Séries de Fourier Matemática Aplicada Carlos Luz Revisto em 2004/2005 Conteúdo 1 Séries de Fourier 1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1.2 Séries trigonométricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1.2.1 Séries de funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1.2.2 Definição de série trigonométrica . . . . . . . . . . . . 1.2.3 Cálculo dos coeficientes de uma série trigonométrica uniformemente convergente . . . . . . . . . . . . . . . 1.3 Séries de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1.3.1 Definição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1.3.2 Convergência das séries de Fourier . . . . . . . . . . . . 1.3.3 Série de Fourier de uma função de período T . . . . . . 1.3.4 Séries de Fourier de funções importantes nas aplicações 1.4 Aplicações das séries de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . 1.4.1 Aplicação à resolução de equações diferenciais . . . . . 1.4.2 Aproximação de uma função por um polinómio trigonométrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 2 2 2 2 8 11 15 15 19 24 27 30 30 33 1 / A g o sto / 2 0 0 5 1 Séries de Fourier 1.1 Introdução As séries de Fourier são séries cujos termos são funções sinusoidais. A sua importância prática deve-se a que uma função periódica (verificando condições bastante gerais) pode ser representada por uma série de Fourier e, sobretudo, ao facto de ser possível obter facilmente em computador excelentes aproximações daquela série. Historicamente, contudo, o aparecimento das séries de Fourier deveu-se, numa primeira fase, aos estudos realizados por Bernoulli1 por volta de 1750 sobre a resolução da equação diferencial às derivadas parciais que regula o fenómeno da vibração de uma corda flexível. Foi porém Fourier2 , 50 anos mais tarde, que ao estudar outra equação diferencial às derivadas parciais–a equação do calor (ver, para referências históricas, [3] e [9])–revelou definitivamente a importância teórica e prática das séries de Fourier. No que se segue começaremos por rever algumas noções e propriedades relativas às séries de funções após o que daremos a definição de série trigonométrica e veremos como calcular os seus coeficientes. Introduziremos depois as séries de Fourier, estudaremos a sua convergência e apresentaremos vários exemplos. Terminaremos com as aplicações das séries de Fourier à resolução de equações diferenciais e à teoria da aproximação de funções. 1.2 1.2.1 Séries trigonométricas Séries de funções Recordaremos nesta subsecção a definição de série de funções bem como as noções de convergência pontual e uniforme (ver, por exemplo, [4] ou [8] para um tratamento mais detalhado do tema). Representemos então por fn , n = 0, 1, 2, . . . , uma sucessão de funções reais de variável real definidas num conjunto D ⊂ IR. Por exemplo, supondo que x ∈ [0, 1], a igualdade fn (x) = xn , n = 0, 1, 2, . . . , define uma sucessão de funções contínuas em [0, 1]3 (ver fig. 1). Definição 1 Diz-se que fn converge num ponto x ∈ D se, uma vez fixado o valor de x, o limite da sucessão numérica fn (x) é finito. Se fn converge em 1 Daniel Bernoulli (1700—1782), físico e matemático suiço tendo-se notabilizado pelos seus trabalhos em dinâmica dos fluidos e na teoria cinética dos gases 2 Jean-Baptiste Joseph Fourier (1768—1830), físico e matemático françês que se notabilizou pelo desenvolvimento da teoria da propagação do calor onde utilizou as séries que passaram a ser conhecidas pelo seu nome. 3 Estamos aqui a considerar f0 (0) = 1. 