INFORMAÇÕES GERAIS COPYRIGHT A Revista Interdisciplinar em Saúde e Educação, editada pela Escola de Saúde e Educação da Faculdade dos Guararapes (Jaboatão dos Guararapes, PE), com periodicidade semestral, tem por finalidade publicar artigos originais relacionados com as áreas de conhecimento da saúde e da educação. Publica, também, trabalhos de revisão crítica da literatura, quando submetidos em forma de abstract para avaliação quanto ao interesse. Na seção de publicações novas compreende resenhas elaboradas por especialistas, segundo sugestão do Conselho Editorial. Suplementos temáticos e aqueles relativos a eventos científicos podem ser publicados mediante aprovação prévia do Conselho Editorial. Manuscritos aceitos e publicados são de propriedade da Revista, ficando os direitos autorais reservados à mesma. A declaração de responsabilidade e transferência dos direitos autorais será encaminhada juntamente com a prova final do artigo, devendo retornar no prazo estipulado. A Revista se reserva o direito de efetuar, nos originais, alterações de ordem normativa, ortográfica e gramatical, com vistas a manter o padrão culto da língua, respeitando, porém, o estilo dos autores. As provas finais não serão enviadas ao autores, ficando sua reimpressão parcial ou total, sujeita à autorização expressa do editor desta revista. A Revista Interdisciplinar em Saúde e Educação foi criada em 2013, por iniciativa da Escola de Educação e Saúde da Faculdade dos Guararapes, e a abreviatura de seu título é RISE, que deve ser usada em bibliografias, notas de rodapé e em referências bibliográficas. Editor executivo Leandro de Albuquerque Medeiros - Faculdade dos Guararapes Conselho Editorial Aline Alves Barbosa da Silveira - Faculdade dos Guararapes Alyne Cristine da Silva - Faculdade dos Guararapes Carla Fabiana da Silva Toscano Macky - Faculdade dos Guararapes Emmanuelle Christine Chaves da Silva – Universidade Federal Rural de Pernambuco Fernando Ramos - Faculdade dos Guararapes Gisela Rocha de Siqueira – Universidade Federal de Pernambuco Letícia Scorsi - Faculdade dos Guararapes Manoela de Lira Malta Araújo – Faculdade dos Guararapes Marcela Soutinho Flórido - Faculdade dos Guararapes Michaelle Moraes - Faculdade dos Guararapes Paulo André da Silva – Universidade Federal de Pernambuco Ricardo Alexandre Guerra Vieira - Faculdade dos Guararapes Shalom Pôrto de Oliveira Assis - Faculdade dos Guararapes Editor de criação Rodrigo Diniz Apoio técnico e administrativo Biblioteca – Faculdade dos Guararapes MISSÃO O objetivo da Revista Interdisciplinar em Saúde e Educação, é contribuir para o desenvolvimento técnico-científico do Estado, buscando a ampliação dos saberes na área da saúde e da educação, auxiliando com a formação de uma massa crítica voltada para atender aos anseios dos cidadãos pernambucanos. INDEXAÇÃO A Revista Interdisciplinar em Saúde e Educação está em processo de indexação. ACESSO LIVRE À INFORMAÇÃO CIENTÍFICA: A política editorial da revista é a do acesso livre e gratuito na disseminação, recuperação da informação e visibilidade científica. Para tanto, todos os artigos publicados podem ser baixados integralmente e gratuitamente, sendo que não é cobrada do autor a publicação do artigo. CORPO EDITORIAL PERIODICIDADE A Revista possui periodicidade semestral. PATROCINADORES A Revista recebe financiamento da Faculdade dos Guararapes. DIRETRIZES PARA AUTORES Os trabalhos submetidos à Revista Interdisciplinar de Saúde e Educação devem enquadrar-se na linha editorial da revista que aborda a temática do desenvolvimento humano com ênfase nas questões relacionadas às necessidades humanas como saúde e educação. A RISE publica artigos e resenhas, assim como reedita trabalhos clássicos e documentos históricos relacionados com os objetivos da revista. Os artigos e resenhas devem ser inéditos e não podem ser simultaneamente submetidos a outra (s) revista (s). Podem ser submetidos trabalhos redigidos em português, inglês, francês, espanhol. Os artigos e resenhas encaminhados a RISE deverão obedecer rigorosamente às instruções da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), notadamente as NBR 10520, 6022, 6023, 6024 e 6028. Os textos extraídos de relatórios técnicos ou científicos, de trabalhos acadêmicos (monografias, dissertações e teses) e de projetos de pesquisa deverão ser convertidos, no que couber para as regras da NBR 6022 da ABNT. Adicionalmente, devem ser observadas as normas e orientações indicadas a seguir. Condições para Submissão Como parte do processo de submissão, os autores são obrigados a verificar a conformidade da submissão em relação a todos os itens listados a seguir. As submissões que não estiverem de acordo com as normas serão devolvidas aos autores. 1. Entrega do material 1.1 Os artigos não deverão ultrapassar 30 páginas com o título em português e inglês, resumo e abstract e até cinco palavras-chave, em português e outro idioma aceito pela revista. O resumo e o seu correspondente em outro idioma deverá ser estruturado de acordo com a NBR 6028 da ABNT em um único parágrafo com, no máximo, 250 palavras. 1.2 Deverão constar no final do artigo os dados referentes ao autor, tais como: titulação efetiva (mestrando ou doutorando não serão considerados por não serem títulos), sua atividade atual, instituição a que esteja vinculado, endereço comercial e residencial, telefones e correio eletrônico. Na editoração eletrônica existe um campo específico para estas informações que devem ser claras e precisas para todos os autores. 1.3 No caso de artigo escrito por mais de um autor a RISE considerará, para fins administrativos, automaticamente como responsável pelo artigo o primeiro autor. 1.4 Os trabalhos devem ser enviados para [email protected], em formato “.rtf”, “.doc” ou .”docx 1.5 A RISE não aceita artigos enviados em cópia física. 2. Apresentação Gráfica do Texto 2.1 Especificações: 2.1.1 Tamanho do papel: A4 2.1.2 Tamanho das letras: • Do corpo do trabalho 12 • Do título 16 • De subtítulos 14 • 2.1.3 Tipos de letras: Arial 2.1.4 Espaços: • Entrelinhas: 1,5 • Superior: 3,0 cm • Inferior: 2,0 cm • Lateral direita: 3,0 cm • Lateral esquerda: 3,0 cm • 2.2 Formatação 2.2.1 O texto deve ser justificado. 2.2.2 Nunca separar as sílabas para evitar desconfiguração do texto ao ser aberto em outro computador. 4.3 Toda a ilustração deve iniciar após o título a Fonte de informação. Quando de elaboração do autor indicar: Fonte: O autor. 2.2.3 Usar somente a cor padrão do texto (preto). 5. 2.2.4 As páginas devem ser numeradas. 5.1 As tabelas apresentam informações tratadas estatisticamente devem seguir as normas da ABNT (padrão IBGE – 1993) e devem conter título e serem numeradas sequencialmente. Os títulos das tabelas devem estar sempre no cabeçalho destas. 2.2.5 Os gráficos, tabelas e figuras e/ou ilustrações deverão ser fornecidos em monocromia (em preto e branco, com ou sem tons de cinza), apresentados no corpo do texto enviando e, também, em anexo, nos formatos originalmente produzidos. 3. Primeira página do Texto 3.1 Título do artigo: Centralizado na página 3 cm da borda superior. 5.2 Todas as tabelas devem conter em seu rodapé a respectiva fonte, indicada de forma a permitir ao leitor verificar a autenticidade dos dados apresentados. 6. 3.2 Títulos das seções e subseções: devem obedecer ao que dispõe a NBR 6024. Não ultrapassar a seção terciária (1.1.1) 3.3 Parágrafos: Cada parágrafo deve ter um recuo de 0,5 cm na primeira linha e nenhuma linha em branco entre eles, exceto para os subtítulos que deverão ter apenas uma linha em branco depois do parágrafo que o antecede. 4. Ilustração Referência 6.1 Devem seguir os padrões estabelecidos pela NBR 6023 da ABNT. 6.2 A REG adota o sistema alfabético de referências (Autor/Data). As referências deverão vir no final do texto, em ordem alfabética. Não colocar referências no rodapé. 7. 3.4 Notas de rodapé (não utilizar nota explicativa no final do texto). As notas deverão ser numeradas em algarismo arábico, devendo ser únicas e consecutivas para cada artigo (o Word oferece este recurso). Tabelas Responsabilidades 7.1 É responsabilidade do autor a correção ortográfica e sintática, como a revisão de digitação do texto, que será publicado conforme o original recebido pela editoração. 7.2 O conteúdo dos textos assinados é de única e exclusiva responsabilidade dos autores. 4.1 Deve ser encaminhada em arquivos separados. 4.2 Qualquer que seja o seu tipo (desenhos, esquemas, fluxogramas, fotografias, gráficos, mapas, organogramas, plantas quadro, retratos e outros) sua identificação aparece na parte inferior, precedida da palavra figura seguida em numeração em algarismo arábico. Exemplos: Figura 1 – Organograma da empresa X; Figura 1 – Foto da Barragem de Xingó; Figura 1 – Esquema simplificado do Pólo Industrial de SUAPE 8. Procedimentos de Avaliação 8.1 Os trabalhos submetidos passarão preliminarmente pelo exame da Editora Guararapes quanto ao cumprimento integral destas normas e das demais aplicáveis pelos critérios da ABNT. Somente os aprovados serão avaliados no sistema duplo cego por pareceristas, de instituições distintas daquela à qual o(s) autor(es) está(ão) vinculados (s). 8.2 O resultado da avaliação de artigos RISE 2014; 1(1): pag inicio – pag final. recusados será comunicado ao autor. Editorial 9. Estas normas seguem as disposições da ABNT e IBGE (para tabulação) em vigor no mês de maio de 2010. É com muito orgulho que iniciamos as atividades da Revista Interdisciplinar em Saúde e Educação, de iniciativa da Escola de Saúde e Educação da Faculdade dos Guararapes / Laureaute International Universities. Neste número de estreia, trazemos revisões e artigos originais produzidos pelos pesquisadores da própria faculdade, como forma de valorização do fruto do trabalho acadêmico produzido em nossa região. Trata-se da primeira revista de cunho científico na área da saúde e educação produzida na cidade do Jaboatão dos Guararapes, localizada na Região Metropolitana do Recife, a qual apresenta grandes problemas socioeconômicos relevantes, assim como outras cidades do Nordeste brasileiro. Do ponto de vista pragmático, entendemos que a revista pode ser uma ferramenta importante na identificação e exploração de tais necessidades da região, para a contribuição na formação de uma massa crítica local e que dê base para iniciativas para a transformação social. O filósofo chinês Confúcio afirma que “a essência do conhecimento consiste em aplicá-lo, uma vez adquirido”. Esta afirmação é inspiradora e nos mostra a relevância da realização da disseminação do conhecimento resultante de pesquisas que sejam instrumentos, diretos e indiretos, para a construção de saberes que levem ao atendimento das necessidades sociais mais importantes, as quais dão condição para seu crescimento e desenvolvimento: a saúde e a educação. Isto nos inspirou, portanto, e que contribuiu na caracterização do escopo desta revista. Assim, convido-os a uma leitura periódica e a celebrar o surgimento deste novo objeto de comunicação científica com a comunidade. Um feliz 2014 a todos. Leandro de Albuquerque Medeiros Editor-chefe revisão BETACaroteno e astaxantina características e importância: Uma revisão Aline Alves Barbosa da Silveira2,1; Kaoru Okada2; Galba Maria de Campos-Takaki2 Resumo Várias pesquisas vêm sendo desenvolvidas com β-caroteno e astaxantina utilizando fontes alternativas de produção. A astaxantina é um carotenóide oxigenado, responsável pela coloração de peixes, como o salmão, enquanto o β-caroteno está presente em vegetais, sendo também produzido por microrganismos. Tanto o β-caroteno como a astaxantina são precursores de vitamina A, demonstrando um alto poder antioxidante. Podem ser obtidos de fontes naturais e/ou sintetizados quimicamente. Este presente artigo representa uma revisão bibliográfica sobre as características dos carotenoides, principalmente o b-caroteno e a astaxantina. Palavras-chave: Carotenóides; astaxantina; antioxidantes; β-caroteno; astaxantina Abstract Several researches have been developed with β-carotene and astaxanthin production using alternative sources. Astaxanthin is a carotenoid oxygenated responsible for the coloration of fish, such as salmon, while β-carotene is present in vegetables and is also produced by microorganisms. Both β-carotene and astaxanthin are precursors of vitamin A, demonstrating a high antioxidant power. Can be obtained from natural sources and / or synthesized chemically. This present article is a review on the characteristics of carotenoids, mainly β-carotene and astaxanthin. Key-words: Carotenoids, astaxanthin, antioxidants, β-carotene, astaxanthin Introdução A astaxantina é um carotenoide oxigenado, pertencente ao grupo das xantofilas, enquanto o β-caroteno ao grupo dos carotenos. Suas fontes naturais principais são as microalgas e os fungos. Os animais são inábeis em produzir estes carotenóides e sua obtenção se dá a partir da dieta. A astaxantina e o β-caroteno, como cerca de 10 % dos carotenoides, são precursores da vitamina A e por isso, possuem atividade antioxidante, capazes de diminuir os radicais livres, formados pelo estresse, má alimentação, doenças e responsáveis pelo envelhecimento e morte celular. (NI et al., 2007; LEE e LEE, 2010; PARK et al., 2010; FRASSET; COOMBES, 2011; FREY;VOGEL, 2011;VÍLCHEZ, et al., 2011; SAOUDI e FEI,2012) Existem diversas fontes de astaxantina: a sintética, derivada de carapaças de crustáceos e a obtida por processos biotecnológicos, como por exemplo, através dos microrganismos. Já para o β-caroteno, as principais fontes são alguns vegetais, microalgas e fungos filamentosos. Diante da crescente busca por uma vida mais saudável, o interesse por compostos naturais vem aumentando, e com isso, a astaxantina e o β-caroteno extraídos de microrganismos têm sido bastante pesquisados. (CHOUBERT et al., 2005; KAEWPINTONG, et al., 2006; KIM et al., 2006; KHANAFARI, et al., 2008; MALDONADE et al., (2008); URIBE et al ., 2009; MAOKA, 2011). O entrave na produção microbiana de carotenóides, como em qualquer bioproduto, são os altos custos dos meios de cultura, por isso, 1. Curso de Ciências Biológicas, Faculdade dos Guararapes; 2. Núcleo de Pesquisa em Ciências Biológicas, Universidade Católica de Pernambuco. email para correspondência: [email protected] várias pesquisas vem sendo realizadas buscando fontes alternativas de produção. Dentre essas fontes alternativas, destacam-se os insumos agroindustriais, tais como milhocina, melaço, caldo de cana de açúcar, quirera e manipueira. (HERNÁNDEZ et al., 2002; CHOCIAI et al., 2002; NITSCHKE & PASTORE, 2004; BRANDÃO et al., 2008; FONTANA et al., 2008; LIU; WU , 2008; NOGUEIRA et al., 2009 ; CROP PRODUCTION, 2010; NING et al., 2012). A produção microbiana de carotenóides, como o β-caroteno e a astaxantina pode ser influenciada por fatores extremos impostos aos microrganismos durante o seu cultivo, para a proteção de suas células. Dentre esses fatores, destacam-se a deficiência de nutrientes, luz (tipo, cor e tempo de exposição), faixas extremas de pH, entre outros fatores. (LABABPOUR et al., 2004; MARTINEZ-MOYA, et al., 2011) Carotenóides Tabela 1. Nomenclatura comercial e semi-sistemática de carotenóides comuns. Nome trivial Aleuraxantina 1´, 16´-Didesidro-1´, 2´-dihidro-β, ϕ - caroten- 21- ol Astaxantina 3,3´- dihidroxi – 4,4´- diceto - β-caroteno Cantaxantina 4,4´- Diceto - β-caroteno α−Caroteno β, ε−Caroteno β−Caroteno β, β−Caroteno γ-Caroteno β, ϕ −Caroteno ε -Caroteno ε , ϕ −Caroteno δ -Caroteno 7,8,7´, 8´− Tetrahidro- β, β -caroteno β−Criptoxantina 3,4-Didesidrolicopeno Equinenona Licopeno Licoperseno 3 −Hidroxi, β, β -caroteno 3,4-Didesidro-ϕ, ϕ -caroteno β, β−Caroten-4-ona ϕ , ϕ −Caroteno 7,8,11,12,15,7´, 8´, 11´, 12´, 15´- Decahidro- ϕ, ϕ -caroteno Neurosporaxantina Ácido 4´- Apo-β - caroten- 4´- óico Neurosporeno Filipsiaxantina 7,8-Dihidro- ϕ , ϕ -caroteno Fenicoxantina 3-hidroxi- β, β−Caroten-4,4´- diona Fitoeno 7,8,11,12,15,7´,8´,11´,12´- Octahidro - ϕ , ϕ −Caroteno Fitoflueno 7,8,11,12,7´,8´- hexahidro - ϕ , ϕ −Caroteno Plectianaxantina 3´,4´- Didesidro-1´,2´-dihidro - β, ϕ −Caroteno-1´,2´-diol Rodoxantina 4´, 5´- Didesidro – 4,5´- retro- β, β−Caroteno-3,3´-diona Rubixantina β, ϕ −Caroten-3-ol 7,8,11,12-Tetrahidrolicopeno 7,8,11,12-Tetrahidro- ϕ , ϕ −Caroteno Torularodina Ácido 3´,4´-Didesidro- β, ϕ -caroten-16´-óico Toruleno α-Zeacaroteno β-Zeacaroteno Zeaxantina Fonte: Rodriguez-Amaya (2001). Nome sistemático 1,1´-Dihidroxi-3,4,3´,4´-tetradesidro-1,2,1´,2´-tetrahidro- ϕ, ϕ -caroteno-2,2´-diona 3´, 4´-Didesidro- β, ϕ -caroteno 7´, 8´-Dihidro- ε , ϕ −Caroteno 7´, 8´-Dihidro- β , ϕ −Caroteno β,β −Caroteno-3,3´-diol Os carotenóides são pigmentos presentes em organismos vivos com cerca de 600 tipos descritos, apresentando muitas variedades, de acordo com suas estruturas e funções. Possuem esta denominação por representarem a maior parte dos pigmentos em cenouras (Daucus carota) (PFANDER, 1992; ZEB; MEHMOOD, 2004; ZEB; MEHMOOD, 2004; FUENTE et al., 2006; SILVA FILHO, 2010; FARIA, et al., 2011; PEREIRA, 2011). As estruturas dos carotenóides são constituídas por cadeias de polienos isoprenóides (C40H56), com oito unidades de cinco isoprenos unidos em um esqueleto central de 22 átomos de carbono e 2 caudas com 9 carbonos, resultando em uma molécula simétrica (RODRIGUEZ-AMAYA; KIMURA, 2004; FUENTE et al., 2006) Quanto à composição, os carotenóides são divididos em carotenos e xantofilas. Os carotenos são compostos somente de carbono e hidrogênio (ex: β-caroteno e licopeno). As xantofilas são carotenóides oxidados que possuem hidroxilas (ex. β- criptoxantina); grupos ceto (astaxantina, cantaxantina); epóxi (violaxantina) e aldeído (β-citraurina). Na figura 1 são encontrados as estruturas dos carotenos e das xantofilas. (RODRIGUESAMAYA, 2001; UENOJO; MARÓSTICA JUNIOR; PASTORE, 2007; CERQUEIRA, et al., 2007; FRASSET; COOMBES, 2011). A tabela 1 demonstra a nomenclatura semi-sistemática e os nomes triviais dos carotenóides comuns, entre eles, a astaxantina. Astaxantina e β-caroteno Fontes e biossíntese A astaxantina (3,3´- dihidroxi -4,4´-dicetoβ− caroteno) é uma xantofila sendo o carotenóide de maior valor econômico (U$$ 2500/Kg), responsável por 28% das vendas de carotenóides. O interesse pela astaxantina vem aumentando nos últimos anos devido a sua utilização em indústrias de cosméticos e de alimentos (como colorante para a criação de peixes e aves domésticas) e também devido a sua propriedade antioxidante (BCC RESEARCH, 2008; PARK et al., 2010; SCHMIDT et al., 2011;). A astaxantina pode ser extraída de fontes naturais ou sintetizada quimicamente. Dentre as fontes naturais destacam-se os peixes (salmonídeos); os crustáceos (camarão e lagosta); as flores da planta Adonis aestivalis e os fungos X. dendrorhous; Saccharomyces cerevisae, M. circinelloides e M. hiemalis (RODRIGUEZ-AMAYA, 2001; ANDRADE, 2002; CHOUBERT, et al., 2005; KIM et al., 2006; KHANAFARI, et al., 2008; URIBE et al ., 2009; MAOKA, 2011). A astaxantina sintética é denominada de Astaxantina disuccinato dissódio (DDA) formando todos os três isômeros de astaxantina: (3-R,3′-R), (3-R,3′-S) e (3-S,3′- S), nas proporções 1:2;1, respectivamente (FASSETT e COOMBES, 2011). A síntese química é conhecida por conter carotenóides não tão eficientes como os naturais, consequentemente, a produção microbiana tem sido bastante investigada (CHOUBERT et al., 2005; KIM et al., 2006; KAEWPINTONG, et al., 2006). O β- caroteno (β, β−Caroteno) é o carotenóide mais abundante na dieta humana e um dos carotenóides precursores de vitamina A (RODRIGUEZ-AMAYA et al., 2008). Está presente em inúmeros vegetais e em microrganismos, tais como os fungos Phycomyces blakesleeanus, Blakeslea trispora, Mucor circinelloides (RODRIGUEZ-AMAYA, 1999; DUFOSSÉ, 2006, ÁLVAREZ, 2006). O β-caroteno é muito utilizado em indústrias de alimentos e farmacêutica para conferir cor alaranjada aos produtos, substituindo os corantes sintéticos (GALLEGO, 2007) Quanto à biodisponibilidade do β-caroteno é um dos carotenóides que mais possuem a capacidade de conversão em vitamina A e 1 mg de β-caroteno equivale a 0,167 mg de vitamina A (BRASIL, 2005). A Via biossintética da produção de astaxantina e β-caroteno para a levedura Saccharomyces cerevisae é descrito na figura 2 e se assemelha a biossíntese de outros fungos (URIBE et al ., 2009). Propriedade antioxidante Uma propriedade bastante pesquisada dos carotenóides é a de precursora da vitamina A (retinol). Esta vitamina combate os radicais livres, através de sua ação antioxidante. Os animais não a produzem, havendo a necessidade de obtêla a partir de alimentos derivados de animais ou que contenham carotenóides (cerca de 10% dos carotenóides possuem esta propriedade). (LEE e LEE, 2010; PARK et al., 2010 FREY;VOGEL, 2011). Devido a esta propriedade, os carotenóides apresentam muitos benefícios à saúde humana, na ação preventiva para problemas de saúde; atuando na indústria de alimentos e farmacêutica como conservante, colorante, antioxidante, aditivo e fonte de vitamina. (LORENZ & CYSEWSKI, 2000; KIM, et al., 2006; PARK et al., 2010; ROMERO et al., 2010; FASSETT e COOMBES, 2011; MUELLER; BOEHM, 2011; ZHONG et al., 2011, VÍLCHEZ, et al., 2011). Segundo Romero et al., (2010) a eficiência de um antioxidante é determinada principalmente por: 1. A sua reatividade frente ao oxigênio livre; 2. A quantidade de moléculas de oxigênio livre que o antioxidante pode remover; 3. Sua capacidade de atingir células lipídicas; 4. A capacidade de gerar, após a reação com oxigênio livre, produtos com baixa reatividade para lipídios. A capacidade antioxidante da astaxantina é determinada pela sua estrutura química, pois em termos de disposição espacial em membranas, a astaxantina se distribui de uma forma quase perpendicular em relação à superfície da membrana (Figura 3), com as duas extremidades em contato com a água. (FUJI HEALTH SCIENCES, 2012). A administração de astaxantina pode preservar a membrana celular, exercendo uma proteção contra o estresse oxidativo e inflamação e proporcionar uma proteção cardíaca e neurológica (LEE; LEE; KNOW, 2010; FRASSET; COOMBES, 2011). Em uma pesquisa com indivíduos acima de 60 anos, foi administrado 1 ovo por dia durante 5 semanas. Os resultados demonstraram que tal consumo aumenta significativamente as concentrações séricas de luteína e zeaxantina sem elevar os lipídios séricos e as concentrações de colesterol. Este perfil demonstra que a luteína e zeaxantina presentes no ovo são antioxidantes que contribuem na redução do colesterol oxidado. (GOODROW et al., 2006). Fontes alternativas de produção Os custos dos meios de cultura encarecem a produção de carotenóides por microrganismos, portanto, há a necessidade de se buscar fontes alternativas de produção, buscando diminuir os custos de produção deste bioproduto, como citado por Yimyoo et al., (2011). Destarte, muitas pesquisas são realizadas com diversos insumos e resíduos agroindustriais. Em muitas pesquisas com a levedura