracionalidade de outros números é uma abordagem que explora números na forma a+b 2 , com a e b racionais, e que contribui para a superação da idéia de que há poucos números irracionais. Palavras-Chave: números irracionais; organização praxeológica; análise de livro didático; estudo histórico-epistemológico. ABSTRACT The main objective of this work is to investigate the difficulties that appeared along the history for the development of the mathematical content irrational numbers and which are the approaches present in the text books. The subject irrational numbers is considered important in the basic education of Mathematics and it comes for the students, in the text books, as an obstacle to its full understanding. One of the aspects that can justify such situation is the complexity that the subject shows. However, the irrational number can be worked in a historical-epistemological process, by doing a study of how the transformation of scientific object to an object of teaching in a praxeological organization has been processing. That organization is the final result of a mathematical activity that presents two inseparable aspects: the mathematical practice, that consists of tasks and techniques, and the speech based on that practice that is constituted by technologies and theories. Our analyses point that factors exist which interfere in the process of teaching-learning of irrational numbers related with the praxeological organization of that content in the collections of the text books of the 70s, 90s and 2000. The proof of the irrationality with traditional Euclidian approach served as parameter to evaluate the degree of difficulty and to analyze the type of tasks, techniques and the theoretical-technological speech for the demonstration of the irrational number. The organization points that the most difficulty is in the axiomatic system that should satisfy to two conditions: to be solid, it means, the postulates cannot contradict each other for themselves or for their consequences; to be complete and enough, in the sense of having conditions to prove true or false all propositions formulated in the context of the theory in subject. The proof of the irrationality in a modern Dedekind approach analyzed by the type of tasks, techniques and for the theoretical-technological speech enlarges the numeric domain, joining to the rational numbers a new category of irrational numbers that fill out the gaps of the numeric straight line. To build techniques to modify and to enlarge the concept of irrationality of other numbers is an approach that explores numbers in the form a+b¥2, with rational a and b, and that contributes to overcome the idea that there are few irrational numbers. Keywords: irrational numbers; organization praxeological; text book analysis; I study historical-epistemological. SUMÁRIO CAPÍTULO 1 ............................................................................................................ 13 Apresentação do trabalho ................................................................................ 13 1.1. Introdução .................................................................................................... 13 1.2. Questão de Pesquisa e Objetivo .................................................................. 16 1.3. Desenvolvimento do Estudo ........................................................................ 17 CAPÍTULO 2 ............................................................................................................ 19 Considerações Históricas e Epistemológicas do número irracional ........... 19 2.1. Antigüidade .................................................................................................. 22 2.1.1. A Matemática do Antigo Egito ............................................................ 22 2.1.2. A Matemática da Babilônia ................................................................. 31 2.1.3. A Matemática Grega Antiga ............................................................... 36 2.1.3.a. Pitágoras ................................................................................ 42 2.1.3.b. Euclides ................................................................................. 45 2.1.3.c. Eudoxo ................................................................................... 46 2.1.3.d. Os Paradoxos de Zenão ........................................................ 48 2.1.3.e. Arquimedes ............................................................................ 50 2.2. Renascimento da Ciência ............................................................................ 55 2.2.1. Galileu ................................................................................................ 55 2.2.2. Cavalieri ............................................................................................. 57 2.3. Idade Moderna ............................................................................................. 58 2.3.1. Descartes ........................................................................................... 58 2.4. Século dezenove .......................................................................................... 59 2.4.1. Bolzano .............................................................................................. 59 2.4.2. Cauchy ............................................................................................... 60 2.4.3. Weierstrass ........................................................................................ 61 2.4.4. Cantor ................................................................................................. 62 2.4.5. Dedekind ............................................................................................ 66 2.5. Considerações ............................................................................................ 71 CAPÍTULO 3 ............................................................................................................ 73 Análise das Reformas Curriculares e dos Livros Didáticos ......................... 73 3.1. Reformas do Currículo de Matemática ........................................................ 75 3.1.1. Guias Curriculares de Matemática – 1ºgrau – 1975 .......................... 75 3.1.2. Proposta Curricular para o Ensino de Matemática – Ensino Fundamental ....................................................................................... 81 3.1.3. Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática – 5ª a 8ª série do Ensino fundamental ....................................................................... 83 3.2. Livros Didáticos ............................................................................................ 87 3.2.1. Livros Didáticos dos Anos 70 ............................................................. 88 3.2.2. Livros Didáticos dos Anos 90 ............................................................. 91 3.2.3. Livros Didáticos dos Anos 2000 ......................................................... 93 CAPÍTULO 4 ............................................................................................................ 97 Organização Praxeológica ............................................................................... 97 4.1. Critérios para Análise ................................................................................... 98 4.2. Quadro Sinopse da Aderência às Situações ............................................... 110 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 115 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 119 FIGURAS E QUADROS Figura 2.1. Marcos na evolução de número irracional ............................................... 21 Figura 2.1.1.1. Tronco de Pirâmide ............................................................................ 23 Figura 2.1.1.2. Conjectura sobre a origem da regra de Ahmes ................................. 24 Figura 2.1.1.3. Círculo de diâmetro igual a 9 ............................................................. 24 Figura 2.1.1.4. Quadrado 8x8 .................................................................................... 24 Figura 2.1.1.5. A sua representação simbólica .......................................................... 25 Figura 2.1.1.6. Um ponto C divide o segmento AB em duas partes Desiguais Parte Maior e Parte Menor ........................................................................... 25 Figura 2.1.1.7. A divisão áurea de um segmento(I) ................................................... 26 Figura 2.1.1.8. A divisão áurea de um segmento ou divisão em média e extrema Razão (II) ............................................................................................ 26 Figura 2.1.1.9. A Pirâmide de base quadrada ........................................................... 29 Figura 2.1.1.10. Pentágono regular ........................................................................... 29 Figura 2.1.2.1. A diagonal de um quadrado de um pequeno tablete da Babilônia antiga .................................................................................................. 33 Figura 2.1.3.1. Triângulo retângulo ............................................................................ 37 Figura 2.1.3.2. Do triângulo retângulo tem se a área do semicírculo de raio c é a Soma das áreas dos semicírculos de raios a e b ............................... 38 Figura 2.1.3.3. A área da Lua hachurada .................................................................. 38 Figura 2.1.3. 4. A área (L) da lua igual a área do triângulo de catetos a ................... 39 Figura 2.1.3.5. O esquema de quatro componentes chamado Quadrivium .............. 40 Figura 2.1.3.6. Antiga civilização da Grécia e seus marcos das descobertas ........... 42 Figura 2.1.3.A.1. Triângulo retângulo (a, b e c) ......................................................... 44 Figura 2.1.3.A.2. Esquema do quadrado de lado (a+b) ............................................. 44 Figura 2.1.3.A.3. Demonstração do Teorema de Pitágoras ....................................... 44 Figura 2.1.3.E.1. Polígono regular inscrito ................................................................. 51 Figura 2.1.3.E.2. Polígono regular circunscrito .......................................................... 51 Quadro resumo 2.1.3.E.3. A diferença entre polígono circunscrito e inscrito ............ 53 Figura 2.4.4.2. A cardinalidade dos pontos do quadrado e do segmento .................. 66 Figura 2.4.5.1. Exemplo um dos Cortes de Dedekind(I) ............................................ 68 Figura 2.4.5.2. Exemplo dois dos Cortes de Dedekind(II) ......................................... 69 Figura 2.4.5.3. Exemplo três dos Cortes de Dedekind(III) ......................................... 69 Figura 3.a. Transposição didática .............................................................................. 74 Figura 3.1.1.1. Guias Curriculares – Conjunto dos números irracionais .................... 78 Figura 3.1.1.2. Subsídios para implementação do Guia Curricular de Matemática Álgebra para o 1º grau – 5ª a 8ª série - informação para o professor 79 Figura 3.1.1.3. Subsídios do Guia Curricular de matemática – Álgebra de 1º grau .. 80 Figura 3.2.1.1. Curso moderno para o ensino de 1º grau .......................................... 90 Quadro: resumo 1. Síntese das análises realizadas por situação nos Documentos Oficiais ......................................................................................... 111 Quadro resumo 2. Síntese das análises realizadas por situação nas coleções de Livros didáticos ............................................................................ 112 CAPÍTULO 1 Apresentação do Trabalho O avesso de um bordado não é tão bonito, mas é mais esclarecedor, pois deixa ver como são dados os pontos. (SCHOPENHAEUER apud BRAGA, 2006, p. 5). 1.1. Introdução No ápice do Movimento da Matemática Moderna (MMM) no Brasil, nos anos 70, uma de nossas preocupações foi a de buscar caminhos que não acarretassem prejuízos à aprendizagem da Matemática de nossos alunos, fato que nos levou diversos questionamentos, entre eles: Com que objetivo ensinamos o conteúdo números irracionais? Para que servem os números irracionais? Onde vamos usar os números irracionais? Para que estudá-los? Afinal, após ouvir uma composição de Mozart, admirar um quadro de Da Vinci ou ler um soneto de Camões, ninguém pergunta: para que serve isso? (GARBI, 2007, p. 5). No dia-a-dia, jamais nos deparamos com uma situação onde precisamos expressar resultados de medições com números possuindo infinitas casas decimais. Na prática, sempre que necessitamos dessas medidas, precisamos apenas de aproximações. 13 As nossas respostas como professores para essas e outras perguntas continuam limitadas, pois ainda não sabemos realmente o que devemos fazer para melhorar o processo de ensino e aprendizagem desse conteúdo e, por isso, aparentes dificuldades dos alunos do Ensino Fundamental relacionadas a alguns conceitos e aplicação de números irracionais. Refletindo sobre o processo de ensino implementado para esses números, chegamos a seguinte hipótese: os obstáculos podem ser encontrados na própria evolução histórica, principalmente na passagem do conjunto dos números Racionais para os Reais. Ao analisar a prática do professor em sala de aula, verificamos que estudos sobre os saberes desse profissional parecem revelar baixos níveis de compreensão e domínio do conhecimento matemático a ser ensinado. De acordo com PAIS (2002), neste caso com o avanço das idéias científicas, certos conhecimentos quando defendidos cegamente por aqueles que o detêm, impedem a aproximação de novo saber. A partir dessas observações, ao tentarmos refletir sobre nossa prática, novas preocupações vimos-nos envoltos em atendemos aos interesses dos alunos? Conseguimos identificar as dificuldades enfrentadas pelos alunos para aprender a Matemática? Resolvemos, então, buscar respostas para nossos questionamentos e fomos para o Mestrado Profissional em Ensino de Matemática na PUC-SP. De acordo com o Histórico do Programa (PUC/SP, 2005). A área de Educação Matemática inclui pesquisas sobre as questões de ensino e de aprendizagem e também sobre o desenvolvimento profissional do professor em sua prática. A vertente de Mestrado Profissionalizante em Ensino pode atender aos anseios de formação de professores que buscam novas formas de atualização, o que nem sempre significa de desenvolver pesquisas acadêmicas. As alternativas de formação continuada comumente oferecidas aos professores dos ensinos fundamentais e médios – cursos de pequena duração, desarticulados de sua prática – não têm produzido resultados positivos. Nesse contexto, o Mestrado Profissionalizante em Ensino, organizado com currículo que contemple sua área específica de conhecimento e sua formação didática – pedagógica, foi considerada uma alternativa potencialmente interessante. 14 O Mestrado Profissionalizante em Ensino, de acordo com as normas da CAPES, tem caráter de preparação profissional na área docente, focalizando o ensino, a aprendizagem, o currículo, a escola e o sistema escolar. Deve também contribuir efetivamente para a evolução do sistema de ensino, seja pela ação direta em sala de aula, seja pela ação em espaços educativos em que a atuação do professor é fundamental: escola, comunidade, associações científicas etc. O presente trabalho é o resultado de nossa busca. Procuramos fatores predominantes para compreendermos as dificuldades que muitos professores e alunos têm na compreensão dos números irracionais. Em 2005, matriculamos-nos no Programa de Mestrado Profissional da Pontifícia Universidade Católica – PUC/SP de acordo com a linha de Pesquisas: A Matemática na Estrutura e Formação de Professores, cujo objetivo é estudo do papel que a Matemática desempenha na estrutura Curricular do ensino elementar e médio e o estudo sobre a reorientação da Formação do Professor de Matemática com ênfase nas pesquisas sobre as representações dos professores em sua prática e sobre as relações professor-aluno-saber matemático. O Tema do nosso trabalho é o Conjunto dos números Irracionais: a trajetória de um conteúdo não incorporado às práticas escolares, já que os números Irracionais são um dos mais intrigantes temas da matemática elementar, sendo ainda hoje assunto de pesquisa. O objetivo principal deste trabalho é investigar as dificuldades que surgiram ao longo da história para o desenvolvimento do conteúdo matemático números Irracionais e quais abordagens estão presentes nos livros didáticos. Esperamos que o produto final de nosso trabalho seja significativo para os professores, ao colocá-los em contato com essa pesquisa, conseqüentemente aos alunos. Assim, o nosso propósito ao apresentarmos este trabalho é contribuir para a formação do professores de matemática, educadores e educandos e leválos a outros ramos de conhecimentos. De acordo com Sacristán (1998, p. 37), as teorias são vários modelos que costumam influir na construção de um currículo antes de ser interpretado pela comunidade de professores. A primeira conseqüência, tanto para o professor 15 quanto para o aluno, é que o currículo não reflete a realidade em sua verdadeira complexidade. A organização Curricular deve criar um ambiente escolar que possa ser caracterizado como espaço em que, além de buscar dados e informações, as pessoas tenham possibilidade de construir seu conhecimento e desenvolver sua inteligência com suas múltiplas competências. O processo de construção de um currículo assim concebido só pode ser um processo em constante construção e renegociação, que leve em conta o princípio de metamorfose das redes. (PIRES, 2000, p. 203-4) Ao refletirmos sobre nossas experiências como professores, percebemos que, com o decorrer dos anos, as perguntas mudaram, mas as dúvidas persistem nas cabeças dos professores de matemática. Nas décadas de 70 a 90, os questionamentos dos professores e alunos eram: os por quês, para que, onde vamos usar isso? Atualmente, os professores e alunos continuam com perguntas: por que temos dificuldades de ensinar e aprender? 1.2. Questão de pesquisa e objetivo Considerando essa reflexão inicial, propomos então a nossa questão: Que dificuldades surgiram ao longo da história de Matemática para o desenvolvimento do conteúdo matemático números irracionais, e quais abordagens estão presentes nos livros didáticos? Logicamente, a consideração deste trabalho não é suficiente e nem temos a pretensão de esgotar o assunto, muito ao contrário, destina-se apenas despertar a atenção sobre o tema Números Irracionais. Acreditamos também que uma nova abordagem do Conjunto dos números irracionais deve ser construída especificamente voltada para a formação de professores e que tal abordagem teria que partir fundamentalmente da problemática da apresentação conceitual e uma visão global dos conjuntos numéricos que efetivamente instrumentalize para o ensino. 16 1.3. Desenvolvimento do Estudo No capítulo dois faremos uma análise histórico-epistemológica dos números irracionais, na qual constatamos que a sua evolução seguiu um caminho muito longo e com muita dificuldade, sendo que a verificação da irracionalidade de um dado número só é possível, naturalmente, no âmbito da própria matemática. Nenhuma verificação empírica, nenhuma medição de grandezas, por mais precisa que seja, provará que uma medida tem valor irracional. Os trabalhos desenvolvidos nas Antigas civilizações do Egito, Babilônia e Grécia através dos estudiosos como Pitágoras (586 a.C.-500 a.C.), Euclides, Eudoxo (408 a.C.-355 a.C.), Zenão e Arquimedes (287 a.C.-212 a.C.); e dos estudos de Galileu (15641642), Descartes (1596-1650), Cavalieri (1598-1647), Bolzano (1781-1848), Cauchy (1789-1857), Weiersttrass (1815-1897), Cantor (1845-1918) até chegar a Dedekind (1831-1916), ocupam posições de destaque nessa caminhada, separando os números Racionais em duas classes A e B para determinação do número Irracional. No capítulo três faremos uma investigação da evolução do conceito de números irracionais nos livros didáticos do Ensino Fundamental e nas Reformas do ensino mais recentes. No capítulo quatro apresentamos uma análise dos livros didáticos, utilizando a noção de Organização Praxeológica proposta por Chevallard (1995), presente em sua Teoria Antropológica do Didático, que situa a atividade matemática no conjunto das atividades humanas e das instituições sociais. E terminamos com nossas considerações finais. 