2 1 / A g o sto / 2 0 0 5 1 1 0.8 x 0.6 x2 0.4 x3 0.2 00 0.2 0.4 x10 0.6 0.8 1 Figura 1: Funções 1, x, x2 , x3 e x10 todos os pontos de D, a função definida por f (x) = lim fn (x), n ∀x ∈ D, designa-se por limite de fn em D. Diz-se também que fn converge pontualmente para f em D. Exemplo 1 A sucessão fn (x) = xn (fig. 1) converge nos pontos do intervalo [0, 1] pois limn→∞ xn é igual a 0 se x ∈ [0, 1[ e vale 1 se x = 1. Assim, a função limite no referido intervalo é f (x) = 0, se 0 ≤ x < 1 . 1, se x = 1 A uma sucessão de funções fn , n = 0, 1, 2, . . . , definidas em D ⊂ IR pode sempre associar-se a série ∞ fn = f0 + f1 + · · · + fn + · · · , n=0 a qual se diz uma série de funções definida em D. A sucessão auxiliar Sk = k fn = f0 + f1 + · · · + fk , k = 0, 1, 2, . . . , n=0 3 1 / A g o sto / 2 0 0 5 diz-se a sucessão das somas parciais da série de funções. Por exemplo, à sucessão de fn (x) = xn definidas em [0, 1] pode associar-se a série funções ∞ de funções n=0 xn , conhecida por série geométrica. A correspondente sucessão das somas parciais é definida, para k = 0, 1, 2, . . . , por k+1 1 + x + x2 + · · · + xk = 1−x , se 0 ≤ x < 1 1−x Sk (x) = . (1) k, se x = 1 Definição 2 Diz-se que a série de funções ∞ n=0 fn é convergente (respectivamente, absolutamente convergente, simplesmente convergente, divergente) num ponto x ∈ D se, uma vez fixado x, a série numérica ∞ f n=0 n (x) é convergente (resp. absolutamente convergente, simplesmente convergente, divergente); equivale a dizer que a sucessão das somas parciais Sk converge em x ∈ D. Definição 3 Se a série de funções ∞ n=0 fn é convergente para qualquer x ∈ D, a função definida por f (x) = ∞ fn (x), ∀x ∈ D, n=0 diz-se a soma pontual da série em D. n Exemplo 2 Voltando a considerar a série geométrica ∞ n=0 x definida em [0, 1] conclui-se que se trata de uma série convergente em [0, 1[ e divergente para x = 1. Com efeito, de (1) sai 1 , se 0 ≤ x < 1 1−x lim Sk (x) = , +∞, se x = 1 k→∞ donde a função 1 1−x é a soma pontual da série geométrica em [0, 1[. Vimos no exemplo 1 que, embora os termos da sucessão fn (x) = xn sejam funções contínuas em [0, 1] a função limite é descontínua no ponto x = 1. Significa isto que uma sucessão de funcões contínuas pode não convergir pontualmente para uma função contínua. Este facto leva à consideração de outras noções de convergência mais fortes como é o caso da convergência uniforme de funções. Definição 4 Diz-se que uma sucessão de funções fn definidas em D ⊂ IR, converge uniformemente em D para a função f, se, para todo o δ > 0, existe uma ordem p independente de x, a partir da qual se tem |fn (x) − f (x)| < δ, 4 ∀x ∈ D. 