vulnerabilidade e moralidade em alasdair macintyre

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VULNERABILIDADE E MORALIDADE EM ALASDAIR MACINTYRE
Bruno Thompis Alves Siqueira Barbosa (bolsista PIBIC/UFPI), Helder Buenos Aires de
Carvalho (orientador, Departamento de Filosofia/UFPI)
INTRODUÇÃO
O presente relatório visa analisar os papeis atribuídos à vulnerabilidade e sua função em
relação à moralidade na obra Animales Racionales y Dependientes (2001) do filósofo escocês
Alasdair MacIntyre. Tal temática soa como problemática e é tratada como nova pela forma dada à
sua abordagem pelo filósofo, uma vez que segundo ele, não tem sido atribuída a ela, papel de real
importância no cenário da filosofia moral. Entendendo sempre que a obra macintyreana ainda está
em constante aprimoramento e reformulação, não podemos e não devemos tratar a obra aqui
estudada nem como expoente máximo no que diz respeito ao fato da vulnerabilidade, nem como
mera ferramenta descartável para entendermos tal dimensão.
A consciência da dimensão da vulnerabilidade humana, para MacIntyre, diferente do
frequentemente difundido no senso comum e constantemente ignorado no ambiente técnico-filosófico
da moralidade, assume papel fundamental no que diz respeito à formação do homem enquanto
agente moral. Para o escocês, o agente moral da sociedade pós-iluminismo é um agente racional
dependente, por mais que almeje a independência e a pregue em seus temas filosóficos com ardor.
Para MacIntyre, a busca desse agente moral pela independência passa diretamente pela
conscientização de sua dependência.
METODOLOGIA
Tomando como eixo diretor a obra Animales Racionales y Dependientes (2001), precedida de
alguns capítulos de Depois da Virtude (2000 [1981]), juntamente com alguns artigos e livros de
intérpretes de sua obra (Carvalho, 2000, 2010; Gamio, 2002) buscou-se efetivar leituras prévias e
interpretativas da bibliografia sugerida com ênfase na obra Dependent Rational Animals, onde se
encontram a quase totalidade dos requisitos necessários para atingirmos os objetivos préestabelecidos para o nosso programa. A leitura da obra citada se deu de forma concatenada e
contextualizada
historicamente,
procurando
sempre
respeitar
a
perspectiva
interpretativa
hermenêutica de Gadamer no que tange a olharmos fixamente o momento histórico no qual o autor
está inserido, tempo para o qual a presente teoria pretende dar respostas.
A obra Animales Racionales y Dependientes (2001), como dito acima, é o foco quase
exclusivo do presente relatório, mas faz-se mais do que necessário nos reportarmos, por vezes, ao
que o autor nos deixou como legado em Depois da Virtude (1981), que faz as vezes de “carro-chefe”
do pensamento macintyreano no que tange a filosofia moral e contém diversos dos conceitos
desenvolvidos na obra aqui estudada. Não devemos perder de vista, no entanto, o enfoque principal
na nossa busca: a conexão entre a dimensão da vulnerabilidade e a moralidade na obra de
MacIntyre. Tal conexão nos é elucidada no cotidiano dos agentes quando entendemos as limitações
desses agentes como seres humanos, a forma praticamente constante com a qual eles costumam
padecer de enfermidades que os incapacita de exercer plenamente a função de agentes morais
conscientes. A posição de MacIntyre é contrária à concepção do senso comum, que costuma tratar
os seres incapacitados como alvo de mera benevolência por parte dos agentes morais “normais”. Sua
posição é uma posição investigativa quando o mesmo procura entender a raiz do problema,
buscando os fatores que impedem que, em nosso contexto social, tais dimensões sejam
reconhecidas de modo satisfatório e contribuam diretamente para a formação de um, realmente, novo
agente moral.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A dimensão da vulnerabilidade encontrada na obra do filósofo escocês perpassa os limites de
compreensão e aceitação do senso comum e da sociedade atual. Dominada por fortes características
individualistas e por um modelo de Estado completamente despreparado e alheio à essa
compreensão da dimensão da vulnerabilidade e suas consequências de aceitação para a sociedade
como um todo, as dificuldades encontradas pelo filósofo na implantação do seu sistema filosófico de
reconhecimento da vulnerabilidade são inúmeras. A família atual, dominada pelo pensamento que
MacIntyre chamou de burguês, pouco se importa com a formação dos filhos no que diz respeito a
atingir um telos comunitário, de conjunto.