17 CAPÍTULO 2 Considerações Históricas e Epistemológicas do Número Irracional Todo professor do Ensino Fundamental, Médio e Universitário deveria conhecer a história da Matemática. Há muitas razões para isto, mas ser um excelente guia pedagógico é talvez a mais importante. (MORRIS KLINE apud CARVALHO, 1984, p. 13) Neste capítulo temos como objetivo fazer uma viagem panorâmica histórica que nos auxilie na reflexão a respeito da importância do tema números irracionais como objeto de estudo. A compreensão epistemológica da evolução do conhecimento do número Irracional, considerando sua motivação filosófica e social tem sido um recurso bastante válido, nos auxiliando a entender a coerência e estrutura do conhecimento do aluno. STRUIK aponta seis aspectos que tornam o estudo da história da Matemática atrativo: 1) ele satisfaz o desejo de muitos de nós de sabermos como as coisas em matemática se originaram e se desenvolveram; 2) o estudo de autores clássicos pode oferecer uma grande satisfação em si mesmo, mas também pode ser um auxiliar no ensino e na pesquisa; 3) ele ajuda a entender nossa herança cultural, não somente através das aplicações que a matemática teve e ainda tem na astronomia, na física e outras ciências, mas também devido às relações que ela teve e ainda tem com campos variados como a arte, a religião,a filosofia e as técnicas artesanais; 19 4) ele pode proporcionar um campo onde o especialista em matemática e os outros campos da ciência podem encontrar interesse comum; 5) ele oferece um pano de fundo para a compreensão das tendências em educação matemática no passado e no presente; 6) podemos ilustrar ou tornar mais interessante o seu ensino e conversação com historietas. (STRUIK, 1985, p. 213 apud MATEUS, 2007, p. 61) Segundo D’Ambrósio (1999), a introdução da História da Matemática para o ensino pode ser considerada elemento motivador e, mesmo, caminho para esclarecer idéias Matemáticas, incluindo-as em um Movimento Humanista. Para conhecermos melhor a história dos marcos da evolução do conceito de número irracional, começaremos a estudar as Civilizações Antigas: Egito, Babilônia e Grécia. Parece que os gregos nunca chegaram a ter uma concepção clara do que nós chamamos hoje de número irracional. Para tentar entender por quê os gregos não conseguiram explicar as contradições geradas pelo fenômeno da incomensurabilidade, por isso estudaremos alguns estudiosos gregos como Pitágoras, Euclides, Eudoxo, os Paradoxos de Zenão e Arquimedes. Talvez da Grécia tenham partido as primeiras grandes provocações filosóficas da época como algo que não estava sendo compreendido ou suficientemente explicado pelos conhecimentos já existentes. Os estudiosos partiram na incessante busca de explicações, gerando assim novas descobertas matemáticas que permanecem válidas até hoje como o famoso Teorema de Pitágoras, No período do Renascimento da Ciência, estudaremos alguns seguidores da Rainha das Ciências italianos como Cavalieri (1635) e Galileu (1638). Nesse período, os estudiosos em matemática enfrentaram novos paradoxos: Quantos elementos tem o conjunto dos números naturais? E dos inteiros? E dos racionais? E dos irracionais? O conjunto dos naturais tem o mesmo número de elementos que o conjunto dos inteiros? Esses paradoxos não foram superados sem traumas pelos estudiosos da matemática. 20 Na época da Idade Moderna estudaremos a invenção da Geometria Analítica do filósofo Descartes (1639). No Século XIX estudaremos a evolução do Conceito do Número Irracional com: Bolzano (1820), Dedekind (1872), Cantor (1883). As respostas a várias provocações só foram consideradas satisfatórias no final do século XIX com os trabalhos sobre os números irracionais de Dedekind, dentre outros. ANTIGÜIDADE A Conquista Constata a O Homem existência de SEGMENTOS PITÁGORAS País A Época Grécia Séc. VI a.C Grécia Séc. IV a.C. INCOMENSURÁVEIS A TEORIA DAS PROPORÇÕES(método de EUDOXO exaustão) Primeira crise no conceito de INFINIDADE. ZENÃO Grécia Séc. IV a.C. Primeira formulação do conceito LIMITE. ARQUIMEDES Grécia Séc. III a.C. RENASCIMENTO DA CIÊNCIA A Conquista País A Época FRAÇÕES BOMBELLI Itália Séc. XVI D.C. Formulação do INFINITO. CAVALIERI Itália 1635 Primeira formulação do CONJUNTO INFINITO GALILEU Itália 1638 Primeiro uso O Homem sistemático das CONTÍNUAS. IDADE MODERNA A Conquista O Homem País A Época Invenção da GEOMETRIA ANALÍTICA DESCARTES França 1639 Pais A Época Alemanha 1820 Primeira Teoria Científica dos IRRACIONAIS Dedekind Alemanha 1872 Segunda dos Cantor Alemanha 1883 Cantor Alemanha 1883 SÉCULO DEZENOVE A Conquista O Homem Primeira Formulação da POTÊNCIA de um Bolzano conjunto Teoria Científica IRRACIONAIS Invenção do TRANSFINITO Figura 2.1. Marcos na evolução do conceito de número irracional (DANTZIG, 1970, p. 214-5) 21 2.1. Antigüidade 2.1.1. A Matemática do antigo Egito O conhecimento do Antigo Egito ainda não foi completamente descoberto, mas já se sabe que eles foram mestres na medicina, na astronomia e, principalmente, na engenharia. (GONÇALVES, nº 3, p. 11). Os egípcios há 6.500 anos escreviam números sem se importarem com a ordem dos símbolos e com o princípio aditivo. Usavam base dez, como fazemos hoje, mas não adotavam notação posicional. Temos como exemplos: ||| e ||| que correspondem ao valor vinte e três nos dias de hoje. A base dez não aparece como uma constante na evolução dos sistemas de numeração já que outras bases também foram usadas; o mesmo acontece com a notação posicional. A matemática era conhecida pelos antigos egípcios como receitas práticas que, muitas vezes, funcionavam por aproximação e eram resultados de tentativas e erros feitos durante milênios. Conheciam o teorema que, mais tarde, passou a chamar-se Teorema de Pitágoras e desenvolveram fórmulas para o cálculo de áreas e volumes. Criaram um calendário de 365 dias e inventaram o relógio de sol e a balança. A civilização egípcia sempre foi considerada uma grande atração do ponto de vista histórico e matemático, pois ao longo de sua fascinante trajetória apresentou uma vasta coleção de documentos matemáticos, como os papiros de Rhind e de Moscou. Os quais são considerados os trabalhos mais importantes da matemática egípcia, por apresentarem o maior número de problemas, os quais surgiram para auxiliar as atividades práticas de agricultura e engenharia. Documento importante, que juntamente com o Papiro de Rhind formam a base de conteúdos matemáticos, desenvolvidos pelos egípcios, é o Papiro de Moscou, comprado em 1858, que, provavelmente foi escrito por volta de 1890 antes de Cristo e contém 25 problemas, os quais retratam a vida prática e não se diferem muito dos encontrados no Papiro de Rhind. Contudo, há dois exemplos neste que têm significado especial. Um deles retrata um cálculo de volume para o 22 tronco de uma Pirâmide de base quadrada, no qual se constatou que os egípcios tinham conhecimento da fórmula V= (a2+ab+b2). h , em que h era a altura do 3 tronco da Pirâmide, a e b eram os lados das bases quadradas. Apesar de essa fórmula não ter sido encontrada em nenhum outro lugar, segundo ZUFFI (20042005, p. 55), era evidente conhecida em essência pelos egípcios. Figura 2.1.1.1. Tronco de Pirâmide Segundo Boyer (1974, p. 16), os papiros tinham uma essência prática no que diz respeito aos fundamentos e utilidades da Matemática Egípcia, a qual não se preocupava com o aprofundamento teórico. Esses documentos poderiam se tratar de guias para estudos e aplicações desses temas. Ainda temos no Egito Antigo o cálculo de aproximações numéricas simples de S , que aparece no problema 50 do Papiro Rhind e trata da tentativa de determinação da área de campo circular. A solução sugere: tire 1/9 do diâmetro e eleve ao quadrado o resto. Disso se deduz que os egípcios aproximavam S por 256/81 =3,16049... Essa aproximação remete à nossa questão de pesquisa por apontar uma maneira de os egípcios resolverem o problema da representação dos números irracionais, aproximando-os com fração de números inteiros. Há indícios de que chegaram a essa solução utilizando um octógono inscrito num quadrado de lado D cuja área, visualmente, semelhante à do círculo. 23 A área de tal octógono é para 64 2 D 81 7 x9 2 7 2 D ou seja, D 9 9 x9 63 2 D , que ele teria aproximado 81 8 2 ( D) . 9 Figura 2.1.1.2. Conjectura sobre a origem da regra de Ahmes Vejamos um exemplo numérico. Figura 2.1.1.3. Círculo de diâmetro igual a 9 24 Figura 2.1.1.4. Quadrado: 8x8 9 2 Área do Círculo = S r 2 = S ( ) u.a. 2 Área do Quadrado: lado x lado = 8x8 u.a. Ao pensarmos na equivalência das áreas obtemos um valor aproximado de S: 81 9 2 S ( ) =8x8 S( ) 64 S 4 2 64 x 4 S 81 256 81 3 13 S # 3 ,16 81 De acordo com BROLEZZI (1996, p. 13) o antigo egípcio usava esse recurso que poderia tornar possível contornar o problema das grandezas irracionais, ou seja, usava números para lidar com a geometria, aproximando numericamente o valor da área de um círculo pela área de um quadrado. De maneira geral, utilizavam números para contagem e para medidas, sem distinção clara nas atividades. TAHAN (1972, p. 232) aponta que dividir um segmento AB em média e extrema razão é dividi-lo em duas partes, AC e CB, tais que todo (AB), dividido pela parte maior (AC), seja igual à parte maior dividida pela parte menor. Simbolicamente temos: Figura 2.1.1.5. A sua representação simbólica. Figura 2.1.1.6. Um ponto C divide o segmento AB em duas partes desiguais: parte Maior e parte Menor. 25 Figura 2.1.1.7. A divisão áurea de um segmento, ou divisão em média e extrema razão Um ponto C divide o segmento AB em duas partes desiguais: parte maior e parte menor. Observamos que a parte maior é uma média entre o todo e a parte menor; a razão é extrema porque não existe, no caso, outra solução da qual resulte a igualdade entre as razões segmentárias. E, para o ponto C, uma posição extrema, denomina-se média e extrema razão. Esse ponto que divide o segmento AB em média e extrema razão é chamado ponto de ouro do segmento AB. Estando o ponto de ouro no segmento diremos que ele é interno e, nesse caso, o maior segmento AC é determinado de segmento áureo interno. Figura 2.1.1.8. A divisão áurea de um segmento, ou divisão em média e extrema razão. Se o ponto C, fora do segmento AB, isto é, o ponto de ouro externo C fica no prolongamento do segmento AB, podemos dizer que o ponto C divide AB em média extrema razão. O segmento AC é chamado segmento áureo externo. Lucas Pacioli (1445-1514) descobriu que existe uma certa divisão que é a máxima expressão harmoniosa, momento agradável ao espírito, aquela que tem a preferência dos artistas, dos arquitetos, dos escultores e dos estudiosos em matemática, ou seja, a divisão em média e extrema razão. Essa divisão áurea foi criada por Leonardo da Vinci (1452-1519), segundo TAHAN (1972, p. 235-6). Se C divide o segmento AB em média e extrema razão, ou, ainda, C ocupa a posição de Ouro no segmento AB, se e somente se, AB=AC+CB com AC>CB, logo, 26 AB AC AC , na figura 2.1.8, CB AC CB AC ( AC )2 2 ( CB ) AC CB AC ( AC )2 CB ( CB )( AC ) ( CB )2 ( AC )2 ( CB )( AC ) ( CB )2 0 AC 1 0 , pela fórmula de Bháskara (*): CB 1 5 AC !0 e 2 CB 1 5 <0. 2 Das duas raízes dessa equação: AC CB 1 5 2 e AC CB 1 5 , a raiz 2 positiva é o ponto de ouro interno e a raiz negativa é o ponto de ouro externo. A “Posição de ouro” é a expressão utilizada por BIEMBENGUT (1996) quando se refere à posição do ponto C sobre AB , determinando a seção áurea desse segmento (p. 13) (CORBO, 2005, p. 58). Segundo CORBO (2005, p. 58), AC CB 1 5 é conhecida como Razão 2 Áurea entre os segmentos AB e AC ou AC e CB. Por sugestão do matemático americano Mark Barr, foi adotada a letra ) (Phi), para representar o número irracional 1 5 , em homenagem ao escultor grego PHIDIAS (490?-430?), pois 2 foi observado que em suas obras há uma predileção por dimensões que atendem à Razão Áurea. De acordo com ÁVILA (1985, p. 11), chamamos de divisão Áurea de um segmento, a divisão em média e extrema razão, enquanto que o número da razão de medida (AB)=a e a medida (CA)=b da figura 2.1.1.6, 5 1 a = é conhecido b 2 como razão Áurea. A matemática e a razão Áurea em particular proporcionam um rico tesouro de surpresas desse tipo. Se AC CB x, substituindo em (*) x2-x-1=0. Baseada na construção de um método interativo do tipo x=f(x), temos x=1+ 1 , a fração x 27 contínua periódica que corresponde a razão Áurea é composta somente de uns, 1 ela converge muito lentamente. x 1 1 1 1 1 ... A razão Áurea é, nesse sentido, mais difícil de expressar como uma fração do que qualquer outro número irracional ou seja, é a mais irracional dos irracionais. Segundo LÍVIO (2006, p. 72), em 1999 o escritor francês Micdhat J. Gazelé escreveu um assunto muito interessante no livro Gnomo: Dos faraós aos fractais; em que dizia: “Disseram que o historiador grego Heródoto aprendeu com sacerdotes egípcios que o quadrado da altura da Grande Pirâmide é igual à área da sua face lateral triangular”. Então, podemos dizer que a Grande Pirâmide foi projetada de modo que a razão entre a altura de sua face triangular e a metade do lado da base quadrada fosse igual à Razão Áurea. SARAIVA (2002, p. 4) apresenta um cálculo aproximado de considerado Razão Áurea, para uma pirâmide. Dados: A altura da pirâmide é h=146,59 metros. A aresta da base quadrada é 2.a = 230,33 metros A metade da aresta da base é a = 115,165 metros. S a altura da face triangular da pirâmide. Aplicando o Teorema de Pitágoras temos: S2 = (115,165 m)2 + (146,59 m)2 S2 = 13262,97723 m2 + 21488,6281 m2 = 34751,60533 m2 S = 186,4178246 metros 28 ), ) 186 ,4178246 m S = # 1,618 a 115 ,165 m (SARAIVA, 2002, p. 4) Figura 2.1.1.9. A pirâmide de base quadrada. Um outro exemplo do número Áureo 1 5 pode ser observado da razão 2 entre os comprimentos de uma diagonal de um lado do pentágono regular. Figura 2.1.1.10. Pentágono regular 29 I) O ângulo ABC = 108º (ângulo interno do pentágono regular). II) O triângulo ABC é isósceles, implica que ângulo BAC e ângulo BCA são congruentes, ou seja, o ângulo BAC é igual ao ângulo BCA=36º. Logo ângulo ABF = 36º. Analogamente, ângulo ABE = ângulo DBC=36º Portanto ângulo FBG=108º-72º=36º Ângulo BGC=108º, ângulo BGA=72º, o que mostra que o triângulo ABG é isósceles (1). Também, pelo caso AA da semelhança de triângulos, tem-se a semelhança de triângulos ABC e BGC, já que os ângulos de ambos medem 36º, 36º e 108º Da semelhança entre os triângulos ABC e BGC, temos: AB GC AC (2 ) BC Representando por l o lado e por d a diagonal do pentágono regular, temos: AC=d, AB=BC=l; GC=d -AG= d-l por (1) Substituindo em (2), tem l d l d d 2 dl l 2 l 0 : multiplicando ambos os membros por 1 l2 resulta: d 2 d ( ) 1 0 l l d l 1r 14 2 d l 1 5 2 1r 5 , considerando a medida positiva, temos: 2 Como não existe qualquer evidência de que os egípcios da época do Antigo Reino tivessem algo além dos mais rudimentares elementos de 30 matemática, a presença de S e ) na geometria das pirâmides deve ser conseqüência de alguns conceitos práticos e não teóricos, consistindo como um verdadeiro enigma das pirâmides. 2.1.2. A Matemática da Babilônia Há cerca de cinco mil anos, entre os rios Tigre e Eufrates começaram a surgir alguns dos principais avanços no mundo do conhecimento científico. (GRECCO, nº 3, p. 16). Ao nos referirmos à matemática da Babilônia, queremos falar sobre o tipo de matemática cultivada na Antiga Mesopotâmia, a região entre os rios Tigres e Eufrates ou, de maneira geral, o que é hoje o Iraque. Os babilônios trabalhavam com um sistema de numeração sexagesimal, base sessenta, que deu origem as nossas atuais unidades de tempo, em horas, minutos, segundo e as unidades de ângulos, em graus, minutos e segundos. As semelhanças entre nosso sistema de numeração e o dos babilônios são várias: nós, como eles, empregamos um número finito de símbolos (usamos dez e eles dois) para exibir todos os números inteiros; fazemos o valor posicional (mudança de casa para a esquerda) ou seja, o seu valor seja multiplicado por 10, se for o nosso; por 60, dos babilônios. Usamos uma extensão desse princípio para exprimir certas frações, como frações decimais e eles com frações sexagesimais, fazendo valer mesmo além da casa das unidades a regra de que a movimentação de um algarismo uma casa para a direita significa dividir o seu valor pela constante 10 ou 60. Também, é certo que cada base tem as suas vantagens e desvantagens. Uma desvantagem de ser a base maior 60 é que a tabuada de multiplicação terá a dimensão de 59 por 59, praticamente impossível a sua memorização. Por sua vez, são possíveis números muito grandes ou bem pequenos, de modo que seus números cresciam muito rapidamente para um lado e decresciam muito rapidamente em direção ao lado oposto. 31 AABOE (1984, p. 26-7) aponta que outra grande diferença, ou seja, a falta de equivalência à vírgula decimal é, certamente, uma deficiência no sistema de numeração sexagesimal, embora, não tão séria quanto pode verificar à primeira vista. No sistema de numeração decimal, quando se trata das técnicas operatórias das multiplicações ou divisões de números decimais em verdade, elas não têm implicação sobre a seqüência dos dígitos do resultado, mas controlam somente sua grandeza, isto é, sobre a posição da vírgula decimal. No S.N.D. temos várias regras e alguns atalhos que facilitam as técnicas operatórias, tais como: para multiplicar por 5 divida por 2 e multiplique o resultado por 10; um número é divisível por 3 ou 9 se a soma dos algarismos é divisível por 3 ou 9. Essas técnicas simples podem ser aplicadas ao sistema sexagesimal; a razão de que são possíveis mais regras na base sexagesimal do que no decimal é porque a base 60 (1, 2, 3, 4, 5, 6, 10, 12, 15, 20, 30, 60) tem muito mais divisores do que base 10 (1, 2, 5, 10). Fica assim evidente que os babilônios não encontravam mais dificuldades com o cálculo aritmético do que nós, hoje. O Sistema de Numeração decimal foi tratado para compreender a densidade dos números Irracionais como procedimento, troca de um ou mais algarismos da representação decimal infinita não periódica baseada na diagonalização de Cantor. Com relação aos cálculos sexagesimais, estes auxiliados por uma grande variedade de tábuas. Existem tábuas para o cálculo de juros compostos, tábuas de quadrados e de raízes quadradas, de cubos, e várias outras que indicam um interesse em processos numéricos muito além das exigências da aritmética simples, com desenvolvimentos sexagesimais finitos, segundo AABOE (1984). Esse recurso tornava possível contornar a dificuldade das grandezas irracionais formando uma linguagem numérica extremamente facilitada para lidar com segmentos incomensuráveis. Assim, por exemplo, utilizando o caso especial do que costumamos hoje chamar de Teorema de Pitágoras, isso aconteceu uns 1200 anos antes da época 32 em que acreditamos que Pitágoras viveu, que os babilônios sabiam que a diagonal do quadrado é 2 vezes seu lado. Temos como a figura 2.1.2.1 uma tradução de um pequeno tablete da babilônia antiga de acordo com AABOE (1984, p. 34 e 35). Vemos três números: a=30; b=(1; 24, 51, 10) e c=(42; 25, 35). Observamos primeiramente que: c=a.b Figura 2.1.2.1. A diagonal de um quadrado de um pequeno tablete da Babilônia antiga, segundo AABOE (1984, p. 35). Verificamos primeiramente o produto c=a.b e introduzimos os pontos e vírgulas nas posições apropriadas, conforme a indicação de AABOE (1984, p. 34). 33 C=(42; 25, 35, 0) Se a representar o lado do quadrado, como sugerido pela figura, e c a diagonal, então, pelo Teorema de Pitágoras, c2= a2 + a2, portanto, c2 = 2 a2 chamaremos de equação I e se temos c=a.b, elevando ao quadrado ambos os membros, temos: c2 = a2. b2 equação II, substituindo na equação I e depois aplicando a lei do cancelamento, temos: b2=2 b b deve ser a aproximação de 2 , desse modo o valor de 2. 2 (1; 24 ; 51; 10 ) 24 51 10 1 1 0 ,4 0 ,014166666 0 ,000046296 60 60 2 60 3 b 1,414212962 ( aproximadam.) Segundo Vitti (1999), os pesquisadores Otto Neugebauer e F. Thureau Dangin, que, na década 30 reconstruíram, através de pesquisa em mais de dez mil tabletes, vários conceitos aritméticos da história da matemática Babilônica, encontraram no tablete Plimpton 322 1 uma relação de números pitagóricos ligados por a2 b2 c 2 , quando o escriba limitou-se a descrever a harmonia da igualdade, não a relacionando a qualquer problema prático. BOYER (1974, p. 8) também aponta os estudos de Neugebauer quanto ao cálculo, dos babilônios, da diagonal de um quadrado, afirmando ser prova suficiente de que o teorema pitagórico era conhecido mais de mil anos antes de Pitágoras. A decifração dos tabletes de argila YB-4650, AO-6484, TV-3420 e YH-567 permitiu, mesmo que de maneira precária, deduzir que os babilônios já trabalhavam com a raiz quadrada de um número. 1 Segundo AABOE (1984, p. 167), Plimton 322 é o tablete de número 322 na coleção Plimton da Universidade de Columbia, New York. 34 Uma aproximação da raiz quadrada de um número (N) pode ser obtida segundo a receita prática: arbitre um valor qualquer ( N0 ) que deverá dividir o número do qual se pretende extrair a raiz quadrada. Resulta outro número ( N1 ). Some ( N1 ) com o arbitrado ( N0 ) e divida tudo por dois. O resultado será outro número ( N 2 ). Divida o número pretendido (N) pelo valor anterior ( N 2 ), quando se encontra ( N 3 ). Divida a soma dos dois resultados ( N 2 e N 3 ) por dois. Continue até os valores convergirem. O texto acima pode ser trazido como segue: X= Raiz quadrada N No = valor aproximado da raiz quadrada de N. N1 N2 N3 N4 N5 N Divida N pelo valor aproximado N o No N o N1 2 Some N1 com No e divida por 2 N Divida N por N2 N2 N2 N3 2 Some N2 com N3 e divida por 2 N Divida N por N4. N4 Continue. Aplicando o procedimento dos babilônios, apresentamos dois exemplos, um para um quadrado perfeito e outro para um não perfeito, encontrados em VITTI (1999, p. 60-1) Exemplo 1: x N0 2, N1 9 2 N2 2 4 ,5 2 9 4 ,5 , 3 ,25 ; 35 N3 N4 9 2 ,76 ; 3 ,25 3 ,25 2 ,76 # 3 ,00 2 Exemplo 2: x No N1 N2 N3 N4 21 4 21 5 ,25 ; 4 4 5 ,25 4 ,625 2 21 4 ,54 4 ,625 4 ,625 4 ,54 4 ,5825 2 21 é aproximadamente 4,58. O ensino da Matemática na Babilônia não encontrava dificuldades na realização de seus cálculos. Isso, pelo fato de possuírem um sistema de numeração posicional, o que pode ser uma das razões que levaram a Matemática dos babilônios a um desenvolvimento maior que a dos egípcios, segundo Miorim (1998). 2.1.3. A Matemática Grega antiga No século III a.C., a cidade fervia de intelectuais e de matemáticos, que tomaram conhecimento dos trabalhos dos colegas enquanto ali estavam e trocaram correspondência durante a produção de suas obras. (autor desconhecido, nº 3, p. 44) GARBI (2003, p. 15) aponta que os egípcios e os babilônios já possuíam expressivos conhecimentos de Aritmética e de Geometria cerca de 2.000 a.C., mas tudo indica que suas descobertas se deram de forma intuitiva, ou seja, através da prática. 