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Esta proposição equivale a afirmar que a sucessão numérica sup |fn (x) − f (x)| → 0 quando n → ∞. x∈D Exemplo 3 Para observar o significado geométrico √ da convergência unidefinidas em [0, 1]. forme consideremos a sucessão de funções fn (x) = x+nx n A fig. 2, onde estão representados os termos f1 , f2 e f10 da sucessão, sugere que fn converge pontualmente para a função f (x) = x definida em [0, 1]. √ x Com efeito, para x ∈ [0, 1], limn→∞ fn (x) = limn→∞ n + x = x. Esta convergência pontual é também uniforme pois √ √ x + nx x 1 − x = sup = → 0. sup n n x∈[0,1] x∈[0,1] n 1 f1 ( x ) = x+x f 2 ( x) = x + 2x 2 f ( x) = x 0.8 0.6 f10 ( x ) = 0.4 x + 10 x 10 0.2 00 0.2 0.4 0.6 0.8 1 Figura 2: Funções f1 (x), f2 (x), f10 (x) e f (x) = x Assim, para qualquer δ > 0, tem-se √ √ x + nx 1 x + nx − x ≤ sup − x = < δ n n n x∈[0,1] desde que n > 1δ . Consequentemente, a partir da ordem p, inteiro √ imediata 1 − x mente superior a δ (independente de x), é válida a desigualdade x+nx < n √ δ, ou seja, x+nx ∈]x − δ, x + δ[, para todo o x ∈ [0, 1] (ver fig. 3 em que se n tomou δ = 0.25, valor para o qual todos os termos da sucessão se encontram em ]x − 0.25, x + 0.25[ a partir da ordem p = 4). A convergência uniforme de uma sucessão de funções permite naturalmente definir a noção de convergência uniforme de uma série de funções. 5 1 / A g o sto / 2 0 0 5 f5 ( x) 1.2 1 0.8 f 10 ( x ) x + 0 , 25 0.6 x 0.4 x − 0 , 25 0.2 00 0.2 0.4 0.6 0.8 1 -0.2 Figura 3: Banda onde se encontram as funções fn (x) para n ≥ 4 Definição 5 Diz-se que a série de funções ∞ uniforn=0 fn , converge k memente em D quando a sucessão das somas parciais Sk = n=0 fn , k = 0, 1, . . ., for uma sucessão de funções uniformemente convergente em D. ∞ n Exemplo 4 A série geométrica n=0 x é uniformemente convergente em 1 1 0, 2 para a função 1−x . De facto, 1 − xk+1 1 1 xk+1 = sup = sup sup Sk (x) − − 1 − x x∈[0, 1 ] 1 − x 1 − x x∈[0, 1 ] 1 − x x∈[0, 12 ] 2 2 k k+1 e como 0 ≤ supx∈[0, 1 ] x1−x ≤ 12 conclui-se que supx∈[0, 1 ] Sk (x) − 2 2 quando k → ∞. Assim, pode escrever-se ∞ 1 1 n x = uniformemente em 0, . 1−x 2 n=0 1 1−x →0 Por outro lado, a mesma série, não é uniformemente convergente em [0, 1[ k+1 k+1 visto que supx∈[0,1] |x|1−x não existe em [0, 1[, pois, para qualquer k, |x|1−x → ∞ quando x tende para 1 à esquerda. Uma condição suficiente, muito útil na prática, para garantir a convergência uniforme de uma série de funções é a seguinte: 6 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Teorema 1 (Critério de Weierstrass) Suponhamos que a série numérica ∞ convergente de termos não negativos e que o termo geral n=0 an é uma série da série de funções ∞ n=0 fn definida em D verifica a condição |fn (x)| ≤ an , quaisquer que sejam a ordem n e o ponto x ∈ D. Então, uniformemente em D. (2) ∞ n=0 fn converge Dem. Observemos em primeiro lugar que a série ∞ é absolutan=0 fn mente convergente em D atendendo a (2), à convergência de ∞ n=0 an e a um dos critérios de comparação deséries de termos não negativos (ver, por exemplo, [8]). Consequentemente, ∞ n=0 fn é convergente em D. Designando por f a sua soma e por Sk a correspondente sucessão das somas parciais tem-se ∞ ∞ sup |Sk (x) − f (x)| = sup fn (x) ≤ an → 0, quando k → ∞, x∈D x∈D n=k+1 n=k+1 ∞ de novo atendendo a (2) e à convergência da série n=0 an . Daqui concluimos que ∞ f é uniformemente convergente em D, como queríamos. n=0 n As séries uniformementes convergentes possuem um conjunto de propriedades notáveis. Apresentaremos, sem