X. dendrorhous são relatadas a produção de carotenóides utilizando fontes diversas, tais como derivados de fibras de milho, cascas de abacaxi, resíduos de mandioca e caldo de cana de açúcar. (CHOCIAI et al., 2002; NGHIEM, 2009, YANG et al., 2011a). Dentre os resíduos citados na literatura, encontramos a manipueira, efluente do processamento da mandioca (Manihot esculenta). Muitas toneladas de manipueira são produzidas na Região Nordeste do Brasil e quando o seu descarte é realizado de forma indevida pode levar a eutrofização dos corpos d´água. A manipueira é composta principalmente por amido, proteínas, celulose e outros nutrientes. (CHOCIAI, 2002, NITSCHKE e PASTORE 2004; CHOUBERT et al. 2005; KAEWPINTONG et al. 2006; VASCONCELLOS et al. 2009; CASULLO et al. 2010; YANG et al. 2011b; YIMYOO et al. 2011, SAOUDI e FEI, 2012). Fontana et al., (2008) citam que a manipueira pode ser um importante insumo na produção de astaxantina por fungos. O caldo de cana é uma matéria-prima barata e abundante em nosso país, maior produtor de cana-de-açúcar do mundo, responsável por 25% da produção mundial. Considerando a riqueza nutricional do caldo de cana, composto por sacarose, glicose, frutose, fibra, celulose, minerais (Fe, K, P, Na, Cu, Mg, Zn, Mn, Ca) e demais micronutrientes. Representa uma excelente via alternativa para a produção de carotenóides, em muitos trabalhos são citados a produção de astaxantina utilizando X. dendrhous em meio de cultura contendo caldo de cana. (CHOCIAI et al., 2002; MORIEL, 2004; MORIEL, 2005; FARIA, 2005; BRANDÃO et al., 2008; NOGUEIRA, et al., 2009). O melaço de cana-de-açúcar é utilizado em meios de cultura para a produção de fungos, pois possui uma composição bastante rica, contendo em sua composição 17% de água; 66 % de açúcares, sendo 16% açúcares redutores (glicose e frutose) e 50%, sacarose; 8% de cinzas, 4% de matéria nitrogenada e minerais (Fe, K, P, Na, Cu, Mg, Zn Mn, Ca). (NOGUEIRA, et al., 2009; HAULY; OLIVEIRA; OLIVEIRA, 2003). Na produção de astaxantina com o melaço são citados os microrganismos X. dendrorhous e a alga Chorella zofingensis. (JIRASRIPONGPUN, et al., 2007; LIU, 2012). A batata é cultivada em todo o mundo e sua composição química é influenciada por muitos fatores, tais como a área de produção, cultivar, solo e clima. É composta por proteínas, fibras, carboidrato, minerais (Fe, Zn e Ca), aminoácidos (18,5% de ácido aspártico e 9,30% de ácido glutâmico), vitaminas (retinol, ácido ascórbico, tiamina, riboflavina, niacina, piridoxina, ácido fólico) e alguns micronutrientes. (TAI-HUA, 2009; ABUBAKAR, 2010; ABA, 2012). Meios de cultura contendo batata inglesa ou batata-doce têm sido utilizados no cultivo de diversas espécies de fungos. Para a preparação destes meios a quantidade de batata utilizada é variável e o meio preparado a partir do cozimento do tubérculo, utilizando-se apenas o extrato da batata, completando-se o meio com água destilada (HANADA; GASPAROTTO; PEREIRA, 2002; VISWANATH, 2008). A milhocina é o efluente do processamento do milho, formado a partir da embebição dos grãos em uma solução de dióxido de enxofre. O líquido embebido é então separado dos produtos sólidos formados (germe, farelo, amido, e glúten). A milhocina é composta por proteínas, aminoácidos, hidratos de carbono, ácidos orgânicos (por exemplo, ácido láctico), vitaminas e minerais. Alguns autores citam a milhocina como fonte para a produção de astaxantina por X. dendrorhous (LIU; WU , 2008; CROP PRODUCTION, 2010 ; NING et al., 2012). O mercado de carotenóides Os Estados Unidos e a Europa em conjunto são responsáveis por uma parte importante das vendas no mercado de carotenóides global de carotenóides. As empresas DSM Nutritional Products representa o maior produtor mundial de carotenóides sintéticos, a BASF é o segundo produtor e em conjunto, representam cerca de 55% do mercado mundial de carotenóides. (PRWEB, 2011). Devido a todas as características apresentadas pelos carotenóides, o mercado mundial destes compostos vem aumentando anualmente. Em 2007, foi de 766 milhões de dólares e espera-se que haja um aumento anual de 2,3%, chegando a 919 milhões de dólares em 2015, como demonstrado na Figura 4 e de 1.3 bilhões de dólares em 2017 (BCC RESEARCH, 2008; PRWEB, 2011). Conclusão Os carotenoides são importantes aliados no combate aos radicais livres, produzidos cotidianamente a partir das nossas atividades diárias. O β-caroteno e a astaxantina são um dos carotenoides principais no combate a esses radicais, sendo que a astaxantina possui um potencial superior aos demais carotenóides. A via microbiana de produção dos carotenoides astaxantina e β-caroteno vêm sendo cada vez mais explorada, devido às facilidades deste tipo de cultivo, porém o entrave da produção se dá principalmente pelos custos dos meios de cultura. Por isso, há a necessidade de se buscar fontes alternativas de produção, garantindo assim, uma produção mais eficiente, com menor custo e com menos riscos para o consumidor, por se tratar de uma fonte natural de produção. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABA (Associação Brasileira de batata). Valor nutricional da batata. http://www. abbabatatabrasileira.com.br/alim_valornutricional. htm (acessado em 12/02/2012). ABUBAKAR, H.N. Chemical composition of sweet potato (Ipomea batatas Lam) dishes as consumed in Kwara state, Nigeria. International Food Research Journal. V. 17, p.411-416, 2010. ANDRADE, S. A. Otimização da produção de carotenóides a partir de fungos filamentosos (Mucorales). 2003. 145 f. Tese (Doutorado em Ciências Biológicas) – Centro de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2003. BCC RESEARCH. The global market for carotenoids. Food and Beverage. March, 2008. Disponível em: < http://www.bccresearch.com/ report/carotenoids-market-fod025c.html>. 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Por consequência, são indicadas a utilização de formulações especializadas, de alto custo, como fonte alternativa de proteínas que atendam às necessidades nutricionais e condições clínicas peculiares destes pacientes. Tendo em vista a dificuldade na obtenção da fórmula industrializada, principalmente após alta hospitalar para manutenção adequada do estado nutricional, faz-se necessário, o aprofundamento de estudos e a busca por alternativas alimentares de acordo com nossa realidade sócio-econômica. Palavras chave: reações adversas aos alimentos, alternativas alimentares, custo ABSTRACT The high prevalence in children, adverse reactions to food as food allergies or intolerances, and other gastrointestinal disorders has led to dietary restrictions of infant formula, usually based on cow’s milk and soy. Consequently, are indicated using specialized formulations, high cost, as an alternative source of proteins that meet the nutritional needs and medical conditions peculiar these patients. Given the difficulty in obtaining the formula industrialized, mainly after hospital discharge for proper maintenance of nutritional status, it is necessary, further studies and the search for alternative food according to our socio-economic reality Keywords: adverse reactions to food, food alternatives, cost INTRODUÇÃO Alimentação no 1 ano de vida O aleitamento materno favorece o crescimento e o desenvolvimento da criança, tanto por suas características nutricionais, imunológicas e psicológicas, quanto por possibilitar o crescimento harmonioso da face, promovendo a maturação das funções do sistema estomatognático (FRANÇA, 2008). No entanto, no século XX a prevalência e a duração do aleitamento materno diminuíram difusamente e de forma mais intensa, com o conseqüente aumento, principalmente nos países subdesenvolvidos, dos índices de mortalidade infantil. Alguns fatores contribuíram para o aban1. Curso de nutrição. Faculdade dos Guararapes 2. Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira Email para correspondência: [email protected] dono da amamentação, como a industrialização promovida pelo capitalismo, ocasionando a inserção da mulher no mercado de trabalho. Além disso, a utilização de tecnologias modernas possibilitou a produção e conservação de leites e alimentos infantis industrializados. Esses alimentos foram amplamente divulgados pela indústria como substitutos eficazes do leite materno (Silveira FJF, Lamounier JA, 2006). O leite de vaca é freqüentemente utilizado em substituição ao leite materno; logo, as suas proteínas são os primeiros antígenos alimentares com os quais o lactente tem contato, o que o torna o principal alimento envolvido na gênese da alergia alimentar nesta idade (Cortez A. P. B. et al, 2007). A alimentação artificial tem sido descrita como um dos importantes fatores de risco na incidência, duração e gravidade do processo diarréico. As proteínas do leite de vaca e de soja durante a diarréia aguda possibilitam, além do aumento do risco de evolução para quadro persistente, o desenvolvimento de alergia (Ballester D, et al. 2002). Reações adversas aos leites A prevalência estimada de alergia às proteínas do leite de vaca é de 2 a 3% em crianças menores de três anos, sendo a intolerância à lactose também frequentemente encontrada nesta faixa etária. Os sintomas mais freqüentes da alergia manifestam-se no trato gastrointestinal, trato respiratório e pele. As manifestações clínicas incluem urticária, prurido, vômito, diarréia, náusea, dor abdominal, angioedema, broncoespasmo e constipação intestinal, dentre outras (Cortez A. P. B. et al, 2007). Nas hipersensibilidades não mediadas por IgE e que apresentam manifestações como colites, enterocolites ou esofagites, o risco de alergia simultânea à soja pode chegar a 60%, não sendo, portanto, rotineiramente recomendado o seu emprego (TOPOROVSKI, 2007). Há, na literatura, várias restrições ao uso das fórmulas à base de soja nos casos não IgE mediados, não sendo recomendadas na terapia nutricional de lactentes tanto pela Sociedade Européia de Alergologia Pediátrica e Imunologia Clínica (Espaci) quanto pela Sociedade Européia de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (ESPGHAN). A Academia Americana de Pediatria (AAP) sugere considerar o uso de tal fórmula nas alergias mediadas por IgE, em lactentes acima de seis meses. Doenças diarréicas Nos países em desenvolvimento a doença diarreica continua sendo um importante problema de saúde, principalmente para as crianças com idade inferior a 5 anos. No Brasil, esta mortalidade é de 6,9%, sendo que uma proporção maior entre os óbitos ocorre no Nordeste do país. (Ballester D, et al. 2002) A diarreia persistente, de etiologia prova- velmente infecciosa, tem sido reconhecida por acometer de 3 a 20% de todos os episódios de diarreia aguda em crianças menores de cinco anos tornamse persistentes e que mais de 50% das mortes provocadas por diarreia estejam associadas a episódios persistentes. (MATTOS, A.P et al 2009) Na vigência do processo diarreico, ocorre agressão à mucosa e a bordadura estriada do enterócito, alterando sua morfologia. As lesões do intestino delgado favorecem a passagem de proteínas alimentares, intactas ou parcialmente hidrolisadas através da mucosa, tendo como consequência alergia às proteínas da dieta (leite de vaca, proteína da soja).(Andrade A.B.J et al, 2000) Alternativas alimentares Até o momento os estudos que tem enfatizado o manejo nutricional para Diarreia Persistente tem usado uma variedade de dietas, que são baseadas em dietas tradicionais tal como o leite (com ou sem lactose), proteína de soja, proteína de frango, hidrolisado proteico e aminoácidos livres. No entanto, apesar de aceitar-se que o manejo nutricional, é, de longe, o componente mais importante no tratamento da diarreia persistente, nenhuma abordagem sistemática ou padronizada para a terapia nutricional tem sido estabelecida até agora. (MATTOS, A.P et al 2009) Já os princípios para a terapêutica da alergia à proteína do leite de vaca fundamentam-se na: 1) exclusão das proteínas do leite de vaca da dieta, ou seja, não oferecer leite de vaca e seus derivados; 2) prescrição de uma nova dieta substitutiva nutricionalmente adequada. Lactentes menores de 6 meses, em geral, recebem fórmula especial como única fonte alimentar, por sua vez, a partir dos 6 meses de vida, o paciente com alergia ao leite de vaca devem receber alimentos complementares (WEBER, T.K. et al, 2007). No entanto, além das proteínas do leite de vaca, algumas crianças podem desenvolver alergia às proteínas da soja, que, neste caso, devem também ser retiradas da dieta (Cortez A. P. B. et al, 2007). Nestes casos a conduta nutricional baseiase na utilização de produtos industrializados com fórmulas quimicamente definidas ou por formulações artesanais compostas por alimento in natura e/ou processados. As dietas preparadas artesa- nalmente podem possuir custo consideravelmente menor do que as industrializadas (FERREIRA, R.S. 2009). Um grande número de formulações comerciais com diversas aplicações está disponível no mercado , entretanto, são de alto custo e, quando administradas por longo período, leva os pacientes a utilizar fórmulas caseiras, no entanto, há escassez de dados nacionais referentes à análise da composição centesimal de dietas enterais artesanais e tais informações são importantes principalmente para o estabelecimento de parâmetros de avaliação da qualidade nutricional de dietas (Atzingen, M. C. V et al, 2007). Hidrolisados protéicos Fórmulas sintéticas com hidrolisados protéicos e aminoácidos livres têm sido usadas no tratamento nutricional de indivíduos com limitações para digerir proteínas intactas, em casos de hidrólise luminal prejudicada, falência gástrica ou hepática, má nutrição associada ao câncer, queimaduras e traumas, má absorção, disfunções metabólicas e alergias alimentares (Atzingen, M. C. V et al, 2007). A aplicação mais comum de proteína hidrolisada foi em formulações para crianças com hipersensibilidade alimentar, a fim de melhorar as propriedades nutricionais e funcionais. Outras possíveis aplicações dos hidrolisados foram sugeridas e incluem a elaboração produtos para geriatria, suplementos alimentares e dietas enterais. (ROSSI, D. M, 2009) Modificações químicas e enzimáticas têm sido usadas para melhorar as propriedades funcionais das proteínas, no entanto, a hidrólise enzimática apresenta maiores benefícios e vantagens sobre a modificação química porque inclui a especificidade da enzima em relação ao substrato, havendo pouca probabilidade de ocorrer reações indesejáveis, que resultem na formação de produtos tóxicos, além de se processar sob condições mais brandas. A hidrólise enzimática da proteína resulta em: a) diminuição do peso molecular, b) aumento do número de grupos ionizáveis, c) exposição de grupos hidrofóbicos que estavam protegidos na estrutura original da proteína (ROMAN & SGARBIERI, 2005). O peso molecular do hidrolisado de frango preparado através de reação enzimática com a bromelina é em média de 3,5 KDa, ou seja, dentro do recomendado para ser considerado uma fonte protéica de baixa alergenicidade (ATZGEN, 2005). Além disso a carne de frango é considerada de baixa alergenicidade, não sendo citada entre os alimentos que mais causam reações adversas (PENTERICH, 2006). Em estudo experimental, o hidrolisado protéico, na forma de ração, apresentou boa qualidade nutricional quando comparada com caseína, em ratos. Os parâmetros biológicos indicaram que a proteína hidrolisada, além de ser de baixo custo, apresentou boas propriedades nutricionais de digestibilidade, eficiência alimentar e utilização de proteína, sugerindo que os aminoácidos foram prontamente disponível para a digestão, tornando esta como fonte adequada (ROSSI, D. M, 2009). Aspectos microbiológicos A atividade de água (Aw) determina a concentração de solutos de um alimento. A capacidade de desenvolvimento de microorganismos é reduzida numa Aw mais baixa. (JAY, 2000) As taxas de crescimento e produção tanto das bactérias quanto das toxinas por elas produzidas, tais como Salmonella spp e Stafilococcus aureu, são menores em condições anaeróbias. (CLIVER e RIEMAN, 2002) As bactérias mais comumentes encontradas nas carnes de aves cruas são: coliformes totais e fecais, Escherichia coli, Salmonella spp., Clostridium perfrigens, Yersinia enterocilitica, Listeria monocitogenes, Campylobacter spp., e Stafilococcus aureus (SILVA JR, 2002) O processo de desidratação tem sido amplamente utilizado como uma das formas mais eficientes de conservação de alimentos e minimização de crescimento microbiológico pela redução da atividade de água do alimento (FRANCO; LANDGRAF, 2005). Já os bolores e leveduras são aeróbios, capazes de se desenvolver em Aw mais baixa e podem produzir metabólicos tóxicos quando se multiplicam. Por isso, a contagem de bolores e leveduras é usada como parte do critério microbiológico em todo o mundo. (NOVAK, et al 2002) O valor de umidade de farinhas à base de proteína animal obtido pelo controle de secagem durante o processamento influencia na estabilidade do produto (vida de prateleira) e conseqüentemente na sua aceitação para comercialização, com umidade equivalente ao da farinha de frango, uma farinha bem aceita. (COSTA, 2008) Os hidrolisados proteicos são recursos dietéticos de grande utilidade na prática clínica, no entanto, em termos de terapia no mundo em desenvolvimento, as maiores limitações de dietas elementares, entre outras fórmulas classificadas como hipoalergênicas, são custo proibitivo das fórmulas industrializadas e viabilidade limitada em sua forma artesanal. (FERNANDES, D. F. M.; FAGUNDESNETO, U. F, 2002) Por tanto, se faz necessário a realização de estudos no sentido de aprimorar o conhecimento e promover novas tecnologias que propiciem melhores condições de obtenção, processamento, estabilidade e utilização destas fórmulas, além de garantir a preservação de suas propriedades funcionais. Considerações Finais Estudos sobre o aperfeiçoamento e desenvolvimento de técnicas para obtenção de proteínas de alto valor biológico, advindas de outras fontes alimentares que possam oferecer opções dietéticas viáveis para o tratamento e manutenção do estado nutricional de indivíduos com as mais diversas afecções do trato gastrointestinal, intolerantes e/ou alérgicos, tem sido de extrema importância, visto que o custo proibitivo, imposto pela comercialização de fórmulas especializadas e industrializadas, com frequência, representa a maior limitação para uma adequada terapia nutricional em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ATZINGEN, M. C. V et al. 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Rev. paul. pediatr., São Paulo, v. 25, n. 2, jun. 2007 WEBER TK et al. Desempenho de pais de crianças em dieta de exclusão do leite de vaca na identificação de alimentos industrializados com e sem leite vaca. Jornal de Pediatria - Vol. 83, Nº 5, 2007 ARTIGO ORIGINAL GORDURA DIETÉTICA E LIPÍDIOS SÉRICOS. Alyne Cristine Souza da Silva ¹ Ana Célia Oliveira dos Santos ² Resumo A associação entre gordura dietética e hiperlipidemia é controvertida. Apesar de décadas de pesquisa ainda é discutível se os níveis recomendados para o consumo de gorduras saturadas e colesterol reduzem o risco de doenças cardiovasculares. O objetivo deste trabalho foi definir a associação entre o consumo de gordura e lipídios plasmáticos. Foram selecionados 115 voluntários com idade acima de 21 anos, originados da livre demanda do ambulatório de nutrição do Hospital Universitário Oswaldo Cruz. O consumo alimentar foi avaliado através de questionário para determinar a ingestão diária de energia total e de gordura. Serum lipides determinations were measured using the Hitachi 912, performed according to the manufacturer’s. A análise dos dados foi realizada ao final do período para descrição dos resultados e geração das curvas de freqüência de distribuição. Diante da análise dos dados, não foi encontrado correlação entre o consumo de gordura e os valores de Colesterol Total, C-HDL, C-LDL e Triglicerídeos circulantes, com valores de R de 0.0939, 0.0946, 0.141 e 0.093, respectivamente. Este estudo enfatiza a necessidade de uma reavaliação dos conceitos atuais sobre o consumo de gordura e sua relação com a incidência de doenças cardiovasculares. Palavras-chave: gordura dietética, lipídios séricos Abstract The association among dietary fat and consummate excessive of energy and hiperlipidemia is plenty of controvertida. In spite of decades of research it is still a debatable proposition if the levels recommended for the consumption of saturated fats, potentially it reduces the risk of cardiovascular diseases. This study define the association among the fat consumption in the diet and lipídios plasmáticos This study included 115 volunteers of the free demand of the clinic of nutrition of the University Hospital Oswaldo Cruz were selected. The alimentary consumption was evaluated through questionnaire to determine the daily ingestion of total energy and of fat. The biochemical dosage was obtained using the apparel Hitachi 912 - Bioehringer Mannheim. Data analysis was accomplished at the end of the period for description of the results and generation of the curves of distribution frequency. Before the analysis of the data, we didn’t find correlation among the fat consumption and the values of Total Cholesterol, C-HDL, C-LDL and circulating triglycerides. The values of R (Coefficient of Regression) they were 0.0939, 0.0946, 0.141 and 0.093; respectively. The severe restriction of the fat consumption defended by the current recommendations, they motivate the increase of the carboidratos consumption that can provoke adverse effects. The present study emphasizes the need of a reavaliação of the current concepts about the fat consumption and its relationship with the incidence of cardiovascular diseases. Key words: serum lipids, dietary fat 1. Curso de Nutrição. Faculdade dos Guararapes 2. Instituto de Ciências Biológicas. Universidade de Pernambuco. E-mail para correspondência: [email protected] Introdução A relação entre gordura dietética e doenças cardiovasculares tem sido tópico de diversas pesquisas e considerável debate em boa parte do século XX (Macnamara, Howell. 