36 A civilização grega que floresceu de 2000 anos a.C. até as conquistas de Alexandre na década de 330 a.C. e foi uma das mais admiráveis em toda a história da humanidade. Atenas foi o centro de toda atenção do mundo helênico e continuou no tempo de Péricles, no século V a.C. Segundo MACHADO (1995, p. 253) na sua origem e remontando ao pensamento grego, a palavra número dizia respeito aos de hoje chamados números naturais, os quais, de fato, permitem ligação intuitiva e imediata com a idéia de medida. Os números podiam ser representados como segmentos de reta, seus quadrados como área, seus cubos como volumes. De acordo com esse tipo de pensamento, números negativos realmente não fariam sentido e menos ainda suas raízes. Pela primeira vez na história surgiram nas disputas políticas e sociais, filósofos e professores que qualificavam as suas teorias. Dentre o grupo de homens críticos, os sofistas desenvolveram uma matemática com elevado grau de perfeição que se relaciona, como é característico, com um assunto fantástico e pouco prático, mas teoricamente válido, as chamadas de lúnulas, as pequenas luas ou crescentes delimitados por dois arcos circulares. Encontrar determinadas áreas limitadas por dois arcos circulares em função dos diâmetros está relacionado com o problema da quadratura do círculo, que constituiu um problema central da matemática grega, segundo STRUIK (1992, p. 75). Apresentaremos apenas a lúnula 1 (ao todo são três) de Hipócrates: Do triângulo retângulo tem-se que a área do semicírculo de raio c é a soma das áreas dos semicírculos de raios a e b, tem-se: ( 2 c )2 ( 2 a )2 ( 2 b )2 c2 a2 b2 c2 2 a2 b2 2 2 Figura 2.1.3.1. triângulo retângulo. 37 Multiplicando-se por S c2 2 S a igualdade da identidade acima, tem-se: S a2 S b2 2 2 Figura 2.1.3.2 (I) Aplicação deste resultado na lúnula, tem-se: Figura 2.1.3.3 (II) A área da Lua hachurada é igual à área do semicírculo de raio b menos (um quarto da área do círculo de raio a menos a área do triângulo isósceles de cateto a), 38 Figura 2.1.3.4 logo, Área da Lua = S b2 S a2 a2 [ ] 4 2 2 Pelo Teorema de Pitágoras temos: ( 2 b )2 L= a2 a2 a2 2 b2 S b2 S2 b2 a2 a2 , portanto, L= 2 4 2 2 Conclui-se que a área (L) da lua é igual à área do triângulo de catetos a. STRUIK (1992, p. 73) aponta que os gregos foram responsáveis pelas primeiras noções e idéias propriamente científicas, do porquê, ou seja, uma matemática que colocava não só a questão de como, mas também a moderna questão científica, por que, ou ainda, fundamentadas em uma lógica de raciocínio e baseadas na tentativa de formar definições dos termos empregados. Segundo BROLEZZI (1996, p. 19), Nicolas Bourbaki, do grupo de matemáticos franceses, atribui a crise dos incomensuráveis aos gregos devido ao fato de que estavam tão convencidos de que no conceito de número não cabia nada mais que inteiro e frações que não aceitaram que os irracionais fossem números também. A existência de segmentos incomensuráveis significa que os números naturais mais a frações são insuficientes para medir todos os segmentos de reta. A solução que se impunha, e que no final do século XIX finalmente foi adotada, era de estender a noção do número. Era evidente que o conceito de números irracionais está diretamente associado à noção de grandezas incomensuráveis. Todavia os gregos não fizeram a ampliação do seu mundo numérico, apenas reforçaram a separação entre a teoria dos números (Aritmética) e a geometria. 39 A separação da Matemática em componentes era como sair de um compartimento e encontrar uma resposta noutro compartimento em que não via claramente as relações e que causava muita obscuridade e embaraço. Parece ser o fruto do receio grego (pitagórico) de misturar a pureza dos números com as grandezas incomensuráveis. O esquema de quatro componentes, que mais tarde foi chamado de Quadrivium, segundo BROLEZZI, (1996, p. 19): Números Grandezas Em repouso Aritmética Geometria Em movimento Música Astronomia Figura 2.1.3.5 - Quadrivium COSTA (1971, p. 220) aponta que os gregos antigos conheciam um outro campo do saber, a logística e a aritmética aplicada, que ensinava aos homens de vida prática (como os agrimensores e militares) que precisavam fazer uso de números em operações e cálculos relativos à geometria e à Astronomia, números racionais vizinhos do valor verdadeiro. Desse modo, a Aritmética grega tratava do que hoje chamamos de Teoria dos Números, e a Logística grega se referia às operações aritméticas, geometria e astronomia que hoje é assunto da Álgebra. Durante a segunda metade do século V a.C. (A IDADE HERÓICA) circularam relatos sobre alguns estudiosos em matemática muito importantes. Essa época é chamada de idade Heróica pois, talvez, nunca se tenha feito em qualquer outra época, um ataque tão audacioso a tantos problemas matemáticos fundamentais com recursos metodológicos tão insuficientes. Alguns exemplos: 1. Os indivisíveis; 2. Os paradoxos de Zenão; 3. A razão de grandezas incomensuráveis; 4. Validade dos métodos infinitesimais; 5. O problema da quadratura; 6. A quadratura do círculo; etc 40 Platão (422 a.C.-347 a.C) foi importante na História da Matemática pois explicitou uma distinção entre Aritmética(no sentido da Teoria dos números) e logística (a técnica da computação). Seu estudo sobre a incomensurabilidade causou um verdadeiro escândalo lógico, pois pareceu arruinar teoremas envolvendo proporções. Mas a crise resultante da incomensurabilidade foi enfrentada com sucesso e com a criatividade de Eudoxo(408 a.C.-355 a.C.), que reformulou a teoria das proporções de modo a levar em conta a existência dos números irracionais, e de Aristóteles(384 a.C.-322 a.C.), considerado o pai de todas as ciências, discípulos de Platão. Durante a idade Helenista (a civilização grega, que floresceu desde uns 2000 a.C. até as conquistas de Alexandre na década de 330 a.C.), três estudiosos matemáticos se destacaram: Euclides(por volta de 300 a.C.), Arquimedes(287 a.C.-212 a.C.) e Apolônio(262 a.C.-190 a.C.). Os Elementos de Euclides e As cônicas de Apolônio foram de longe as melhores obras em seus campos. Arquimedes pode ser considerado pai da Física-matemática não só por seu estudo sobre o equilíbrio de planos, mas também por outro tratado como corpos flutuantes. Arithmetica escrito por Diophanto (em torno de 250D.C.) reúne uma coleção de 100 problemas resolvidos de modo original. Ptolomeu (127-151D.C,) viveu no século II da nossa era e sua principal obra é o Almagesto que, em árabe, significa o maior. A preocupação central desse astrônomo era o estudo da trigonometria, que lhe permitia localizar, entre outras coisas, a posição dos planetas na abóbada celeste. Do nosso ancestral que inventou a roda ao grego Arquimedes, percebemos que muita coisa mudou, a ciência evoluiu e as descobertas deixaram de ocorrer ao acaso para serem criativas e planejadas na hora e no tempo certo. Abaixo, temos a linha do tempo da Civilização Grega Antiga que não estudava somente a geometria conforme as notações periódicas e suas descobertas, mas as principais obras primas da área da matemática que permanecem até hoje, como o famoso Teorema de Pitágoras. 41 Figura 2.1.3.6. Antiga civilização da Grécia e seus marcos das descobertas segundo GIRARDI (nº 3, ?a, p. 5). 2.1.3.a. Pitágoras (586?a.C. - 500? a.C.) Temos conhecimento particularmente de Pitágoras de Samos, em torno de 530 a.C., e seus seguidores, os pitagóricos, por suas realizações na matemática, na filosofia e na religião. Enquanto a maior parte dos sofistas dava prioridade à realidade da mudança, os pitagóricos privilegiavam os estudos dos elementos imutáveis da natureza e da sociedade. Na procura de leis eternas do universo, os pitagóricos estudaram geometria, aritmética, astronomia e música, mais tarde chamado de quadrivium. Os números (inteiros) eram divididos em classes: ímpares e pares, primos e compostos, perfeitos, amigos, triangulares, quadrados, pentagonais, etc. Os pitagóricos investigavam as propriedades dos números, acrescendo-lhes um sinal do seu místicismo e convergindo a sua filosofia cósmica que tentava reduzir todas as relações fundamentais a relações numéricas: tudo é número. Davam a maior importância às razões entre números. A igualdade de razões formava: I) uma proporção aritmética: 2b = a + c; II) uma proporção geométrica: b2 III) uma proporção harmônica: 2 b a.c ; 1 1 , a c e interpretavam-nas filosófica e socialmente. 42 Segundo PIRES (2006, p. 137), os irracionais apareceram também no meio pitagórico, os quais se interessavam por figuras regulares, quadrado, triângulo eqüilátero, pentágono, e como em cada uma aparece uma relação irracional, percebe-se tal qual foi a confusão e quão grande foi o escândalo que durou mais de dois mil anos. A descoberta da irracionalidade da 2 é provavelmente da Escola Pitagórica, segundo STRUIK (1992, p. 80), devido aos segmentos de reta incomensuráveis. Essa descoberta pode ter tido interesse pela média geométrica a:b=b:c, isto é, b= a.c , parecia que servia como símbolo de nobreza aos pitagóricos. Qual é a média geométrica de 1 e 2, dois símbolos sagrados? Essa questão centralizou ao estudo da razão entre a diagonal e o lado do quadrado e concluiu que essa razão não podia ser expressa por número, o que hoje chamamos de racionais (inteiros e fracionários), os únicos que eram conhecidos naquela época. A demonstração clássica da irracionalidade de 2 , segundo Aristóteles, é: Suponhamos por hipótese que a razão é a : b e o máximo divisor comum de a e b é igual a 1., isto é, a e b primos entre si. Então a 2 2b 2 , pelo que a2, e portanto a é par, digamos a=2m, m inteiro positivo. Então, b tem de ser ímpar, mas, visto que, b também tem de ser par. Mas se a é par e b é par então os dois não são primos entre si. Esta contradição provém da hipótese de que é racional. Portanto não é racional. (STRUIK, 1992, p. 80). A descoberta de que 2 não é racional, perturbou a harmonia da aritmética e da geometria do universo dos pitagóricos. Surgia assim uma outra dificuldade, as provocações do filósofo Zenão de Eléia que em breve estudaremos, ou seja, os Paradoxos de Zenão. Entretanto, a grande contribuição dos pitagóricos à geometria grega foi o Teorema de Pitágoras. Seja o triângulo retângulo de catetos a e b e hipotenusa c. 43 Figura 2.1.3.A.1 Sejam agora dois quadrados de lado (a+b) Figura 2.1.3.A.2 (I) Figura 2.1.3.A.3 (II) Nas figuras 2.1.3.A.2 e 2.1.3.A.3, a demonstração do Teorema de Pitágoras, segundo (EVES, 2005, p. 103). O primeiro quadrado está decomposto em seis partes, a saber: um quadrado médio (área b2), um quadrado pequeno (área a2) e mais quatro triângulos retângulos congruentes. O segundo quadrado está decomposto em cinco partes: Um quadrado médio (área c2) sobre a hipotenusa e quatro triângulos retângulos congruentes. Da figura 2.1.3.A.2: a2 + b2 + 4. Da figura 2.1.3.A.3: . c2 + 4. 44 a.b =(a+b)2 2 a.b =(a+b)2 2 (I) (II) Igualando I e II, temos: a2 b2 4. cancelamento, obtemos: a2 b2 a.b 2 c 2 4. a.b aplicando a lei do 2 c 2 , e concluímos que: À soma das medidas das áreas dos quadrados sobre os catetos é igual a medida da área do quadrado sobre a hipotenusa. 2.1.3.b. Euclides Aos onze anos comecei a estudar Euclides, tendo meu irmão como meu tutor. Foi esse um dos grandes acontecimentos de minha vida, algo tão deslumbrante como o primeiro amor. Eu não imaginava que houvesse no mundo nada tão delicioso. BERTRAND RUSSEL (1872-1970) apud GARBI (2006, p. 48). Os Elementos de Euclides são os mais antigos textos matemáticos gregos que nos chegam completos até os dias de hoje. Euclides conseguiu incorporar, neste único trabalho, bem ordenado, praticamente todo o conhecimento matemático acumulado por seus antecessores, com algumas exceções notáveis, como as secções cônicas e a geometria esférica, e possivelmente algumas descobertas próprias. Nos treze livros que compõem Os Elementos, Euclides organizou a geometria desenvolvida naquela época em único texto, apresentando duas das três grandes descobertas gregas: 1. a teoria de Eudoxo das proporções, livro V; 2. a teoria de Teeteto dos irracionais, livro X; 3. deixando apenas a teoria dos cinco corpos regulares que ocupava lugar de destaque na cosmologia de Platão. Segundo BARBOSA (1985, p. 102), Euclides baseou a construção da geometria em dez axiomas separados em duas classes. Cinco foram classificados como “noções comuns” e os outros cinco como “postulados”. As “noções comuns” parecem ter sido consideradas como hipóteses aceitáveis a todas as ciências, enquanto “os postulados” eram como hipóteses aceitáveis a geometria. As cinco noções comuns eram: 45 1. Coisas que são iguais a uma mesma coisa são também iguais entre si; 2. Se iguais são adicionados a iguais, os resultados são iguais; 3. Se iguais são subtraídos de iguais, os restos são iguais; 4. Coisas que coincidem com outras coisas são iguais a uma outra; 5. O todo é maior do que qualquer de suas partes. Os Postulados eram: 1. Pode-se traçar uma reta por quaisquer dois pontos; 2. Pode-se continuar uma reta infinitamente; 3. Pode-se descrever uma circunferência com qualquer centro e qualquer raio; 4. Todos os ângulos retos são iguais; 5. Se uma reta corta duas outras retas formando ângulos colaterais internos cuja soma é menor do que dois retos, então as duas retas, se continuadas infinitamente, encontram-se, no lado na qual estão os ângulos cuja soma é menor do que dois retos. 2.1.3.c. Eudoxo (408 a.C. – 355 a.C.) Nos dias de hoje parece fácil perceber que a crise dos incomensuráveis seria resolvida com uma simples ampliação do conceito de número, introduzindo os chamados números irracionais, de tal modo que, fixando uma unidade de comprimento arbitrária, qualquer segmento de reta pudesse ter uma medida numérica. Quando o segmento considerado é comensurável com a unidade escolhida, sua medida é um número racional (inteiro ou fracionário). Os números irracionais representam medidas de segmentos que são incomensuráveis com a unidade. Mas os gregos tomaram outro caminho inventando um modo de falar em igualdade de razões mesmo no caso de grandezas incomensuráveis. Com isso criaram toda uma teoria das proporções que só dependia dos números naturais. O criador dessa teoria, exposta no livro V dos Elementos de Euclides, foi Eudoxo (408-355 a.C.), matemático e astrônomo ligado à escola de Platão, que introduziu a noção de grandeza, não como número, mas como segmento, ângulo, área, 46 volume, e que poderia variar continuamente. Grandezas eram opostas aos números, as quais passam de um valor para outro, como 3 para 4. Entretanto, segundo COBIANCHI (2001, p. 101) os conceitos de razão e proporção eram vinculados à geometria, por isso não eram usados números para expressá-las a fim de escapar dos números irracionais. A teoria de Eudoxo capacitava os estudiosos matemáticos gregos a fazerem um enorme progresso na geometria. Assim, no caso de dois segmentos comensuráveis A e B, ele deve ter percebido que dizer que A está para B, assim como m está para n, equivale a dizer que nA=mB. Então, no caso de quatro segmentos, dizer que A está para B assim como C está para D, significa a existência de dois números m e n tais que: nA=mB e nC=mD. No caso em que A e B forem incomensuráveis, igualdades do tipo nA=mB nunca ocorrerão. Mas, dados dois números quaisquer m e n, podemos sempre testar se nA>mB, nA=mB ou nA<mB; E igualmente, se nC>mD, nC=mD ou nC <mD. Pois bem, esse teste é o que Eudoxo utiliza para dar uma definição de igualdade de duas razões, A:B e C:D, que se aplique sempre, sejam segmentos comensuráveis ou não. É característica a definição 5 do livro V dos Elementos, de Euclides: Diz-se que [quatro] grandezas estão na mesma razão, a primeira para a segunda e a terceira para a quarta, quando, tomando quaisquer eqüimúltiplos da primeira e da terceira, e tomando quaisquer eqüimúltiplos da segunda e da quarta, os primeiros eqüimúltiplos excedem, são iguais ou são menores que os últimos eqüimúltiplos tomados na ordem correspondentes. STRUIK (1992, p. 84). Isto significa, na nossa notação, que A:B=C:D se nA>mB se e nC>mD, nA=mB implica nC=mD e nA<mB só se nC<mD, sendo m e n inteiros. Para uma tal definição tinha de ser estabelecido primeiro o chamado “axioma de Arquimedes”, que em Os Elementos de Euclides precede a definição anterior, como definição 4: Diz-se que [duas] grandezas têm uma razão de uma para outra se cada uma puder, quando multiplicada, exceder a outra. STRUIK (1992, p. 84). 47 Segundo COBIANCHI (2001, p. 101) a Teoria das Proporções de Eudoxo trazia graves conseqüências. Uma delas foi forçar uma forte separação entre número e geometria, deixando somente a geometria tratar de razões incomensuráveis. Uma outra conseqüência foi direcionar os estudiosos em matemática para a categoria de geômetras, e a geometria tornar-se a base para quase todo rigor matemático nos próximos dois mil anos. Embora seja genial, a solução dada por Eudoxo ao problema dos incomensuráveis afastou os gregos de um desenvolvimento numérico da Matemática que, a partir de então, tornou-se geometria e os problemas aritméticos e algébricos tratados em “Os Elementos” de maneira geométrica. A aritmética e a Álgebra somente voltariam a ganhar importância e autonomia própria com a influência dos estudiosos árabes em matemática a partir do século XII. 2.1.3.d. Os Paradoxos de Zenão Um paradoxo é uma afirmação que não nos parece contraditória em si mesma, mas que contraria fatos ou pressupostos tidos como verdadeiros segundo SALVITTI (1996, p. 12). Um exemplo de paradoxo é o de Zenão sobre Aquiles e a Tartaruga. Aquiles vai disputar uma corrida contra uma tartaruga e, sendo justo, dá-lhe uma certa vantagem. Mas, contrariando a sua expectativa e a nossa experiência, não consegue alcançar a tartaruga. Com efeito, raciocina Zenão, quando Aquiles atinge o ponto em que ela, a tartaruga, se encontrava quando ele iniciou a corrida ainda não alcançou, pois ela, embora muito lenta, moveu-se para um ponto à frente. Quando Aquiles alcançar este novo ponto, ainda não a terá atingido, ela se encontra agora ainda mais à frente, e quando ele atingir este novo ponto, etc,... Desta maneira, ele nunca conseguirá alcançá-la. Nesta corrida, por meio de um recurso hábil, Zenão dividiu o intervalo de tempo entre o momento da partida de Aquiles e o instante em que ele alcançaria a tartaruga em muitos intervalos de tempo. Entende-se, então, que a soma de muitos termos deve ser necessariamente infinita, o que pode ser errado. Poderíamos, da mesma forma, dizer que 2/3 é infinito, pois: =0,6+0,06+0,006+... 48 existe infinidade de termos do lado direito. O argumento referente à Aquiles e a tartaruga envolve uma progressão geométrica. De acordo com Zenão, Aquiles nunca alcançará a tartaruga, pois a vantagem dela diminui na progressão geométrica, mas, a soma de números infinitos de termos pode ser finita. Em tempos modernos, a seqüência no primeiro argumento de Zenão é uma progressão geométrica decrescente infinita: a série: s1 1 ; s2 2 1 1 2 4 3 ; s3 4 1 1 1 1 , , , ,... Essa progressão gera 2 4 8 16 1 1 1 2 4 8 7 ; s4 8 1 1 1 1 2 4 8 16 que converge para 1. Podemos argumentar que a soma: 15 ;... , 16 1 1 1 1 ... 2 4 8 16 representa o número finito 1, apesar do argumento de Zenão, de que a soma se estende por um número infinito de termos. Com esta introdução dos conceitos de convergência e limite pelos matemáticos fica enfraquecido o argumento de Zenão de que a soma de uma série infinita ou de uma seqüência infinita de números deve, necessariamente, ser infinita, de acordo com COBIANCHI (2001, p. 99). Os outros paradoxos de Zenão usam o mesmo tipo de raciocínio, como por exemplo a demonstração de que o movimento é impossível, pois se uma flecha não se move em um instante, então não pode mover-se durante um intervalo de tempo. Zenão adota a hipótese alternativa que o tempo e o espaço não são infinitamente divisíveis, isto é, existe uma menor unidade indivisível de tempo e de espaço. Os paradoxos envolviam problema do domínio da matemática que contém hoje assuntos como a continuidade, processos de passagem do limite e uma introdução apropriada ao sistema dos números reais. O objetivo principal de Zenão era provavelmente defender seu sistema filosófico ou de Parmênides (c.500 a.C.), mostrando como seria muito mais fácil chegar a conclusões ridículas a partir das hipóteses dos sistemas rivais. Sua argumentação funciona também como um exemplo cauteloso aos matemáticos, que mostra como um raciocínio sobre limites deve ser cuidadosamente examinado, antes que seja considerado convincente. Os argumentos de Zenão tornaram clara a incompatibilidade entre o mundo contínuo e a teoria das mônadas. COBIANCHI (2001, p. 97) aponta que esta incompatibilidade já havia sido revelada pelo fato de existirem alguns valores que 49 não podem ser representados por razões de números inteiros, que são números Irracionais. Para Zenão era negar a tese dos pitagóricos, mas não justificar a impossibilidade do movimento. Segundo COBIANCHI (2001) a hipótese pitagórica era que a soma dos números crescentes de segmentos, ainda que decrescentes, cada vez menores, deve tender para o infinito, porque cada um conteria um número inteiro de átomos dotados de dimensões, que seria equivalente a efetuar a soma de infinitos números inteiros, que tendem para o infinito. A corrente dos pitagóricos acreditava na existência de uma unidade de medida absoluta. A medida, a menor unidade de todas, era chamada de mônada. Assim uma quantidade de tempo, por exemplo, poderia ser dividida em um certo número unidade tempo, que a comporiam. Essa unidade, por sua vez, não poderia mais ser subdividida. Havia uma dúvida sobre isso já que apesar da crença pitagórica não ser aceita por todos, não se tinha um argumento convincente para negá-la. Assim, Zenão jogou por terra a afirmação dos pitagóricos mostrando que se admitirmos a existência de uma menor unidade absoluta cairemos num absurdo. Por outro lado, a crise não estaria completamente resolvida se fosse admitido que uma certa quantidade de tempo pudesse ser subdividida indefinidamente até um mínimo que seria nula, porque isso levaria à contradição de que somar essas partes nulas para reconstituir o todo daria como resultado algo de medida zero que não o valor da medida de partida. Essas formas de pensar, que levaram sempre a contradições, plantaram as bases para o conceito de limite e o conceito de números reais. A partir dela, podemos dizer que não existe a menor medida de tempo ou não existe a menor medida de segmento, etc. 2.1.3.e. Arquimedes (287 a.C.