demonstração, três destas propriedades por serem importantes para os objectivos que temos em vista (para as respectivas demonstrações ver, por exemplo, [4] ou [8]). Teorema 2 (Continuidade da função soma) A soma de uma série uniformemente convergente de funções contínuas é uma função contínua. Teorema 3 (Integrabilidade de uma série de funções) Toda a série ∞ fn n=0 uniformemente convergente de funções contínuas definidas num intervalo real [a, b], é integrável termo a termo, isto é, a em que f designa a soma de b f= ∞ n=0 ∞ n=0 a b fn , fn . 7 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Teorema 4 (Derivabilidade de uma série de funções) Seja fn uma sucessão de funções com derivada contínua num intervalo b] e suponhamos ∞ ∞ [a, que n=1 fn = f pontualmente em [a, b] e que n=1 fn é uniformemente convergente em [a, b]. Então f é derivável em [a, b] e tem-se ∞ fn = f em [a, b]. n=1 1.2.2 Definição de série trigonométrica Muitos fenómenos (como por exemplo o movimento da corda vibrante, as ondas electromagnéticas, a propagação do calor, etc.), são descritos por equações diferenciais que admitem soluções periódicas. Estas funções definemse precisamente do seguinte modo: Definição 6 Seja f uma função real definida em IR. Diz-se que f é uma função periódica se existe um número real T = 0 tal que, para todo o x ∈ IR se tem f (x + T ) = f (x). O número T diz-se um período de f . Como exemplos amplamente conhecidos de funções periódicas citamos as funções trigonométricas sen x e cos x, que são periódicas de período 2π. Mais geralmente, as funções sen nx e cos nx, em que n é um inteiro positivo, são periódicas de período 2π pois n 2π sen n x + = sen (nx + 2π) = sen nx n e 2π = cos (nx + 2π) = cos nx. cos n x + n Na fig 4 estão representadas, no intervalo [0, 4π], as funções sen x e sen 4x, periódicas de períodos 2π e π2 , respectivamente. Duas propriedades das funções periódicas são imediatamente reconhecidas: • Os múltiplos inteiros do período de uma função periódica são igualmente períodos da função (tem-se assim em particular que 2π é período de sen nx e cos nx, qualquer que seja n = 1, 2, . . . , visto que é múltiplo inteiro de 2π ; além disto, 2π é o menor período positivo comum a todas n aquelas funções). 8 1 / A g o sto / 2 0 0 5 período período 1 1 0.5 0 0.5 π 2π 3π 4π 0 -0.5 -0.5 -1 -1 π/2 sen x π 3π/2 2π 5π/2 6π 7π/2 4π sen 4x Figura 4: Funções periódicas • A soma de duas funções periódicas de período T é também uma função periódica de período T (por exemplo, na fig.5 está representada a função 1 + sen x + sen 4x de período 2π dado que todas as funções têm este 2 mesmo período; esta afirmação resulta do que foi dito atrás e do facto de qualquer número real não nulo poder ser tomado para período de uma função constante). período 3 2 1 0 π 2π 3π 4π -1 Figura 5: Função 1 2 + senx + sen4x As funções sen nx e cos nx (n = 1, 2, . . .) desempenham um papel central na teoria das séries de Fourier. Com efeito, elas estão na base da definição dos chamados polinómios trigonométricos, os quais são funções da forma Sk (x) = a0 + (a1 cos x + b1 sen x) + · · · + (ak cos kx + bk sen kx) 2 ou, abreviadamente, para k ≥ 1, 9 1 / A g o sto / 2 0 0 5 a0 (an cos nx + bn sen nx) , + 