1997; Macnamara 2000). Diversos estudos têm demonstrado a importância da dieta no controle e prevenção de doenças crônico-degenerativas. Os hábitos alimentares têm sido relacionados com alterações no perfil lipídico, cardiopatias, hipertensão, diabetes, dentre outros (Fornes et al. 2000; Martins et al. 1994; Hooper et al. 2001). Por outro lado, a maior discussão atualmente na nutrição humana é a melhor proporção entre carboidrato e gordura na dieta (Grundy, 1999). Mais de 61 milhões de americanos tiveram no último ano alguma forma de Doença Cardiovascular (hipertensão, infarto, doença cardíaca reumática ou falência cardíaca congênita). Em adultos, a prevalência de Doenças Cardiovasculares é mais alta em negros nãohispânicos (40% para homens e mulheres), seguido por brancos não - hispânicos (30% para homens e 24% para mulheres) e americanos de origem mexicana (29% de homens e 27% de mulheres) (Willet, 1998). No Brasil, é a principal causa de mortalidade, ou seja, cerca de 300.000 brasileiros por ano são vítimas de doenças cardiovasculares. Comparando-se as taxas de mortalidade ajustadas por idade, nas principais metrópoles brasileiras, com as de alguns países, nota-se que na faixa etária de 45-64 anos várias cidades apresentam valores elevados, sobretudo entre as mulheres (Costa et al, 2000). Os programas de educação em alimentação e nutrição incentivam o baixo consumo de gordura sugerindo que o excesso provocaria elevação dos níveis de lipídios circulantes, bem como da reserva do tecido adiposo (Stallones, 1983). Porém, uma restrição severa de gordura pode provocar um comprometimento do crescimento, atraso no desenvolvimento e risco elevado para deficiência de micronutrientes. Além disso, não resulta em redução da ingestão calórica, desde que os carboidratos, principalmente, açúcares simples, tem substituído as calorias provenientes da gordura (Lichtenstein, 1998). A eficácia das modificações dietéticas propostas à população é bastante controvertida. A existência de mecanismos precisos de feedback são responsáveis pelo balanço da entrada do colesterol dietético (exógeno) e síntese de colesterol (endógeno) na maioria dos indivíduos (Howell et al, 1997). Portanto, o retrocontrole da biossíntese hepática do colesterol total independe da fonte, em conseqüência, o colesterol da dieta pode servir também para reduzir sua biossíntese (Schroepfer, 1981). Esta é principal razão porque a redução do colesterol dietético possui um efeito pequeno sobre as concentrações do colesterol plasmático (Parks, 2001). A atual recomendação dietética para reduzir os níveis de lipídios séricos e prevenir a progressão de doenças cardiovasculares submetem aos pacientes uma restrição dietética muito severa, no entanto, a redução dos níveis lipídicos não responde na mesma proporção, a qual fica em torno de 8 a 12%, em se tratando de pacientes com hipercolesterolemia grave, esta redução pode ser considerada insignificante. Tal afirmação não condiz com a teoria de que a gordura dietética aumenta os lipídios plasmáticos (Parks, 2001; Swaddiwudhipong et al.1998; Macnamara 2000). Desde que a hiperlipemia representa um grande interesse para a Saúde Pública, o presente estudo propõe-se fornecer subsídios para estabelecer uma recomendação diária de lipídeos, que favoreça seu controle. Materiais e Métodos Foram selecionados 115 voluntários, com idade acima de 20 anos, originados da livre demanda do ambulatório de Nutrição do Hospital Universitário Oswaldo Cruz que estivessem freqüentando o serviço pela primeira vez. O total da amostra foi obtida através da análise periódica dos dados, até que obtivesse uma significação estatística. O consumo alimentar foi avaliado através de questionário de freqüência alimentar semiquantitativo e registro diário para determinar a ingestão de energia total e de gordura. O questionário foi aplicado em entrevista individual após a consulta do ambulatório de Nutrição. Para cálculo do consumo de energia e macronutrientes foi utilizado o softwere Excel for Windows 98 e tabelas de composição de alimentos. A determinação dos lipidios séricos foi realizada em amostras de sangue venosos coletado em EDTA após 12- 14 h de jejum. Colesterol e triglicerides foram medidos pelo método enzimático (Roche Diagnostica) em um anailsador Hitachi 912 Bioehringer Mannheim Clinical Chemistry Analyzer. O valor de LDL-c foi calculado pela fórmula de Friedewald: LDL-C= CT - (HDL-C+TG/5) (Friedewald; Fredrickson, 1972), que é exata para amostras cujas concentrações de triglicerídeos não ultrapassem 400 mg/dL.Antes do início das dosagens foram avaliados controles de qualidade interno e externo para a verificação quanto ao funcionamento do sistema de análises. A análise dos dados foi realizada ao final do período para descrição dos resultados e geração das curvas de freqüência de distribuição. Foi utilizado o Programa estatístico Statgrafics (Wilkinson, 1990) para avaliar a correlação entre os dados. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos do Hospital Universitário Oswaldo Cruz , da Universidade de Pernambuco, UPE, sob o no 90/05. Resultados e Discussão Tabela 1 - Análise de Regressão do Perfil Lipídico e Gordura Dietética Diante da análise dos resultados podemos observar que o consumo de gordura da população estudada foi de 23,96% ± 6.57, o percentual de gordura animal foi de 15,56% ± 6.53, o de gordura vegetal observado foi de 8,86% ± 4.,43. O percentual de hidrato de carbono foi de 57,69% ± 8.13; As calorias consumidas ficaram em torno de 2579,46 Kcal ± 1178.63 . As calorias provenientes das proteínas foram de 18,18% ± 4.11. Com relação ao perfil lipídico, 37,83% do total de voluntários avaliados apresentaram valores de triglicerídeos (TG) acima de 150mg/dL; 61,2% apresentaram colesterol total (CT) acima de 200 mg/dl; 18,0% apresentaram valores de HDL-C menores que 40 mg/dl e 46,8% valores de LDL-C maior ou igual a 130mg/dl (Tabela 1 and Figure 1). De acordo com o sexo: 63.7%(CT), 13.18%(HDL), 46.15% (LDL) e 37.3%(TG) apresentaram alterações entre o sexo feminino e 50%(CT), 40%(HDL), 50%(LDL) e 40%(TG) para o sexo masculino. O alto consumo de gordura tem sido associado com a incidência de doenças cardiovasculares e aterosclerose. Os programas para prevenção dessas enfermidades incentivam a redução do consumo de gordura na dieta habitual ((Lichtenstein, 1998). Porém, diversos estudos têm demonstrado um avanço das dislipidemias, principalmente entre crianças e jovens (Friedewald; Fredrickson, 1972, Wilkinson, 1990), sendo considerado como um preditor do perfil lipídico na vida adulta (Seki, et al. 2003). Apesar de décadas de pesquisa ainda é uma questão discutível se os níveis recomendados para o consumo de gorduras saturadas e colesterol, potencialmente reduz o risco de doenças cardiovasculares (Moura et al, 2000). Os resultados mostram um consumo de gordura dentro dos níveis recomendados (23,96% ± 6.57), apesar da população estudada não ter recebido nenhum tipo de aconselhamento antes da aplicação do questionário. Foi evidenciado o efeito da atenção nutricional sobre a mudança dos hábitos alimentares de pacientes submetidos a terapia (Brotons et al, 1998). Por outro lado, o consumo médio de carboidratos encontrado foi em torno de 58 a 65% das calorias totais, ou seja, a dieta habitual da população analisada demonstrou um alto consumo de alimentos glicídicos. A clientela que freqüenta ambulatórios de hospitais públicos é em sua maioria, de classe social mais baixa. Num estudo realizado na área metropolitana da região Sudeste do Brasil, sobre os hábitos alimentares da população e classe social, foi encontrado um maior consumo de proteína de origem animal por parte da camada mais favorecida. A participação calórica das gorduras (G%) e proteínas (P%) foi diretamente proporcional ao poder aquisitivo da classe, ao passo que a dos carboidratos (HC%) apresentou relação inversa (Martins et al. 1994). Desta forma, o baixo custo deste nutriente favorece seu amplo consumo por parte das camadas menos favorecidas. Figura 1 – Consumo de gordura total e valores de colesterol sérico Estudos anteriores demonstraram não haver correlação entre a gordura dietética e os valores de lipídios séricos (Taubes, 2001), os dados do presente estudo, em concordância com os anteriores, demonstraram não haver uma relação causa efeito entre essas duas variáveis, ou seja, a correlação entre o consumo de gordura e os lipídios séricos é inexistente à nível intrapopulacional. O que reforça a necessidade de uma reavaliação nos conceitos existentes sobre a contribuição da variável dietética no desenvolvimento desta enfermidade (Batista, 2003). Muitos dos conhecimentos correntes sobre o metabolismo dos lipídeos e aterogênese não podem ser acomodados em estudos epidemiológicos, ainda que estes estudos sejam economicamente possíveis e os procedimentos empregados sejam aceitáveis para a saúde das pessoas. Portanto, a forma como esta hipótese tem sido avaliada epidemiologicamente é muito simplificada em termos bioquímicos, no entanto, tem sido utilizada na formulação de programas dietéticos para prevenção de doenças cardiovasculares (Stallones, 1983). Ravnskov, em sua exaustiva revisão da literatura não encontrou nenhuma associação consistente entre o consumo de gordura total ou ácidos graxos saturados e causas de morte por doenças cardiovasculares, em vários países. Usando dados da FAO (Food and Agriculture Organization) das Nações Unidas e da Organização Mundial de Saúde (OMS). Segundo ele, numa tentativa de reconstruir o diagrama do estudo dos sete países, não foi encontrada a mesma correlação. A razão é que haviam sido excluído dados de 16 países na formulação da hipótese Dieta-Coração (Ku, et al. 1998). A base da hipótese Dieta-Coração (Varela, 1986) é a correlação observada entre o consumo de gordura e a incidência de doenças cardiovasculares, porém esta correlação é significativa apenas à nível interpopulacional e inexistente a nível intrapopulacional (Stallones, 1983). Talvez porque em estudos populacionais as variações intraindividuais não são consideradas ou são mascaradas quando reunidas em grupos ou classes. (Ravnskov, 2002). Além disso, se avaliarmos esta hipótese do ponto vista bioquímico certamente, chegaremos a conclusão que sua base científica é frágil. Pois, em condições normais, existe uma relação inversa entre a ingestão de colesterol na dieta e a biossíntese do colesterol. Esta relação sustenta um suprimento diário relativamente constante de colesterol e isso explica porque a restrição deste na dieta somente garante uma redução de no máximo 15% nas concentrações de colesterol circulante (Mann, 1977). Estudos têm demonstrado que os pacientes com hipercolesterolemia são submetidos a uma restrição dietética muito severa para prevenir a progressão de doenças cardiovasculares, no entanto, a redução dos níveis lipídicos não respondem na mesma proporção, chegando a ser insignificante em se tratando de pacientes com hipercolesterolemia grave (Parks, 2001; Swaddiwudhipong et al.1998; Macnamara 2000 ). Em estudo experimental com ratos, foi demonstrado que uma dieta com 60% de gordura apresentou menor capacidade aterogênica que uma dieta com menor proporção de gordura (25%) da mesma origem, além de não ter afetado os níveis circulantes de colesterol, colesterol em α-lipoproteínas e glicose ((Batista, 2003). Observações prévias sobre o metabolismo dos lipídeos demonstram que os níveis de triglicerídeos circulantes diminuem potencialmente em resposta a uma dieta hiperlipídica e os níveis de colesterol plasmático permanecem inalterados em indivíduos adultos normais e em ratos (Araújo, 1975; Medeiros, 1982). Os resultados sugerem a necessidade de mais estudos a nível experimental para analisar de forma mais precisa a relação da gordura dietética sobre os lipídios séricos e o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Na análise dos dados não foi encontrada correlação entre o consumo de gordura e o perfil lipídico da população estudada. Nos guias anteriores da Sociedade Americana de Câncer e outras organizações, a redução do consumo de gordura total foi enfatizada. No entanto, a hipótese da associação com câncer não tem sido confirmada em estudos recentes e a evidência é conclusiva agora de que a redução no consumo de algumas formas de gordura insaturada poderá aumentar o risco para doenças cardiovasculares. A respeito do consumo excessivo de gordura na dieta contribuir para a obesidade, o super consumo de carboidratos poderá provocar o mesmo efeito. Desta forma, o limite de calorias provenientes de todas as fontes alimentares e o gasto energético através da atividade física, associada ao consumo adequado de fibras, parece ser a recomendação mais apropriada (Keys, 1953). Referências Appel, L.J., Sacks, F.M. et all. Effects of protein, monounsaturated fat, and carbohydrate intake on blood pressure and serum lipids: results of the Omni Heart randomized trial. JAMA. 2005 Nov. 16; 294(19): 2497-8 v Araújo, C.R.C. de. 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O presente estudo teve como objetivo comparar a força muscular produzida pelos músculos eretores da coluna lombar em indivíduos sedentários e indivíduos com dor lombar. Utilizou-se para mensuração da força o aparelho Tesys da marca Globus através de uma célula de carga nele existente, e um eletromiógrafo de superfície utilizando eletrodos de Ag/ AgCl. Os resultados mostraram diferença significativa apenas quando comparadas às forças dos músculos extensores lombares entre os grupos (controle e experimental) e quando comparadas às forças dos hemicorpos também intergrupos. Portanto, estes resultados sugerem que há um déficit de força nos pacientes com lombalgia quando comparados aos indivíduos quem não apresentam dor lombar, porém são necessários mais estudos para que os resultados presentes tenham maior consistência. Palavras chaves: Dor lombar, Força muscular, Eretores da coluna. COMPARATIVE STUDY OF THE STRENGTH OF THE MUSCLES ERECTOR SPINAE MUSCLES OF THE LUMBAR SPINE IN HEALTHY INDIVIDUALS AND PATIENTS WITH LOW BACK PAIN. ABSTRACT The low back pain is one of the more frequent painful complaints in the medical practice . After the occurrence of lumbar pain, the muscles spinal erectors suffer atrophy that exactly persists after the regression of the symptoms. The present study it had a goal to compare the muscular strenght produced by the muscles erectors of the lumbar column in individuals sedentary and individuals with lumbar pain. The Tesys device of the Globus mark was used for to measure of the strenght through a load cell in existing it and a electromyography of surface using electrodes of Ag/AgCl. The when comparative results had only shown to significant difference to the strenght of the muscles lumbar extensors between the groups (control and group of with lumbar pain) and when compared with the forces of the also of the sides of the body intergroups. Therefore, these results suggest that it has a deficit of strenght in the patients with low back pain when compared with the individuals who they do not present lumbar pain, however are necessary more studies so that the results gifts have greater consistency. Keywords: Low back pain, muscle force, erectors spinal. INTRODUÇÃO A lombalgia é uma das queixas dolorosas mais freqüentes na prática médica. Aproximadamente 80% das pessoas experimentam dor na região lombar ao menos em uma ocasião ao longo da vida. As principais causas de dor lombar são as mecânico-posturais ou degenerativas. Como exemplo: discartrose, espondilolistese, prolapso de disco, osteoartrose zigapofisária. Todavia, muitas 1. Curso de Fisioterapia. Faculdade dos Guararapes. E-mail para correspondência: [email protected] dessas anormalidades estruturais podem ser encontradas em indivíduos assintomáticos, ficando difícil fazer a correlação entre o sintoma doloroso e a alteração estrutural (IKEDO & TREVISAN, 1998). Gonçalves & Barbosa (2005) apresentam dados obtidos de uma população de indivíduos jovens e sugerem que a incidência de dor lombar é menor em indivíduos ativos. Em adição, também tem sido relatado que, em uma população de atletas, a incidência de dor lombar é maior em atletas de elite. Em termos biomecânicos, dependendo do tipo de esporte, atletas freqüentemente tendem a absorver carga repetitiva de baixa magnitude ou impactos únicos de alta magnitude com maior freqüência do que indivíduos ativos não atletas. De acordo com Kujala, Salminen e Taimela (1992) tem sido demonstrado que a força e a resistência isométrica de músculos da coluna vertebral de atletas não diferem significantemente na comparação com não atletas. Alterações da coordenação paravertebral e do ritmo lombo-pélvico também têm sido relacionadas à dor lombar crônica e à fadiga precoce dos músculos (COSTA & PALMA, 2002), modificações têm sido atribuídas ao desuso secundário ao quadro álgico, compondo o processo conhecido como “síndrome de descondicionamento”. Gonçalves (1998) descreve o levantamento de carga, através da eletromiografia integrada onde demonstra que na posição inicial do levantamento, estando o indivíduo inclinado para frente para pegar a barra, os músculos multifído, longuíssimo do tórax e iliocostal lombar estão em silêncio. Após elevar a barra até a posição ereta, existe uma ação dos extensores do quadril relatando particularmente a atividade do glúteo máximo, assim como da ação conjunta do grande dorsal e iliocostal lombar para estabilizar a coluna lateralmente, porém suas contribuições para o levantamento são menores que o sistema ligamentar porterior por apresentarem um braço mais curto que os últimos. Os multifído só apresentam atividade após 25 graus de flexão do tronco durante o levantamento. Ao atingir a postura ereta, ocorre o aumento da lordose que diminui a ação dos ligamentos e aumenta a ação dos multifídios. O músculo multífido tem sido destacado como importante estabilizador dinâmico do segmento lombar. A análise através de tomografia computadorizada demonstrou hipotrofia seletiva das fibras, presente em 80% dos pacientes com dor crônica (DANNEELS et al, 2001). Um dos testes de avaliação da fadiga nos músculos da coluna lombar comumente proposto é o teste de Sorensen, que consiste na extensão isométrica da coluna lombar, partindo de uma posição de decúbito ventral com estabilização de joelho e pelve e com as mãos cruzadas sobre o tórax (BIERINGSORENSEN, 2003). Esse teste foi inicialmente proposto apenas para a verificação do tempo de resistência isométrica (TRI) para avaliar as variáveis mecânicas, mas quando a atividade eletromiográfica dos músculos lombares foi relacionada com a EMG (eletroneuromiografia), uma relação curvilínea (CLARK; MANINI; PLOUTZ-SNYDER, 1984) ou linear foi encontrada (MANNION; DOLAN, 1994). Silva & Gonçalves (2003) relatam que a contração isométrica é uma forma estática de exercício que ocorre quando um músculo se contrai sem mudança apreciável no seu comprimento ou sem movimento articular visível. Embora não seja realizado trabalho físico, uma grande quantidade de tensão e rendimento de força é produzida pelo músculo. A partir do exposto a cima este estudo propôs avaliar a força dos músculos eretores da espinha lombar, usando captação do sinal eletromiográfico durante contração isométrica contínua desses músculos, no intuito de melhor compreender o comportamento mecânico e fisiológico desses músculos frente à dor lombar. METODOLOGIA Amostra: Este estudo foi realizado no período de Janeiro a Junho Recife na cidade do Recife, capital do estado de Pernambuco, foi estudo de caráter descritivo transversal que envolveu um total de 20 indivíduos do sexo feminino. Os voluntários foram divididos em dois grupos: Grupo controle que constava de 10 indivíduos sem sintomas de lombalgia, e um grupo experimental com e 10 indivíduos com sintomas de lombalgia. Os participantes do grupo experimental foram escolhidos mediante análise das suas fichas de avaliação fisioterapêuticas presentes nos prontuários da Clínica Escola de Fisioterapia da FIR, e que obedeçam aos critérios de inclusão: o voluntário deveria ter entre 18 a 45 anos e não estar fazendo atividade física, e especificamente para os voluntários do grupo experimental deveriam apresentar dor lombar crônica. Todos os voluntários que aceitaram participar do estudo assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido de acordo com a Resolução 160/96 da Comissão Nacional de Ética em pesquisa, do Ministério da Saúde. E o estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa do Hospital Agamenon Magalhães. Protocolo experimental: A análise do padrão de força máximo foi medido através da contração isométrica voluntária máxima (CIVM), com uso do aparelho Tesys, da marca globus, conectado a um computador. Após a instalação do software, foram observadas as informações referentes ao início do teste e os dados da atividade captados pela célula de carga do equipamento. O movimento realizado para a aquisição da CIVM, foi o de extensão isométrica da coluna vertebral tendo como resistência uma célula de carga fixa tanto a um cinto utilizado pelos voluntários quanto à base da mesa de teste na outra. Com o objetivo de fornecer maior estabilidade aos voluntários, três cintos foram posicionados ao redor das articulações dos quadris, joelhos e tornozelos fixando a pelve e os membros inferiores à mesa de teste. Inicialmente, foi realizado um teste de CIVM e após foram realizadas três repetições com duração de cinco segundos e intervalo de cinco minutos entre cada contração. A CIVM de cada voluntário foi determinada por meio da média dos três valores obtidos. Os dados foram analisados utilizando a estatística descritiva, com resultados apresentados como média ± desvio padrão (MD ± DP) através de gráficos elaborados no Microsoft Office Excel 2003. Para análise comparativa da força muscular foi utilizado o teste t-student para amostras pareadas, através dos softwares SPSS 13.0 para windows. Todos os testes foram aplicados com 95% de confiança. RESULTADOS Tabela 1: Comparação da força dos músculos extensores da coluna lombar entre os hemicorpos direito e esquerdo tanto do grupo controle quanto experimental. Tabela 2: Comparação da força dos músculos extensores da coluna lombar entre o grupo experimental e o controle a força bilateralmente e as forças de cada hemicorpo. Fez parte do nosso trabalho um total de 20 indivíduos com idades entre 18 a 45 anos todos do sexo feminino. Ao serem analisados os dados de força muscular dos eretores da coluna lombar de cada hemicorpo e comparados dentro do grupo de origem, foi verificado que não houve diferença estatística significativa, como observamos na tabela 1. A tabela 2 nos mostra que ao compararmos a força muscular dos eretores da coluna lombar entre o grupo controle e o experimental, obtivemos diferença estatisticamente significativa, o mesmo ocorreu quando a análise se deu entre as forças de cada hemicorpo comparadas intergrupos. DISCUSSÃO No presente estudo, analisando a força muscular dos extensores da coluna, foi possível observar que não existiram diferenças significativas entre a força dos músculos extensores da coluna do hemicorpo direito e esquerdo tanto no grupo controle quanto no grupo experimental (tabela 1). Entretanto, os valores de força do grupo experimental (lombalgia) foram menores e com diferença estatisticamente significativa quando comparado com o grupo controle (tabela 2). Uma boa postura é definida como um equilíbrio de estruturas da coluna vertebral (ósseas e musculares). Entretanto, diante das constantes mudanças diárias da postura humana associada à má postura torna essa uma tarefa difícil, e leva ao aparecimento de desequilíbrios ósseos e musculares. O desequilíbrio muscular pode ser explicado pela diferença entre a