– 212 a.C.) Arquimedes (287-212 a.C.), o maior estudioso em matemática do período helenístico e de toda a antiguidade, viveu em Siracusa como conselheiro do rei Hierão. As mais importantes contribuições dele foram feitas no domínio que hoje chamamos de Cálculo Diferencial Integral: teoremas sobre áreas de figuras 50 planas e sobre volumes de corpos sólidos. Na Medição do círculo encontrou uma aproximação da circunferência do círculo pelo uso de polígonos regulares inscritos e circunscritos, levando esta aproximação a polígonos de 96 lados. Foi o primeiro a obter uma aproximação razoável de S por números racionais e provou que: 3 1 10 S 3 , usando dois polígonos regulares de 96 lados, um inscrito 7 71 e outro circunscrito a um círculo de raio 1. Segundo IMENES (1979, p. 87-90), para calcular o perímetro de quaisquer polígonos regulares, inscritos e circunscritos numa circunferência de raio 1, devemos considerar as figuras 1 e 2, respectivamente. Figura 2.1.3.E.1 Figura 2.1.3.E.2 Na figura 2.1.3.E.1, seja l n o lado do polígono regular inscrito de n lados. Temos: AM= l n 2 AÔM= AÔB 2 ln 2 r 180 º sen n .: l n 360 º n 2 2.sen donde: pn=2nsen ln 2 1 180 º n ln 2 180 º n 180 º , pn n Perímetro do polígono regular inscrito de n lados. 51 E, sendo Ln o lado do polígono regular circunscrito de n lados, da figura 2, tem-se: AM= L n 2 180 º n AÔM= Ln 2 r 180 º tg n Ln 2 tg Ln 2 1 Ln 2 180 º n portanto: Pn=2n.tg 180 º , Pn n Perímetro do polígono regular circunscrito de n lados. Note que o perímetro do polígono regular inscrito é igual ao produto do número n.sen 180 º por 2, sendo que esse número 2 foi obtido por 2.r, com r=1 o n raio da circunferência. O número n.sen 180 º n depende exclusivamente do polígono regular. Na figura 2.1.3.E.2, nota-se que o perímetro do polígono regular circunscrito é igual ao produto do número n.tg 180 º por 2, sendo que esse n número 2 foi obtido por 2.r, o raio da circunferência. O número n.tg 180 º depende n exclusivamente do polígono regular. Com o auxílio de uma calculadora científica, podemos obter os valores de n.sen 180 º n pn 180 º e os valores de n.tg 2 n P n , para vários polígonos. 2 Estes valores constam no Quadro resumo abaixo: 52 n pn (inscrito) 2 P n pn 2 2 P n (circunscrito) 2 (Circunscrito)-(inscrito) 3 2,598 5,196 2,598 4 2,828 4,000 1,172 5 2,939 3,633 0,694 6 3,000 3,464 0,464 12 3,106 3,215 0,109 24 3,133 3,160 0,027 48 3,139 3,146 0,007 96 3,141 3,143 0,002 Quadro resumo 3.1.3.E.3 Portanto, 3,141< S <3,143. A média aritmética desses dois valores é 3,142. O valor correto de S é 3,14145... O símbolo S não foi usado na antiguidade e no sentido moderno foi usado por William Jones em 1706, um amigo de Isaac Newton, mas foi adotado por Euler e usado em sua Introductio em 1748. Da tabela podemos concluir que, sendo pn e P n , respectivamente, os perímetros dos polígonos regulares de n lados, inscritos e circunscritos a uma circunferência de raio r, e sendo C o perímetros dessa mesma circunferência, tem-se: pn C P n Alem disso, qualquer que seja n, tem-se: Conclui-se então que: 3,141< pn C Pn 2r 2r 2r C 3,143; para n=96. 2r Logo, 3,141 < S < 3,143. Nota-se que a demonstração acima foi uma aplicação do método de exaustão para se obter um valor limite de S . Obteve-se o valor de S a partir de um par de polígonos regulares: inscrito e circunscrito, como se podem obter os perímetros dos polígonos regulares inscritos e circunscritos com o dobro do números de lados. Aplicando-se sucessivas vezes esse processo, pode-se 53 calcular os perímetros dos polígonos regulares inscritos e circunscritos de 12, 24, 48, 96 lados e, dessa forma, obter cada vez mais próximo do valor limite de S . Começando com um triângulo, polígonos regulares, e duplicando o número de lados até que Arquimedes alcançou polígonos de 96 lados. Os perímetros sucessivos dos polígonos inscritos formam uma seqüência, e os dos circunscritos formam outra. Se o processo fosse contínuo, as duas seqüências convergiriam para o mesmo limite que é o comprimento da circunferência. Se o raio dessa última fosse a unidade, o limite comum seria S . Assim, usando o processo de raciocínio por absurdo, Arquimedes encontrou uma aproximação da circunferência do círculo pelo uso dos polígonos regulares inscritos e circunscritos. Esta demonstração apresenta duas seqüências, e ambas são constituídas por números Racionais, de acordo com COBIANCHI (2001). O “método de exaustão” será muito importante para a idéia de limite, porque se apóia na noção de que duas grandezas variáveis se aproximarão do estado de igualdade se sua diferença tornar-se quase nula. Esse método, que se constitui em um avanço muito importante ao estudo da continuidade, levou Arquimedes a uma posição considerável no cálculo diferencial e integral, que o usou esse método em várias circunstâncias para estimar a quadratura da parábola, o perímetro da circunferência e área do círculo. Outra obra importante de Arquimedes foi “O Método”, descoberto casualmente por Heiberg em 1906, é um dos poucos documentos da história da Matemática, que menciona procedimentos para a descoberta de teoremas. Por ele, sabemos que Arquimedes pesava e media mentalmente curvas, superfícies e volumes, o que muitas vezes sugeria as relações que mais tarde provava com todo o rigor matemático. A obra O Método tratava do assunto de Continuidade. Em todos os trabalhos, Arquimedes combinou uma originalidade de raciocínio surpreendente com uma mestria de técnica de cálculo e rigor nas demonstrações. O primeiro trabalho sobre o cálculo do S foi desenvolvido por meio de trigonometria, enquanto que Arquimedes usou o processo para o cálculo do comprimento da circunferência, que é apresentado na obra sobre as medidas do círculo e que é considerada a primeira tentativa verdadeiramente científica de 54 calcular-se o valor aproximado de S , já que ele começou provando que a área daquela figura é igual à de um triângulo cuja base é o comprimento da circunferência e cuja altura é o raio do círculo. Podemos dizer que o número S certamente o irracional mais conhecido é definido a área limitada por um círculo de raio 1. A demonstração de que S é um número irracional, apesar de não ser trivial, pode ser feita usando-se apenas o cálculo diferencial elementar. A primeira demonstração de que S é irracional só foi obtida em 1761 por J.H. Lambert, de forma não completamente rigorosa, usando frações contínuas, tendo sido finalmente obtida de modo rigoroso pelo famoso matemático A. M. Legendre e publicada em 1855. O fabuloso matemático grego Arquimedes foi o primeiro a obter uma aproximação razoável de S por números racionais. Ele provou que 3 10 1 S 3 , usando dois polígonos 71 7 regulares de 96 lados, um inscrito e outro circunscrito a um círculo de raio 1. No século XVIII, igualdade: 2 S o matemático suíço Leonard Euler demonstrou essa 1 1 1 1 1 1 1 1 1 . ... 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2.2. Renascimento da Ciência 2.2.1. Galileu Galileu Galilei (1564-1642) – humanista e estudioso em matemática, física e astronomia era dono de um intelecto incomparável. Foi seduzido ao estudo matemático do movimento e à relação entre a distância, velocidade e aceleração e foi encontrar um método matemático de tratamento adequado dos processos infinitos. Galileu nunca deu explicação de suas idéias sobre os cálculos, deixando isto para seus alunos Torricelli e Cavalieri. Suas idéias matemáticas eram sempre originais como transparece da sua observação: “nem o número de quadrados é menor do que o da totalidade dos números, nem o último é maior do que o primeiro”, segundo STRUIK (1992, p. 160). 55 GUZMÁN (1986, p. 103) aponta que os pitagóricos, no século VI a.C., pensaram que não seria preciso sair essencialmente dos números naturais para interpretar matematicamente a realidade. Eles verificaram que no próprio símbolo de sua fraternidade religiosa, o pentagrama, se escondia um monstro incompreensível chamado número irracional, o número áureo, e conseqüentemente a idéia do infinito. É possível que os gregos se depararam com a idéia de infinito por causa dos recorrentes paradoxos atribuídos ao filósofo Zenão de Eléa (495 – 435 a.C.). As idéias de infinitamente pequeno estavam muito longe de serem resolvidas, já que as grandezas infinitamente pequenas são aquelas as quais todo múltiplo fica inferior a unidade e as grandezas infinitamente grandes, aquelas que são maiores que todo número qualquer de unidades, isto é, aquelas as quais todo o conjunto finito de unidades constitui apenas uma parte. A mesma confusão voltou a surgir com os paradoxos de Galileu sobre infinitamente grande. A situação pareceu ficar bem encaminhada em finais do século XIX, quando Weierstrass, Cantor e Dedekind conseguiram reinterpretar e atualizar as velhas teorias gregas. Observe a equação: 1 1 1 ... 1 , ou, em notação mais sofisticada, 2 4 8 f ¦ 2 n 1 . Do lado esquerdo parece que temos algo incompleto, a soma infinita; o n 1 do lado direito temos finitude, um complemento. Nesse caso, há uma tensão entre os dois lados, que é uma fonte de poder e um paradoxo. O infinito constituiu-se, então, um conceito intimidador, conflitante com a nossa intuição e causou espanto a Galileu ao descobrir que os conjuntos infinitos não se comportavam da mesma maneira que os finitos, o caso dos conjuntos enumeráveis entre conjunto dos números quadrados perfeitos e conjunto dos números inteiros positivos. Parece que os estudiosos em matemática alimentam-se substancialmente todas as vezes que um paradoxo é enunciado e saem em busca incessante de explicação, enriquecendo, assim, a matemática. 56 2.2.2. Cavalieri (1598-1647) BONAVENTURA CAVALIERI, discípulo de Galileu, desenvolveu a noção de indivisíveis, mas que se mostrou inadequada para o cálculo. Entretanto, Cavalieri conseguiu obter áreas limitadas através de curvas como y=xm, onde m é um inteiro positivo. Em seu livro Geometria indivisibilus continuorum, publicado em 1635, Cavalieri estabeleceu uma forma simples de cálculo o ponto gerando a reta e a reta gerando o plano através do movimento. Então, adicionou segmentos de reta para obter uma área e segmentos de plano para obter um volume mas quando Torricelli lhe mostrou que desta forma se podia provar que qualquer triângulo é dividido por uma altura em duas partes iguais, ele substituiu “linha” por “faixa”, ou seja, uma linha de pequena espessura, e assim voltou-se a uma teoria “atômica” (o mundo é constituído de elementos indivisíveis). As suas idéias sobre linhas que construíam uma área conduziram-no ao correto princípio de Cavalieri, o qual afirma que sólidos de alturas iguais terão mesmo volume se as secções planas de alturas iguais tiverem a mesma área, o que permite realizar o equivalente da integração de polinômio. Embora alguns estudiosos em matemática tenham rejeitado completamente o uso dos indivisíveis de Cavalieri, outros, certos de que eles constituíam uma ferramenta poderosa no processo de resolução de problemas, tentaram modificá-los de tal modo a poderem justificar o seu uso. STRUIK (1992, p. 167) aponta que o aparecimento do livro de Cavalieri estimulou um número considerável de matemáticos, em diferentes países, a estudar problemas que envolviam infinitesimais (quantidades infinitamente pequenas). Os Indivisíveis de Cavalieri foram modelo para os mais importantes livros escritos neste período de antecipação a Arithmetica infinitorum (1655), de John Wallis (1616-1703). O título do seu livro mostra que Wallis tencionava ultrapassar Cavalieri na sua Geometria Indivisibilibus; era a nova arithmética (álgebra) que Wallis queria aplicar, não a antiga geometria. Nesse processo, Wallis estendeu a álgebra numa verdadeira análise – foi o primeiro matemático a fazê-lo. Com os 57 seus métodos dos processos infinitesimais obteve novos resultados e o introduziu séries infinitas e produtos infinitos e usou com grande competência expoentes imaginários, negativos e fracionários. 2.3. Idade Moderna 2.3.1. René Descartes (1596-1650) WAGNER (1991, p. 9) aponta que o século XVII foi importantíssimo para a história da Matemática nesse período. Começava a existir um grande intercâmbio entre os matemáticos e formavam-se grupos de cientistas na França, Itália e Inglaterra, podendo-se citar René Descartes. Assim nasceu a ciência moderna que foi precedida e acompanhada por um desenvolvimento do pensamento filosófico que deu origem a uma formulação extrema do dualismo espírito/matéria, que veio à tona através da filosofia de René Descartes. Para ele, a visão da natureza derivava de uma divisão fundamental em dois reinos separados e independentes: o da mente e o da matéria. A divisão cartesiana permitiu aos cientistas tratar a matéria como algo morto e inteiramente separado de si mesmos, vendo o mundo material como uma vasta quantidade de objetos reunidos numa máquina de grandes proporções. Essa visão mecanicista do mundo foi sustentada por Isaac Newton, que elaborou sua Mecânica a partir de tais fundamentos, tornando-a o alicerce da Física Clássica. A filosofia de Descartes não se mostrou importante apenas em termos do desenvolvimento da Física Clássica já que exerce, até hoje, influência sobre o modo de pensar ocidental. Com a evolução do Cálculo e participando da renovação total da matemática, os pensadores pouco a pouco iam libertando-se da antiga visão aristotélica e surgiu uma nova matemática que haveria de se tornar o exemplo clássico do pensamento quantitativo e lógico. 58 STRUIK (1992, p. 162, 165) aponta que esta evolução da matemática foi estimulada pela publicação de La Géométrie (1637), de Descartes, que introduziu todo o campo da geometria clássica no domínio da ação dos algebristas. Descartes publicou La Géométrie como uma aplicação do seu método geral de unificação racionalista, nesse caso de unificação da álgebra e da geometria. O mérito do livro, de acordo com o ponto de vista geralmente aceito, consiste principalmente na criação da chamada “geometria analítica”. DANTZIG (1970, p. 172) aponta que Descartes e Fermat buscaram a solução na álgebra, algebrizando, assim, a geometria. Um problema de geometria podia ter um processo de manipulação da álgebra para ter resultado na geometria analítica. Assim, todos os famosos problemas da antiguidade, qualquer problema que levasse a uma equação do primeiro grau era capaz de uma solução geométrica apenas com régua; que a construção com compasso e régua era equivalente a uma equação quadrática; mas se um problema levasse a uma equação irredutível de grau mais alto do que o segundo, sua solução não seria possível apenas com régua e compasso. As propriedades da álgebra já admitiam implicitamente os irracionais em termos de igualdade com grandezas racionais, cuja produção obtinha os mesmos resultados que os gregos - comprometidos com o máximo rigor e limitados pelo medo aos números irracionais e ao infinito. 2.4. Século dezenove 2.4.1. Bolzano Bernardo Bolzano (1781-1848) foi um padre theco afastado pela igreja por sustentar pontos de vista progressistas sobre teologia, e que publicou o livro Paradoxos do Infinito, cuja obra e idéias receberam pouca atenção dos matemáticos da época. 59 Bolzano comenta que se pensássemos em termos de números de elementos para conjuntos infinitos, teríamos um paradoxo, já que um conjunto infinito poderia ser semelhante a um subconjunto próprio (como o conjunto dos Naturais e dos naturais ímpares por exemplo). Na perspectiva dos “Paradoxos” há necessidade de dissociar o conceito de número do de grandeza, ao menos por duas razões: A primeira permite definir as grandezas infinitamente grandes como aquelas que são maiores que todo número qualquer de unidade, isto é, aquelas as quais todo conjunto finito de unidades constitui apenas uma parte; a segunda, as grandezas infinitamente pequenas como aquelas as quais todo múltiplo fica inferior à unidade. Diríamos, em linguagem do dia-a-dia, que além dos números inteiros esse conjunto compreende o que nós chamamos números racionais, os números irracionais, e enfim os infinitamente grandes e os infinitamente pequenos. Em outros termos, o conjunto das grandezas constitui uma extensão do conjunto dos números reais (que compreende os inteiros, as frações e os irracionais) acrescentando-se os infinitamente grandes e os infinitamente pequenos. A diferença entre número e grandeza ajuda a resolver o paradoxo do maior número e outros do mesmo tipo. O conjunto, atualmente chamado por naturais, de todos os números naturais é o exemplo de uma grandeza (pluralidade) infinita que não é um número, pois, um número é uma “pluralidade numerável”, uma grandeza finita. 2.4.2. Augustin-Luis Cauchy (1789-1857) Cauchy é a figura mais influente da Matemática na França de sua época por várias décadas. Primeiramente apresentou um novo estilo de rigor que formou o princípio-guia para grande parte do desenvolvimento da Análise no século XIX. Segundo, ele usou esse enfoque para definir a derivada como um limite, e fez uma combinação dos conceitos de função e de limite nos fundamentos do cálculo, que foi reconhecido no século XVIII. 60 Cauchy foi, também, o responsável pela mudança de atitude na Análise e apresentou o seu novo enfoque sobre esse conceito em seus livros. Forneceu uma fundamentação completa dos conceitos de cálculo e incluiu muitos exemplos de um novo tipo de raciocínio, especialmente em relação a problemas de convergência de seqüências e séries. Como aponta COBIANCHI (2001, p. 157), deve-se a Cauchy a idéia de que a existência do limite de uma seqüência numérica determina a lei segundo a qual se formam os termos da própria seqüência, sem que intervenham razões de ordem geométrica. Ele definiu o número irracional como limite de uma seqüência de números racionais, parecendo-lhe evidente a existência desse limite. Por exemplo, a seqüência an 1 n (1 ) define o número e . n Outro elemento para a sua definição de limite é a questão da interpretação do termo “infinitamente pequeno”, o que capacitou também a formular uma definição mais precisa de continuidade. Quando os valores numéricos sucessivos de uma variável diminuem indefinidamente de modo a tornarem-se menores que qualquer número dado, dizemos que a variável se torna “infinitamente pequena” ou uma quantidade infinitamente pequena. O limite de tal variável é zero. Segundo Cauchy, uma quantidade infinitamente pequena não é zero, nem é uma quantidade constante menor do que qualquer quantidade finita, mas é uma variável que se aproxima de zero; na verdade, idéias vagas de uma quantidade que se torna cada vez menor estavam na base de todas as explicações sobre infinitésimos como indefinidamente pequenos. 2.4.3. Karl Wilhelm Theodor Weierstrass (1815-1897) Karl Weiertrass estudou Direito por quatro anos na Universidade de Bonn, passando em seguida para a Matemática. Abandonou os estudos antes de se doutorar, tornando-se professor do ensino secundário em Braunsberg, de 1841 a 1854. 61 STRUIK (1992) aponta que a fama de Weierstrass baseou-se no seu raciocínio extremamente cuidadoso e no rigor, que é visível não apenas na sua teoria das funções, mas também no seu cálculo das variações. Clarificou as noções de mínimo de uma função e de derivadas e, com isto, eliminou o que estava vago nos conceitos fundamentais do cálculo. Ele era a consciência matemática por excelência metodológica e lógica. Outro exemplo do seu raciocínio meticuloso foi a descoberta da convergência uniforme, já que com ele começou a redução dos princípios da análise aos conceitos aritméticos mais simples, o que nós chamamos hoje de aritmetização da matemática. Atualmente em Análise, os tipos de desenvolvimento de raciocínio que se baseiam no conceito de número irracional e no limite em geral é essencialmente um mérito dessa atividade científica de Weierstrass. Devemos-lhe o fato de existir unanimidade nos resultados das questões mais complicadas relativamente à teoria das equações diferenciais e integrais, apesar das combinações mais audaciosas e diversificadas com a aplicação sobre a transposição de limites. ÁVILA (2001, p. 129) aponta que nas Notas dos cursos de Weierstrass aparecem as primeiras noções topológicas, em particular a definição de “vizinhança” de um ponto, a definição de continuidade em termos de desigualdade envolvendo e, e vários resultados sobre funções contínuas em intervalos fechados. Em particular, o chamado “Teorema de Bolzano-Weierstrass”: “Toda seqüência limitada ( an ) possui uma subseqüência convergente” está entre esses resultados, o qual ele formulou originalmente para conjuntos infinitos e limitados, e não para seqüências. O Teorema diz que todo conjunto numérico infinito e limitado possui ao menos um ponto de acumulação. Weierstrass, através de seus cursos, exerceu decisiva influência na modernização da Análise. 2.4.4. Georg Ferdinand Ludwig Philipp Cantor (1845-1918) Georg Cantor nasceu em São Petersburgo, Rússia, em 3 de março de 1845. Estudou matemática na Universidade de Berlim, entre seus professores estavam Karl Weierstrass, Ernst Eduard Kummer e Leopold Kronecker. 