2 n=1 k Sk (x) = (3) em que a0 , a1 , a2 , . . . , b1 , b2 , . . . são números reais (o factor 12 do primeiro termo é introduzido por conveniência técnica como veremos adiante). O inteiro k que ocorre em (3), toma valores não negativos e diz-se a ordem do polinómio trigonométrico. Os polinómios trigonométricos conduzem à definição seguinte: Definição 7 Chama-se série trigonométrica à série a0 (an cos nx + bn sen nx) , + 2 n=1 ∞ (4) em que a0 , a1 , a2 , . . . , b1 , b2 , . . . são números reais que se designam por coeficientes da série. A expressão an cos nx + bn sen nx, n = 1, 2, . . . , diz-se a n-ésima harmónica da série, designando-se o polinómio trigonométrico Sk (x) dado em (3) por soma parcial de ordem k da série (4). A sucessão dos polinómios trigonométricos Sk (x), k = 0, 1, . . ., é constituída por funções periódicas de período 2π. Consequentemente, se Sk (x) convergir o seu limite terá de ser necessariamente uma função de período 2π (demonstre!). O exemplo seguinte permite ilustrar graficamente este facto. Exemplo 5 Consideremos a série trigonométrica ∞ π2 4 cos 2x 4 cos 3x π2 cos nx (−1)n = − + ··· , +4 − 4 cos x + 2 3 n 3 22 32 n=1 (5) cujas somas parciais S0 (x) = π2 3 π2 − 4 cos x 3 4 cos 2x π 2 4 cos 2x = − 4 cos x + S2 (x) = S1 (x) + 2 2 3 22 25 cos nx π2 +4 S25 (x) = (−1)n 3 n2 n=1 S1 (x) = S0 (x) − 4 cos x = se encontram representadas gráficamente, na fig.6. Esta figura sugere que, no intervalo [−π, π], a sucessão das somas parciais Sk (x) tende para a função 10 1 / A g o sto / 2 0 0 5 f (x) = x2 . Com veremos adiante, Sk (x) converge para a função periódica de período 2π representada na fig.8 (de notar que esta função constitui o prolongamento, por períodos de 2π a toda a recta IR, da função f (x) = x2 , x ∈ [−π, π]). 7 4.2 4 6 3.8 3.6 5 3.4 4 3.2 3 3 2.8 2 2.6 1 2.4 −π π 0 −π S0 (x) 0 π S1 (x) 8 8 7 6 6 5 4 4 3 2 2 1 −π 0 π −π S2 (x) 0 π S25 (x) Figura 6: Gráficos das somas parciais 1.2.3 Cálculo dos coeficientes de uma série trigonométrica uniformemente convergente O critério de Weierstrass dado no teorema 1 fornece uma condição suficiente de convergência para a série trigonométrica (4). Com efeito, para quaisquer x ∈ IR e n = 1, 2, . . . , tem-se |an cos nx + bn sen nx| ≤ |an | + |bn |, donde, se a série numérica |a0 | (|an | + |bn |) + 2 n=1 ∞ 11 1 / A g o sto / 2 0 0 5 for convergente conclui-se que a série trigonométrica (4) é uniformemente ∞ convergente em IR, para o que basta que as séries ∞ n=1 an e n=1 bn sejam absolutamente convergentes. Exemplo 6 A série ∞ n=1 sen nx n2 é uniformemente convergente em IR pois sen nx 1 ≤ 2, 2 n n ∀n = 1, 2, . . . 1 e ∞ n=1 n2 é uma série numérica convergente. Pelo teorema 2 fica então a saber-se que a sua soma é uma função contínua (ver fig.7 na qual esta função se encontra representada). De referir que a série dada é também absolutamente convergente. De assinalar contudo que as noções de convergência uniforme e convergência absoluta não estão relacionadas (ver [6, pág. 819]). 1 0.5 -10 -5 0 5 10 -0.5 -1 Figura 7: Soma da série ∞ n=1 sennx n2 Quando uma série trigonométrica converge uniformemente para uma função torna-se possível deduzir fórmulas que permitem calcular os coeficientes a0, an e bn (n = 1, 2, . . .) à custa da referida função. Para obter estas fórmulas necessitamos do seguinte resultado auxiliar: Lema 5 As funções 1, cos x, sen x, . . . , cos nx, sen nx, . . . 