força e a flexibilidade entre grupos musculares de uma mesma articulação (KOLLMTIZER et al, 2000 e KLEE et al, 2004). Tal condição só é perceptível ao indivíduo quando estas começam a se manifestar através da deformidade ou dor. (MORAES, 2000). Estudos têm sugerido que a força muscular de músculos da coluna vertebral flexores e extensores desempenham importante papel na manutenção da postura, e que em situações patológicas como a lombalgia, poderiam se encontrar fracos favorecendo ao desequilíbrio muscular e aparecimento da dor lombar. Os estudos de Hides, Richardson e Jull (1997) demonstraram que episódios de dor lombar levam a uma rápida atrofia dos músculos eretores lombares mesmo depois a regressão dos sintomas. Já os estudos de Wadell et al (1992) através do estudo mioelétrico observou que a atividade dos extensores da coluna estavam reduzidas quando comparados com outros músculos do tronco em indivíduos com dor lombar. Os nossos achados corroboram os achados de Suzuki e Endo (1983) que observaram através da analise com dinamômetro isocinético que os músculos do tronco eram mais fracos em indivíduos com lombalgia, e sugeriram que a dor da lombalgia inibiria a atividade muscular, favorecendo assim a redução da força desses músculos. Lee, Ooi e Nakamura (1995) através do estudo isocinético da força dos músculos extensores do tronco sugeriram que estes apresentaram níveis reduzidos de força no grupo de lombalgia e relacionou os resultados a fraqueza muscular generalizada a fatores psicológicos, como o medo da lesão. Já Ikedo e Trevisan (1998) observaram que a musculatura extensora da região lombar porção superior e inferior apresentaram deficiência na força muscular maior no subgrupo com lombalgia do que o subgrupo sem lombalgia. Kuriyama e Ito (2005) em seus estudos com eletromiografia de superfície viu que a atividade dos extensores do tronco se encontrava com atividade reduzida e que os indivíduos realizavam uma proteção do movimento para evitar novamente a lesão. Entretanto, os estudos de Balogun, Oladipo e Olawoye (1991) utilizando análise da força dos músculos extensores do tronco não observaram diferenças significativas entre a força nos grupos controle e com lombalgia. Outros estudos justificam a redução da força dos extensores do tronco a fatores psicológicos como medo de realizar o movimento que promoveu a lesão e com isso o indivíduo com lombalgia restringiria o movimento da coluna e levaria dessa forma a fraqueza muscular dos músculos do tronco em especial dos extensores do tronco mesmo depois da regressão da dor. (SWINKELS-MEEWISSE et al, 2003; GROTE et al, 2004). Através dos resultados deste estudo pode-se sugerir que a força muscular no grupo experimental lombalgia foi menor que o grupo controle, entretanto, esses dados não podem ser conclusivos devidos ao pequeno número da amostra e, algumas variáveis que não puderam ser analisadas nesse trabalho como: variáveis antropométricas (peso; altura) e a relação entre a força muscular entre os flexores e extensores do tronco e sua relação com a lombalgia. Portanto, mais estudos são necessários para que os resultados sugeridos nesse trabalho possam ser mais respaldados e conclusivos a respeito do comportamento da força muscular em indivíduos com lombalgia. CONCLUSÃO Os resultados deste estudo sugerem que há um déficit de força da musculatura paravertebral nos pacientes com lombalgia quando comparados aos indivíduos que não apresentam dor lombar, porém são necessários estudos com maior poder de análise para que possam se aprofundar discussões e debater ideias relacionadas ao comportamento da força muscular em indivíduos com lombalgia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BALOGUN, J.A.; OLADIPO, V.A.; OLAWOYE, A.G. Isometric back strength of low back pain patients and healthy controls. Int J Rehabil Res, 14(4):313-21, 1991. BIERING-SORENSEN, F. A One-Year Prospective Study of Low Back Trouble in a General Population. The Prognostic Value of Low Back History and Physical Measurements. Dan Med Bull, v.31, n.5, p.362-375, 003. CLARK, B. C.; MANINI, T. 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A partir de um Vygotsky que se apresenta diferentemente do que usualmente se costuma aprender com ele, iremos e estabelecer um paralelo entre as propostas deste autor e o trabalho desenvolvido pela psiquiatra brasileira, Nise da Silveira, com suas concepções acerca de tratamentos psicoterapêuticos a pacientes de hospitais psiquiátricos que utilizam a arte como fonte de equilíbrio. A vida e obra do louco/artista Fernando Diniz são utilizadas como exemplos bem-sucedidos desta utilização. Palavras-chave: Psicologia da Arte. Vygotsky. Nise da Silveira Abstract This article aims to pursue some quite unknown ideas from Vygotsky formulated in his book The Psychology of Art, such as: (i) the art as a source of balance between the individual and the environment; (ii) the notion of catharsis; (iii) the art as a social technique of sentiment, “the social in us”. Through a different Vygotsky from what is usually learnt from this author we will establish a parallel between his purposes and the work of the Brazilian psychiatrist, Nise da Silveira, with her concepts about psychotherapeutic treatments to hospitalized patients, which use the art as a source of balance. The life and work of the crazy/ artist, Fernando Diniz, are used as example of a successful use of this treatment. Key-words: Psicologia da Arte. Vygotsky. Nise da Silveira INTRODUÇÃO Lev Semyonovich Vygotsky nasceu em 5 de novembro de 1896 na Rússia numa família judaica de boas condições financeiras e de membros bem instruídos. Durante a infância Vygotsky teve à sua disposição uma biblioteca bastante enriquecida e tutores particulares. Já na juventude, o teórico demonstrou grande curiosidade por poesia, literatura e teatro. Sua formação na universidade foi em Direito, mas durante os anos de estudo sobre a advocacia ele manteve seu gosto pela arte. Supõese que aí reside uma das fortes influências sobre seu posterior interesse pela Psicologia (VAN DER VEER & VALSINER, 1999). Na adolescência, Vygotsky começou a estudar Hamlet de Shakespeare. Em 1915, ele escreveu a primeira versão de uma análise literária desta obra, e um ano depois, a segunda versão desta análise se transformou em sua dissertação de Mestrado, sob o título A Tragédia de Hamlet, Príncipe da Dinamarca, de Shakespeare. Em 1924, Vygotsky voltou a este assunto no livro Psicologia da Arte. E, como Van der Veer e Valsiner (1999) afirmam, o discurso em cada um dos textos é substancialmente diferente. Na análise de 1916 encontra-se um tom mais juvenil e recheado de exclamações. Já em Psicologia da Arte, fica claro o desenvolvimento do pensamento do autor em direção a um nível mais geral, onde Hamlet se torna parte deste quadro mais amplo. Em tempo, é interessante notar que, já na versão de 1916, pode-se verificar que Vygotsky estava imerso num raciocínio dialético, descobrindo 1. Direção da Escola de Saúde e Educação. Faculdade dos Guararapes. 2. Departamento de Psicologia. Universidade Federal de Pernambuco E-mail para correspondência: [email protected] os lados opostos de um mesmo todo, raciocínio que o acompanhou durante a elaboração de sua teoria. De acordo com Bezerra (1999), Psicologia da Arte é um livro polêmico, pois o autor mantém, do início ao fim, uma atitude de estabelecer um debate entre diferentes correntes e autores do campo da psicologia e da estética. Influenciado por um contexto pessoal/social de interesse constante por assuntos relacionados à literatura, teatro, arte, crítica literária (postura interdisciplinar que marca a constituição de sua obra) Vygotsky enfatiza a dimensão afetivo-emocional do funcionamento psicológico de indivíduos e grupos sociais. Foi dessa forma que ocorreu a passagem do autor para o campo da psicologia, onde os problemas relacionados a esta ciência foram emergindo a partir de seu contínuo interesse por questões de arte e literatura. Em seu livro Psicologia da Arte, o autor lança vários questionamentos e ideias a respeito do olhar que a psicologia, enquanto ciência que busca compreender o homem, deve ter a respeito desta produção eminentemente humana chamada arte. Este livro, entretanto não trata diretamente da criação de uma obra de arte. O foco central de sua análise é a estrutura psicológica da mensagem, o reconhecimento da arte como “técnica social do sentimento”, procurando estudar como mensagens artísticas podem ser consideradas influentes na vida do homem enquanto sujeito social, afirmando que a arte é “o social em nós”, sendo fonte de equilíbrio entre o indivíduo e o seu meio social. Alguns dos objetos de estudo do presente artigo são determinadas ideias principais de Vygotsky que nortearam seus questionamentos em Psicologia da Arte, tais como: a arte como fonte de equilíbrio entre o indivíduo e o seu meio social; a arte enquanto técnica social do sentimento e o poder transformador da arte através da catarse. Durante a leitura deste livro nos deparamos com a grande coincidência entre as reflexões de Vygotsky e as propostas daqueles que trabalham com a arte como recurso terapêutico, ou seja, a arte como forma de tratamento de pacientes psicoterápicos, neuróticos ou psicóticos. Trata-se de uma situação onde esta possibilitaria a expressão de conteúdos inconscientes e conseqüentemente a “cura”, onde haveria a transformação de sentimentos contraditórios, angustiantes, em algo útil e produtivo, revelando para o paciente potencialidades até então desconhecidas (efeito criador da arte através da catarse). Vygotsky afirma que o inconsciente influencia nossos atos, manifestando-se no nosso comportamento através da obra de arte (racionalizações; impressão ilusória; relação arte e psicanálise), onde a arte seria um meio direto de atender a desejos não satisfeitos e não realizados, terapia para o artista e para o espectador; meio para afastar o conflito com o inconsciente sem cair na neurose. Será estabelecido, portanto, um diálogo entre as propostas de Vygotsky e as idéias de Nise da Silveira. A proposta do trabalho de Terapia Ocupacional desenvolvido por esta psiquiatra e seus efeitos sobre seus pacientes serão utilizados nesse artigo para ilustrar a aplicação de idéias bastante próximas às de Vygotsky. A seguir explicitaremos algumas idéias principais desenvolvidas no seu livro Psicologia da Arte. NOÇÕES SOBRE A PSICOLOGIA DA ARTE No prefácio do livro Psicologia da Arte, Bezerra (1999) aponta que Vygotsky compreende a arte como fenômeno humano que decorre da relação direta ou mediata do homem com um cosmo físico, social e cultural, expressando as relações de reciprocidade entre homem e mundo e as representações que o homem faz do mundo (pressuposto que vai fundamentar toda sua teoria posteriormente). Daí podemos compreender porque ele considera a arte como um instrumento, um signo, que regula as ações sobre o psiquismo: a arte como fonte de equilíbrio entre indivíduo e meio. 2.1. A arte como fonte de equilíbrio entre indivíduo e meio O estudo psicológico realizado por Vygotsky (1999), nos mostra que a arte desempenha um importante papel: “é a mais importante concentração de todos os processos biológicos e sociais do indivíduo na sociedade, meio de equilibrar o homem com o mundo nos momentos mais críticos e responsáveis da vida” (p.329). Sendo assim, a verdadeira natureza da arte, sempre implica algo que se transforma, que supera o sentimento comum, o medo, a dor, a inquietação, eliminando e transformando esses sentimentos opostos, equilibrando o organismo com o meio, onde o biológico se transforma no social. O sentimento é inicialmente individual e, através da obra, de arte torna-se social ou generaliza-se. É essa possibilidade de superação de sentimentos que não encontram vazão na vida normal, através da catarse na arte, que constitui o fundamento do seu campo biológico: “(...) todo nosso comportamento não passa de um processo de equilíbrio do organismo com o meio. Quanto mais simples e elementares são as nossas relações com o meio, tanto mais elementar é o transcorrer do nosso comportamento. Quanto mais complexa e delicada se torna a relação entre o organismo e o meio, tanto mais ziguezagueantes e confusos se tornam os processos de equilibração. Nunca se pode admitir que essa equilibração se realize até o fim de maneira harmoniosa e plana, sempre haverá oscilações de nossa balança, sempre haverá certa vantagem da parte do meio ou do organismo. Nenhuma máquina, mesmo a mecânica, jamais conseguirá funcionar até o fim usando toda a energia exclusivamente em ações úteis. Sempre existem estímulos de energia que não podem encontrar vazão em trabalho útil. Neste caso surge a necessidade de descarregar de quando em quando a energia não utilizada, dando-lhe vazão livre para equilibrar a nossa balança com o mundo” (p. 311). Ao promover o equilíbrio entre o indivíduo e o meio, ordenando sentimentos e restabelecendo a harmonia psíquica, a arte revela potencialidades desconhecidas, liberando nossa criatividade. Perante essa necessidade de reequilibrio, o indivíduo-artista recorre à transformação da matéria, criando sua obra. A criatividade no artista é feita de associações de imagens (relação entre opostos: fantasia x emoção; sentimento x pensamento; consciente x inconsciente), onde cada imagem está impregnada de uma determinada emoção que será canalizada para a criação de uma outra imagem e assim sucessivamente. Essa associação de imagens repercute, então, numa ação que chamamos de criatividade. Isto é que o autor nomeia efeito catártico da arte. Cabe ressaltar que nesta proposta também temos a arte como reconciliação do interno com o externo. O psiquismo é visto aqui como palco de contradições internas. Na mediação entre os opostos e na conciliação das emoções daí advindas, prevalece o papel da criatividade. A psique do artista não se enquadra num desequilíbrio insano, mas aproveita um desequilíbrio normal para compensá-lo criando, modelando, buscando o equilíbrio perdido, crescendo psicológica (processo de individuação; autonomia) e socialmente (a arte é o “social em nós”). Para uma melhor compreensão das colocações de Vygotsky referentes à psicologia da arte, faz-se necessário explicitar suas idéias sobre a catarse, uma vez que este conceito permeia todo o pensamento do autor. 2.2. O efeito catártico da arte O termo catarse usado por Vygotsky é impreciso, conforme atesta o próprio autor, mas segundo ele, nenhum outro termo dentre os empregados na psicologia até então, traduz com tanta plenitude e clareza o fato central para a reação estética, de que as emoções angustiantes e desagradáveis são submetidas a certa descarga, à sua destruição e transformação em contrários. A base desse processo seria a natureza contraditória implícita à estrutura de toda obra de arte. Assim, segundo o autor: “Ainda sabemos muito pouco de fidedigno sobre o próprio processo da catarse, mas mesmo assim conhecemos o essencial, isto é, sabemos que a descarga de energia nervosa, que constitui a essência de todo sentimento, realiza-se nesse processo em sentido oposto ao habitual, e que a arte assim se transforma em um poderosíssimo meio para atingir as descargas de energia nervosa mais úteis e importantes” (VYGOTSKY, 1999, p.270). Na busca de uma melhor compreensão do que vem a ser catarse, Vygotsky cita vários autores que também utilizaram o termo. Para Aristóteles, esta seria a base da explicação da tragédia, mencionando-a reiteradamente a respeito de outras artes; enquanto para E. Muller, seria a passagem do desprazer para o prazer. Já para Bernays, essa palavra significa cura e purificação no sentido médico, enquanto para Zeller, representa uma tranquilização da emoção. Finalmente, para Lessing, a catarse é a conversão das paixões em inclinações virtuosas, “efeito moral da tragédia”, concepção com a qual Vygotsky concorda (apud VYGOTSKY, 1999). Para desenvolver o raciocínio a respeito da catarse Vygotsky também alude a Freud, e numa série de aspectos ele concorda com o psicanalista. Freud (1950), entretanto, utiliza o termo catexia, para designar o processo pelo qual a energia libidinal disponível na psique é vinculada ou investida na representação mental de uma pessoa, idéia ou coisa. A palavra original alemã significa ocupar e investir; catexia é o processo de investir energia. Uma vez liberada ou redirecionada esta mesma energia está então disponível para satisfazer outras necessidades habituais, temos aí a necessidade de liberar energias presas. Para Freud, não somos basicamente animais racionais, mas somos dirigidos por forças emocionais poderosas, cuja gênese é o inconsciente. As emoções seriam as vias para o alívio da tensão e a apreciação do prazer, concepção esta semelhante à de Vygotsky. Elas também podem servir ao ego ajudando-o a evitar a tomada de consciência de certas lembranças e situações (traumas). Através da observação de respostas emocionais, de suas expressões adequadas ou inadequadas, Freud encontrou as pistas que seriam as chaves para descobrir e compreender as forças motivadoras do inconsciente. Neste sentido, podemos perceber que Vygotsky concorda com uma série de pressupostos colocados pela psicanálise. Entretanto há uma série de outros com os quais ele discorda. É então que ele faz críticas contundentes a esta teoria, por exemplo a respeito da questão colocada pelos psicanalistas de que o fundamento da arte é sempre constituído de atrações e desejos inconscientes recalcados que necessariamente se referem a questões sexuais. A arte sempre se relaciona ao delitoso, ao vergonhoso, ao rejeitável? A psicanálise, na visão de Vygotsky, reduz o papel social da arte a um antídoto que tem a função de salvar o homem dos vícios. O poeta, como ele diz, passaria a ser apenas um histérico que incorpora as vivências de uma infinidade de pessoas estranhas, incapaz de sair de seu círculo estrito criado por sua infantilidade. Ele afirma que, para a psicanálise, é como se o homem fosse escravo de sua tenra infância. Exemplo disto é o efeito que o complexo de Édipo terá sobre o indivíduo, fazendo com que o resto de sua vida não tenha grande valor. Desta forma, os artistas seriam sempre semelhantes uns aos outros, dada a universalidade deste fenômeno e seu efeito padronizador. Parece-nos que, para Vygotsky aceitar a psicanálise como base para análise da psicologia da arte, esta teria de incluir a consciência com papel mais ativo, inserindo outras fases da vida do indivíduo, além da infância, como determinantes em sua formação, além de dar mais destaque ao papel do social e àquilo que é comum a todos os indivíduos sem cair na generalização destes. Assim, a arte estaria, de fato, sendo concebida como técnica social do sentimento. Compreender a arte como catarse, é compreendê-la como o veículo adequado para atingir o equilíbrio do organismo com o meio nos momentos críticos do nosso comportamento. São nesses momentos que nos voltamos para a arte, desvelando-a como ato criador, pois além de equilibrar o indivíduo, a arte amplia suas possibilidades, superando sentimentos angustiantes e contraditórios, elucidando, purificando o psiquismo, revelando e explodindo para a vida potencialidades até então desconhecidas. O ato artístico, criador, não é constituído por meio de operações puramente conscientes. Este caráter de explosão e de descarga não tira da arte o poder de estruturar e ordenar nossos dispêndios psíquicos. Ela é capaz de organizar nosso comportamento visando ao futuro, a arte é vista, então, como fonte de equilíbrio entre o indivíduo e o meio. Ao promover modificações duradouras no nosso organismo e comportamento, a arte pode ser considerada como um meio e recurso da educação, daí o sentido educativo da arte, elucidando seu efeito prático e vital. Vygotsky assevera que a psicologia não poderia explicar o comportamento humano ignorando a reação estética suscitada pela arte. Decorre daí a idéia central da psicologia da arte: a arte como técnica social do sentimento ou “o social em nós”, que carrega seu papel fundamental, o poder transformador. 