62 Ele percebeu que desde o tempo de Zenão, de Eléia (cerca de 450 a.C.), a idéia do infinito é bastante sutil e perigosa, já que, por meio dela, podem-se facilmente produzir alguns paradoxos de difícil explicação. No início do século XVII, Galileu (1564-1642) notou um fato que lhe chamou atenção: nem o número de quadrados é menor do que o da totalidade dos números, nem o último é maior que o primeiro. Como a cada número da linha superior corresponde um e um só número da linha inferior e reciprocamente, não temos dificuldades em aceitar que ambas têm a mesma quantidade de elementos. Entretanto, todos os números da linha inferior também podem ser encontrados na linha superior, ou seja, como bem observou Galileu no conjunto infinito dos naturais a parte é igual ao todo. Isso bate de frente com a noção comum de Euclides, válida para quantidades finitas, segundo a qual a parte é sempre menor do que o todo. Segundo GARBI (2006, p. 285), com o Cálculo muitas discussões sobre infinito, quantidades infinitamente grandes ou pequenas eram usadas para avaliar limites. Desde o tempo de Zenão, de Eléia (450 a.C.) os estudiosos matemáticos afirmavam que o infinito real é algo que não existe, havendo apenas um infinito potencial, ou seja, a possibilidade de se fazer com que certas quantidades sejam tão grandes quanto desejarmos. Em 1831, Gauss escreveu: “O infinito é apenas uma figura de linguagem”, uma forma abreviada para a afirmação de que existem limites dos quais certas relações podem se aproximar tanto quanto nós desejarmos, desde que permitamos que outras magnitudes cresçam sem qualquer restrição. Em relação ao infinito, os matemáticos ficaram mais cautelosos porque estavam conscientes de que qualquer descuido poderia levar a grandes erros. O estudo de Cantor foi sobre o tamanho dos conjuntos com infinitos elementos, por exemplo existem infinitos números naturais e infinitos números irracionais. Haveria alguma forma de se comparar estas duas infinidades, de se saber se uma é maior do que a outra? Cantor entendeu que a 63 possibilidade de se estabelecer uma correspondência biunívoca entre os elementos de dois conjuntos finitos assegura que ambos têm o mesmo número de elementos. Cantor decidiu estender esse mesmo critério para os conjuntos infinitos de tal modo que todo conjunto que pudesse ser colocado em correspondência biunívoca com o conjunto dos naturais era enumerável. Criou também um número cardinal “transfinito” correspondente à infinidade dos números naturais, chamando-o de (álef-zero, de álef, a primeira letra do alfabeto hebraico). Por hipótese, se todos os conjuntos são enumeráveis, existiria apenas um transfinito. Na verdade, esta era a idéia de Cantor na primeira etapa de sua obra prima: enumerar os números reais era um dos pontos mais importantes de seu programa; e a teoria dos números transfinitos deve seu nascimento a essa tentativa do “contar o continuum”, segundo DANTZIG (1970, p. 191). Em 1874, Cantor atestou que era impossível alinhar todos os números reais numa seqüência enumerável. Entretanto, a demonstração disso só surgiu em 1883, quando lhe aprimorou esta demonstração da não enumerabilidade do conjunto dos números reais. Nela considerou somente as representações decimais infinitas de cada número, como por exemplo: 0,5=0,4999..., para que cada um deles tenha apenas uma única representação decimal. Um esboço das principais idéias contidas em tal demonstração, é descrito a seguir: O princípio geral consiste em presumir que todos os números reais foram colocados hierarquicamente e supõe-se que fosse possível estabelecer uma correspondência biunívoca entre os números do intervalo [0; 1], ou seja, os números deste intervalo são elementos de uma seqüência escritos em suas representações decimais da seguinte forma: a1 0 , a11 a12 a13 ... a1n ... a2 0 , a21 a22 a23 ... a2 n ... .................... .................. .................... .................... an 0 , an1 an 2 an 3 ... ann ... .................... .................... onde ( 0 d aij d 9 ) 64 GARBI (2006) aponta que Cantor mostra, através de um processo diagonal, que é possível produzir outros números, os quais apesar de reais não estão entre os enumerados. Ora, construindo qualquer número do tipo 0, b1 b2 b3 ..., , tal que b1 z a11 , b2 z a22 . b3 , etc , ele estará entre 0 e 1 e diferirá por pelo menos um dígito de qualquer número da lista, que deveria conter todos os reais daquele intervalo, se eles fossem contáveis. Portanto, não o são. Assim, a cardinalidade do “contínuo” dos números reais não é 0 . Cantor chamou-a de c (de contínuo) ou 1 , uma segunda ordem de “número transfinito”. Quando dois conjuntos são ambos infinitos, não pode existir nenhuma função sobrejetora f: N em R. Em particular se não existe nenhuma correspondência biunívoca entre N e R, diz-se então que a cardinalidade de N é estritamente menor do que a do R. Transfinito é a existência de um número que fosse infinito, porém o menor número maior do que todos os números finitos. Embora não haja o maior número dos números – pode-se sempre somar 1 a qualquer número e obter um maior, há a possibilidade da existência de um número maior do que todos os números finitos. Se A e B são duas coleções finitas, cada uma delas contendo o mesmo número de elementos estão obviamente têm a mesma potência e também têm o mesmo número cardinal. Comprovada a existência dos dois transfinitos, Cantor questiona se haveria algum transfinito entre ambos ou outros além de 1 . Pareceu-lhe evidente que um transfinito maior do que 1 [a cardinalidade do segmento de reta unitário] seria achado no conjunto dos infinitos pontos de um quadrado de lado unitário. Cantor descobriu uma prova e uma forma de se estabelecer uma correspondência biunívoca entre os pontos de tal quadrado e os pontos de tal segmento. Seja um quadrado de lado unitário, um ponto P(x, y) genérico interno a ele e um segmento de reta unitário com um ponto Q. 65 Suponhamos que as coordenadas de P sejam y x 0 , x 1 x 2 x 3 ... e 0 , y y y ... onde os x 1 e y os são dígitos de zero a nove. Se criarmos um 1 2 3 1 número q 0 , x 1 y x 2 y ... x n y ... ele estará entre zero e um e corresponderá a 1 2 n um único ponto Q sobre o segmento unitário. Reciprocamente dado um ponto Q qualquer por sua coordenada linear q 0 , x 1 y x 2 y x 3 y ... x n y ... , os dígitos 1 2 3 n x i y i podem ser desembaralhados de volta, de modo a formar as coordenadas de um ponto P interno ao quadrado e assim está estabelecida uma correspondência biunívoca, como aponta GARBI (2006). Figura 2.4.4.2 Esta também é uma das idéias primitivas de Cantor. Os pontos contidos num segmento de comprimento 1 têm a mesma potência que os da linha definida, e os pontos contidos dentro do quadrado de lado 1 têm a mesma potência que os do plano indefinido. Para isso será suficiente mostrar que podemos estabelecer uma correspondência um a um entre a região desse quadrado e o segmento, segundo DANTZIG (1970). 2.4.5. Richard Dedekind (1831-1916) Richard Dedekind (1831-1916) foi colega de Georg Cantor e estudou em Göttingen, onde foi aluno de Gauss e Dirichlet. Em 1858 tornou-se professor em Zurique, transferindo-se em 1862 para Brunswick, sua terra natal, onde permaneceu pelo resto de sua vida. 66 Em 1858, no início de sua carreira como professor, percebeu a falta de fundamentação adequada para os números reais, principalmente quando teve de provar que uma função crescente e limitada tem limite. Na reconstrução dos números reais foi buscar inspiração na antiga teoria das proporções de Eudoxo. Assim, em 1887 Dedekind escreve. “... e se interpretamos número como razão de duas grandezas, há de se convir que tal interpretação já aparece de maneira bem clara na célebre definição dada por Euclides sobre igualdade de razões. Aí reside a origem de minha teoria (...) e muitas outras tentativas de construir os fundamentos dos números reais” (ÁVILA, 2001, p. 29). (...) há muito tempo pensei, em vão, nestas coisas até que encontrei o que procurava. A minha descoberta será julgada de maneira diferente por pessoas diferentes mas acredito que a maioria dela a achará trivial.. No parágrafo anterior salientou-se que cada ponto p contido numa reta divide essa reta em duas partes tais que cada ponto de uma das partes fica à esquerda de cada ponto da outra parte. Afirmo que a essência da continuidade está na inversa, isto é, no seguinte princípio: se todos os pontos de uma reta pertencem a duas classes tais que cada ponto da primeira classe fica à esquerda de cada ponto da outra classe, então existe um e só um ponto que determina esta divisão em duas partes.” Richard Dedekind(GARDING, 1981, p. 145) COBIANCHI (2001) aponta que para garantir sua definição de “Continuidade” de maneira puramente aritmética, Dedekind aplicou procedimentos iguais para o Conjunto dos números Racionais Q e para uma reta geométrica contínua r, que constavam além de Continuidade, as propriedades de ordenação, de enumerabilidade, de infinidade e de densidade. Foi estabelecido, também, um morfismo entre o Conjunto dos números racionais Q e para uma reta geométrica contínua r. A comparação do domínio dos números racionais Q com a reta geométrica contínua r levou ao reconhecimento da existência de lacunas de uma certa imperfeição ou descontinuidade do conjunto Q e, ao mesmo tempo a reta geométrica contínua r de perfeição, ausências de lacunas, continuidade. Assim, deve-se a Dedekind uma nova concepção puramente aritmética do número irracional. 67 Consideremos o conjunto de todos os números racionais Q. Pode-se repartir o conjunto dos números racionais de uma infinidade de maneiras, em dois conjuntos R1 e R2, tais que cada racional pertença ou a R1 ou a R2, qualquer número de R1 seja inferior a qualquer número de R2. Dedekind chama de Corte esses conjuntos dos números racionais. Três casos ocorrem, e apenas três, os quais mutuamente se excluem: 1) Em R1, existe um número r1 superior a todos os outros números desse conjunto, e neste caso não existe em R2 nenhum número que seja inferior a todos os outros números de R2. Exemplo: Considere um corte (R1, R2) na reta numérica racional de modo que à classe R1 pertençam todos os números racionais menores ou iguais a zero, e à classe R2 todos os racionais maiores que zero. Figura 2.4.5.1. exemplo 1 Seja R1 o conjunto formado pelos racionais negativos e zero; R2 compreende todos os racionais positivos, dos quais nenhum é inferior a todos os outros. Nesse caso, dizemos que (R1, R2) define o número real 0, que é também um número racional. 2) Em R2, existe um número r2 inferior a todos os outros números desse conjunto, e neste caso não existe em R1, nenhum número que seja superior a todos os outros números de R1. Exemplo: Considere um corte (R1, R2) na reta numérica racional de modo que à classe R1 pertençam todos os racionais menores que zero e à classe R2, todos os racionais maiores ou igual a zero. 68 Figura 2.4.5.2. exemplo 2 Nesse caso, dizemos que (R1, R2) define o número real 0, que é também racional. 3) Não existe em R1 um número que seja superior a todos os outros de R1, nem em R2 um número que seja inferior a todos os outros de R2. Exemplo: Considere um corte (R1, R2) na reta numérica racional de modo que à classe R1 pertençam todos os números racionais cujo quadrado é menor que 3 e à classe R2, todos os racionais cujo quadrado é maior que 3. Observe que (R1, R2) define um corte sobre Q, pois qualquer número racional ou pertence à classe R1 ou pertence à classe R2. Além disso, não existe nenhum racional que pertença as duas classes ao mesmo tempo. Figura 2.4.5.3. exemplo 3 Não existe nenhum número racional que seja o maior de todos os de R1, nem nenhum que seja menor de todos os de R2, porque nenhum número racional tem 3 para quadrado. No exemplo 1 e 2, os conjuntos R1 e R2 caracterizam o número racional r1=r2=0. No exemplo 3, por extensão, R1 e R2 definem um número qualificado de irracional. 69 Para Dedekind, qualquer número racional ou irracional é o símbolo de um corte no sistema dos números racionais, assim, cada corte aberto, ou corte do terceiro tipo, se identifica a um número irracional. Observe que o que faz Dedekind não é nada mais do que ampliar o domínio numérico, dos números racionais, que era conhecido pelos gregos juntando a esses números racionais uma nova categoria de números, os números irracionais, que vêm preencher as lacunas cuja existência os gregos já haviam constatado. Ao conjunto dos números racionais e irracionais, Dedekind dá o nome de conjunto dos números reais, e à reta contendo os racionais e irracionais de reta numerada real. Assim, Dedekind conclui que, segundo MIGUEL (2005, p. 115): 1) Existem mais pontos na reta que números racionais; 2) O conjunto dos números racionais não é adequado para se aplicar aritmeticamente a continuidade da reta; 3) Logo, é absolutamente necessário criar novos números para que o domínio numérico seja tão completo quanto a reta, isto é, para que possua a mesma continuidade da reta. De acordo com a teoria de Dedekind, esse é o único aspecto que distingue os dois tipos de números: é característica de um número racional pertencer a uma das classes e é também característica dos irracionais não pertencer a nenhuma. DANTZIG (1970, p. 156) aponta que, por mais paradoxal que possa parecer, o presente é verdadeiramente irracional, usando-se a palavra no sentido de Dedekind, pois, apesar de agir como partição, não é nem parte do passado, nem do futuro. Na verdade, numa Aritmética baseada apenas no tempo, se tal Aritmética fosse possível, o irracional seria encarado como um dado, enquanto todos os esforços de nossa lógica seriam dirigidos para o estabelecimento da existência de números racionais. COBIANCHI (2001, p. 194) aponta que através dos “Cortes de Dedekind” foi explicado de uma maneira puramente aritmética o conjunto dos números reais, justificado também a continuidade, e a noção de número irracional adquirindo 70 sentido geral, rigoroso, e colocando um ponto final em mais de vinte século de polêmicas, dúvidas e brigas filosóficas. 2.5. Considerações As primeiras descobertas do ser humano foram frutos de tentativa e erro e não de uma prática desenvolvida do método científico como o conhecemos hoje. Entre o quinto e o sexto século a.C., os gregos descobriram que os segmentos incomensuráveis são indispensáveis em geometria, e esta foi uma das mais importantes contribuições à civilização. Este trabalho tenta compreender a construção do conhecimento do número Irracional, quais os grandes conflitos filosóficos da época, e como foram feitas as principais descobertas que permanecem válidas até hoje. O primeiro caso de duas grandezas, que não guardam ente si uma relação de inteiro a inteiro, foi encontrado pelos pitagóricos no lado e na diagonal de um quadrado. A demonstração da sua incomensurabilidade foi encontrada em Os Elementos de Euclides, mas Aristóteles dizia ser conhecida de Pitágoras. Entendemos, então, que os gregos nunca chegaram a ter uma idéia clara do que nós chamamos hoje de número irracional. Foi Descartes que estabeleceu assim uma identidade das operações sobre grandezas e das operações sobre números: do cálculo geométrico e do cálculo algébrico. O irracional não lhe parece mais considerado numerus fictus (números fictícios), mas como numerus verus (números com significados), por isso que se torna necessário representar por números todos os estados de uma grandeza de espécie determinada. Só no final do século XIX que a noção de número irracional adquiriu sentido geral, rigoroso e puramente aritmético, independente da intuição geométrica. O ponto de vista cartesiano é ainda o do número como medida da grandeza; os números reais concebem-se como medindo segmentos de uma reta, na qual foram escolhidos uma origem e um segmento unidade já os irracionais correspondem aos segmentos incomensuráveis ao segmento unidade. 71 Essa interpretação métrica apresenta uma certa dificuldade. É preciso mostrar que se tem o direito de efetuar sobre os números generalizados as operações da aritmética, cujas regras foram estabelecidas para os números racionais ou, em outros termos, que a cada símbolo obtido pela combinação das expressões que representam os irracionais, corresponde efetivamente um certo segmento. Isso exige o apelo à noção da continuidade geométrica, o que se traduz por um postulado conhecido por postulado de Cantor-Dedekind. O Postulado de Dedekind-Cantor: É possível associar a qualquer ponto na reta um único número real e, inversamente, qualquer número real pode ser representado de maneira única por um ponto numa reta, hoje conhecido como Axioma segundo GARBI (2006, p. 290). Para Dedekind, qualquer número racional ou irracional é o símbolo de um corte no sistema dos números racionais. Cada corte aberto, ou corte do terceiro tipo, se identifica com um número irracional. Em outros termos, número real, racional ou irracional pode ser considerado como par de conjuntos infinitos de números racionais, e como o número racional se exprime em termos do número inteiro, a concepção de Dedekind nos permite finalmente conceber o número irracional como uma arquitetura de números inteiros. 72 CAPÍTULO 3 Análise das reformas curriculares e dos livros didáticos Nesta parte do estudo, apresentaremos uma análise de reformas curriculares e de livros didáticos. Os livros didáticos contêm exercícios, definições, exemplos, observações e demonstrações que são apresentados em uma linguagem a ser usada na comunicação com a classe. Muitas vezes, o professor aprende no livro didático aquilo que vai ensinar a seus alunos sendo que o livro é umas das maiores fontes do saber para os alunos. A maioria dos professores procura os livros didáticos para a elaboração de seu plano de aulas e de ensino, não utilizando os documentos oficiais (LIMA, 2001, p. 45). Para escolha dos livros didáticos para análise tomou como base os livros mais indicados pelos professores da nossa região Vale do Ribeira. Levamos em conta também a opinião de alguns professores nossos conhecidos. Para análise dos livros didáticos do Ensino Fundamental, separamo-os de acordo com as reformas Curriculares, isto é, livros dos anos 70 pela oublicação dos Guias Curriculares, livros dos anos 90, pela publicação da Proposta Curricular para o ensino da matemática do 1º grau e livros dos anos 2000 devido aos Parâmetros Curriculares Nacionais de matemática do Ensino fundamental. Segundo os PCN (1998, p. 21), os documentos oficiais mais recentes não são conhecidos pelos professores, que muitas vezes não sabem de sua importância e nem o que motivou sua elaboração. Percebe-se ainda que as idéias ricas e inovadoras, veiculadas nesses documentos não chegam aos professores 73 ou são incorporadas superficialmente com diversas falhas de interpretação, não provocando as mudanças esperadas e desejadas. Um dos aspectos abordados neste trabalho refere-se a tentar compreender as transformações sofridas pelo saber quando passa do campo científico para a Escola. Essas idéias apareceram na definição dada por Chevallard apud PAIS (2002, p. 19). Um conteúdo do conhecimento, tendo sido designado como saber a ensinar, sofre então um conjunto de transformações adaptativas que vão torna-lo apto a tomar lugar entre os objetos de ensino. O trabalho que, de um objeto de saber ensinar faz um objeto de ensino, é chamado de transposição didática. Figura 3.a. Transposição didática: Conceito que expressa o processo de transformação em categorias (SANT’ANNA, BITTENCOURT e OLSSON, 2007, p. 78) A transposição didática é um conceito que expressa o processo de transformação entre três categorias: o saber sábio, o saber a ensinar e o saber ensinado, aquele que verdadeiramente acontece em sala de aula. Pela FIGURA 3.a acima notamos que, o processo de transposição didática permite compreender a passagem do saber dos matemáticos (saber sábio) ao saber a ensinar ou a saber ensinado, e este processo é encaminhado em várias etapas. Uma das etapas passa-se ao nível da noosfera e da organização do currículo. O papel de noosfera se relaciona com a transposição institucional, ou seja, com a transposição dos saberes de forma que estes possam se configurar enquanto objetos de ensino nas instituições. (ASSUDE, 1992, p. 95). 74 Apresentaremos a seguir uma análise de documentos oficiais curriculares e de livros didáticos dos anos 70, 90 e 2000, centrada em um objeto de ensino, números irracionais. 3.1. Reformas do currículo de matemática Iremos apresentar uma análise nos seguintes documentos: x Guia Curricular de matemática do 1º grau e Subsídios para implementação do Guia Curricular de matemática - Álgebra para o 1º grau – 5ª a 8ª séries – informações para o professor; x Proposta Curricular para o ensino de Matemática do 1º grau e Experiências Matemáticas da 8ª série; e x Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental de Matemática. 3.1.1. Guias curriculares de Matemática – 1º grau – 1975 Subsídios para implementação do Guia Curricular de matemática-Álgebra para o 1ºgrau – 5ª a 8ª séries – informações para professor Na década de 70, a Secretaria Estadual de Educação de São Paulo – SEESP, por meio de Coordenadoria de Ensino e Normas Pedagógicas – CENP, elaborou, além dos Guias Curriculares (1976), os Subsídios para implementação dos Guias Curriculares (1977) e a Geometria Experimental (1978). Entretanto, no âmbito de Delegacia de Ensino (DE), antiga denominação à Diretoria de Ensino, apontava-se a dificuldade de comunicação com as Unidades Escolares no que se referia às discussões sobre implantação de novas propostas. Assim a CENP, órgão central da SEESP, encarregada de promover um canal competente de comunicação entre os órgãos centrais e a rede escolar, propôs a criação da Monitoria (1976), hoje denominada Assistente Técnica Pedagógica (ATP), com o objetivo de dar apoio pedagógico regional à ação supervisora na implementação do currículo de matemática. 