12 1 / A g o sto / 2 0 0 5 são ortogonais4 em [−π, π], isto é, π cos nx cos mxdx = 0, n = m −π π sen nx sen mxdx = 0, n = m −π π cos nx sen mxdx = 0, n, m = 0, 1, 2, . . . . −π Além disto, π 1dx = 2π, −π π −π 2 cos nxdx = π π e −π sen2 nxdx = π, n = 1, 2, . . . . cos α−β temos, para Dem. Atendendo a que cos α + cos β = 2 cos α+β 2 2 n = m, 1 π cos nx cos mxdx = [cos(n − m)x + cos(n + m)x] dx 2 −π −π π 1 sen(n − m)x sen(n + m)x = + = 0. 2 n−m n+m −π π Analogamentese provaria (utilizando outras fórmulas de transformação π logarítmica) que −π sen nx sen mxdx = 0, se n = m e que, para n, m = π 0, 1, 2, . . . , −π cos nx sen mxdx = 0. 2α 2α e sen2 α = 1−cos , as últimas duas Atendendo a que cos2 α = 1+cos 2 2 igualdades do lema provam-se como segue: π 1 π 2 cos nxdx = (1 + cos 2nx)dx = π 2 −π −π e π 1 π 2 sen nxdx = (1 − cos 2nx)dx = π. 2 −π −π Podemos agora deduzir as fórmulas para o cálculo dos coeficientes de uma série trigonométrica uniformemente convergente para uma função f definida em [−π, π]. Com efeito, nesta situação, pode escrever-se a0 + (an cos nx + bn sen nx), 2 n=1 ∞ f (x) = ∀x ∈ [−π, π]. (6) Tem-se então: b a 4 Duas funções contínuas f, g : [a, b] −→ IR dizem-se ortogonais em [a, b] se e só se f (x)g(x)dx = 0. 13 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Teorema 6 Suponhamos que é válida a igualdade (6) com convergência uniforme. Então, tem-se 1 π an = f (x) cos nxdx, n = 0, 1, 2, . . . (7) π −π e 1 bn = π π −π f (x) sen nxdx, n = 1, 2, . . . . (8) Dem. Como a série dada em (6) converge uniformemente em [−π, π] e os seus termos são funções contínuas, tem-se que a soma é contínua e é possível integrar a série termo a termo em [−π, π] se atendermos aos teoremas 2 e 3, respectivamente. Assim, integrando ambos os membros de (6) obtém-se, π π ∞ a0 + f (x)dx = (an cos nx + bn sen nx) dx 2 −π −π n=1 π π π ∞ a0 = dx + an cos nxdx + bn sen nxdx = πa0 2 −π −π −π k=1 π π atendendo a que −π cos nxdx = −π sen nxdx = 0, qualquer que seja n = π 1, 2, . . . . Da igualdade −π f (x)dx = πa0 deduz-se então a fórmula para a0 . Fixando um inteiro positivo m e multiplicando cada termo da série dada em (6) por cos mx, obtemos uma série uniformemente convergente em [−π, π], atendendo ao critério de Weierstrass (teorema 1). Consequentemente, é válida a igualdade ∞ a0 f (x) cos mx = cos mx + (an cos nx + bn sen nx) cos mx, ∀x ∈ [−π, π]. 2 n=1 Integrando ambos os membros desta igualdade em [−π, π], obtém-se, +bn π a0 f (x) cos mxdx = 2 −π π −π sen nx cos mxdx = am π −π π −π cos mxdx + ∞ an n=1 π −π cos nx cos mxdx + cos2 mxdx = πam , atendendo ao lema 5. Desta expressão obtém-se a fórmula (7). Resta assinalar que a dedução de (8) se faz de modo análogo multiplicando a série dada em (6) por sen mx. 14 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Percebe-se agora a razão de se ter considerado o factor 12 no 1o termo da série trigonométrica (4). Com efeito, a multiplicação de a0 por 12 possibilita que a fórmula para an , n = 1, 2, . . . , seja igualmente válida para n = 0. Este facto não teria lugar se o 1o termo