2.3. A arte como técnica social do sentimento: “o social em nós” Conceber a arte como técnica social do sentimento, significa entendê-la como sendo determinada e condicionada pelo psiquismo do homem social, atividade de fundo social na qual o homem se forma e interage com seus semelhantes e com seu mundo numa relação intercomplementar de troca. A arte é vista aqui como instrumento da sociedade, expressando os aspectos mais íntimos e pessoais do ser humano. Na arte supera-se certo aspecto do nosso psiquismo que não encontra vazão na vida cotidiana. Ela parte de determinados sentimentos vitais, mas realiza certa elaboração desses sentimentos, através da catarse: descarga indispensável de energia nervosa, estímulos de energia que não podem encontrar vazão em trabalho útil (prevalência da contradição emocional; natureza contraditória que subjaz à estrutura de toda obra de arte). Nesse sentido, a arte resolve e elabora aspirações extremamente complexas do organismo, tornando-se um veículo adequado para atingir o equilíbrio com o meio nos pontos críticos do nosso comportamento. Quando a arte realiza a catarse, o seu efeito é social, pois a transformação das emoções fora de nós se realiza por força de um sentimento social que foi objetivado, levado para fora de nós, materializado e fixado nos objetos externos da arte, que se tornaram instrumento da sociedade. O sentimento não se torna social, ao contrário, torna-se pessoal Quando cada um de nós vivencia uma obra de arte, este sentimento se converte em pessoal sem com isso deixar de continuar social (interdependência das dimensões individual e social na arte). A arte recolhe da vida o seu material, mas transforma esse material em algo que não está em suas propriedades. Faz-se necessário o ato criador de superação desse sentimento, para então a arte se realizar. Por si só, nem o mais sincero sentimento é capaz de criar a arte. A arte nunca gera de si mesma uma ação prática, apenas prepara o organismo para tal ação. Daí que ela não pode ser considerada apenas como um “ornamento da vida”, pois ao surgir da realidade e voltar-se para esta mesma, a arte virá a ser definida pelo meio no qual o indivíduo está inserido. A emoção que a obra de arte comunica é incapaz de traduzir-se em ações de modo imediato e direto, o que liga diretamente ao fato de ela ser considerada uma técnica social do sentimento, ou o “social em nós”. Podemos inferir que a arte é uma expressão ou continuidade do biológico que se transforma em social; de signo em atividade do psiquismo, correlacionando intelecto e emoção. Através da catarse, processos a priori inconscientes são transformados em conscientes, já que as causas mais imediatas do efeito artístico estão ocultas no inconsciente, exemplo disto é que nunca conseguiremos dizer com exatidão porque precisamente gostamos dessa ou daquela obra. Como dito anteriormente, o inconsciente influencia nossos atos através da arte. Portanto, toda obra de arte suscita uma série de sentimentos opostos entre si e provoca seu curto-circuito e destruição, através da catarse. Esse seria o verdadeiro efeito da obra de arte. Daí reside uma questão basilar para a psicologia da arte: como devemos considerar o sentimento – apenas como dispêndio de energia psíquica ou lhe cabe o papel economizador e preservador na economia da vida do psiquismo? Vygotsky, assim como Freud (apud VYGOTSKY; 1999), concebe os sentimentos como processos de dispêndio de energia, cuja expressão final se percebe como sensação, onde as emoções e paixões seriam as manifestações mais patentes e elevadas do sentimento. Todas as nossas emoções teriam uma expressão não só no corpo, mas também na psique, ou seja, as emoções precisam de certa expressão por meio de nossa fantasia. Diante disto é que se compreende a relação entre sentimento e fantasia: todas as nossas vivências fantásticas e irreais transcorrem numa base emocional absolutamente real. Assim, sentimento e fantasia não são dois processos separados entre si, mas essencialmente o mesmo processo, onde a fantasia seria a expressão central da reação emocional. Daí a diferença entre sentimento comum e artístico: é o mesmo sentimento, sendo que no artístico existe uma atividade intensificada da fantasia. Por isso, o autor considera que as emoções da arte são emoções inteligentes, ou seja, em vez de se manifestarem “de punhos cerrados e tremendo” (VYGOTSKY, 1999, p. 267), resolvemse principalmente em imagens da fantasia, o que requer uma elevadíssima atividade do psiquismo (a arte é o trabalho do pensamento, seja real ou irreal). Os estudiosos da arte trabalham com sentimentos híbridos, pois toda obra de arte – referindo-se o autor mais especificamente à fábula, novela, tragédia – encerra forçosamente uma contradição emocional, suscita uma série de sentimentos opostos entre si, provocando seu curto-circuito e destruição, através da catarse. Vygotsky chegou ao pressuposto acima citado, ao estudar a tragédia de Hamlet, enfatizando o aspecto pragmático dos textos literários, ou seja, interpretados sob ponto de vista do receptor. A estrutura psicológica da mensagem foi o foco central da análise de Vygotsky em Psicologia da Arte, já que não era possível a análise dos processos subjetivos de codificar e decodificar a mensagem: “(...) o aspecto mais relevante da arte é que ambos os processos de sua criação e de seu uso parecem não compreensíveis, inexplicáveis e escondidos da consciência dos que tem que lidar com eles” (VALSINER & VAN DER VEER, 1999). É com base nisto que os autores acima citados afirmam que a arte esconde a arte. Vale enfatizar que o receptor na análise de Vygotsky às vezes assumia o papel do próprio autor, mas outras vezes era apresentado no sentido de um outro genérico. Isto se refere à idéia contida na expressão “o social em nós”. A forma como cada indivíduo reage à arte é subjetivamente idiossincrática, mas todas as maneiras individuais de reação estética estariam ligadas por alguma estrutura fundamental fornecida pela estrutura psicológica da mensagem. Explicitando melhor essa idéia, podemos afirmar que a experiência de sentimentos contraditórios encontrados na fábula, tragédia, novela, seriam gradualmente gerados pela estrutura psicológica da mensagem, que guiaria as reações estéticas do receptor. Essa contradição afetiva ou “catástrofe da fábula” desenvolve-se num “curto-circuito” de cargas elétricas opostas, onde essa contradição se resolveria numa explosão. Foi dessa forma que Vygotsky (1999) elevou esse desenvolvimento afetivo ao nível da lei geral de reação estética (contradição emocional) culminando no que chamou de catarse. De acordo com os pontos levantados até aqui, podemos perceber que Vygotsky compreende a arte como algo que proporciona transformação. Através dela há a superação do sentimento comum, do medo, da dor, da inquietação. E esta superação elimina, transforma sentimentos e proporciona equilíbrio entre o organismo e o meio. Como dito anteriormente, neste livro o autor não fala diretamente da criação de uma obra de arte (exemplo disto é o fato de ele afirmar que se deve centrar a atenção no espectador), e para fazer suas reflexões ele se concentra basicamente numa forma de arte, a arte literária. Entretanto, o próprio autor destaca que muitas de suas afirmações podem ser levadas para o entendimento de outras expressões artísticas, entre elas as artes plásticas. Podemos utilizar suas reflexões também para o entendimento do veículo que move o artista. Uma vez que Vygotsky propõe que a arte tem o poder de estabelecer o equilíbrio entre o indivíduo e o meio, e que há uma busca de novas modalidades de intervenção social que visam compreender os novos modos de subjetivação individual, as novas expressões que o sofrimento psíquico assume, podemos conceber a arte como um recurso terapêutico. Veículo de expressão social, a arte é também demonstração da subjetividade humana, onde cada símbolo ou reação estética tem um significado particular para cada indivíduo. Este significado só pode ser apreendido a partir da história de cada um, que é absolutamente única e singular. Conceber a arte como o “social em nós” é considerar a interação das dimensões filogenética, ontogenética, sociogenética e microgenética na constituição do indivíduo, onde o passado, o presente e o futuro estão imbricados. Um paciente psiquiátrico, ao produzir arte, tem a possibilidade de exprimir seu inconsciente, retratar, por exemplo, em imagens a experiência caótica que lhe invade a consciência, e assim, num processo catártico, diminuir a carga energética destas emoções, transformar-se e, possivelmente, estabelecer um caminho em direção à cura. A arte concebida como fonte de equilíbrio, através de seu efeito catártico, passa então a se configurar como instrumento terapêutico. A ARTE COMO RECURSO TERAPÊUTICO Para a tarefa de tentar compreender a arte como um recurso terapêutico faz-se necessário buscar exemplos da aplicação deste conceito. Será utilizada neste artigo a proposta do trabalho de Terapia Ocupacional desenvolvido por Nise da Silveira e seus efeitos sobre seus pacientes. Como veremos adiante, estes pacientes, ao produzirem materiais artísticos, elaboram e organizam a desordem de suas psiques. Exemplo disto é a produção de mandalas pelos esquizofrênicos, que, além de se mostrar uma produção comum a vários pacientes, possibilita-lhes organizar a dissociação esquizofrênica. Entretanto, antes de discutirmos os efeitos da arte sobre os pacientes tratados por Nise da Silveira devemos esclarecer as razões pelas quais optamos por utilizar sua obra para ilustrar tais aplicações. Faz-se indispensável também compreender qual a visão desta psiquiatra a respeito da esquizofrenia, doença mental mais comumente tratada por ela através deste recurso. 3.1. Por que Nise da Silveira? A obra de Nise da Silveira é forte e grandiosa. São numerosas as referências a seu nome e parece ser unânime uma admiração por parte daqueles que optam por falar desta psiquiatra. Os feitos de Nise da Silveira são inúmeros e em variadas áreas, como pode-se verificar através de sua biografia encontrada no website do Museu de Imagens do Inconsciente (http://www. museuimagensdoinconsciente.org.br/html/nise. html). Nise da Silveira nasceu em Maceió, no estado de Alagoas, em 1905. Formou-se em Medicina pela Faculdade de Medicina da Bahia em 1926. Em sua trajetória envolveu-se não apenas com o exercício de sua profissão, mas também com movimentos políticos e artísticos. Iniciou, em 1946, a Seção de Terapêutica Ocupacional no Centro Psiquiátrico Nacional, atualmente denominado Instituto Municipal Nise da Silveira. Fundou, em 1952, uma das unidades mais famosas deste instituto, o Museu de Imagens do Inconsciente, com o material produzido nos ateliês de pintura e modelagem da Seção de Terapêutica Ocupacional. Quatro anos mais tarde, com a colaboração de amigos, fundou a Casa das Palmeiras, clínica de reabilitação e reinclusão social para ex-pacientes de instituições psiquiátricas. Entre 1957 e 1958 freqüentou o Instituto C. G. Jung em Zurique. Lá apresentou uma exposição de obras produzidas no Museu de Imagens do Inconsciente, sendo que foi o próprio C. G. Jung quem abriu tal exposição em reconhecimento ao trabalho de Nise da Silveira. O Museu de Imagens do Inconsciente se localiza no bairro de Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro e reúne atualmente cerca de 300 mil obras, entre telas, pinturas, desenhos e esculturas. Este museu também é um centro de estudos e pesquisas, com grandes contribuições, sobre imagens que povoam o inconsciente. A Casa das Palmeiras, que foi reconhecida como utilidade pública pelo governo da Guanabara, trabalha em regime de externato e tem o anseio de estabelecer uma ponte entre o hospital psiquiátrico e a sociedade, além de servir como contraponto às condições adversas a que se submetem os pacientes de hospitais psiquiátricos. Para tal, o trabalho terapêutico nesta instituição prima por utilizar a expressão artística como forma de tratamento; proporcionar um ambiente livre para seus pacientes, onde portas e janelas se encontram abertas; e estabelecer a ordem de uma maneira inovadora, na qual pacientes e funcionários não são diferenciados, por exemplo, pelo uso de crachás ou jalecos (SILVEIRA, 1992). De acordo com Dias (2004), Nise da Silveira é reconhecida como aquela que revolucionou a pesquisa e o tratamento da doença mental no Brasil exatamente por utilizar a arte como recurso terapêutico. A psiquiatra exibiu um pioneirismo ao estabelecer a terapia ocupacional dos pacientes, em especial sua expressão artística, com um papel relevante no seu tratamento. Este pioneirismo se evidencia também na sua capacidade de integrar conceitos da teoria junguiana às atividades artísticas de seus pacientes, e assim outorgar respeito à chamada “arte dos loucos ou alienados”. Vale ressaltar que, além da força dos atos em si, tais feitos podem ser considerados pioneiros também devido à época em que aconteceram. Na década de 40 a psiquiatria brasileira se utilizava basicamente de métodos violentos de tratamento, entre eles a convulsoterapia pelo eletrochoque. Assim sendo, a psicanálise se apresentava como uma segunda opção para estes tratamentos. Além disto, de acordo com a própria Nise da Silveira (1992) e também com Mello (http:// w w w. m u s e u i m a g e n s d o i n c o n s c i e n t e . o r g . b r / expos/arqueologia/arqueologia.html), a terapia ocupacional era um método conhecido, mas de pouco apelo, constituindo uma prática periférica aos métodos mais utilizados. Mello destaca que esta terapêutica rapidamente se evidenciou como um bom procedimento de tratamento, uma vez que as melhoras clínicas se acumulavam. Em tempo, vale observar que as formas de arte que mais se destacaram nesta prática foram a pintura e a modelagem. Esta característica desbravadora de Nise da Silveira se confirma, ainda, no fato de que não havia muito interesse por parte da comunidade científica nas práticas ocupacionais e na arte dos alienados. Entretanto, a psiquiatra buscou e encontrou apoio junto ao meio artístico entre personalidades renomadas como Mário Pedrosa, Almir Mavignier, Graciliano Ramos, Ivan Serpa, Ferreira Gullar, Abraham Palatnik, Carlos Drummond de Andrade e Leon Dégand (DIAS, 2004; FRAYZE-PEREIRA, 2003). É curioso observar este movimento da arte em prol da arte, pois foi o meio artístico que reconheceu a produção dos alienados como expressão artística. Deste modo, podemos dizer que os artistas foram grandes incentivadores desta iniciativa de usar a arte como recurso terapêutico. Dias (2004) afirma que, de um lado o meio artístico, e de outro a ciência, na pessoa de Nise da Silveira, unem-se e encontram formas de mostrar que os indivíduos que compunham as obras do Museu de Imagens do Inconsciente eram duplamente singularizados, sendo ao mesmo tempo artistas e loucos. Este status garantiu a divulgação desta técnica terapêutica como uma prática inovadora. Segundo esta autora, a arte dos alienados começou a ser comparada à produção de artistas modernos, o que lançou o questionamento a respeito da distância entre normais e loucos. Somando-se a isto o fato de que os desenhos dos doentes mentais atestavam que sua capacidade artística sobrevivia à perda da razão e das habilidades sociais, acreditava-se que a distância em questão poderia ser menor do que se julgava. Frayze-Prereira (2003), em seu artigo a respeito da obra de Nise da Silveira, também aponta que o artista carrega um tanto desse marginal, desse louco. Esta discussão a respeito da distância entre loucos e sãos também é tratada por Vygotsky em Psicologia da Arte. O autor afirma que os psicanalistas vêem a arte numa posição intermediária entre o sonho e a neurose1. Teríamos nestes três estados a manifestação do inconsciente, que apesar de se tratarem de manifestações diferentes são de mesma natureza. O artista estaria, portanto, entre o sonhador e o doente mental, sendo que o processo psicológico em cada um deles seria o mesmo, diferindo apenas em grau. MüllerFreienfels, segundo Vygotsky, afirma que, de acordo com a psicanálise, Shakespeare e Dostoiévski não se tornaram criminosos pelo fato aliviarem suas tendências criminosas ao representarem criminosos em seus textos. Vygotsky desenvolve este raciocínio colocando a arte como “alguma coisa como uma terapia para o artista, e para o espectador” (p. 87), sendo que ela representa uma forma de afastar o conflito com o inconsciente sem que o artista caia na neurose (ou na psicose). O trabalho desenvolvido por Nise da Silveira segue claramente esta tônica. Entretanto, seu foco principal foi em pacientes esquizofrênicos. Isto pode ser evidenciado na afirmação de FrayzePereira (2003) de que desde o início, o Museu de Imagens do Inconsciente se constituiu como um núcleo de pesquisa da esquizofrenia. Devemos, então, conhecer como esta psiquiatra compreende tal doença mental. 3.2. A esquizofrenia segundo Nise da Silveira A psiquiatria dominante define que uma das características mais importantes da esquizofrenia é a cisão de diferentes funções psíquicas. Tal definição é aceita por Nise da Silveira que coloca também que a esquizofrenia pode ser definida como o campo do consciente sendo invadido por conteúdos emergentes de camadas profundas da psique. O indivíduo esquizofrênico está, então, envolto por um mundo diferente daquele do cotidiano e tem, portanto, grande dificuldade em exprimir seus pensamentos e emoções através das palavras. Entretanto, existe neste indivíduo uma necessidade imprescindível de se expressar, e o que torna esta expressão possível são as imagens (SILVEIRA, 1992). As imagens retratadas nas produções artísticas destes pacientes, conforme Nise da Silveira define, vêm de estratos muito profundos do inconsciente, que se encontram extremamente distanciados do consciente, e assumem formas arcaicas, estranhas, carregadas de energia. Podemos incluir nesta definição duas idéias encontradas nas afirmações de Vygotsky: tratam-se de imagens carregadas de fantasia; trata-se de um 1 Neste trabalho concordamos com esta noção, porém a ampliamos, substituindo a neurose por todas as doenças mentais,o que inclui, portanto, também a psicose. processo catártico. O autor coloca que fantasia e sentimento são duas faces de um mesmo processo, no qual a fantasia seria a expressão central da reação emocional. É aqui que ele diferencia o sentimento comum do sentimento artístico, sendo que este último é o “local” em que a atividade da fantasia é intensificada. Ele coloca ainda que as emoções da arte se resolvem em imagens da fantasia. Com relação à catarse, já foi apontado acima que apesar da imprecisão deste termo, esta é vista pelo autor como descarga indispensável de energia nervosa, e que carrega a possibilidade de expressar a contradição de sentimentos opostos. Nas imagens produzidas pelos pacientes esquizofrênicos de Engenho de Dentro a cisão da psique citada acima pôde ser visualizada. Encontravam-se desenhos caóticos, representações dissociadas da estrutura do corpo humano, árvores cortadas em pedaços, entre outros exemplos do despedaçamento da personalidade (http://www. museuimagensdoinconsciente.org.br/pdfs/mundo_ imagens.pdf). Porém, Nise da Silveira percebeu que imagens circulares, ou que tendiam ao círculo se impunham nas produções dos pacientes, imagens que pareciam fazer clara alusão às mandalas encontradas em textos sobre religiões orientais. A psiquiatra, então, submeteu algumas das imagens à apreciação de Jung, e obteve dele o retorno de que aqueles desenhos que apresentavam tal regularidade, “rara na produção de esquizofrênicos” (p. 9) denotavam uma forte tendência do inconsciente em buscar uma compensação à dissociação esquizofrênica. Encontra-se aí uma exemplificação da proposta de Vygotsky de que a arte pode servir de fonte de equilíbrio entre o indivíduo e o meio, e, neste caso, de um bem-sucedido recurso terapêutico. Esta busca por uma compensação à dissociação esquizofrênica é, em outras palavras, uma busca pelo equilíbrio mediada pela atividade artística. Podemos afirmar que a esquizofrenia se configura num ataque ao equilíbrio da psique. Tais imagens circulares, segundo Nise da Silveira, exprimem movimentos instintivos de defesa desta psique, tentativas de renovação. Poderíamos, então, supor movimentos em direção à cura? Ou, conforme as idéias de Vygotsky, novas formas de comportamento? Contrariando a grande maioria dos psiquiatras, a autora sustenta que curar a esquizofrenia é possível. Mas para isto certas condições favoráveis devem ser mantidas. Ela chama a atenção, entretanto, para o fato de que, num hospital psiquiátrico, tais condições são quase impossíveis de serem encontradas. A cura, na proposta de Nise da Silveira, fica condicionada à relação interpessoal, e sobre este aspecto a autora afirma que, tanto para o indivíduo esquizofrênico, quanto para aquele, considerado normal, com quem o paciente deve estabelecer uma troca, há uma dificuldade na comunicação. Há um recuo recíproco de um em oposição ao outro. Entretanto, esta cura só será possível se for estabelecida uma ponte entre o esquizofrênico e o outro (seja ele o terapeuta, o cuidador, ou qualquer outro personagem), e cabe a este outro ser paciente, afetuoso, e criar um ambiente livre de qualquer coação. Como veremos a seguir, para a psiquiatra, a volta à realidade será possível apenas se o sujeito esquizofrênico puder estabelecer uma relação de confiança com alguém. Vemos aqui mais uma conformidade entre as colocações acima e as propostas de Vygotsky. Tanto em Psicologia da Arte como no restante de sua obra, sempre fica clara a importância que o autor confere ao social e aos parceiros com os quais os indivíduos se deparam durante suas experiências. O autor propõe a face social da arte (“o social em nós”). Isto significa dizer que a arte é determinada e condicionada pelo psiquismo do homem social, é uma atividade de fundo social na qual o homem se forma e interage com seus semelhantes e com seu mundo numa relação intercomplementar de troca. Ou seja, na visão de Vygotsky, assim como para Nise da Silveira, a presença desse outro social é transformadora e fundamental. Vale destacar que se pode encontrar nestas colocações a respeito do papel do outro uma possível motivação da psiquiatra para estabelecer o trabalho oferecido na Casa das Palmeiras. Convém observar ainda que, conforme Frayze-Pereira (2003) afirma, Nise da Silveira deslocou a problemática da loucura do campo da psicopatologia médica para o campo da cultura. Entretanto é fundamental ressaltar que sua proposta de trabalho não se destina a transformar pacientes psiquiátricos em artistas, mas sim valer-se da capacidade inerente ao ser humano de produzir arte como um instrumento capaz de tirá-lo do ostracismo em que a doença mental o coloca. Fazse necessário, portanto, compreender, a proposta de trabalho de Nise da Silveira. 