75 Assim, os programas de conteúdo matemático eram divulgados por professores de universidades brasileiras e os Guias por professores divulgadores da Delegacia de Ensino e do Curso de Metodologia da Matemática - materiais estruturados. Os subsídios para implementação do Guia Curricular de matemática – Álgebra para o 1º grau - 5ª a 8ª séries – informações para professor, serviram como instrumentos nos quais o professor podia buscar o conhecimento, já que fora concebido com objetivo de auxiliá-lo com algumas informações referentes a certos conceitos subjacentes à maioria dos assuntos abordados no Guia Curricular. Até a década de 70, predominava no Brasil uma orientação curricular que se caracterizava por apresentar uma ordem hierárquica de conteúdos que deveriam ser ensinados, geralmente sem incluir aspectos importantes como objetivos, metodologia, sugestões de atividades etc. No início dos anos 70, o ensino de Matemática no Brasil, assim como em outros países, foi influenciado por um movimento de renovação, a nível da organização do saber e do ensinar foi à reforma, sendo conhecido como Movimento da Matemática Moderna. A Matemática Moderna nasceu como um movimento educacional inscrito numa política de modernização econômica e foi posta na linha de frente do ensino por ser considerar que, juntamente com a Área de Ciências, ela constituía uma via de acesso privilegiada para o pensamento científico e tecnológico. Para tanto se procurou renovar a Matemática desenvolvida na escola da Matemática como é vista pelos estudiosos e pesquisadores. (PCN, 1998, p. 19). O contexto inicial deste movimento era muito diferente do que prevaleceu nas propostas curriculares. Acreditava-se que era possível um ensino proposto que se fundamentava em grandes estruturas que organizavam o conhecimento matemático contemporâneo e enfatizava a teoria dos conjuntos, as estruturas algébricas, a topologia, etc. Esse movimento provocou, em vários países, inclusive no Brasil, discussões amplas e reformas no currículo de Matemática. Houve, ainda, tentativa de uso de novas técnicas de ensino, com o objetivo de favorecer a aprendizagem. Diversas criações didáticas surgiram para tentar 76 melhorar esta proposta, como foi o caso dos diagramas de Venn, que passou a constituir um novo objeto de ensino. No entanto, essas reformas deixaram de considerar um ponto básico que viria tornar-se seu maior problema: o que propunha, estava fora do alcance dos alunos, principalmente das séries finais do ensino fundamental. O ensino passou a ter preocupações excessivas com formalizações, distanciando-se das questões práticas. A linguagem da teoria dos conjuntos, por exemplo, enfatizava o ensino de símbolos e de uma terminologia complexa comprometendo o aprendizado do cálculo numérico, da geometria e das medidas. Os números eram tratados a partir de sua organização em conjuntos numéricos, passando-se dos naturais aos inteiros, aos Racionais, aos Reais, tendo como fio condutor as propriedades estruturais que caracterizavam tais conjuntos deixando de lado a ampliação dos conjuntos numéricos e o estudo da evolução da noção do número, principalmente dos irracionais. Na figura 3.1.1.1 notamos que o conteúdo Números irracionais tem como objetivo associar aos números irracionais as representações decimais infinitas e não periódica. Essa caracterização dos irracionais pode criar obstáculos à compreensão da noção de irracionalidade e da própria natureza do contínuo numérico. 77 Figura 3.1.1.1. Guias Curriculares – Conjunto dos números irracionais. Os números racionais e irracionais têm um tratamento integrado na aplicação do dia-a-dia, na utilização da tecnologia. Essa afirmação demanda um entendimento um pouco mais aprofundado de que os números racionais podem ser escritos como fração e os irracionais, não. Os Guias trazem várias definições e aplicações para os números racionais e suas propriedades (densidade, ordenação, etc) enquanto os números irracionais vêm com pequena definição e sem explicação dadas as suas propriedades 78 (densidade, ordenação, etc), com tratamento isolado e não parecendo existir conexão entre os conteúdos num único momento. Entendemos, em primeiro lugar, que o professor precisa fundamentalmente conceber os irracionais como números, em segundo lugar, que o professor precisa saber a diferença entre números racionais e irracionais e que os racionais completam os irracionais, e, finalmente, precisa saber que são objetos criados com alguma finalidade, ou alguma necessidade humana. Os subsídios do Guia Curricular de matemática dão umas informações a respeito da necessidade de ampliação do conjunto numérico através da equação x2=r e justificando que existem lacunas nos conjuntos números racionais. Apresentam na figura 3.1.1.2 que não existe o racional p que seja a medida da q diagonal de um quadrado de L unidade de lado, isto é, a equação x2-r=0 não tem solução em Q. Figura 3.1.1.2. Subsídios para implementação do Guia Curricular de Matemática-Álgebra para o 1º grau - 5ª a 8ª séries - informações para o professor. 79 A figura 3.1.1.3 mostra, usando a representação decimal e aproximações, uma seqüência de racionais menores que maiores que 2 , ambas com limite 2 e uma seqüência de racionais 2. Figura 3.1.1.3. Subsídios do Guia Curricular de matemática-Álgebra para 1º grau Percebemos que o ensino era realizado de modo centrado no professor que expõe, demonstra ou prova rigorosamente tudo no quadro-negro. O aluno, salvo algumas poucas atividades alternativas, continua sendo considerado 80 passivo, tendo de imitar a linguagem e os raciocínios lógico-estruturais ditado pelo professor (FIORENTINI, 1995). 3.1.2. Proposta Curricular para o Ensino de Matemática – Ensino Fundamental – 1997 A proposta Curricular para o ensino de matemática – Ensino fundamental do Estado de São Paulo, elaborada pela Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas - CENP, da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo foi publicada durante os anos 80/90. Em decorrência da contraposição às idéias do Movimento da Matemática Moderna a concepção de currículo também havia sido alterada significativamente, em lugar de uma concepção que privilegiava o tecnicismo e o formalismo no ensino da matemática, passava a defender os princípios da tendência pedagógica conhecida como construtivista. O construtivismo adotado pela Proposta Curricular levava em conta que o conhecimento matemático deveria valorizar mais o processo do que o produto. A preocupação maior era o desenvolvimento de estruturas mentais dos alunos e, desse modo, a importância do conteúdo em si era bastante relativa. A Proposta Curricular para o ensino da matemática - Ensino fundamental, as Experiências matemáticas, a Prática Pedagógica de matemática, as Atividades Matemáticas são instrumentos em que o professor pode buscar o saber sábio e o saber a ensinar. O volume 4 das Experiências Matemáticas (1994, p. 14-5) tem em seu prefácio: O papel do professor é portanto, fundamental, em todos os aspectos, seja na ordenação das atividades, seja na ampliação ou redução da abordagem de um dado assunto, seja em relação ao fato de não submeter todos os alunos mesmo ritmo etc.. 81 É importante destacar que numa proposta em que os objetivos, os conteúdos e a metodologia se redefinem, a avaliação não pode restringirse meramente à aplicação de provas e testes, mas utilizar-se de um amplo espectro de indicadores. Eles podem incluir a observação do aluno quando trabalha individualmente e seu posicionamento frente a um grupo; seu desempenho quando realiza provas com resultada mostrando competência para buscar as informações que interessam e também quando realiza provas em que o que se pretende identificar é o nível de sistematização e de assimilação de um dado conceito. Entendemos que a Proposta Curricular para o ensino da matemática do 1º grau foi considerada importante principalmente pelo modelo de modificações no ensino da matemática e também pela ampla divulgação em todo o território Nacional e sua influência na elaboração de propostas curriculares em outros estados. Suas Diretrizes e sugestões a respeito da organização do conhecimento matemático escolar influenciaram diretamente as propostas de diversos estados até os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, principalmente quanto à organização dos conteúdos por temas. a integração entre os temas num currículo espiral e entre diferentes disciplinas e a Matemática. Embora os números possam ser estudados a partir de sua organização em conjuntos numéricos, passando-se dos Naturais aos Inteiros, aos Racionais, aos Reais, tendo como fio condutor às propriedades estruturais que caracterizam tais conjuntos, a Proposta Curricular apresenta esse conteúdo de uma maneira diferente. Propõe-se acompanhar a evolução da noção de número, a partir de contagem ou de medida, sem ter ainda as propriedades claramente divisadas, deixando se guiar pelo fio condutor que a história propicia e trocando assim uma sistematização prematura por uma abordagem mais rica em significados (MIGUEL e MIORIM, 2005). A Proposta Curricular dos anos 90 e as Experiências Matemáticas da oitava série não trazem um maior aprofundamento do conceito de irracionalidade. Tem-se que: C D S , chamando de C o comprimento da circunferência e de D a medida do diâmetro da mesma unidade de medida. O número S , apresentado dessa maneira, é pouco provável que um aluno diga que é um número irracional. 82 O aluno também tende a associar ao número irracional a idéia de número aproximado, número de forma decimal infinita. Por determinamos por meio de uma calculadora o número exemplo, quando 5 , obtemos o valor aproximado 2,236067977. Percebemos que na Proposta Curricular a abordagem do conjunto dos números racionais sempre aparece antes do conjunto dos números irracionais. Na ampliação do campo numérico, tanto a Proposta quanto as Experiências Matemáticas dão ênfase ao conceito, aprofundamento e aplicação do conjunto dos racionais e tratam o conteúdo dos irracionais, com recuperação do processo histórico da produção desse conhecimento. Criam-se situações com a construção de um quadrado de lado unitário e pergunta-se a medida da diagonal desse quadrado, o que coloca em questão a postura do professor e a do aluno. Para a implantação da Proposta Curricular, o professor necessita ter postura de orientador e motivador da aprendizagem na construção de conhecimento matemático, numa tarefa de erros e acertos. O erro que o aluno comete ao realizar um exercício de matemática, passa a ser visto não de forma negativa, ruim e que deva ser imediatamente corrigido pelo professor, ao contrário, para o construtivismo, o erro é sinônimo de manifestação positiva de grande valor pedagógico, refletindo um tipo de postura diferente que o professor deveria ter diante do erro.(FIORENTINI, 1995). 3.1.3. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) 5ª a 8ª SÉRIE – Ensino Fundamental Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) foram desenvolvidos a partir dos anos noventa, praticamente dez anos depois das reformulações curriculares que marcaram a década de 80, especificamente em São Paulo com a apresentação da Proposta Curricular para o Ensino de 1º Grau. Os PCN, sob influência de órgãos de financiamento internacionais, têm o intuito de orientar e garantir a coerência entre as práticas educativas e os novos investimentos no sistema educacional, além de terem a intenção de constituir, portanto, uma 83 política curricular, com ênfase no desenvolvimento de capacidades, habilidades e competências, visando à integração dos alunos no mundo social contemporâneo. PIRES (2003) relaciona as várias tensões e questões existentes na época: Como construir referências nacionais de modo a enfrentar antigos problemas da educação brasileira e ao mesmo tempo encarar novos desafios colocados pela conjuntura mundial e pelas novas características da sociedade, como a urbanização crescente? O que significa indicar pontos comuns do processo educativo em todas as regiões, mas, ao mesmo tempo, respeitar as desigualdades da realidade brasileira? Como equacionar problemas referentes à possibilidade de acesso aos centros de produção de conhecimento, tanto das áreas curriculares quanto da área pedagógica, e que se refletem na formação dos professores que colocaram as idéias curriculares em prática? Que Matemática deve ser ensinada às crianças e jovens de hoje e com que finalidade? De que modo teorias: didático e metodológico deve ser incorporado ao debate curricular, sem que sejam distorcidas e traga prejuízos a aprendizagem dos alunos?. Os PCN trazem sugestões, objetivos, conteúdos e uma fundamentação teórica dentro de cada área, com intuito de contribuir com o trabalho do professor. Nessa proposta, optou-se por um tratamento específico das áreas, contemplando também a integração entre elas, além de serem incorporadas às áreas de conhecimento algumas questões sociais consideradas mais importantes, como ética, saúde, meio ambiente, orientação sexual e pluralidade cultural, a serem abordadas enquanto temas transversais. Além disso, os PCN sugerem a organização do ensino através de ciclos formados pelo agrupamento de séries segundo (SANT’ANNA, BITTENCOURT e OLSSON, 2007). Os PCN mantiveram algumas semelhanças com a Proposta Curricular para o ensino da Matemática de São Paulo, principalmente no caso da organização curricular por grandes temas, mas também introduziram novos aspectos, ao considerar novas áreas de pesquisa, como é o caso do debate a respeito das novas tecnologias, da preocupação com a inclusão dos componentes sociais e culturais, do aprofundamento do debate relativo ao papel do erro na aprendizagem, como também da postura do professor com relação à valorização dos conhecimentos prévios e das hipóteses que os alunos investigam nos problemas. Assim, os PCN apresentam um discurso moderno na direção de uma política curricular nacional. 84 Os PCN estimulam o desenvolvimento do pensar matemático com a idéia de que qualquer aluno é capaz de fazer matemática em sala de aula, envolvendo cada um no processo de produção do conhecimento, a fim de garantir sentido ao que é feito. Para tanto, é preciso despertar a análise crítica de valores e de idéias, com atividades que façam parte de um contexto significativo para o aluno. Quando a atividade tem significado para o aluno, amplia e resulta em novas relações que ele estabeleceu entre os diferentes temas matemáticos e também entre estes e as demais áreas do conhecimento e as situações do dia-adia. O estabelecimento de relações é fundamental para que o aluno compreenda efetivamente os conteúdos matemáticos, que se tornam uma ferramenta poderosa para resolver problemas e para a aprendizagem/construção de novos conhecimentos. Entretanto, tradicionalmente, o professor reproduz e apresenta o conteúdo oralmente, partindo de elementos primitivos, definições para prosseguir com a teoria e a demonstração. Só após esta apresentação completa é que aparecem os exercícios de aprendizagem, fixação e aplicação, o que pressupõe que o aluno aprenda pela reprodução. Assim, considera-se que uma reprodução correta evidência se ocorreu a aprendizagem. Essa prática de ensino tem se mostrado não eficiente porque não basta ao professor passar ou dar aos alunos os conteúdos prontos e acabados, que já foram descobertos e se apresentam sistematizados nos livros didáticos. Sob essa concepção, é suficiente que o professor apenas conheça a matéria que irá ensinar, cabendo ao aluno copiar e repetir. Naturalmente, à medida que se redefine o papel do aluno diante do saber, é preciso redimensionar também o papel do professor que ensina Matemática no ensino fundamental. 85 Ao trabalhar com essas relações nos terceiro e quarto ciclos o professor deve levar em conta que os alunos adolescentes; jovens atuam mais em grupo do que individualmente e, por isso, a interlocução direta com um determinado aluno é mais fácil de se estabelecer, principalmente diante de outros alunos. Tal fato exige do professor uma profunda compreensão das mudanças pelas quais eles estão passando, além da perseverança e criatividade para organizar e conduzir as situações de ensino de modo que garanta suas participações e interesses. (PCN, 1998, p. 39). Segundo os PCN de matemática (1998), o professor deve desempenhar diferentes papéis, organizador, facilitador, mediador, incentivador, avaliador. Entretanto, segundo PIRES (2003) a descentralização na tomada de decisões curriculares nas diferentes regiões brasileiras acarretou problemas bastante graves. Ao deixar essa atribuição aos estados e municípios, o reflexo das desigualdades regionais nos currículos ficava evidente: regiões mais desenvolvidas economicamente e socialmente, com maior acesso à produção de conhecimentos científicos, reuniam melhores condições de elaborar projetos curriculares contemporâneos, incluindo avanços das pesquisas tanto das áreas de conhecimento específico como das áreas didático-pedagógicas. Em compensação, as demais continuavam reproduzindo listas de conteúdos sem maior reflexão sobre a sua importância ou não. Esse contraste foi claramente notado em estudo feito pela Fundação Carlos Chagas em 1996, que buscava identificar o que se ensinava nas diferentes regiões brasileiras a partir da análise de documentos curriculares oficiais. No quarto ciclo, além da consolidação dos números e suas operações já conhecidas pelos alunos, existe a necessidade de ampliar os significados dos números pela identificação da existência de números não-racionais. Os PCN (1998) recomendam aos professores que proponham aos alunos a análise, interpretação, formulação e resolução de novas situações-problema, envolvendo os números (Naturais, Inteiros e Racionais) e os diferentes significados das operações, e que sejam valorizadas as resoluções aritméticas tanto quanto as algébricas. Dessa forma, assumem a resolução de problemas como um de seus pilares e buscam argumentos relacionados ao desenvolvimento histórico da Matemática para justificar a importância do trabalho com problemas históricos. 86 A própria História da Matemática mostra que ela foi construída como resposta a perguntas provenientes de diferentes origens e contextos, motivadas por problemas de ordem prática (divisão de terras, cálculo de créditos), por problemas vinculados a outras ciências (física, astronomia), bem como por problemas relacionados a investigações internas à própria matemática. (BRASIL, 1998, p. 40). Segundo MIGUEL e MIORIM (2005, p. 53) podemos entender ser possível buscar na História da Matemática apoio para se atingir objetivos pedagógicos que levem os alunos a perceberem, por exemplo: 1. a matemática como uma criação humana; 2. as razões pelas quais as pessoas fazem matemáticas; 3. as necessidades práticas, sociais, econômicas e físicas que servem de estímulo ao desenvolvimento das idéias matemáticas; 4. as conexões existentes entre matemática e filosofia, matemática e religião, matemática e lógica, etc; 5. a curiosidade estritamente intelectual que pode levar à generalização e extensão de idéias e teorias; 6. as percepções que os matemáticos têm do próprio objeto da matemática, as quais mudam e se desenvolvem ao longo do tempo; 7. a natureza de uma estrutura, de uma axiomatização e de uma prova. 3.2. Livros Didáticos Nos PCN (1998, p. 20-1) encontramos que: No Brasil, o Movimento Matemático Moderno, veiculado principalmente pelos livros didáticos, teve grande influência, durante longo período, só vindo a refluir a partir da constatação de inadequação de alguns de seus princípios básicos e das distorções e dos exageros ocorridos. (...) Não tendo oportunidade e condições para aprimorar sua formação e não dispondo de outros recursos para desenvolver as práticas da sala de aula, os professores apóiam-se quase exclusivamente nos livros didáticos, que, muitas vezes, são de qualidade insatisfatória. Recentemente, o Plano Nacional dos livros didáticos (PNLD), projeto de avaliação institucional dos livros didáticos, veio a institucionalizar a vinculação existente entre a política nacional de distribuição de livros didáticos e as práticas escolares, por meio de uma seleção criteriosa dos livros a serem recomendados 87 para uso didático nas escolas. Neste contexto, a influência dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) tornou-se ainda mais relevante e constitui um dos aspectos considerados na presente análise. A função do livro didático no Brasil, enquanto instrumento de mediação de tendências curriculares, tem sido objeto de estudos em diversas áreas, inclusive em Educação Matemática. Essas análises indicam alguns problemas existentes nos livros didáticos e ao mesmo tempo modificações e influências presentes nesses materiais. 3.2.1. Livros didáticos dos anos 70 Analisamos duas coleções: x Coleção A – Matemática para o 1º grau – 7ª e 8ª série, de autoria de Lydia Conde Lamparelli, Adolfo Walter P. Canton, Pedro Alberto Morettin e Dalva Fontes Indiani, do ano de 1973. x Coleção B – Curso moderno de matemática para o ensino de 1º grau – 7ª e 8ª série, de autoria de Anna Averbuch, Franca Cohen Gottlieb, Lucília Bechara Sanchez, Manhúcia Perelberg Liberman, supervisão de L.H. Jacy Monteiro, do ano de 1977. Nessas Coleções de livros didáticos analisados encontramos recomendações para que o aluno faça suas atividades e anotações no próprio livro. Observamos que as recomendações de atividades foram exatamente na ordem de apresentação dos assuntos. Encontramos um padrão recorrente nas coleções A e B. O texto contém informações sobre o tema, apresenta introdução ou definição, propriedades e procedimentos de cálculo. Além disso, cada um de seus capítulos: (i) Expõe o “conhecimento pronto e acabado” e em seguida atividades de fixação; (ii) Aprofunda os conceitos na linguagem matemática, baseada na teoria dos conjuntos, apresentando e discutindo quase tudo sobre o assunto; (iii) Apresenta uma ordem linear dos conteúdos. 