da série fosse a0 , pois neste caso ter-se-ia π 1 a0 = 2π f (x)dx. −π 1.3 1.3.1 Séries de Fourier Definição Vimos atrás que a uma série trigonométrica uniformemente convergente em [−π, π] corresponde uma função (que é a sua soma) que verifica as igualdades (7) e (8). Inversamente, a cada função integrável5 em [−π, π] pode ser associada a série trigonométrica (4) com os coeficientes dados por (7) e (8). Definição 8 Seja f uma função integrável em [−π, π]. A série trigonométrica (4) com os coeficientes an e bn dados por (7) e (8) diz-se a série de Fourier de f. Escreve-se então a0 f (x) ∼ (an cos nx + bn sen nx) + 2 n=1 ∞ em que o símbolo “∼” se lê “tem associada a série de Fourier”. Os coeficientes an e bn dizem-se os coeficientes de Fourier de f. Surge assim o problema de saber se a série de Fourier de uma função f converge (e aqui há muitas noções de convergência!) e em caso afirmativo se converge para f. O assunto é delicado e a bibliografia enorme. Na secção seguinte analisaremos apenas um caso de convergência pontual com uma hipótese simples sobre a função f. Por agora, e antes de passarmos aos exemplos, convém fazer as seguintes notas sobre a definição anterior: Observação 1 Para uma função f periódica de período 2π, podemos naturalmente definir a série de Fourier de f como sendo a série trigonométrica (4) (com x ∈ IR), desde que existam os integrais (7) e (8). Observação 2 Modificando f num número finito de pontos a função resultante tem a mesma série de Fourier. De facto, os integrais que definem os coeficientes de Fourier não se alteram modificando f num número finito de pontos (ver, por exemplo, [4, pág. 534]). 5 No que se segue, a integrabilidade de uma função será sempre entendida no sentido de Riemman (para a definição deste integral ver, por exemplo, [8, pág. 170]) 15 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Observação 3 No caso de f ser par ou ímpar o cálculo dos coeficientes de Fourier simplifica-se. De facto, se f é par, tem-se π an = π2 0 f (x) cos nxdx, (n = 0, 1, 2, . . .) . bn = 0, (n = 1, 2, . . . .) Se f é ímpar, tem-se an = 0, (n = 0, 1, 2, . . .) . π bn = π2 0 f (x) sen nxdx, (n = 1, 2, . . .) Basta observar que o produto de duas funções pares ou o produto de duas funções ímpares é uma função par, que o produto de uma função ímpar por uma função par é ímpar, que cos nx é par e sen nx é ímpar e que, para qualquer função f integrável em [−a, a], se f é par, então a a f (x)dx = 2 f (x)dx −a e se f é ímpar, então 0 a −a f (x)dx = 0. Exemplo 7 Determinar a série de Fourier da função f de período 2π definida em [−π, π[ por 1 se −π ≤ x < 0 f (x) = . 2 se 0≤x<π Tem-se então, 1 π 1 0 1 π a0 = f (x)dx = 1dx + 2dx = 1 + 2 = 3 π −π π −π π 0 e, para n = 1, 2, . . . , 1 π 1 0 2 π f (x) cos nxdx = cos nxdx + cos nxdx an = π −π π −π π 0 2 sen nx π 1 sen nx 0 + =0 = π n π n −π 0 e 1 π 1 0 1 π f (x) sen nxdx = sen nxdx + 2 sen nxdx bn = π −π π −π π 0 2 cos nx π 1 cos nx 0 − − + = π n −π π n 0 1 1 cos nπ 2 cos nπ 1 = − + + − + π n n π n n 2 1 − cos nπ se n é impar nπ = = . 0 se n é par nπ 16 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Consequentemente, f (x) ∼ 3 2 + 2 π sen x + sen 3x 3 + ··· + sen(2n−1)x 2n−1 + ··· . Exemplo 8 Determinar a série de Fourier da função f de período 2π definida no intervalo [−π, π] por f (x) = x2 (fig. 8). 