3.3. A proposta de Nise da Silveira Em princípio, a arte pode ser utilizada como uma opção de tratamento tanto de pacientes psicológicos integrados à sociedade, quanto daqueles considerados mais graves e que em muitas vezes se encontram apartados do convívio social. Contudo, conforme dito acima, o trabalho desenvolvido por Nise da Silveira no Museu de Imagens do Inconsciente se voltou mais a pacientes esquizofrênicos. De fato, segundo a psiquiatra, em todas as atividades da Terapia Ocupacional por ela coordenadas o ponto central foi o afeto. É com base nisto que Nise da Silveira sustenta que a volta à realidade só é possível se o esquizofrênico puder estabelecer uma relação de confiança com alguém (http://www.museuimagensdoinconsciente. org.br/pdfs/mundo_imagens.pdf). Nesta proposta de trabalho de Nise da Silveira, animais também servem de recurso terapêutico. Ela, inclusive, lhes confere o status de co-terapeuta. Cachorros, por exemplo, não provocam frustrações, trazem calor à relação, ofertam amor sem exigir uma reciprocidade. Abelardo e Carlos são dois exemplos de como este afeto catalisado pelos animais pode ser transformador. Ambos eram pacientes que residiam no hospital psiquiátrico em que Nise da Silveira exercia suas funções. Abelardo era temido por sua intensa agressividade, contudo se esmerava em cuidados com cães e gatos abandonados. Carlos falava uma língua própria, cheia de neologismos, os quais tornavam quase impossível a compreensão de suas mensagens. No entanto, quando precisou cuidar de seu cachorro ferido, o afeto agiu sobre seu pensamento e Carlos proferiu palavras concatenadas em frases absolutamente compreensíveis (http:// www.museuimagensdoinconsciente.org.br/pdfs/ mundo_imagens.pdf). Mas, uma vez que o propósito deste trabalho é focar na proposta de que a arte pode servir como recurso de tratamento a pacientes psiquiátricos, centraremos nossa discussão a respeito dos efeitos das atividades artísticas sobre os pacientes de Nise da Silveira. Esta psiquiatra encara a arte no ateliê de um hospital psiquiátrico não como ponto de partida para associações verbais, mas vê a importância da imagem em si mesma. A arte, ou o simbolismo nela embutido, compõe um tipo de linguagem. E cabe ao terapeuta compreender esta linguagem. Não se trata, portanto, de tentar traduzí-la, tampouco de ser ela um meio de fazer com que materiais reprimidos cheguem ao consciente. Ela ainda assevera que a comunicação com esquizofrênicos em casos graves tende a fracassar se pretender iniciar e/ou se pautar pela interação verbal (1992) A função da arte pode ser outra, diz Nise da Silveira. “A pintura pode ser utilizada pelo doente como um verdadeiro instrumento para reorganizar a ordem interna e ao mesmo tempo reconstruir a realidade” (http:// www.museuimagensdoinconsciente.org. br/pdfs/mundo_imagens.pdf, p. 5). A arte serve de instrumento de transformação da realidade interna e externa do paciente, além de servir de meio de acesso ao seu mundo interno (FRAYZE-PEREIRA, 2003). Um indivíduo considerado esquizofrênico está mergulhado na dissociação de sua mente. Diante disto, a possibilidade do paciente retratar em imagens esta experiência caótica pode lhe proporcionar a despotencialização destas vivências e diminuir sua carga energética. Há uma tentativa de reorganizar sua psique dissociada. Podemos concluir que, tanto esta autora, quanto Vygotsky encaram a arte como fonte de equilíbrio entre o indivíduo e o meio. Frayze-Pereira (2003) afirma que a arte produzida pelos pacientes de Nise da Silveira foi denominada por Mário Pedrosa como arte virgem, um tipo de arte que não leva em consideração as convenções acadêmicas. Segundo este autor, esta denominação se baseia nas idéias de Jean Dubuffet sobre art brutt também descritas por Nise da Silveira (1992). Este conceito qualifica artisticamente as produções dos não-profissionais, incluídos aqui os psiquiatrizados. Ambos autores valorizam o caráter transgressivo, e poderíamos dizer libertador, desta forma de arte. Nise da Silveira (apud FRAYZE-PEREIRA, 2003) vê no fato de ser a arte uma produção impessoal a possibilidade de se considerar as criações dos pacientes como obras de arte. Ou seja, estas seriam expressões do inconsciente coletivo. Neste enfoque, o artista é encarado com um instrumento da arte, como homem coletivo que carrega a alma inconsciente e ativa da humanidade. Cabe fazer uma observação aqui para explicar um pouco melhor esta noção de inconsciente coletivo. Em vários pontos de sua obra Jung se refere a este conceito. Para ele, os conteúdos mentais inconscientes podem ser fruto da repressão, como supõe Freud. Estes se referem a assuntos pessoais. Mas o autor amplia esta noção ao colocar que tais conteúdos também podem ser impessoais ou coletivos. Ele diz considerar um erro fatal o fato de se considerar a psique, e explicála meramente sob um ponto de vista pessoal. Tal explicação só serviria às atividades cotidianas do indivíduo (JUNG, 1988). Segundo o autor, “O inconsciente pessoal caracteriza-se pelo fato de que seus conteúdos são formados pessoalmente e são ao mesmo tempo aquisições individuais que variam de pessoa para pessoa, tendo cada qual o seu próprio inconsciente. O inconsciente coletivo, porém apresenta conteúdos que são formados pessoalmente apenas em grau ínfimo e, no essencial, em grau nenhum; não são aquisições individuais, mas são essencialmente os mesmos em toda parte e não variam de pessoa para pessoa. Esse inconsciente é como o ar que é sempre o mesmo em toda parte, que é respirado por todos e a ninguém pertence. Os conteúdos (chamados arquétipos) são condições prévias ou esquemas da constituição psíquica em geral.” (JUNG, 2002, p. 13) Essas formas pré-existentes ou originais, os arquétipos, na visão de Jung, teriam uma relação estreita com os instintos, de modo que aqueles constituiriam imagens inconscientes destes últimos. Em outras palavras, podemos dizer que os instintos se referem ao biológico e os arquétipos ao psicológico. Aqui encontramos uma característica inerente ao inconsciente coletivo, seu caráter hereditário e atemporal. Veríssimo (1997) afirma que os arquétipos se mostram sob o que Jung denominou imagens arquetípicas do inconsciente coletivo. Tais imagens são as vias de acesso que possibilitam a revelação da dimensão suprapessoal do inconsciente. A noção de inconsciente coletivo de Jung não pressupõe de modo algum uma mente grupal. 2 Termo utilizado pelo próprio autor Trata-se, ao contrário, daquilo que constitui um elo entre o indivíduo e as experiências ancestrais. Vygotsky afirma que “se o seu efeito [da arte] se processa em um indivíduo isolado, isto não significa, de maneira nenhuma, que as suas raízes e essência sejam individuais” (p.315). O autor ainda coloca que o social existirá mesmo onde haja apenas um homem e suas emoções pessoais. O sentimento não nasce no indivíduo e contagia aos outros. O que ocorre é uma refundição das emoções de fora deste indivíduo através e por força de um sentimento social. Portanto, assim como Jung, Vygotsky também diferencia o social do coletivo, e apesar de os dois autores utilizarem termos diferentes para suas definições, podemos visualizar que ambos seguiram a mesma linha de raciocínio e fizeram uma distinção entre aquilo que é grupal e aquilo que é comum a todos os indivíduos. Vygotsky vê na arte mais funções do que simplesmente o contágio de algum sentimento. Para ele, a arte opera o “milagre”2 da transformação, o qual ele relaciona ao milagre da transformação da água em vinho. O autor coloca que “a verdadeira natureza da arte sempre implica algo que transforma, que supera o sentimento comum, e aquele mesmo medo, aquela mesma dor, aquela mesma inquietação, quando suscitadas pela arte, implicam o algo a mais acima daquilo que nelas está contido. E este algo supera esses sentimentos, elimina esses sentimentos, transforma a sua água em vinho, e assim se realiza a importante missão da arte.” (p.307) A arte recolhe seu material da vida, mas o que produz é acima desse material, ou seja, a arte se apresenta para a vida como o vinho para a uva. Nise da Silveira se baseia nas concepções de Jung sobre inconsciente coletivo e arquétipos para analisar o material produzido por seus pacientes. Ela admite que as imagens retratadas por seus pacientes surgem do inconsciente coletivo. As imagens arquetípicas não representam algo que existiu num passado distante, mas também algo que existe agora, onde o arquétipo não é um vestígio, mas um sistema ativo que funciona no presente. Tal atividade foi reconhecida pela psiquiatra, pois os conteúdos inconscientes retratados por seus pacientes se mostraram sujeitos a transformações. O inconsciente, portanto, sofre e produz mudanças, influencia e sofre a influência do ego. Tais mudanças podem ser acompanhadas através do relato dos sonhos, mas, uma vez que a comunicação verbal com os esquizofrênicos é comprometida, as imagens retratadas por eles também proporcionam este benefício (SILVEIRA, 1992). É interessante apontar também que outro ponto em comum entre os autores citados se refere às divisões entre diversos grupamentos: loucos versus sãos; arte versus não-arte; primitivos versus modernos, entre outros. Os autores parecem ser unânimes ao apontar que tais linhas são absolutamente tênues. Vygotsky usa estes exatos termos para dizer da diferenciação entre arte e não-arte. Ao falar da relação entre arte e trabalho, Vygotsky, baseando-se nas colocações de Bucher, aponta que inicialmente a música e a poesia tiveram a função de resolver, através da catarse, a tensão do trabalho, o que se refere aos povos primitivos. Mas mesmo quando a arte se separa do trabalho, ou seja, nas sociedades modernas, ela mantém as mesmas funções de sistematizar ou organizar o sentido social e dar vazão a uma tensão angustiante. Desta forma, o papel primeiro da arte é funcionar como o mais forte instrumento na luta pela existência, seja por povos primitivos ou modernos. Frayze-Pereira (2003) e Dias (2004), ao retratarem a obra de Nise da Silveira, afirmam que a arte transcende a distinção entre sanidade e loucura. Frayze-Pereira ainda afirma que a arte transcende a diferença entre primitivos e modernos. 3.4. Um exemplo Um dos pacientes mais famosos de Nise da Silveira é Fernando Diniz. Sua expressão plástica foi acompanhada pela psiquiatra no setor de pesquisa do Museu de Imagens do Inconsciente. Fernando Diniz é reconhecido como grande artista dentro e fora do Brasil, tendo participado de inúmeras exposições (http://www.museuimagensdoinconsciente.org.br/ pdfs/FDiniz0.pdf). Mas mesmo assim, do ponto de vista da psiquiatria tradicional, ele continuava sendo considerado um paciente crônico, “sem nenhuma perspectiva de trazer para a coletividade dons de qualquer espécie” (SILVEIRA & BERNARDI, p.1) A história deste louco / artista é conturbada. Fernando nasceu pobre, mulato e órfão de pai. Ele sempre sonhou em estudar Engenharia, e chegou 3 Antes de ser acolhido no Centro Psiquiátrico de Engenho de Dentro a ser o primeiro de sua classe, mas o sonho do terceiro grau nunca se concretizou. Sua infância foi atormentada pelas condições sociais opressoras em que viveu. Mesmo antes de a psicose se apresentar à sua psique, sua auto-imagem já havia sido lesada. Alguns métodos de tratamento a que foi submetido antes de ingressar no Centro Psiquiátrico de Engenho de Dentro somaramse a tais opressões. Um exemplo disto é o fato de que, após ter principiado seu tratamento na referida instituição com Nise da Silveira, onde já havia iniciado seu trabalho com a atividade plástica no Museu de Imagens do Inconsciente, num determinado dia ele foi abruptamente transferido para uma outra instituição. A motivação para tal transferência, segundo Nise da Silveira, foi uma prática comum para que se melhore as estatísticas dos hospitais psiquiátricos brasileiros: altas mal discriminadas, ou transferências para hospitais de pacientes crônicos (SILVEIRA & BERNARDI). Mas durante o tempo em que esteve fora, Fernando recebeu o afeto de seus amigos do Museu. Estes lhe visitavam com freqüência. E dois anos após sua saída ele pôde voltar ao Centro Psiquiátrico, aonde foi recebido festivamente, além de demonstrar grande alegria por estar de volta. Apesar de se encontrar num estado grave de saúde física, após uma curta fase de pinturas caóticas, este paciente reencontrou seu caminho em termos da produção de suas imagens. Ao definir a condição mental de Fernando, Nise da Silveira afirma que as alterações na sua psique não representaram cisões graves a ponto de submeterem o consciente à invasão dos conteúdos inconscientes. Seu ego não se espatifou, mas ficou enfraquecido, incapaz de assumir seu papel e lhe proporcionar alguma estabilidade. A psiquiatra faz uma crítica contundente ao formato dos hospitais psiquiátricos ao propor que a condição de Fernando foi agravada pelas condições a que foi submetido nestas instituições de tratamento3. Segundo ela, estes locais serviram para massacrar ainda mais sua auto-imagem e não alimentaram seus movimentos de forças auto-curativas em direção a uma reconstrução da psique dissociada. Ao chegar ao ateliê, Fernando era um sujeito cabisbaixo que mal podia se comunicar com os outros, pois o volume de sua voz era tão baixo a ponto de ser dificilmente ouvida, tal era o estado de alienação em que se encontrava. Seu acervo conta com mais de 20 mil trabalhos de pintura, escultura, desenho, tapeçaria, móbiles, etc., que relatam sua trajetória artística e psicológica. Foi graças a seu trabalho artístico que Fernando conseguiu sair do anonimato e conquistar a estima e o respeito dos colegas e funcionários do Centro Psiquiátrico. Contudo, mais do que sair do anonimato, a possibilidade de retratar em imagens a desordem de sua psique permitiu a Fernando encontrar seu caminho, dar forma às perturbadas emoções que lhe acompanhavam e estabelecer um processo de auto-cura, onde novas direções se apresentaram (http://www.museuimagensdoinconsciente.org.br/ pdfs/FDiniz0.pdf). No catálogo da exposição O Universo de Fernando Diniz encontramos sua definição do que é pintar: “Pintar é procurar fazer as coisas por meio do pincel. É uma riqueza, pois se faz figuras e mais figuras até formar uma fortuna. É uma riqueza que se aprende tirando da fumaça do ar. A pintura vem por meio das imagens. Por meio da pintura acabei aprendendo tudo.” (http://www. museuimagensdoinconsciente.org.br/ pdfs/FDiniz0.pdf). Ele define também o que são as mandalas: “Pra mim uma mandala é uma porção de coisas, tem tantas coisas em volta da mandala... Alguém perguntou: Um ovo estrelado é uma mandala? Cada pessoa diz uma coisa, cada mandala é diferente da outra. Eu tava pensando que uma mandala é uma roda grande com uma porção de figurinhas de ouro em volta. Tava pensando que era alguma coisa de religião.” (http://www. museuimagensdoinconsciente.org.br/ pdfs/FDiniz0.pdf). Fernando morreu em 5 de março de 1999 de cardiopatia e câncer, mas mesmo doente fisicamente ele continuou com sua produção, fazendo inclusive uma exposição no Museu Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro em dezembro de 1998. CONSIDERAÇÕES FINAIS As contribuições de Vygotsky encontradas em Psicologia da Arte nos despertaram uma primeira emoção: de que se trata de um autor diferente do que habitualmente se conhece, um outro Vygotsky, que enfatiza a dimensão afetivoemocional do sujeito inserido em seu meio social. O objetivo deste trabalho foi percorrer algumas idéias pouco conhecidas de Vygotsky e estabelecer um paralelo entre as propostas deste autor e as concepções que permeiam atendimentos psicoterapêuticos que optam por utilizar a arte como fonte de equilíbrio. O trabalho desenvolvido por Nise da Silveira e o louco/artista Fernando Diniz foram utilizados aqui como exemplos bemsucedidos desta utilização. O que está por trás de ambas as visões é o funcionamento da pessoa humana em nossa sociedade. O ponto de destaque está nessa dimensão afetivo-emocional tanto dos indivíduos quanto da sociedade em que estes vivem, e no surgimento de novas formas de comportamento. Van Geert (2003) coloca que num dado processo o “novo” pode emergir. Entretanto, vale ressaltar o que se compreende por este termo. Não se trata de algo único, que jamais ocorreu, mas sim aquilo que seja inovador diante da história daquele processo. Idéias semelhantes a respeito do novo surgindo como produto do próprio processo e da não possibilidade de definição prévia do que vem a ser este produto também são encontradas no Dialogismo. Temos, por exemplo, a proposta de Marková (1990) de que o diálogo é um processo composto por três passos: 1) a comunicação inicial de um dos parceiros, 2) a resposta do outro, 3) a resposta do primeiro à resposta do segundo. Esta noção carrega a idéia de interdependência entre os parceiros, mas além disto, traz também o novo emergindo como fruto do diálogo. A concepção de que o novo pode surgir como fruto de um processo que sempre envolve duas ou mais pessoas que estabelecem uma relação de diálogo, seja através das palavras ou das imagens, também se faz presente neste trabalho. A arte e a relação com o outro (que deve ser necessariamente afetiva, de acordo com Nise da Silveira) podem proporcionar o encontro dessa transformação, desse novo. A transformação de Fernando incluiu a aceitação de si próprio como artista, e como tal ele pôde definir seu ofício: “O artista é quase um milagre. O artista já nasceu artista, gosta de se apresentar, mostrar a beleza...” (http://www. museuimagensdoinconsciente.org.br/pdfs/FDiniz0. pdf) O uso do termo “milagre” por Fernando nos faz recordar Vygotsky ao estabelecer o papel transformador da arte. É curioso observar também como as poucas e precisas palavras de Fernando estão em consonância com todo o raciocínio desenvolvido por Vygotsky explicitado anteriormente. Fernando, guiado por Nise da Silveira, vivenciou este milagre. Sua reintegração social, através da sua obra de arte, se deve à transformação que a expressão artística lhe proporcionou. Assim, sua arte lhe possibilitou buscar novos caminhos, novas formas de viver e de se reequilibrar. De uva, Fernando virou vinho. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEZERRA, Paulo. Prefácio à edição brasileira. In VIGOTSKI, L. S. Psicologia da Arte. São Paulo: Martins Fontes, 1999, pp. XII-XVIII. DIAS, P. B. Arte e Ciência no Brasil (1946 - 1952): O apoio de artistas e críticos de arte nas origens do Museu de Imagens do Inconsciente. Trabalho apresentado na Associação Nacional de História (ANPUH) – Rio de Janeiro, 2004. FRAYZE-PEREIRA, J. A. Nise da Silveira: imagens do inconsciente entre psicologia, arte e política. 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Holanda ² RESUMO O objetivo deste estudo foi descrever o nível de escolarização e outros fatores sociais e profissionais apresentados por atletas de duas equipes de futebol do estado de Pernambuco. Foram avaliados 50 atletas, todos do sexo masculino e com idade variando entre 18 e 30 anos, através de um questionário semi-estruturado elaborado pelos pesquisadores e aplicado individualmente aos atletas durante os dias de treinamento. De acordo com os resultados encontrados verificou-se que apenas 02 (4%) dos entrevistados possuem nível de escolarização superior e 96% (n=48) não completaram a 3ª série do ensino médio, sendo que destes 40% (n=20) não completaram o ensino fundamental até a 8ª série e 16% (n=08) são analfabetos ou não completaram o ensino fundamental até a 4ª série. Foi observado, ainda, que a totalidade dos atletas avaliados treinava numa carga de trabalho semanal acima de 30 horas. Desta forma, conclui-se destacando a necessidade de um maior conhecimento por parte dos dirigentes e dos próprios atletas sobre a importância de investir na sua formação escolar e a importância de realização de estudos e projetos que possam viabilizar a conciliação entre a vida profissional e a continuidade dos estudos por parte de jogadores de futebol. Palavras-chave: Esportes, futebol, atletas, escolaridade. LEVEL OF ESCOLARIZAÇÃO AND OTHER FACTORS RELATED TO OCCUPATIONAL PROFILE OF FOOTBALL PLAYERS ABSTRACT The objective of this study has been to describe the schooling level and other social and professional factors presented by athletes from two soccer teams in the state of Pernambuco – Brazil. Fifty athletes were evaluated, all of them of male sex and with ages varying from 18 to 30, through a semi-structured questionnaire elaborated by researchers and individually applied to the athletes during the training days. According to results found, it has been verified that only 02 (4%) of respondents have higher education and 96% (n=48) have not completed the 3rd year of high school, and from these 40% (n=20) have not finished their basic course up to 8th grade and still from these 16% (n=08) are illiterate or have not completed their 4th grade. It has also observed that the totality of athletes have trained on a weekly workload over 30 hours. This way, it has been concluded that it is necessary a greater importance to be given by the clubs officers and the athletes themselves to the necessity of investing in schooling formation and the attainment of studies and projects that can enable the athletes to go on their studies without affecting negatively their professional life. Key-words: Sports, Soccer, athletes, schooling level. INTRODUÇÃO O futebol é uma ocupação profissional que não depende diretamente da escolarização, desta forma, os jovens, principalmente os que advêm das classes sociais menos favorecidas, apostam nesse tipo de profissão muito precocemente e isto vem determinando um histórico de abandono escolar (LIMA; MATTA 2005; DAMO, 2005). Amaral e colaboradores (2007), 1. Curso de Educação Física. Faculdade dos Guararapes. 2. Curso de Educação Física. Faculdade Associação Caruaruense de Ensino Superior e Técnico. E-mail para correspondência: [email protected] afirmam que na caminhada para se chegar ao profissionalismo, muitos jogadores enfrentam problemas pessoais, familiares e sociais para continuarem sua formação escolar e destacam alguns fatores apontados pelos atletas de futebol que exercem influência na freqüência e dedicação dos mesmos ao estudo escolar, tais como grande rotina de treinamentos e viagens para disputa de competições. Damo e Amaral (2005) observaram que, além disso, a prática de futebol vem acontecendo cada vez mais cedo no Brasil. E Rodrigues (2002) e Vieira (2003) acreditam que a possibilidade de rápida ascensão social que o futebol pode proporcionar faz com que os atletas dêem prioridade a vida profissional esquecendo, assim, os estudos. Vieira (2003) identificou que, após seis a oito anos de investimento no futebol, o jovem atleta se encontra numa situação delicada devido à negligência com relação aos estudos. Enquanto Filgueira (2008) sugere que muitos dos fracassos enfrentados pelos jogadores, na sua vida pessoal e profissional, estão relacionados com o nível de escolarização dos mesmos. Portanto, além dos problemas socioculturais relacionados à dificuldade que atletas de futebol têm para dar seqüência aos seus estudos, também se discutem na comunidade científica, as dificuldades que esses atletas encontram em compreender e assimilar aspectos relacionados à tática do jogo, bem como as demais tarefas designadas pelo treinador (FILGUEIRA, 2008). Desta forma, este estudo foi direcionado no sentido de verificar qual o nível de escolarização e outros fatores sociais e profissionais, como idade, classe social e carga horária de treinamento de atletas de futebol de dois Clubes da primeira divisão desta modalidade em Pernambuco e têm suas sedes baseadas na cidade de Caruaru. METODOLOGIA 2.2 AMOSTRA A pesquisa foi realizada de julho a agosto de 2010 com duas equipes da primeira divisão de futebol do estado de Pernambuco, onde, através de um questionário, foi traçado o perfil sociodemográfico dos atletas. Foram incluídos neste estudo do tipo descritivo e transversal, 50 atletas, todos do sexo masculino. A fim de obter permissão para a apresentação e preenchimento dos questionários todos os atletas assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido e a direção dos clubes concedeu autorização, através de uma carta de anuência, para a aplicação do questionário e o uso de seus dados para fins de pesquisa e publicação. A coleta de dados só foi iniciada após o trabalho ter sido submetido, analisado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade ASCES. 2.2 QUESTIONÁRIO A coleta de dados foi realizada através de um questionário semi-estruturado aplicado individualmente aos atletas durante os dias de treinamento dos mesmos. Este instrumento de avaliação foi composto por questões de múltipla escolha e descritivas elaboradas pelos pesquisadores e questões do critério de classificação socioeconômica Brasil (ANEP, 2010), nas quais foram registradas informações sobre os perfis profissionais e sociodemográficos dos atletas pesquisados. 2.3 ANÁLISE DOS DADOS Para apresentação dos resultados foi realizada uma análise descritiva dos dados e a apresentação das variáveis mensuradas foi feita através de tabelas. O software utilizado foi o Excel 2000. 2.4 RESULTADOS Dos cinquenta praticantes de futebol avaliados neste estudo, a maioria era casado, com idade média de 22,26 anos tendo idade mínima de 18 anos, máxima de 30 anos e desvio padrão de 3,6 anos e com relação ao nível de escolarização 96% (n=48) não completaram a 3ª série do ensino médio e 40% (n=20) não completaram o ensino fundamental até a 8ª série, sendo que 16% (n=08) são analfabetos ou não completaram o ensino fundamental até a 4ª série. Conforme se observa na Tabela 1. Tabela 1: Tabela referente às características sociodemográficas dos atletas de uma equipe da primeira divisão de Futebol do estado de Pernambuco Quanto ao perfil profissional dos esportistas, os entrevistados declararam não exercer outro tipo de atividade profissional e apresentaram uma grande variação quanto ao período de prática do futebol, com um tempo de mínimo de 1 ano de prática na modalidade, uma média de 4,58 anos e 16% (n=8) acima de 10 anos de prática. E no que diz respeito à carga de treinamento semanal observou-se que a totalidade dos atletas treinava acima de 30 horas por semana. 