88 Das características apontadas nas coleções A e B, a linearidade é a que mais chamou nossa atenção pelos seguintes motivos: a. parecem reproduzir implicitamente o modelo euclidiano, partem de elementos primitivos: introdução, demonstração, fixação de exercícios e aprofundamento; b. no estudo dos temas, parte-se dos mais fáceis para os mais difíceis; c. os conteúdos foram elaborados como conhecimentos prontos e acabados de tal modo que o professor e o aluno ocupam uma posição secundária, constituindo-se meros executores de um processo cuja concepção, planejamento, coordenação e controle ficam a cargo de especialistas. O livro didático da 7ª série da coleção A apresenta os números Irracionais logo após atividades de números Racionais na forma fracionária, correspondendo a uma representação decimal infinita e periódica. Os autores expõem o conhecimento pronto sobre esses números Irracionais, dizendo que não possuem uma representação decimal infinita e periódica, e em seguida, apresentam exercícios de fixação. No livro da 8ª série da coleção A, os autores fazem o estudo dos segmentos comensuráveis e incomensuráveis e, em seguida, exercícios com caráter de fixação. No livro da 7ª série da coleção B, os números Irracionais apareceram através de uma classificação de números decimais ilimitados que podem ser dízimas periódicas ou não, já os decimais ilimitados que não são dízimas periódicas representam números chamados Irracionais. Também é feita a demonstração por absurdo de que a equação x 2 2 não tem solução e que pode ser escrita como quociente de dois inteiros e em seguida, são apresentados exercícios de aplicação. No livro da 8ª série da coleção B, os autores dão ênfase a representação de números Irracionais na reta numérica, sendo que nos exercícios preliminares, tentam passar que existem segmentos de reta que não podem ser medidos através de um número Racional. 89 Observamos que os autores do livro didático da 8ª série da Coleção B ainda possuem vestígios do modelo enciclopédico ao tentarem esgotar o assunto de números Irracionais em unidade estanque de cada volume. Em nenhum momento é destacada a relação do segmento incomensurável com o número Irracional. Na Figura 3.2.1.1, a atividade é formada de seqüência de triângulos retângulos isósceles de lado 1, ESPIRAL PITAGÓRICA, para alguns valores de n, a medida hn é racional quando (n+1) é quadrado perfeito e, para outros, a medida de hn, não é racional quando (n+1) não é quadrado perfeito. Figura 3.2.1.1. Curso Moderno para o ensino de 1º grau (AVERBUCH, GOTTLIEB, SANCHEZ, LIBERMAN, MONTEIRO, 1977, p. 6) Nossa análise apontou que as coleções priorizam objetivos que se restringem ao treino como desenvolvimento de habilidades estritamente técnicas. Os conteúdos, sob esse enfoque, aparecem dispostos em passos seqüenciais em forma de instrução programada, onde o aluno deve realizar uma série de exercícios do tipo siga o modelo. Esses livros foram elaborados numa perspectiva tradicional, respeitando a linearidade apresentada no Movimento da Matemática Moderna, com conhecimento pronto, isolado e exercícios de fixação sem respeitar o ritmo de cada aluno. 90 Essas considerações mostram que os autores centraram-se em uma pedagogia tecnicista, com objetivos instrucionais e em técnicas de ensino com que garantem o alcance dos objetivos propostos. 3.2.2. Livros Didáticos dos anos 90 Analisamos duas coleções: x Coleção C – Matemática: Conceitos e História – 1ºgrau – 7ª e 8ª séries, de autoria de Scipione Di Pierro Netto, do ano de 1997. x Coleção D – Matemática e Vida; 1ºgrau – 7ª e 8ª série, de autoria de Vincenzo Bongiovanni, Olímpio Rudinin Vissoto Leite, José Luiz Tavares Laureano, do ano de 1997. As coleções C e D analisadas parecem que foram elaborados sobre outra visão, diferente dos anos 70 embora não tenham rompido seus compromissos com a linearidade. Mesma não estando mais ligadas às estruturas matemáticas, percebe-se uma mudança significativa em relação à linguagem matemática utilizada na representação dos conceitos. Esta modificação se deve muito provavelmente às tendências construtivistas presentes nos documentos oficiais curriculares. Nesta perspectiva, identifica-se também o objetivo de aproximar o conhecimento matemático do cotidiano dos alunos, o que se evidencia nos textos através de uma linguagem mais coloquial na apresentação dos conteúdos, assim como na tentativa de atualização dos enunciados dos problemas construindo conexões entre os temas e evitando em muitos pontos o conhecimento pronto e isolado. Nessas Coleções, o estudo de um tema não se limita a um só capítulo, ao contrário, é retomado várias vezes ao longo das séries, com apresentações diferentes, que buscam se adaptar à evolução da maturidade e da experiência matemática dos alunos. 91 Os autores dos livros didáticos atendem a orientação da história no estudo dos números pelo fio condutor que a esta propicia. No livro didático da 7ª série da Coleção C, o autor começa com ampliações dos conjuntos numéricos de Naturais a Reais. Ao tratar de números Racionais são explorados temas como densidade, distribuição dos números Racionais e decimais periódicas na reta numérica. Os Irracionais são introduzidos como que se não pudessem ser escritos na forma de frações com numerador inteiro e denominador inteiro diferente de zero, porque suas representações decimais são infinitas e não-periódica, conforme a citação abaixo: Se 2 tivesse um resultado exato, como 2 =1,4142135, então a última casa decimal seria um destes algarismos: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 ou 9. Acontece que, se 2 fosse 1,414213 ou 1,4142135, ou outro número qualquer, veja o que ocorreria: 1,414213 x 1,414213 = ..........9; 1,4142135 x 1,4142135 =.........5; 1,41421352 x 1,41421352 = ..........4. E jamais ocorreria o valor 2 ou 2,000...00 exato, pois: 1 x 1= 1; 2 x 2 = 4; 3 x 3 = 9; 4 x 4 = 16; 5 x 5 = 25; 6 x 6 = 36; 7 x 7 = 49; 8x 8 = 64; 9 x 9 = 81. Neste caso, o irracional 2 nunca terá uma expansão finita, nem terá uma expansão infinita e periódica, pois se fosse um número decimal de expansão infinita e periódica como 1,414213562... resultaria 1 372792206 1272792206 414213562 41421356 1 . 900000000 900000000 900000000 Assim, seria racional. (SCIPIONE DI PIERRO NETTO, 1997, p. 16). O autor apresenta contos semelhantes ao de Malba Tahan, adequados à prática pedagógica. No livro da 8ª série da coleção C, o autor apresenta outras histórias sobre: os pitagóricos e o 1º paradoxo de Zenão, as mônadas, Arquimedes e o cálculo do número pi; os números pitagóricos, a diagonal e o lado dos quadrados, a corrida de Aquiles e a Tartaruga - 2º paradoxo de Zenão. No livro da 7ª série da coleção D, os autores fazem uma revisão dos números Naturais, dos inteiros, dos Racionais e do descobrimento dos números Irracionais, sempre usando recursos históricos. Para os autores, a alternativa pelo 92 fio condutor que a história propicia forneceria a abordagem mais interessante para tornar o estudo dos números irracionais mais significativo. Bongiovanni, Vissoto e Lauriano (1997) comentam que os egípcios para evitar que, após as cheias, um agricultor perdesse parte de suas terras para outro mantinha funcionários par medir e desmarcar suas terras. Esses trabalhadores usavam uma corda com treze nós distribuídos em intervalos iguais. Desse modo, o intervalo entre dois nós funcionava como unidade de medida. A corda era fixada ao chão de três estacas em pontos estratégicos. Se a corda ficasse bem esticada, o anglo formado na segunda estaca media 90º de acordo com as medidas 3, 4 e 5 intervalos de nós. Os egípcios precisavam obter um ângulo reto para marcações de suas terras, porque os terrenos geralmente eram retangulares. A primeira idéia de aplicação do Teorema de Pitágoras. No livro da 8ª série da coleção D, os autores fazem novamente uma revisão do conjunto dos naturais, dos inteiros, dos racionais e dos números irracionais com aprofundamento cada vez maior e com desenvolvimento cíclico, em espiral, de acordo com as sugestões da Proposta Curricular para o ensino da matemática/SEESP. Bongiovanni, Vissoto e Lauriano (1997). Procuram trabalhar com os números Naturais e suas propriedades, recordando os inteiros sobre regras de sinais e mudança de referencial, direção e sentido, reconhecimento e a sua definição de racional com as propriedades, e brincando com números Irracionais para calcular na prática ou na calculadora o número famoso como pi e raiz quadrada de 2. 3.2.3. Livros didáticos dos anos 2000 Analisamos duas coleções: x Coleção E – Matemática hoje é feito assim – Ensino fundamental – 7ª e 8ª séries, de autoria de Antônio José Lopes, do ano 2000. x Coleção F – Tudo é matemática – Ensino Fundamental – 8ª série, de autoria de Luiz Roberto Dante, do ano 2005. 93 Ao analisarmos as coleções E e F verificamos que atendem explicitamente a proposta pedagógica e estão fundamentadas nos mesmos princípios norteadores dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Os textos foram elaborados, de tal modo, que evitam a linearidade e constroem conexões, fugindo de conhecimento pronto. Além de seqüências didáticas específicas, existem seções que propiciam diálogo e debates entre alunos e entre estes e o professor, bem como a reflexão sobre conhecimentos extra-escolares. O autor da coleção E, no livro da 8ª série do ensino fundamental, faz uma revisão sobre os conjuntos numéricos os números naturais e suas propriedades, dos múltiplos e dos divisores, os números inteiros, da propriedade de fechamento para os naturais e inteiros, da enumerabilidade dos naturais e inteiros, do conjunto Q dos números racionais, da ordenação dos racionais, dos decimais finitos e infinitos (dízimas periódicas) e da representação decimal infinita e periódica. O autor introduz os irracionais por meio da história da matemática do século IV a.C. e pela classificação dos números: infinita e periódica de número racional e a infinita e não periódica de números irracionais. Afirma, ainda que hoje temos respostas para maior parte das questões como essas, uma vez que sabemos que: Os irracionais são infinitos. A expansão decimal dos irracionais é infinita e não-periódica e podemos estabelecer uma correspondência entre os pontos de uma reta e os números irracionais. LOPES (2000) prova que os irracionais são infinitos pela demonstração de que p é um número irracional sempre que p for um número primo. Sabe-se que pela teoria dos números que o conjunto dos números primos é infinito, logo, podese tirar a conclusão que o conjunto dos números irracionais é infinito. Esse autor apresenta atividades com os Paradoxos dos infinitos (conjuntos infinitos) e o uso de um número irracional no dia-a-dia. 94 Lopes (2000) os conjuntos numéricos a partir de números naturais e suas propriedades, par e ímpar, voltando ao assunto de números inteiros com conjuntos enumeráveis e com m.m.c. (a, b) e m.d.c. (a., b), O conjunto dos Racionais Q e sua definição, conjunto ordenado, e finalmente com números irracionais com questionamentos: quantos são números irracionais? Como representa-los? Que números são os racionais? Como se distribuem? Comparando racionais com irracionais e suas densidades, usando um número irracional, comprimento da circunferência, a quadratura do círculo e o pai da calculadora. O autor do livro da 8ª série da coleção F faz uma revisão geral nos conjuntos numéricos dos naturais até os números racionais, semelhantes ao do livro da coleção E. Para a introdução dos números irracionais utilizou o número S e o número 2. DANTE (2005, p. 17) aproxima os racionais do irracional S e do irracional 2 para mostrar que a expansão decimal dos irracionais é infinita e não- periódicas através de aproximações racionais sucessivas. No primeiro momento, o autor classifica os números pelo padrão que não se repete após a vírgula de números irracionais. Como exemplo dado: 0,10100100010000...O número é formado na parte inteiro que é zero e uma parte não inteira formada de um1 0 um, um 1 dois 0, um 1 três 0, um 1 quatro 0, etc. a) O notável número S . 3< S <4; 3,1< S <3,2; 3,14< S 3,15;... b) O número 2. O autor descreve que o número 2 é a medida da diagonal do quadrado de lado mede 1 unidade de comprimento. A explicação vem por meio de comunicação perguntas e respostas: - Como seria 2 na forma decimal? - Vamos respondê-la por tentativas e aproximações. 95 Se 1 2 4 1 2 2 . Fazendo tentativas com uso da calculadora 2 1,44 2 1,69 2 1,96 2 2 ,25 ( 1,2 ) temos: ( 1,3 ) ( 1,4 ) ( 1,5 ) Assim, 1,4< 2 1,5 . Tentando mais uma aproximação, temos: 2 1,9881 2 2 ,0164 ( 1,41 ) ( 1,42 ) Logo, 1,41 2 1,42 , continuando com o processo, poderemos chegar a valores como: 2 # 1,414213562. Para a construção do conjunto dos números irracionais, esses autores procuraram incorporar algumas indicações presentes nos PCN de matemática em relação à abordagem do conhecimento matemático, mas fazem de maneira diferente. 96 CAPÍTULO 4 Organização Praxeológica Utilizaremos a noção de Organização Praxeológica proposta por Yves Chevallard, presente em sua Teoria Antropologia do didático, para analisarmos atividades desenvolvidas com números irracionais. Numa atividade matemática como em qualquer atividade, existem duas partes dependentes. De um lado estão as TAREFAS e as TÉCNICAS, e de outro, estão as TECNOLOGIAS e as TEORIAS que são compostas de elementos que permitem justificar e entender o que é feito, isto é, uma reflexão sobre a prática. Para responder a uma determinada questão é necessário organizar uma praxeologia matemática, que é constituída por tipo de problema, uma ou várias técnicas, sua tecnologia e a teoria correspondente (CHEVALLARD, 2001, p. 275). A tarefa envolve dois momentos diferentes ao mesmo tempo, o do professor e o dos alunos nos problemas envolvendo números irracionais, sendo que cada tipo de problema envolve uma técnica. Essa técnica é justificada pela “tecnologia”, que além do torná-la compreensível, traz elementos que podem transformar essa técnica, o momento tecnológico-teórico para dar ênfase aos dois níveis de justificativa: a tecnologia, que se mantém mais próxima da técnica, e a teoria, um pouco mais distante. Justificada pela tecnologia, a técnica traz elementos que podem modifica-la e ampliar seu alcance, superando suas limitações e permitindo, às vezes, a 97 produção de uma nova técnica. Por sua vez a “teoria” é a explicação da tecnologia e serve para interpretá-la, justificá-la e demonstrá-la. Outro elemento da Organização Praxeológica que utilizamos em nossa análise é chamado de Discurso Técnico-Tecnológico que consiste em utilizar três momentos do estudo, isto é, a teoria e a tecnologia em relação a uma técnica de forma simultânea (MAIA, 2007). O bloco [tarefa/técnica] é considerado o saber-fazer, ao passo que [tecnologia/teoria] é considerado o saber. Nesta perspectiva, no estudo da análise do conceito de números irracionais, não se pergunta o que é número irracional, mas quais são os tipos de tarefas a serem executadas e de técnicas envolvidas e quais são as respectivas justificativas tecnológicas e teóricas. Assim, o conceito matemático de número irracional emerge dessa praxeologia. 4.1. Critérios para análise Na avaliação do tipo de tarefa, pretendemos verificar se ela está bem identificada, se sua razão de ser está explicitada, se é adequada para os alunos da série a que se destina e se o conjunto de tarefas fornece uma visão das situações matemáticas mais utilizadas. Na avaliação da técnica, verificaremos se ela é disponibilizada nos livros e, em caso afirmativo, se de maneira completa, ou seja, passo a passo, ou somente esboçada. Na avaliação do bloco tecnologia/teoria, se está disponível pelo menos no manual do professor e, em caso afirmativo, como são dadas as justificativas tecnológicas. Realizaremos essa análise considerando algumas situações nos livros didáticos utilizados no capítulo anterior e incluiremos, ainda, as verificações se estão seguindo ou não as orientações contidas nos documentos oficiais. 98 Situação 1: A prova da irracionalidade de n c , onde c é racional positivo e n inteiro positivo. Abordagem tradicional (euclidiana) Os livros didáticos anteriores à década de 70 parecem reproduzir implicitamente o modelo euclidiano, pois geralmente partem de elementos primitivos e definições para prosseguir com a teoria (teoremas e demonstrações) Só após esta apresentação completa é que aparecem os exercícios de aplicação. Para o entendimento dessa prova da irracionalidade é preciso ter conhecimento básico de: 1. Números Naturais e inteiros: x Primos; x Unicidade da decomposição em fatores primos; x Inteiros pares e ímpares; x Propriedades de fechamento; x M.d.c. (a, b) e m.m.c (a, b); x Propriedades da divisibilidade. 2. Números racionais: x Definição de números racionais; x Representações decimais finitas e infinitas; x Dízimas periódicas; 3. Equações. “Demonstre que n c não é racional”. A tarefa proposta consiste em demonstrar que n c não é um número racional de acordo com uma abordagem tradicional. A técnica a ser utilizada consiste no fato de que os inteiros pares e ímpares são fechados em relação à multiplicação. E, em particular, uma potência enésima de um inteiro par é par e uma potência enésima de um inteiro ímpar é ímpar. O discurso teóricotecnológico compreende que nenhuma solução da equação n c a pode ser b 99 escrita como quociente de dois inteiros, Para isso, utiliza-se um raciocínio por redução ao absurdo. Uma variação dessa situação é considerar o seguinte enunciado: “Demonstre que 3 5 não é racional.” A tarefa demonstrar de acordo com a abordagem euclidiana tradicional, isto é, demonstração indireta, raciocinando por absurdo. A técnica sabemos que os inteiros pares são fechados em relação à multiplicação, o mesmo acontecendo com os inteiros ímpares. Em particular, o cubo de um inteiro par é par e o cubo de um inteiro ímpar é ímpar. O discurso Teórico-Tecnológico suponhamos, agora, que 3 5 fosse um número racional, isto é, 3 5 a b onde a e b são inteiros. Suponhamos ainda, e isto é essencial para o argumento, que a seja uma fração irredutível, ou seja, que a e b sejam primos entre si, que a b e b não têm divisores comuns. Elevando ao cubo a equação acima e simplificando, obtemos, 5 a3 , a3 3 b 5 b3 . Dessa igualdade podemos concluir que, como a não é divisível por b, tem que ser divisível por 5. Como a é divisível por 5 temos, inevitavelmente, a=5m. Agora faremos o mesmo com b. De a3=5.b3, segue que 5.b3 é divisível por a. Como a e b não tem divisores comuns, então 5 é divisível por a, logo a=1 ou a=5. Se a=1 então não existe valor inteiro para b tal que 1=5.b3. Se a=5 então também não existe valor inteiro para b tal que 53=5.b3, pois a e b são primos entre si, ou seja, b não pode ser divisível por 5. Mas, agora chegamos à conclusão de que a é inteiro ímpar (a=1 ou a=5) e b não é inteiro, enquanto a e b foram, inicialmente, supostos primos entre si. Esta contradição nos leva à conclusão de que não é possível escrever 3 100 5 na forma a com a e b inteiros e, portanto, b 3 5 é irracional. Verificamos que a demonstração tem como primeira necessidade expor um conteúdo conhecido dos alunos, porém o assunto exige muito conhecimento de aritmética e da teoria dos números. Do ponto de vista cognitivo, o aluno tem dificuldade para compreender a prova da irracionalidade por envolver um raciocínio por absurdo. Analisamos os livros didáticos da coleção A, a única que usou essa situação1 como a demonstração de acordo com a abordagem euclidiana tradicional, ou seja, demonstração indireta raciocinando por absurdo. Todos os documentos oficiais das Reformas da Educação recomendam ou indiretamente quanto a demonstração indireta euclidiana, situação 1, considerado como referência a noção de rigor em matemática. Situação 2: A prova da irracionalidade de n c , onde c e n são inteiros positivos. Abordagem Moderna (dedekindiana). Em uma abordagem moderna dos números reais, a partir dos cortes de Dedekind, observamos que: 1. Existem mais pontos na linha reta do que números racionais; 2. O conjunto dos números racionais não é adequado para aplicarmos aritmeticamente a continuidade da reta; 3. É absolutamente necessário criar novos números para que o domínio numérico seja tão completo quanto à reta. Demonstre que n c não é racional. A Tarefa consiste em demonstrar de acordo com a abordagem dedekindiana moderna. E, a técnica considera um corte (A, B) na reta numérica racional de modo que a Classe A pertençam todos os números racionais cuja potência de n é menor que c e à classe B, todos racionais cuja potência de n é maior que c. O discurso teórico-tecnológico compreende que se o número de separação entre duas classes A e B não pertence à classe A, nem a classe B, então o número não é racional. Ele será um número irracional. 101 O conhecimento básico para entendermos essa prova de Irracionalidade são: definição de números racionais; representações decimais finitas e infinitas, representações decimais infinitas e não periódicas, potências, equações e inequações em Q. Uma variação dessa situação é considerar o seguinte enunciado: Demonstre que 3 5 não é racional. A Tarefa demonstrar de acordo com abordagem dedekindiana moderna. A técnica demonstrar através dos cortes de Dedekind. O discurso teórico-tecnológico observe que (A, B) define o corte sobre Q, pois qualquer número racional, ou pertence à classe A ou pertence à classe B. Portanto, não existe nenhum racional que pertença a ambas as classes ao mesmo tempo. Para provar a irracionalidade, escrevemos x= 3 5 . Se elevarmos ao cubo, temos: x3=5, consideremos alguns valores de x tais que: x3 5 x X3 1 1 1,1 1,331 1,2 1,728 1,3 2,197 1,4 2,744 1,5 3,375 1,6 4,096 1,7 4,913 1,709 4,991 1,79 5,74 1,78 5,64 1,77 5,54 1,76 5,45 1,75 5,35 1,74 5,26 1,73 5,17 1,72 5,08 1,71 5,0002 x3 ! 5 x X3 Classe A={1; 1,1; 1,2; 1,3; 1,4; 1,5; 1,6; 1,7; 1,709...} Classe B={1,79; 1,78; 1,77; 1,76; 1,75; 1,74; 1,73; 1,72; 1,71...