Apesar de a tarefa ser aparentemente simples, MacIntyre versa que os esforços rumo ao
reconhecimento da dimensão supracitada esbarra nos problemas diagnosticados ainda em Depois da
Virtude (2001): uma crise moral e social fortíssima que se amplia e se agrava cada vez mais. O
diagnóstico feito na obra anterior é um diagnóstico esclarecedor e frequentemente interpretado com
pessimismo pelos leitores ávidos de sua obra, porém, como é comum na obra do escocês, há sempre
a preocupação nos indicar uma saída. Em Depois da Virtude, a saída sugerida foi um retorno à ética
aristotélica das virtudes e o combate frequente à concepção emotivista de moralidade que domina o
cenário social de nosso tempo. Na obra aqui estudada, no entanto, o autor nos oferece uma saída
semelhante e que se apresenta com caráter de continuidade, exemplificando o retrato de frequente
construção da obra macintyreana.
Se, em Depois da Virtude, o foco foi o citado acima, em Animales Racionales y Dependientes
a busca pelo papel das virtudes no cenário atual de desordem moral do reconhecimento da
vulnerabilidade e suas características, além do reconhecimento da dependência, passa diretamente
pelo exercício da combinação e justa-medida do catálogo de virtudes apresentadas a nós pela
tradição. Buscar exercitar o caráter de reciprocidade, de mútua troca na construção do agente
racional independente e autônomo, é ponto fundamental defendido pelo autor no que concerne a
saída do homem da estrutura da dependência e distanciação da estrutura do autoengano.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De fundamental importância para o cenário filosófico atual, MacIntyre exercita magistralmente
o papel de incitar o leitor comum ou até o ávido leito profissional no rumo das questões propostas por
ele no decorrer de suas obras. Tratar a filosofia de seu tempo como, realmente, uma proposta às
questões levantadas em seu tempo atribui ao autor caráter didático e convidativo.
Trazer à tona o debate sobre a vulnerabilidade e explicitar a forma como esta é vista no
contexto filosófico, não só histórico mas também na atualidade, rende a MacIntyre uma tarefa árdua e
quase messiânica para os padrões sociais que temos em nossa sociedade, hoje.
Faz-se mister entendermos que o homem é, sim, apto a desenvolver-se e fazer a troca da
condição de agente racional dependente (e eternamente dependente) para a condição de agente
racional prático independente e autônomo. No entanto, como dito anteriormente, o terreno onde
o florescimento do homem se dá, é um ambiente hostil à moralidade como um todo. O telos dos
sistemas sócio-econômicos da pós-modernidade, se é que há um, jamais foi a boa convivência, o
bem viver ou quaisquer que sejam os preceitos que almejem boa convivência entre os homens. Cabe
a nós, propiciarmos que tal ambiente floresça e que as dimensões aqui defendidas estejam cada
vez mais indissociáveis do cotidiano do agente moral racional e que sua busca seja inclinada rumo à
independência, à autonomia.
PALAVRAS-CHAVE
Vulnerabilidade. Dependência. MacIntyre. Moral. Moralidade.
REFERÊNCIAS
CARVALHO, Helder B. A. de. Alasdair MacIntyre e o retorno às tradições morais de pesquisa
racional. IN: OLIVEIRA, Manfredo A. de (org.). Correntes fundamentais da ética
contemporânea. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000. p. 31 – 64.
CARVALHO, Helder B. A. de. A antropologia dos animais racionais dependentes. Pensando Rev. de
Filosofia. 2010, Vol: 1 Nº 2, p. 119-168.
GAMIO, Gonzalo. Alasdair MacIntyre: Animales racionales y dependientes. Areté Rev. de Filosofia.
2002, Vol: XIV Nº 1, p. 143-148.
MACINTYRE, Alasdair. Animales Racionales y Dependientes. Por qué los seres humanos
necessitamos las virtudes. Barcelona: Paidós, 2001.
_________. Depois da Virtude. [1981] Trad. Jussara Simões. Revisão Helder B. A. de Carvalho.
Bauru: EDUSC, 2001.
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