2.5 DISCUSSÃO Neste estudo, que compreendeu somente atletas do sexo masculino, na sua maioria casados e com idade média de 22,26 anos, observou-se que todos os atletas tinham uma carga horária de treino acima de 30 horas semanais e apresentavam baixo nível de escolarização, com 16% (n=08) dos pesquisados declarando não ter completado o ensino fundamental até a 4ª série. Para Samulski e Marques (2009) o estudo da trajetória esportiva de um atleta tem características diferenciadas pelo perfil, pela cultura organizacional da modalidade esportiva e pelo ambiente socioeconômico no qual estes estão inseridos. Desta forma, o futebol pode ser visto no Brasil como um poderoso instrumento de ascensão social e, neste sentido, Lima e Matta (2005) indicam que fatores socioculturais e econômicos influenciam diretamente na procura pela sua prática. Quanto a fatores sociais e profissionais, Stewien e Camargo (2005) em estudo realizado com jogadores de futebol na cidade de ManausAM e Cohen et al (1997) analisando vários estudos sobre características de perfil sócio-demográfico de atletas de clubes de futebol, observaram números bastante semelhantes aos encontrados na presente pesquisa, principalmente no que se refere a alta carga de treinamento semanal e o baixo nível de escolarização dos atletas profissionais de futebol. E um estudo realizado por Matta (2004) mostrou que dos 43 jogadores analisados, só 33% concluíram os estudos no ensino médio e apenas 2% conseguiram chegar ao ensino superior, mas sem terminá-lo. Para Amaral et al (2007) e Soares et al (2009), os jogadores de futebol, seja no contexto amador ou profissional, deixam de frequentar as escolas porque não conseguem conciliar com a programação puxada de treinos, viagens e competições. E, apesar de não ter sido o caso dos atletas avaliados no presente estudo, ainda existem aqueles que realizam outras atividades profissionais, o que prejudica ainda mais a sua disponibilidade para estudar (BALLISTA, 2005). Por outro lado, ainda é possível arrazoar que a cobrança por resultados e a necessidade dos clubes de negociarem atletas, cada vez mais jovens, para o milionário mercado exterior, parece ter relação direta com o aumento na sobrecarga de trabalho destes atletas e o consequente abandono escolar e baixo nível de escolarização que apresentam. Autores como Filgueira (2008) também discutem sobre a dificuldade que esses atletas encontram em compreender e assimilar aspectos relacionados às tarefas designadas pelo treinador e a tática do jogo, decorrentes da capacidade cognitiva, como elemento de base também para o desenvolvimento atlético. Mas, apesar dessas evidências, o autor reconhece que não existe consenso sobre quanto o aspecto sociocultural dos jogadores pode influenciar no seu próprio rendimento dentro de campo. Já no que se refere à classificação social, de acordo com dados do Departamento de Análise de Situação e Saúde do Ministério da Saúde (ANEP, 2010), o quadro de extrema desigualdade existente na sociedade brasileira tem estreita relação com a falta de oportunidade de acesso da maior parte da população a educação e isto ameaça fortemente a realização do potencial dos jovens e determina conseqüências negativas ao seu desenvolvimento físico e intelectual, principalmente as crianças e adolescentes. Segundo dados do IBGE (2007), aproximadamente um terço dos indivíduos moradores de comunidades de periferia tem entre um a quatro anos de escolaridade e, traçando um paralelo entre o nível de ocupação da população economicamente ativa e o grau de escolarização, demonstram uma relação direta entre nível de ocupação e anos de estudos. Portanto, apesar da percepção dos jovens quanto ao futebol ser a principal, senão a única, opção de ascensão social e melhoria na qualidade de suas vidas, as dificuldades encontradas após a inserção no contexto de sua prática podem prejudicar a sua formação escolar e influenciar de forma negativa no processo de ascensão desejado por estes atletas. Primeiro, porque de acordo com documentos do Departamento de Registro e Transferência da CBF, 82,17% dos atletas nacionais recebem até dois salários mínimos e apenas um percentual menor que 5% destes atletas recebem acima de 20 (vinte) salários mínimos mensais. E, segundo, porque aliado a este fato, a profissão de jogador de futebol é bastante curta, com os atletas encerrando a carreira logo após os 30 anos de idade. Assim, apesar da péssima distribuição salarial no futebol não ser diferente da dos outros trabalhadores brasileiros, já que, segundo dados do IBGE (2007), apenas 1,6% dos trabalhadores brasileiros recebem mais de 20 salários mínimos, de acordo com Ballista (2005), o baixo nível de escolarização apresentado pela maioria dos jogadores de futebol ao encerrarem suas carreiras dificultam a reinserção no mercado de trabalho em outra atividade e determinam uma série de transtornos de ordem social para estes indivíduos. CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com os resultados deste estudo, verificou-se que o futebol se apresenta como uma prática desportiva com uma realidade estrutural que pode prejudicar a formação acadêmica dos atletas e isto pode ter influência na sua vida pessoal e profissional. Isto sugere a necessidade de um maior conhecimento por parte dos dirigentes e dos próprios atletas sobre a importância de investir na sua formação escolar e indica a importância de realização de estudos e projetos que possam viabilizar a conciliação entre a vida profissional e a continuidade dos estudos por parte de atletas de futebol desde a época de iniciação na modalidade, ainda no contexto do treinamento amador. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANEP - Associação Nacional de Empresas de Pesquisa. Critério de Classificação Econômica Brasil, 2010. Disponível em: <www.anep.org.br>. Acesso em: 08 de Março de 2010. AMARAL, Paulo Roberto Trombini; THIENGO, Carlos Rogério; OLIVEIRA, Flávio Ismael da Silva. Os motivos que levaram jogadores de futebol amador a abandonarem a carreira de jogador profissional. Revista Digital - Buenos Aires - Ano 12 - N° 115 - Dezembro de 2007. Disponível em: <http://www.efdeportes.com>. Acesso em: 08 de Março de 2010. BALLISTA, Bruno Gazal. 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Existem classes de fármacos promissoras, como é o caso das ftalimidas, 1,2,3-triazóis e compostos glicoconjugados. A presente revisão vem apresentar a relevância em unir os três centros farmacofóricos citados anteriormente, na perspectiva de serem sintetizados futuros candidatos a fármacos que apresentem potentes atividades biológicas, levando à ocorrência de menos efeitos colaterais. Palavras-chave: Ftalimidas. 1,2,3-Triazóis. Glicoconjugados. Atividade Hipolipidêmica. Atividade Antiinflamatória. Abstract Atherosclerosis is a chronic disease characterized by the accumulation of lipids and fibrous connective tissue in the arterial wall, which is a major cause of cardiovascular disease, and is also considered an inflammatory disease. This disease is triggered by hypercholesterolemia and progresses to an inflammatory disease. The search for hypolipidemic and anti-inflammatory drugs, for use in atherosclerosis is constant, since those commercially available have their use restricted due to severe undesirable effects. There are a promising class of drugs, as in the case of phthalimides, 1,2,3-triazole compounds and glycoconjugates. The present review is to present the importance of uniting the three pharmacophoric centers mentioned above, the prospect of being synthesized future drug candidates that have potent biological activities, leading to the occurrence of fewer side effects. Keywords: Phthalimides. 1,2,3-Triazoles. Glycoconjugates. Hypolipidemic activity. Anti - inflammatory activity. INTRODUÇÃO A aterosclerose é uma doença crônica caracterizada pelo acúmulo de lípidos e de tecido conectivo fibroso na parede arterial, que é uma das principais causas de doenças cardiovasculares, tais como infarto do miocárdio e derrame (TANDRA & VUPPALANCHI, 2009), também é considerada uma doença inflamatória (Gottlieb; Bonardi; Moriguchi, 2005; Afiune Neto et al., 2006). Aterosclerose também contribui significativamente para a morbidade e mortalidade nos países industrializados (Ginsberg & Stalenhof, 2003). O aumento do risco de doença cardíaca coronariana está associado com uma elevada concentração de colesterol total, lipoproteína de baixa densidade (LDL), triglicerídeos e baixa concentração sérica de lipoproteína de alta densidade (HDL). Aterosclerose, hiperglicemia, insuficiência cardíaca congestiva e algumas outras doenças estão fortemente integradas a distúrbios do 1. Coordenação da Área Básica da Escola de Saúde e Educação. Faculdade dos Guararapes. 2. Laboratório de Síntese de Produtos Bioativos. Departamento de Ciências Moleculares. Universidade Federal Rural de Pernambuco. 3. Laboratório de Química e Metabolismo de Lipídeos e Lipoproteínas. Departamento de Bioquímica. Universidade Federal de Pernambuco. E-mail para correspondência: [email protected] metabolismo de lípidos e lipoproteínas do plasma. Uma vez que os lípidos são insolúveis no sangue, seus transportes realizam-se em associação com proteínas, o que permite o seu transporte por todo corpo. Lipoproteínas presentes no soro têm sido o foco de vários estudos, como a etiologia de doenças cardiovasculares (ABDELAZIZ et al., 2011). Os fármacos mais usados para tratamento das hiperlipidemias são as estatinas. Utilizadas ainda em prevenção primária e secundária, com o propósito de diminuir os níveis de lipoproteínas plasmáticas ricas em colesterol e reduzir os riscos de doenças cardiovasculares. Esses efeitos são resultantes da atividade inibidora das estatinas sobre a enzima HMGCoA redutase (hidroximetilglutaril-CoA redutase), com a propriedade de bloquear a conversão do substrato HMG-CoA em ácido mevalônico, inibindo os primeiros passos da biossíntese de colesterol (CAMPO & CARVALHO, 2007) (Figura 1). Os efeitos colaterais que acompanham o uso das estatinas são relaconados à ação hepatotóxica, com possível aumento das enzimas aspatato e alanina transaminases; miopatias, com evolução a rabdomiólises e insuficiência renal (CAMPO & CARVALHO, 2007). Figura 2 - Estrutura química da Ezetimiba. b) niacina apresenta efeito antilipolítico diminuindo os ácidos graxos livres no sangue e, como consequência, resulta na redução do substrato fornecido para a síntese hepática dos triglicerídeos e mais especificamente partículas de VLDL, que são precursores das LDL (HAMOUD et al., 2012) (Figura 3); Figura 3 - Estrutura Química da Niacina. Figura 1 - Reação catalisada pela HMG-CoA redutase. Fonte: Quintão (2011). Altas doses de estatinas são frequentemente associadas com o aumento de efeitos adversos, portanto existe a necessidade de uma opção de tratamento adicional e alternativo. Existem algumas opções para o tratamento de dislipidemias e aterosclerose, que não são baseadas nas estruturas das estatinas (ROZMAN & MONOSTORY, 2010). As drogas não estatinas incluem: a) ezetimiba que inibe seletivamente a absorção do colesterol no bordo em escova do intestino bem como no hepatócito (TAMAKI et al., 2012) (Figura 2); c) inibidores da CETP (proteína transferidora de colesterol éster), estas drogas, inibem a CETP proteína que facilita o transporte dos ésteres de colesterol e triglicerídeos entre as lipoproteínas, levando ao enriquecimento das HDL em triglicerídeos. Um bloqueio na função da CETP resulta no aumento do colesterol-HDL com uma diminuição no colesterol-VLDL e consequentemente no colesterol-LDL (WHAYNE, 2009); d) sequestradores de ácidos biliares (ex. colestiramina) (Figura 4) são drogas que não são absorvidas a partir do intestino para a corrente sanguínea, e, geralmente, não têm a exposição sistêmica, assim a droga, juntamente com os ácidos biliares ligados, são excretados através das fezes (JACOBSON et al., 2007); Figura 4 - Estrutura Química da Colestiramina. e) ativadores de PPAR (receptor ativador de proliferação de peroxissomos), os receptores nucleares PPARs controlam o metabolismo lipídico e desempenham um papel central na manutenção da homeostase dos lipídeos. Três PPARs foram identificados PPARα (expressado no fígado, rim, músculo ou tecido adiposo), PPARδ (expressado no cérebro, tecido adiposo e pele) e PPARγ (expressado em quase todos os tecidos). PPARα e PPARγ são alvos moleculares de drogas comercializadas como os fibratos (ativadores do PPARα) (Figura 5) e as tiazolidinedionas (Figura 6) (ativadores do PPARγ) (NICHOLLS & UNO, 2012); Figura 5 - Estrutura Química do Clofibrato. De fato, no que se refere à aterosclerose, sugere-se que esta patologia esteja relacionada com distúrbios lipídicos e inflamatórios, ou seja, dois fatores fazendo parte de uma única patogênese e que existem muitos fatores relacionados com sua origem. Portanto, a aterosclerose é desencadeada por hipercolesterolemia e progride para uma doença inflamatória (Steinberg, 2002; Libby et al., 2011; Weber et al., 2011). A esse respeito, as drogas que têm um efeito “pleiotrópico” (efeitos anti-inflamatórios e hipolipidêmicos) são de grande interesse. Embora existam várias drogas que são utilizadas como hipolipidêmicas, como é o caso das estatinas, e agentes anti-inflamatórios, ainda é de grande valor encontrar compostos mais eficazes, não tóxicos e que apresentem menos efeitos colaterais e representem uma abordagem atraente, inovadora e promissora para o tratamento de hiperlipidemias e doenças inflamatórias. Devido ao restrito número de drogas hipolipidêmicas disponíveis comercialmente, fazem-se necessárias contínuas investigações por novos fármacos mais eficazes e que apresentem menos efeitos colaterais. A estratégia das drogas não estatinas pode ser uma valiosa perspectiva para o tratamento das dislipidemias, seja como terapia única ou como terapia combinada. Esta revisão bibliográfica visa apresentar a classe das ftalimidas, 1,2,3-triazóis e glicoconjugados, mostrando seus efeitos sobre a redução nos níveis lipídicos e também atividade anti-inflamatória. A ideia central deste trabalho bibliográfico é que futuramente possa ser utilizado para apresentar a estratégia da hibridação molecular entre dois ou três centros farmacofóricos (ftalimidastriazóis, ftalimidas-triazóis-carboidratos e ftalimidastriazóis-ftalimidas), originando moléculas inéditas com potência biológica e menos tóxicas. Figura 6 - Estrutura Química das Tiazolidinedionas. f) drogas que possuem como alvos moleculares enzimas envolvidas na síntese do colesterol têm sido submetidas a ensaios pré-clínicos ou clínicos para o tratamento de dislipidemia ou contra vias distintas que contribuem para o desenvolvimento da aterosclerose (ROZMAN & MONOSTORY, 2010). Figura 7 - Estrutura Geral de Interesse Futuro Sintético e Biológico. As bases teóricas necessárias à compreensão de estudos futuros, sendo elaborada de forma coerente e atualizada. Inicialmente, serão apresentados os centros farmacofóricos, que são as classes das ftalimidas, 1,2,3-triazóis e compostos glicoconjugados. Para cada classe de compostos, serão feitas abordagens importantes, como definição de cada classe, algumas formas de obtenção através da síntese orgânica, propriedades farmacológicas e outras aplicações fora da biologia. Desta forma, ficará mais fácil ser percebida a importância das classes utilizadas neste estudo como alvos farmacológicos. Diversos grupos de pesquisadores vêm sintetizando substâncias que apresentem prováveis atividades biológicas. No início, os pesquisadores limitavam-se a isolar determinadas substâncias naturais a partir do extrato bruto de plantas com eficácia conhecida. Porém, nos dias atuais, a química - tendo como subárea a síntese orgânica - passou não somente a criar análogos sintéticos e derivados, mas também a criar substâncias inéditas, que vieram se tornar fármacos (BARREIRO & FRAGA, 2008). Geralmente, os fármacos sintéticos são aquirais e possuem mais de um heteroátomo entre átomos de nitrogênio, enxofre e oxigênio, predominantemente, além de cloro e flúor. Classificando-os pelo tipo de mecanismo de ação, observar-se-á que, em sua maioria, são substâncias sintéticas com propriedades inibidoras de enzimas, antagonistas de receptores e que atuam, em menor número, no nível de canais iônicos (BARREIRO & FRAGA, 2008). O processo e o tempo requerido desde a descoberta de um fármaco até a aprovação do medicamento para comercialização pode ser longo, porém bem definido e compreendido pela indústria farmacêutica. Após a descoberta (p. ex. síntese) de um fármaco novo, ele é biologicamente caracterizado quanto a seus efeitos farmacológicos e toxicológicos e avaliado quanto a sua aplicação terapêutica potencial. Estudos de formulação são então realizados para determinar as características iniciais do produto ou a forma farmacêutica. Para fornecer a evidência exigida quanto aos aspectos de segurança e eficácia, uma sequência progressiva de ensaios pré-clínicos (p. ex. culturas de células, estudos em animais) e clínicos (humanos) são realizados. Após a realização de todos os ensaios clínicos e pré-clínicos, o responsável pelo produto pode encaminhar uma petição para registro de medicamento novo (NDA, new drug application) para sua comercialização (ALLEN; POPOVICH; ANSEL, 2007). Quando uma substância promissora é caracterizada quanto à atividade biológica, ela é também avaliada em relação às suas propriedades físicas e químicas que conduzem a estudos de formulação bem-sucedidos e obtenção de uma forma farmacêutica estável e eficaz. Dentre as características a serem analisadas de uma substância candidata a um novo fármaco, encontrase o coeficiente de partição (MCKARNS et al., 1997; BRUNS & WATSON, 2012). Para produzir uma resposta farmacológica, uma molécula de fármaco deve primeiramente atravessar uma membrana biológica constituída de lipídeos e proteínas, que age como barreira lipofílica para muitos fármacos. A capacidade do fármaco de penetrar essa barreira é baseada, em parte, na sua afinidade pelos lipídeos (lipofilia) versus sua afinidade por uma fase aquosa (hidrofilia). Então, o coeficiente de partição de um fármaco é a medida de sua distribuição em um sistema lipofílico-hidrofílico e indica sua capacidade de penetrar sistemas biológicos multifásicos (PETRAUSKAS & KOLOVANOV, 2000; SHARMA et al., 2010). No que diz respeito à atividade biológica, a literatura relata diversas informações sobre substâncias ou drogas que têm diversas atividades e apresentam pelo menos dois grupos químicos distintos numa mesma molécula (NICOLAIDES; FYLAKTAKIDOU; LITINAS, 1998). Uma estratégia de modificação molecular de fármacos e compostos-protótipos empregada para o desenho estrutural de novos análogos-ativos ou protótipos otimizados é a hibridação molecular. Compreende a identificação das subunidades farmacofóricas de dois protótipos/fármacos que são acoplados em uma nova estrutura combinadas com grupamentos espaçadores (spacers) ou grupos de união (linkers), de tal maneira que os farmacóforos sejam respeitados estruturalmente (BARREIRO & FRAGA, 2008). Observando essas informações, podemos destacar as ftalimidas N-substituídas e também os 1,2,3-triazóis como substâncias químicas com amplas atividades biológicas e merecedoras de destaque. Ftalimidas 1.1 Definição A ftalimida[1H-Isoindole-1,3(2H))-diona], (Figura 8), nome adotado pelo Chemical Abstract (CAS N 85-41-6), pertencente a família química das imidas. O Esquema 2. Síntese de Gabriel de ftalimidas. c) Ciclização de uma variedade de derivados bifuncionais tais como: ácido amídico, diamidas e dinitrilas (Esquema 3) (GRAMMETT, 1979). NH O Figura 8 - Estrutura Química da Ftalimida. 1.2. Métodos de Síntese de Ftalimidas É considerada a ftalimida como sendo derivada da reação do ácido ou anidrido ftálico e amônia com eliminação de água. Embora esse seja o método mais empregado na sua obtenção, existem outros métodos não comuns que são empregados com essa finalidade. Na síntese, são consideradas como compostos heteroaromáticos devido à viabilidade da formação do anel imida através das reações entre: a) aminas e compostos relacionados com anidrido ftálico (GAWRONSKI et al., 1998) (Esquema 1) e dicloreto ftálico (BUCKLES & PROBST, 1957). Esquema 3. Ciclização de derivados bifuncionais de ftalimida. d) Síntese de ftalimidas N-substituídas catalisada por 1,4-diazabiciclo[2,2,2] octano [DABCO] em um sistema com menos solvente (Esquema 4) (HERAVI; SHOAR; PEDRAM, 2005). Esquema 4. Síntese de ftalimidas N-substituídas catalisada por 1,4-diazabiciclo[2,2,2] octano [DABCO]. 1.3 Importância das Ftalimidas Esquema 1. Síntese de ftalimidas partindo do anidrido ftálico com aminas. b) Através da síntese de Gabriel, em que o sal ftalimida de potássio reage com haletos de alquilas para se obter N-alquilftalimidas (Esquema 2) (GIBSON & BRADSHAW, 1968). Os derivados das ftalimidas constituem uma importante classe de compostos heteroaromáticos e são extensamente estudadas dentro da química medicinal, por apresentarem diferentes atividades biológicas, tais como, hipolipidêmica (SRIVASTAVA et al., 2001; SENA et al., 2003; ABDEL-AZIZ et al., 2011; EL-ZAHABI et al., 2012), anti-inflamatória (COLLIN et al., 2001; MACHADO et al., 2005; FALCÃO et al., 2006), antitumoral (NAJDA-BERNATOWICZ et al., 2009; HORVAT et al., 2012), antiviral (HOFFMAN et al., 1992; VAN DERPOORTEN et al., 1997), analgésica (ANDRICOPULO et al., 2000), antimicrobiana (ORZESZKO et al., 2000) e anticonvulsivante (BAILLEUX et al., 1994; KAMINSKI et al., 2011; YADAV et al., 2012). A talidomida, uma ftalimida utilizada comercialmente, é um derivado sintético do ácido glutâmico, consiste de um anel glutarimida e de um anel ftalil. O seu desenvolvimento inicial foi como um sedativo sem toxicidade e com o potencial dos barbitúricos (LIMA et al., 2002), mas, após alguns anos de uso como sedativo e agente antiemético, essa substância foi retirada do mercado devido às propriedades teratogênicas que se tornaram aparentes, durante a década de 60. Entretanto, durante esse tempo, foi verificado que a talidomida era efetiva também no tratamento do eritema nodular leprosário. Ainda tem sido relatado que a talidomida é usada clinicamente exercendo efeito imunomodulador e anti-inflamatório em uma ampla variedade de doenças (LIMA et al., 2002), dentre as quais podemos destacar: infecções oportunistas na síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS), artrite reumatoide, lúpus eritrematoso sistêmico, entre outras. A talidomida é reportada como reguladora, também, da produção de várias citocinas, incluindo o fator de necrose tumoral alfa (TNF), interleucinas (ILs) 2, 4, 5, 6, 10 e 12, e do interferon (KUMAR; WITZIG; RAJKUMAR, 2002). Tendo sido mencionada a importância das ftalimidas para a química medicinal, não se pode esquecer de destacar suas aplicações na indústria como monômeros na síntese de polímeros e copolímeros termoestáveis (IM & JUNG, 2000). 