} Notamos que: 1. Todos os números racionais estão distribuídos nestas duas classes; 2. Os cubos dos números racionais da primeira classe são menores que 5, crescentes e cada vez mais próximos de 5, enquanto os cubos dos números racionais da segunda são maiores do que 5, decrescentes e também cada vez mais próximos de 5; 102 3. A diferença entre dois valores correspondentes, um da primeira e outro da segunda classe, vai se tornando cada vez menor, nunca chegando, porém, a ser nulo. Nestas condições, o número 3 5 está separando essas duas classes de números racionais, não pertencendo, portanto, ao campo racional, por não ser possível encontrar um número racional cujo cubo seja igual a 5. As duas classes de números racionais, com as propriedades enunciadas, serviram para definir 3 5 . Portanto, 3 5 é número irracional. Do ponto de vista cognitivo, o aluno parece ter condição de processar essa demonstração. Ao examinarmos os livros didáticos das coleções analisadas tivemos agradável surpresa, já que a prova da irracionalidade de n c já não ocorre na velha abordagem tradicional, mas uma abordagem dedekindiana moderna considerado a situação 2. Os documentos das Reformas Educacionais indicam ou recomendam uma abordagem moderna para justificar a irracionalidade. Dedekind elaborou uma teoria dos números reais mais elaborada, no final do século XIX. Situação 3 - A prova da irracionalidade de n c , onde c e n são inteiros positivos. Abordagem moderna pela equação polinomial. Para verificar a irracionalidade de um número dado faremos uma pesquisa de raízes racionais na equação polinomial. Nas equações polinomiais a x 3 b x 2 c.x d 0( a z 0 ) , quando a, b, c e d são números inteiros, ocorre a seguinte propriedade; se um número racional p q (sendo p e q primos entre si) é raiz da equação polinomial, então p é divisor de d, e q é divisor de a. Observamos que, substituindo x por p/q na equação acima, temos: 103 a.( p 3 p 2 p ) b.( ) c(. ) d q q q 0 Efetuando cálculos nessa equação, podemos chegar às seguintes conclusões: 1ª ) a p3 q bp cpq d q 2 Como o segundo membro é um número inteiro, então q tem que ser divisor de a, pois p e q são primos entre si. 2ª) a. p2 bpq c. q 2 d q3 p Como o primeiro membro é um número inteiro, então p tem que ser divisor de d, pois p e q são primos entre si. “Prove que n c não é racional.” A tarefa demonstrar de acordo com a abordagem moderna, e considerando a equação polinomial: xn=c. A técnica um número da forma n c , onde c e n são inteiros positivos, ou é irracional ou é um inteiro; no segundo caso, c é uma n-ésima potência de um inteiro. Dada equação polinomial: xn-c=0, a=1 e d=-c aplicando a seguinte propriedade: q é divisor de a, isto é, q=1, e p é divisor de d, então p q { r1,rc } . O discurso teórico-tecnológico: fazer uma verificação se existe uma raiz racional ou mais. Uma variação dessa situação é considerar o seguinte enunciado: “Prove que 3 5 não é racional.” A tarefa consiste em provar que equação polinomial. 104 3 5 não é racional utilizando uma A técnica consiste que, ou 3 5 é uma raiz de x3-5=0, ou esta equação tem uma raiz racional, que tem que ser 1 ou 5, considerando a=1 e d=- 5. O discurso técnico-tecnológico compreende que os divisores de a={-1, 1} e divisores de d={-1,1, -5, 5} p é divisor de 5:, então p é –1, 1, -5 ou 5. q é divisor de 1, então q é –1 ou 1. Logo, para p/q temos as seguintes possibilidades: -1, 1, -5, 5. Como (-1)3-5 z 0; 13-5 z 0; (-5)3-5 z 0; 53-5 z 0, então x3-5=0 não tem raiz inteira, logo não tem raiz racional, de modo que 3 5 é um número irracional. Do ponto de vista cognitivo, o aluno não terá dificuldade para processar esta demonstração. Ao examinarmos livros didáticos tivemos agradável surpresa, já que a prova da irracionalidade de n c ocorre em todas as coleções numa abordagem moderna pela equação polinomial dando sentido ao conhecimento matemático e também ao saber escolar. Todos os documentos oficiais das Reformas Educacionais recomendam a utilização da abordagem mais moderna principalmente pela equação polinomial valorizando a contextualização como objeto a ensinar na formação de jovens. Situação 4: Construir uma técnica para provar a irracionalidade de outros números Situação 4 construir uma técnica para provar a irracionalidade. A tarefa consiste em construir uma técnica para determinar se um número dado é ou não irracional. A técnica considera como ponto de partida que irracional, então a sua metade 3 2 3 é irracional. Se é irracional. Se somarmos 3 é 5 , a soma 2 105 5 3 2 2 5 3 5 3 é irracional. Então 2 vezes 2 2 mesmo com 5+ 3 5 3 . Portanto, se sabemos que 5 3 também será e o 3 não é racional, então 5 3 também não será racional. 2 O discurso técnico-Tecnológico utiliza o teorema: “se a e b são números racionais, com b diferente de zero, e se x é um número irracional, então a+bx também é irracional”. Uma variação dessa situação é considerar o seguinte enunciado: “Prove que 7- 3 não é racional.” Como 3 é irracional, então 7- 3 é irracional. De outra maneira, suponhamos que 7- 3 fosse um número racional, digamos r, isto é, r = 7- 3 , isolando a 3 , temos: 3 =7-r. Mas, números racionais são fechados em relação às quatro operações: adição, subtração, multiplicação e divisão (exceto por zero) e, portanto, 7-r é um número racional. Mas 3 é irracional e, assim, chegamos a uma contradição. Concluímos, então, que 7- 3 é irracional. Para esta demonstração é necessário conhecermos alguns irracionais e a propriedade de fechamento das quatro operações para os racionais e assim chegarmos a uma contradição. Do ponto de vista cognitivo, o aluno será capaz de realizar as demonstrações sem dificuldades com conhecimento de números racionais que são fechados em relação à quatro operações: adição, subtração, multiplicação e divisão(exceto por zero). Ao analisarmos os livros didáticos das coleções, alguns autores como das coleções B e C deixaram de utilizar a situação 4, na construção de uma técnica para provar a irracionalidade de outros números. Nem todos os documentos oficiais das Reformas Educacionais deixaram de mencionar ou utilizar a situação 4 na construção de uma técnica para provar a irracionalidade de outros números. 106 Situação 5: Outras caracterizações de número irracional Outras caracterizações de número irracional. A tarefa é propor uma outra forma de caracterizar o número irracional. A maioria dos livros didáticos de matemática traz as caracterizações do número irracional como: a. número irracional não é racional, e portanto não pode ser escrito na forma de fração; b. número cuja representação decimal é infinita e não-periódica. A técnica aponta que, enquanto os termos número racional e fração ordinária são, às vezes, usados como sinônimo, a palavra fração, sozinha, é usada para denominar qualquer expressão algébrica com numerador e denominador. (NIVEN, 1984). O discurso técnico-tecnológico considera que qualquer número, com representação decimal infinita periódica, apesar de não ter fim para o número de termos, a soma tem um valor bem definido. O número por ter representação decimal não-periódica, também corresponde a um determinado ponto da reta real. É aquele para o qual converge a seqüência de pontos, ponto correspondente a um ponto irracional. A palavra “racional” se refere-se à razão de números inteiros e “irracional” indica a ausência de uma tal razão. Do ponto de vista cognitivo, a dificuldade do aluno está na linguagem de todo dia, ao associar número irracional como tudo aquilo que não é familiar. Todos os livros didáticos analisados trazem essas caracterizações dos números irracionais sem explicações e detalhes do significado da palavra ou com frase solta. Todas as Reformas Educacionais trazem indireta ou diretamente as caracterizações do número irracional. Nessa passagem de uma reforma para outra, parece que criam um certo número de obstáculos. Parece que esses obstáculos não se constituem na falta de conhecimento, mas pelo contrário, são 107 conhecimentos antigos cristalizados pelo tempo, que resistem à instalação de novas concepções que ameaçam a estabilidade intelectual de quem detêm esse conhecimento. Situação 6: Segmentos comensuráveis e Segmentos incomensuráveis Segmentos comensuráveis e Segmentos incomensuráveis. A tarefa consiste em descrever quando eles são chamados de segmentos comensuráveis e quando de segmentos incomensuráveis. Trataremos de duas técnicas a primeira pela razão de segmentos; e a segunda, utilizando o método de subtrações sucessivas, conhecido como máximo divisor comum entre dois segmentos dados. O discurso técnico-Tecnológico compreende que: 1. Dados dois segmentos quaisquer, se a razão de suas medidas tomadas com a mesma unidade for um número racional, os segmentos são chamados comensuráveis e, se esta razão for um número irracional os segmentos são incomensuráveis. 2. Sempre que for possível encontrar o maior divisor comum entre dois segmentos, eles serão chamados de segmentos comensuráveis, pois é possível expressar a medida de um deles utilizando o outro como unidade de medidas. Se não for possível encontrar o maior divisor comum entre dois segmentos, isto é, repetindo o processo e não encontrar uma diferença zero, então eles são chamados de segmentos incomensuráveis. Do ponto de vista cognitivo, a dificuldade do aluno está na conceituação do número racional como resultado da medição de uma grandeza, que coloca a ênfase no aspecto do racional como expressão da medição de uma grandeza escolhida como unidade. Essa expressão é um número inteiro ou fracionário, chamado preferencialmente de número racional, caso contrário de número irracional. 108 Apenas a coleção A introduziu as atividades com segmentos comensuráveis e incomensuráveis para melhorar a definição de números racionais e números irracionais. Dos documentos oficiais apenas o GUIA CURRICULAR deixou de apontar a necessidade e a importância do estudo dos segmentos comensuráveis e incomensuráveis para definir números racionais e irracionais respectivamente. Situação 7: Infinito e representação decimal A igualdade 0,333...=0,3+0,03+0,003+...= 1 é verdadeira? 3 A tarefa consiste em identificar a dificuldade para interpretar essas duas igualdades. A técnica compreende em mostrar que a representação decimal infinita por envolver a idéia de limite, não tem uma forma simples. O discurso Teórico-Tecnológico considera que se 0,3+0,03+0,003+...=0,333... então representa a soma de infinitas parcelas. Por um lado, o resultado de uma soma é concebido como o número finito 1 que se 3 obtém no final do processo de somar e, por outro lado, é impossível chegar ao final. Nesse caso, a soma estende-se por um número infinito de parcelas. Do ponto de vista cognitivo, a dificuldade do aluno está na compreensão da idéia de limite envolvendo representação decimal infinita. Notamos que o símbolo de reticências causa instabilidade nas respostas. Ao examinarmos livros didáticos percebemos que não ocorrem abordagens do infinito e representação decimal, sendo que essas ausências enfraquecem sensivelmente as definições de números racionais e irracionais. Os documentos oficiais analisados não apontaram para esses detalhes. O infinito e a representação decimal sempre foram obstáculos epistemológicos e problemas para os estudantes, bem como para os professores de matemática. 109 Situação 8: Conceito de irracionalidade Corte uma folha de papel sulfite em dois pedaços ao acaso. É sempre possível exprimir a razão entre os tamanhos desses dois pedaços (as áreas ou comprimentos deles) por um número racional? A Tarefa consiste em aprofundar o conceito de irracionalidade. A técnica considera a necessidade de reconhecimento dos segmentos comensuráveis e incomensuráveis, e também a quantidade infinita de números irracionais e racionais. O discurso Teórico-Tecnológico compreende que a razão entre dois números reais é irracional se um deles ou ambos for irracional. Esta atividade tem como aprofundamento o conceito de irracionalidade desmistificando a idéia que número irracional não pode ser escrito como fração. Do ponto de vista cognitivo, a dificuldade do estudante está na compreensão do conceito de irracionalidade. Ao analisarmos os livros didáticos não encontramos atividades relacionadas a esse conceito de irracionalidade. Também não houve apontamento desse conceito de irracionalidade nos documentos oficiais. Com a ausência desse objeto a ensinar, criam-se diferentes fontes de dificuldades na aprendizagem escolar. 4.2 Quadro sinopse da aderência às situações O Quadro resumo 1 apresenta uma síntese da análise realizada nas coleções de livros didáticos, Os itens assinalados com um X indicam que o capítulo do livro didático é aderente ao critério. 110 SITUAÇÃO GUIA CURRICULAR PROPOSTA CURRICULAR PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS X X X n X X X n X X X X X X X X X 1-Prova da irracionalidade de n c - abordagem tradicional (euclidiana) 2-A prova da irracionalidade de c -abordagem Moderna(dedekindiana) 3-A prova da irracionalidade de c -abordagem Moderna pela equação polinomial 4-Construir uma técnica para provar a irracionalidade de outros números. 5- Outras caracterizações de número irracional 6-Segmentos comensuráveis e segmentos incomensuráveis 7- infinito e representação decimal 8- Conceito de irracionalidade X Quadro resumo 1. síntese das análises realizadas por situação nos documentos oficiais. Analisando o quadro resumo 1 constatamos as situações 7 e 8 não estão preenchidas. Acreditamos que as duas abordagens são de suma importância para a construção do conceito de números irracionais. Os PCN de matemática do Ensino fundamental apontam que a comprovação da irracionalidade de um número dado só tem uma possibilidade, no âmbito da própria matemática (PCN, 1998, p. 106). O GUIA CURRICULAR foi o único que deixou de mencionar na situação 6, enfraquecendo ainda mais a ligação com números racionais e irracionais respectivamente. A situação 4 não foi apontada no GUIA CURRICULAR, mostrando que para essa justificativa basta saber que os números racionais são fechados em relação as quatro operações. 111 SITUAÇÃO COL. A COL. B COL. C COL. D COL. E COL. F X X X X X X X X X X X X X X X X X X n 1-Prova da irracionalidade de c abordagem tradicional (euclidiana) X n 2-A prova da irracionalidade de c -abordagem Moderna (dedekindiana) n 3-A prova da irracionalidade de c -abordagem Moderna pela equação polinomial 4-Construir uma técnica para provar a irracionalidade de outros números. 5- Outras caracterizações de número irracional 6-Segmentos comensuráveis e segmentos incomensuráveis 7- infinito e representação decimal 8- Conceito de irracionalidade X X X X X Quadro resumo 2. síntese da análise por situação nas coleções de livros didáticos Examinando os livros didáticos constatamos as situações 7 e 8 não estão preenchidas. Talvez a maior dificuldade da situação 7 envolva a idéia de limite, que não é tão simples para o aluno. A situação 8 é uma atividade para verificar a possibilidade da incomensurabilidade presente no dia-a-dia. Analisando os livros didáticos, somente a coleção A comentou a situação 6, que parece não considerar a possibilidade de incomensurabilidade de segmentos e também a relação confusa com a irracionalidade. Na situação 4, somente as coleções B e C não apontaram uma técnica para provar a irracionalidade de um número dado. Para isso bastaria saber que os números racionais são fechados em relação as quatro operações fundamentais. A situação 1, foi apontada por apenas a coleção A, as demais coleções não apontaram para essa abordagem, que é considerada ultrapassada e de difícil entendimento por parte dos alunos. A finalidade desse trabalho foi a de estudar os fenômenos relacionados ao ensino e a aprendizagem do conteúdo de números irracionais nas séries finais do ensino fundamental. Nas coleções de livros didáticos analisados, apenas a coleção A apresentou a abordagem tradicional euclidiana, por ter sido elaborado no período 112 da Matemática Moderna. As coleções dos outros períodos mudaram bastante, principalmente devido a influência da Proposta Curricular para o ensino da matemática e dos Parâmetros Curriculares Nacionais. A demonstração da irracionalidade com abordagens alternativas modernas também foram destaque de nossa análise para a compreensão alguns aspectos relacionados ao processo de ensino e aprendizagem de números irracionais. Apontamos que: x As idéias matemáticas evoluem, nesse caso, o conceito de número irracional não é estático, é um conhecimento historicamente construído e que se reconstrói para cada professor; x Um mesmo objeto matemático como números irracionais, permite diversas abordagens de ensino, que repercutem em nossa ação pedagógica na sala de aula; x Uma vez que os conceitos matemáticos, como números irracionais, se transformam, evoluem, modificam e ganham novos significados, sua compreensão exige que se volte sempre a eles, em diferentes momentos da aprendizagem. 113 CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir de nossos estudos, a nos propusemos responder a seguinte questão de pesquisa: Que dificuldades surgiram ao longo da história da Matemática para o desenvolvimento do conteúdo matemático, números irracionais, e quais abordagens estão presentes nos livros didáticos? Para tentarmos responder a essa questão, realizamos uma análise histórico-epistemológica dos números irracionais e verificamos que a descoberta dos incomensuráveis, na antiguidade, representou um momento de crise no desenvolvimento da Matemática, a qual foi superada ainda no século IV a.C. por Eudoxo da escola Platônica. Este autor desenvolveu uma teoria das proporções que permitiu superar a dificuldade dos incomensuráveis sem a necessidade de números irracionais, a qual pretendia contornar o problema de expressar a razão entre segmentos incomensuráveis, que é um número irracional, pois os estudiosos gregos da época aceitavam a existência de números inteiros e alguns Racionais. Depois de mais de dois milênios, Richard Dedekind construiu uma teoria rigorosa dos números reais e vários estudiosos em matemática colaboraram nesta conquista, desde as Antigas Civilizações, o Renascimento da Ciência, a Idade Moderna e o século dezenove. Cantor, um desses matemáticos que colaborou com o desenvolvimento dos números reais, denominou o infinito dos números inteiros e dos racionais de 0 . Ele sabia que os números irracionais, os transcendentes em particular, eram mais abundantes que os racionais, ou seja, que aqueles números não podiam ser postos em correspondência biunívoca com os racionais. Continuando, por um 115 método simples, Cantor provou que os números reais não são contáveis e chamou a potência daquele conjunto de C (de contínuo) ou 1 . Nos documentos curriculares oficiais, os números irracionais são tratados em uma organização linear, por meio de acumulação nos conjuntos numéricos, ou seja, primeiro os naturais, depois os inteiros, depois os racionais e por último os irracionais. O tipo de abordagem dada ao seu ensino continua sendo o axiomático euclidiano, enquanto outros tipos de abordagens poderiam ser mais aproveitados pelos alunos e professores na sala de aula. A maioria desses documentos propõe acompanhar a evolução dos números irracionais através do fio condutor que a história propicia, trocando uma sistematização prematura por uma abordagem mais rica em significados. A História da Matemática mostra que os conceitos matemáticos foram construídos como respostas a perguntas provenientes de diferentes origens e contextos, motivadas por problemas de ordem prática, bem como por problemas relacionados a investigações internas à própria matemática. Nas coleções mais recentes, nas atividades com números irracionais, os autores estão construindo conexões entre os temas, evitando a idéia de conhecimento pronto, propõem a evolução dos números irracionais através do fio condutor que a história propicia dentro da sala de aula. O estudo do tema irracional é retomado várias vezes ao longo dos volumes, buscando acompanhar a evolução do aluno e das experiências matemáticas desenvolvidas. Entretanto, em nossa análise encontramos outras maneiras de abordar o conteúdo matemático. Segundo Singh (1999), a idéia de demonstração matemática clássica começa com uma série de axiomas, declarações que julgamos ser verdadeiras. Então, através de argumentação lógica, é possível chegar a uma conclusão: Se os axiomas estiverem corretos e a lógica for impecável, então a conclusão será inegável o teorema. Os teoremas matemáticos dependem deste processo lógico e uma vez demonstrados serão considerados verdades. A prova matemática é absoluta, o que faz com que essa ciência Matemática seja considerada exata, ou seja produz conclusões indubitavelmente corretas. 116 Essa maneira de ver a matemática é sentida nos livros didáticos da década de 70. A partir da década de 80 começa-se a perceber um certo abandono dessa abordagem tradicional euclidiana para abordagens mais modernas, como a dedekindiana, que utiliza equação polinomial, além de outras caracterizações de número irracional. Percebemos em nossa análise que os números naturais, inteiros e racionais são bastante trabalhados nos livros didáticos, mas os irracionais são tratados de forma muito superficial. O principal fator que nos motivou a realizar esse trabalho foi exatamente o desejo de apontar e esclarecer dificuldades de ensinar e aprender sobre o conjunto dos números irracionais. Conseguimos muito pouco, mas aprendemos muito com esse trabalho. 117 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AABOE, A. Episódios da História antiga da matemática. Sociedade Brasileira de Matemática. 1984, 170p. ACZEL, A. D. O mistério de alef: a matemática, a Cabala e a procura do infinito São Paulo:Globo, 2003, 218p. ALCÂNTARA, S. D. Aprendizagem em Matemática: registros de representação semiótica./Silvia Dias Alcântara (org.) - Campinas. SP: Papirus, 2003(Coleção Papirus. Educação). AMADEI, F. L. O infinito: um obstáculo no estudo da matemática. 2005. 111f. Dissertação: Mestrado em Educação Matemática. 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