1.4 Propriedades Farmacológicas das Ftalimidas 1.4.1 Atividade Hipolipidêmica No plasma, as lipoproteínas funcionam como vesículas que transportam os lipídeos circulantes. Elas formam micelas globulares que são constituídas de um núcleo não polar formado de triglicerídeos e ésteres de colesterol recorbertos por uma camada anfifílica de proteínas, fosfolipídeos e colesterol livre. As lipoproteínas são classificadas em ordem crescente de acordo com suas densidades, que dependem do seu conteúdo proteico: quilomícrons (QM), lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL), lipoproteína de densidade intermediária (IDL), lipoproteína de baixa densidade (LDL) e lipoproteína de alta densidade (HDL) (QUINTÃO & NAKANDAKARE, 2011). Os responsáveis pelo transporte dos lipídeos da dieta são os QM. Quando são liberados pelas células da mucosa intestinal são chamados de quilomícrons nascentes. À medida que sofrem a ação de lipase lipoproteica, enzima que hidrolosa os triglicerídeos (TG), liberam os ácidos graxos nos tecidos periféricos, constituindo assim os quilomícrons remanescentes, os quais são ricos em colesterol esterificado. Finalmente, são removidos por receptores hepáticos para apoproteína E (apo-E), sendo endocitados pelos hepatócitos, onde são hidrolisados (KINDEL; LEE; TSO, 2010). A VLDL produzida pelo fígado, com a função de transportar os TG de origem endógena, também sofre ação da lipase lipoproteica. O resultado desse processo é a formação de uma lipoproteína de densidade intermediária (IDL) a qual se transforma em LDL após ação adicional da lipase lipoproteica (OOI et al., 2012). A LDL é a principal responsável pelo transporte de colesterol na circulação, podendo ser endocitada por células do fígado ou de tecidos extra-hepáticos por meio de receptores específicos (MURTOLA et al., 2012); esses receptores reconhecem e se ligam à apoproteína B-100 e a apoproteína E da superfície lipoproteica. As HDL são sintetizadas no fígado bem como no intestino e têm como principal função captar o colesterol liberado das membranas dos tecidos periféricos para ser transportado para o fígado - este é chamado de transporte reverso do colesterol. Nesse processo, o colesterol é esterificado nas HDL, por ação da lecitina: colesterol aciltransferase (LCAT), através da transferência de resíduos de ácidos graxos da fosfatidilcolina, produzindo lisofosfatidilcolina e éster de colesterol. A LCAT é uma glicoproteína sintetizada nos hepatócitos e secretada no plasma, onde circula na forma livre ou complexada com as lipoproteínas de alta densidade (BOGAARD et al., 2012). O aumento na concentração dos níveis lipídicos plasmáticos acarreta em hiperlipidemias primárias ou secundárias (QUINTÃO & NAKANDAKARE, 2011). O efeito hipolipidêmico da ftalimida e seus derivados, como as ftalimidas N-substituídas, foi inicialmente descrito em 1979 por Chapman et al., que relataram ser esta nova classe de compostos efetiva na redução dos níveis de colesterol e triglicerídeos em roedores, sendo administradas doses relativamente baixas de 20 mg/Kg/dia durante 16 dias de tratamento (CHAPMAN; COCOLAS; HALL, 1979). Anos mais tarde, Hall et al., 1983, relataram o mecanismo de atuação de uma série de N-fenilftalimidas, estando relacionada com a redução dos níveis de colesterol e triglicerídeos, atuando possivelmente de algumas maneiras: a) suprimindo a atividade de enzimas importantes envolvidas na síntese do colesterol e dos triglicerídeos (inibe a atividade da acetil CoAredutase em 50% e da enzima HMG-CoA redutase em 26%); b) acelerando a excreção biliar do colesterol; c) bloqueando a absorção do colesterol pelo intestino via circulação entero-hepática (HALL et al., 1983). Chapman et al., 1984, observaram em uma série de derivados da N-arilftalimida que a substituição no anel fenil afeta significativamente a atividade hipolipidêmica dos compostos testados (CHAPMAN et al., 1984). E ainda: quando um substituinte etóxi é introduzido na posição orto do anel fenil, a atividade hipolipidêmica é aumentada, apresentando os níveis de colesterol e triglicerídeos reduzidos em 57% e 44% após 16 dias de tratamento, respectivamente. Já o grupo etil quase não afetou a atividade hipolipidêmica. Dessa forma, foi mostrado que substituições realizadas por grupos que retiram elétrons, levam a drogas mais eficientes. Após análises das observações realizas por Chapman et al., 1984, os pesquisadores Ramos e Neto (1990) estudaram a relação estruturaatividade (QSAR) em ftalimidas, sendo revelada, através de índices eletrônicos, que a planaridade e a introdução de um átomo eletronegativo eram fatores importantes na atividade da ftalimida (RAMOS & NETO, 1990). Em 1996, Antunes e Srivastava relataram a síntese de três novas ftalimidas ligadas a oxadiazol e, através de cálculos semiempíricos de orbitais moleculares, conseguiram prever que tais compostos poderiam apresentar atividade hipolipidêmica (ANTUNES & SRIVASTAVA, 1996). No ano de 2001, Srivastava et al. investigaram a ação farmacológica de derivados da ftalimida e, neste trabalho, foram relatados dois compostos que apresentavam carboidratos nas suas estruturas, com grande efetividade para reduzir o colesterol e triglicerídeos em camundongos normolipidêmicos (SRIVASTAVA et al., 2001). Sena et al., (2003), sintetizaram N-arile N-(1,2,4-triazol)ftalimidas e determinaram a presença da atividade hipolipidêmica para todos os compostos testados. O composto que apresentou o átomo de cloro na posição para do anel fenil reduziu os níveis de colesterol em 63% e os níveis de triglicerídeos em 47% (SENA et al., 2003). Recentemente, Abdel-Aziz et al., (2011), idealizaram e, em seguida, sintetizaram algumas imidas cíclicas com atividade anti-hiperlipidêmicas e hipoglicemiante, retomando, dessa forma, os estudos sobre o potencial em reduzir os níveis lipídicos apresentados pelas ftalimidas e seus derivados. 1.4.2 Atividade Anti-inflamatória A inflamação é um processo que o organismo utiliza como defesa para uma lesão causada por agentes físicos (como o calor, o frio ou o trauma), químicos (as substâncias de naturaza irritante) e biológicos (como os microorganismos) (CALIXTO et al., 2004). Durante o processo da inflamação, células especializadas são ativadas e atuam para inativar ou destruir o agente agressor, iniciando, logo após, o processo de reparação tecidual. Dependendo da persistência da lesão inflamatória e dos seus sintomas clínicos, a inflamação poderá ser classificada em aguda ou crônica. A inflamação aguda é caracterizada por apresentar curta duração e mostrar dilatação das arteríolas, além de levar a um aumento da permeabilidade vascular, acúmulos de leucócitos, produção de proteínas de fase aguda e dor (LEVINE et al., 1999; LIBBY; RIDKER; MASERI, 2002). Perdurando esse processo, o agressor continua ativo, o processo cronifica, ou seja, acontece o mecanismo de destruição tecidual e, em seguida, a tentativa de reparo celular. As células acionadas são os macrófagos, linfócitos e plasmócitos que se aderem aos vasos sanguíneos, promovendo uma vasodilatação e também resultando na formação de exsudatos e granulomas. Todo processo inflamatório chegará ao fim, quando o agente agressor for eliminado e os mediadores secretados ou destruídos. As reações inflamatórias são mediadas por fatores químicos derivados de proteínas ou de células plasmáticas. As citocinas, classificadas como próinflamatórias e anti-inflamatórias são moléculas de natureza proteica, apresentando a capacidade de sinalizar diferentes células de defesa e regular a resposta inflamatória (CALIXTO et al., 2004). Essas moléculas podem ser enquadradas em diversas categorias: interferon, interleucinas, fator estimulador de colônias, fator de necrose tumoral e fator de transformação de crescimento. Dentre essas, há categorias que se destacam no processo inflamatório agudo e crônico, bem como no processo de reparo celular: as interleucinas 1, 6 e o fator de necrose tumoral. Destacam-se também outros mediadores químicos como a histamina, as prostaglandinas e a bradicinina. O mecanismo da inflamação é iniciado através da liberação de mediadores inflamatórios estes mediadores são formados no tecido lesado, provocando danos nas membranas celulares e promovendo a ativação da fosfolipase A2; como consequência dessa ativação, ocorre à liberação de ácido araquidônico, fator ativador de plaquetas e enzimas lisossômicas. Esse processo fisiológico, de formação do ácido araquidônico, origina substâncias com um importante papel na inflamação, que são as prostaglandinas, os tromboxanos, os leucotrienos, as lipoxinas, os ácidos epoxieicosatetraenoicos (EETs), os ácidos hidroxieicosatetraenoicos (HETEs) e os ácidos hidroperoxieicosatetraenoicos (HPETEs) (SHERWOOD & TOLIVER-KINSKY, 2004). As drogas corticosteróides impedem a atividade da fosfolipase A2, e, portanto, reduzem a liberação do ácido araquidônico. Em outras palavras, essas drogas inibem a formação de prostaglandinas, leucotrienos e tromboxanos (CARVALHO; CARVALHO; RIOS-SANTOS, 2004). Por sua vez, as drogas anti-inflamatórias não esteroidais (NSAIDs) inibem a produção de prostaglandinas - um exemplo: o ácido acetilsalicílico provoca uma acetilação irreversível da enzima ciclooxigenase (VANE DER OUDERAA, 1980). Já a indometacina e o ibuprofen produzem uma inibição reversível na mencionada enzima, competindo com o ácido araquidônico, pelo sítio ativo da enzima (VANE, 1990). Existem três vias principais para a síntese das prostaglandinas (Figura 9) a partir do ácido araquidônico: a) via da ciclooxigenase 1 (COX-1), chamada de constitutiva por ser produzida constantemente e distribuída nos tecidos; b) via da ciclooxigenase 2 (COX-2), denominada de induzida por ser formada frente a estímulos inflamatórios; c) via da lipoxigenase, atuando na formação dos ácidos hidroperoxieicosatetraenoicos ou leucotrienos (CARVALHO; CARVALHO; RIOSSANTOS, 2004). Apesar do potencial anti-inflamatório, as drogas do tipo corticosteróides e não corticosteróides apresentam efeitos colaterais, tais como transtornos gastrointestinais (associados pelos AINES diversos), alterações sanguíneas, alterações cardiovasculares, cefaléia, entre outras (CARVALHO; CARVALHO; RIOS-SANTOS, 2004). A busca incessante por fármacos anti-inflamatórios que apresentem menos efeitos colaterais é o que movimenta a indústria farmacêutica nos dias atuais. Como descrito anteriormente, as ftalimidas também apresentam atividade anti-inflamatória considerável dentro da biologia (COLLIN et al., 2001; MACHADO et al., 2005; FALCÃO et al., 2006), sendo alvo dos químicos sintéticos para obtenção de moléculas eficazes para a terapêutica. Antunes et al., (1996), relataram que quatro derivados de ftalimida ligados a oxadiazol por uma função alquila apresentaram atividade analgésica e anti-inflamatória superior à atividade do ácido acetilsalicílico em doses de 10 mg/Kg, e que entre esses compostos praticamente não existiam diferenças entre as atividades apresentadas, quando comparadas entre si. Lima et al., (2002), descreveram a síntese e a determinação da atividade anti-inflamatória de novas N-fenil-ftalimidas sulfonamidas e os isósteros N-fenil-ftalimidas amidas, designados como híbridos da talidomida e inibidores da fosfodiesterase. Os compostos testados apresentaram efeito inibidor para o TNF nesta mesma publicação, os autores comprovaram a importância do grupo farmacofórico da ftalimida para a atividade anti-inflamatória dos derivados. Figura 9 - Síntese de Prostaglandinas, Prostaciclina, Troboxano A2 e Leucotrienos. Fonte: ASSIS (2012). Heterocíclicos 1,2,3 Triazólicos 2.1 Definição São compostos heterocíclicos aromáticos nitrogenados de cinco membros que contêm um ou mais átomos de nitrogênio, pertencem à classe de substâncias denominada genericamente de azol, sendo que o mais simples deles é o pirrol; mesmo os compostos heterocíclicos de cinco membros contendo átomos de enxofre ou oxigênio, adicionalmente a um átomo de nitrogênio, recebem a denominação de azol, sendo chamados, respectivamente, de tiazol (DE SOUZA et al., 2005) e oxazol. Destacamos, os membros mais simples da classe (HUDSON, 1992): pirazol, imidazol, 1,2,3-triazol, 1,2,4-triazol, tetrazol e pentazol. Os triazóis encontram-se entre os mais estudados sistemas heterocíclicos, eles têm despertado o interesse pelo fato de apresentarem um vasto campo de aplicações, que vão desde usos como explosivos, até como agroquímicos e fármacos (FERREIRA et al., 1999; AGALAVE; MAUJAN; PORE, 2011). Até o momento, sabe-se que todos os triazóis são de origem sintética, não sendo estes heterocíclicos encontrados na natureza (HUDSON, 1992). 2.2 Métodos de Síntese de 1,2,3-Triazóis através da via de cicloadição 1,3-dipolar Os 1,2,3-triazóis podem ser sintetizados por diversas rotas, como as rotas clássicas (mais antigas) ou por rotas mais recentes; iremos focar na forma de obtenção, utilizando a via de cicloadição 1,3-dipolar, porém sem deixar de mencionar a rota pioneira para obtenção desses compostos. A síntese pioneira do heterociclo 1,2,3-triazólico foi a preparação de 2-aril-1,2,3-2H-triazóis, desenvolvida por Pechmann, em 1888, a partir do tratamento da bis-fenil-hidrazona derivada de compostos 1,2-dicarbonílicos com ácido nítrico (FERREIRA et al., 1999; MELO et al., 2006) (Figura 10). Figura 10 - Síntese de 1,2,3-triazóis a partir da bisfenil-hidrazona. As reações de cicloadição 1,3-dipolares entre azidas e substâncias contendo ligações duplas ou triplas são conhecidas e têm sido estudadas desde 1893. A primeira reação deste tipo foi realizada por Arthur Michael, que isolou por destilação o produto formado pela reação entre a fenil-azida (preparada em 1893) e o acetilenodicarboxilato de etila (FERREIRA et al., 1999). De modo geral, as cicloadições entre azidas e acetilenos ocorrem rapidamente, sendo um dos métodos mais versáteis para preparação de 1,2,3-triazóis. O uso de acetilenos simétricos, de fácil obtenção, é o ponto de partida para preparação de muitos outros derivados triazólicos. Normalmente, o derivado acetilênico simplesmente é aquecido juntamente com a azida, com ou sem solvente. Baseado nos estudos de Sharpless et al., 2001, sobre a chamada clik chemistry, existe um grande número de trabalhos publicados tendo o cobre (I) catalisando a reação de cicloadição 1,3-dipolar envolvendo azida-alcino. Este tipo de reação fornece condições brandas para o meio reacional e os rendimentos finais das reações são elevados, apresentando regioespecificidade de 1,2,3-triazóis-1,4-dissubstituídos. A reação catalisada por metal constitui uma melhoria considerável da clássica cicloadição 1,3-dipolar térmica de Huisgen, que proporciona a formação de triazóis (KOLB; FINN; SHARPLESS, 2001; HUISGEN, 1963; FREITAS et al., 2011). Em 2011, Barbosa e Oliveira sintetizaram novos compostos 1,2,3-triazóis ligados a benzoheterocíclicos, utilizando a cicloadição 1,3-dipolar entre azida de ftalimida e alcino terminal; os autores ainda utilizaram o iodeto de cobre (CuI) como catalisador. Os produtos finais obtidos apresentaram bons redimentos (BARBOSA & DE OLIVEIRA, 2011). Alguns 1,2,3-triazóis ligados à ftalimidas foram obtidos empregando uma metodologia baseada na click chemistry, utilizando a irradiação de ultrassom, onde os compostos são obtidos de forma rápida e com bons redimentos (SILVA, et al., 2012) . 2.3 Propriedades 1,2,3-Triazóis Farmacológicas dos O interesse em derivados 1,2,3-triazólicos pela área farmacológica surgiu pelo fato destes compostos serem bioisósteros dos anéis heterocíclicos imidazólico, 1,2,4-triazólico e tetrazólico, encontrados em substâncias com atividades farmacológicas diversas, como antifúngica, antidepressiva, antiviral, antitumoral e anti-hipertensiva. Podemos destacar a atividade inibitória de esteroides ligados a 1,2,3 triazóis em cultura de células humanas de câncer de próstata (BÖHM; KAROV, 1981). Os compostos 1,2,3-triazóis apresentam ainda outras propriedades, como anti-histamínica, anti-inflamatória e analgésica (RAJASEKARAN & RAJAGOPAL, 2009; SHAFI et al., 2012). A ação dos 1,2,3-triazóis contra fungos e bactérias é geralmente menor que a dos 1,2,4-triazóis. Contudo Dzhuraev e colaboradores (DZHURAEV; MKSHUMOV; KARIMUKOVA, 1992) prepararam diversos 1,2,3-1H-triazóis que foram testados como bactericidas, sendo que alguns apresentaram pronunciada atividade. Por exemplo, um derivado triazólico dibromado é cinco vezes mais potente que a penicilina, o cloranfenicol e a polimixina contra o Staphyllococus aureus. Outros 1,2,3-triazóis glicosilados (HAGER; MIETHCHEN; REINKE, 2000) foram sintetizados e também apresentaram atividade inibitória do crescimento de algumas linhagens de células tumorais (leucemia, melanoma, câncer de útero, de ovário, de próstata, renal, de mama, de cérebro e de células pequenas de pulmão). Menegatti et al., 2003, planejaram racionalmente e posteriormente sintetizaram uma nova família de compostos triazólicos contendo a subunidade N-arilpiperazínica, sendo os novos compostos candidatos a protótipos de agentes neuroativos, pois se mostraram ligantes seletivos para receptor dopaminérgico do subtipo D2 (MENEGATTI et al., 2003). Os Isonucleosídeos 1,2,3-triazólicos foram sintetizados por cicloadição 1,3-dipolar entre azidas derivadas de um carboidrato e alcinos. Estes isonucleosídeos apresentaram significativa inibição da enzima transcriptase reversa do vírus HIV-1 (LUTZ, 2008). Cabe também destacar uma revisão recente do Agalave e colaboradores, 2011 (AGALAVE; MAUJAN; PORE, 2011), em que os autores destacam através da clik chemistry, de 1,2,3-triazóis como centros farmacofóricos, muitas atividades farmacológicas para tais moléculas, dentre as quais podemos mencionar anticâncer, inibidora de proteases HIV-1, antituberculose, antifúngica e antimicrobiana. Como apresentado no tópico relacionado sobre as ftalimidas deste trabalho científico, Sena et al., (2003), sintetizaram N-aril- e N-(1,2,4-triazol) ftalimidas e determinaram a presença da atividade hipolipidêmica para todos os compostos testados, mostrando que compostos triazólicos foram capazes de reduzir os níveis de colesterol e triglicerídeos em camundongos tratados com baixa concentrações (20 mg/Kg/dia) dessas drogas; neste mesmo trabalho, a maior eficiência dos compostos testados foi para reduzir os níveis de colesterol total. 2.4 Outras Aplicações dos 1,2,3-Triazóis Os 1,2,3-triazóis são excelentes ligantes para ferro e para outros metais (SHARMA; KUMARI; SINGH, 2010) e têm sido utilizados com sucesso como inibidores de corrosão em radiadores e em sistemas de refrigeração. Polímeros contendo o 2-(2-hidroxi)-benzo-2H-1,2,3-triazol são usados como estabilizantes contra radiação ultravioleta (GUPTA et al., 1983.). Esses produtos foram desenvolvidos comercialmente desde a década de 70 e continuam tendo aplicações até hoje. Nos últimos anos, vários corantes contendo núcleo triazólico foram introduzidos no mercado. Esses corantes, em sua maioria, apresentam a principal característica, que é a capacidade de realçar a cor em fibras, como poliacrilonitrila e acetato de celulose. Compostos Glicoconjugados Diversos papéis importantes nos processos biológicos desempenham os compostos glicoconjugados, como mostrado na introdução do presente estudo, eles apresentam papel no reconhecimento celular nos casos de inflamação (GIANNIS, 1994), metástase tumoral (FEIZI, 1993), reposta imune das infecções bacterianas e virais (RUDD et al., 2001). Os glicoconjugados sintéticos correlacionados com a estrutura de superfícies celulares e com a função celular estão em desenvolvimento como agentes terapêuticos (BERTOZZI, 2001). De Oliveira e Sinou, em 2006, utilizaram uma forma viável de síntese de glicoconjugados. A síntese foi de alguns 1,2,3-triazóis insaturados ligados a glicoconjugados com bons redimentos, utilizando cicloadição 1,3-dipolar (De OLIVEIRA & SINOU, 2006). Ainda no mesmo ano, Tiwari e colaboradores (2006) sintetizaram novos derivados glicosil-(1→3)-frutose com propriedades para tratar desordens metabólicas, por exemplo, os casos de hipercolesterolemia. Os autores mostraram que, a presença da molécula de frutose na extremidade redutora da D-rafinose e D-melezitose, oligossacarídeos de frutose comercialmente disponíveis, foi necessária para a atividade antihiperlipidêmica; as concentrações utilizadas dos compostos testados no experimento foram na ordem de 100 mg/Kg/dia (TIWARI et al., 2006). O grupo farmacofórico ftalimido é um grupo protetor comum para aminas e é amplamente utilizado na química de carboidratos, exatamente por apresentar diversificadas atividades biológicas, como mostradas ao longo desta revisão da literatura. Os derivados do N-ftalimidometil 2,3,4,6 tetra-O-acil-α-D-manopiranosídeos mostraramse excelentes agentes hipolipidêmicos, quando administrados em concentrações relativamente baixas. (SRIVASTAVA et al., 2001). A fração ftalimido é insolúvel em água, porém, quando conjugada com açúcares, apresenta grupos hidroxílicos livres, que podem aumentar a sua solubilidade em água, tornando assim toda a estrutura mais semelhante à das drogas comerciais. Com esta ideia em mente, Meng et al., 2007, sintetizaram uma série de N-ftalimidametil 2,3-dideoxi-açúcares e glicosídeo 2,3-insaturado que apresentou atividade anti-inflamatória aguda significativa, quando administrada em uma concentração de 100 mg/Kg (MENG et al., 2007). Toda a revisão bibliográfica, descrita sobre o tema central deste estudo, mostrou que os centros farmacofóricos (ftalimida, triazol e carboidrato), contidos neste trabalho, quando analisados separadamente, são bons agentes anti-infamatórios e hipolipidêmicos. Partindo dessa ideia, poderão ser realizados trabalhos que reúnam os três centros com o intuito de potencializar o efeito farmacológico de tais compostos, proporcionando a busca por fármacos cada vez mais potentes, que atuem sobre os níveis lipídicos e combatam a inflamação, apresentando menos efeitos colaterais. Referências ABDEL-AZIZ, A. A. M.; EL-AZAB, A. S.; ATTIA, S. M.; AL-OBAID, A. M.; AL-OMAR, M. A. Synthesis and biological evaluation of some novel cyclic-imides as hypoglycaemic, anti-hyperlipidemic agents. European Journal of Medicinal Chemistry, 46, 4324-4329, 2011. AFIUNE NETO, A.; MANSUR, A. P.; AVAKIAN, S. D.; GOMES, E. P. S. G. RAMIRES, J. A. F. Monocitose é um marcador de risco independente para a doença arterial coronariana. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 86, 2006. AGALAVE, S. G.; MAUJAN, S. R.; PORE, V. S. Click chemistry: 1,2,3-triazoles as pharmacophores. Chemistry an Asian Journal, 6, 2696-2718, 2011. ALLEN, L. V. Jr.; POPOVICH, N. G.; ANSEL, H. C. 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