10 8 6 4 2 −2π −π 0 π 2π 3π Figura 8: f (x) = x2 Como f é par, bn = 0, n = 1, 2, . . . . Por outro lado, 2 π 2 2 a0 = x dx = π 2 π 0 3 e, para n = 1, 2, . . . , an 2 π 2 = x cos nxdx π 0 π 2 2 sen nx π 4 = − x sen nxdx x π n nπ 0 0 π 4 4 cos nx π 4 = − 2 cos nxdx = (−1)n 2 . x nπ n nπ 0 n 0 Consequentemente, a série de Fourier de f é ∞ π2 cos nx +4 (−1)n . 3 n2 n=1 Recorde-se que esta é a série considerada no exemplo 5. Vejamos agora como escrever a série de Fourier na forma complexa. Consideremos então as igualdades cos nx = 1 inx e + e−inx 2 e 17 sen nx = 1 inx e − e−inx , 2i 1 / A g o sto / 2 0 0 5 as quais se deduzem facilmente da fórmula de Euler eix = cos x + i sen x. Substituindo aquelas igualdades na série de Fourier obtém-se a0 + (an cos nx + bn sen nx) 2 n=1 ∞ 1 inx 1 inx a0 −inx −inx = an e + e + e −e + bn 2 2 2i n=1 ∞ an bn inx a0 an bn −inx = + + e + − e 2 2 2i 2 2i n=1 ∞ 1 a0 1 inx −inx + (an − ibn ) e + (an + ibn ) e = 2 2 2 n=1 ∞ (9) Pondo a0 1 1 , cn = (an − ibn ) e c−n = (an + ibn ) 2 2 2 a expressão (9) pode escrever-se na forma c0 = +∞ (10) cn einx , n=−∞ a qual se diz a forma complexa da série de Fourier. Os coeficientes cn , n = 0, ±1, ±2, . . . , dizem-se os coeficientes complexos de Fourier. A fórmula para o seu cálculo obtém-se imediatamente a partir da fórmula de Euler, de (7) e de (8): π 1 cn = f (x) e−inx dx, n = 0, ±1, ±2, . . . . (11) 2π −π Exemplo 9 Escrever na forma complexa a série de Fourier do exemplo anterior. 2 Visto que a0 = 2π3 , an = (−1)n n42 e bn = 0, deduz-se imediatamente das fórmulas (10) que (−1)n n22 , se n = 0 . cn = π2 , se n = 0 3 Então, a série de Fourier do exemplo anterior escreve-se na forma complexa do seguinte modo: ∞ (−1)n inx π2 +2 e . 3 n2 n=−∞ n=0 18 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Vejamos agora como obter os coeficientes cn directamente a partir de (11). Com efeito, se n = 0, π 1 π2 2 c0 = x dx = 2π −π 3 e, se n = 0, tem-se 2 −inx π π xe 1 1 2 π −inx 2 −inx cn = xe dx = + xe dx 2π −π 2π −in −π in −π −inx π π π −inx 1 1 e xe −inx = xe dx = − x dx inπ −π inπ −in −π −in −π π 2 1 e−inx 2π cos nπ 1 = (−1)n 2 . + = inπ −in in −in −π n 1.3.2 Convergência das séries de Fourier O problema fundamental da teoria das séries de Fourier consiste em saber sob que condições a série de Fourier de uma função f é convergente para essa função. Trata-se, como referimos acima, de um assunto delicado que tem originado a publicação de numerosos resultados estabelecendo condições para a convergência da série de Fourier (a exposição de vários destes resultados pode ser vista em [1], [2], [5],[7], [9] ou [10]). Nesta secção, demonstraremos apenas uma condição suficiente de convergência pontual supondo que a função f é seccionalmente suave no sentido da seguinte definição: Definição 9 Seja f uma função real definida no intervalo [a, b] ⊂ IR (excepto eventualmente num número finito de pontos) e representemos respectivamente por f (x+ ) e f (x− ) os seus limites laterais direito e esquerdo num ponto x. Então: 1. Diz-se que f é seccionalmente contínua em [a, b] se existe uma partição de [a, b], a = x0 < x1 < x2 < . . . < xN = b, tal que: (a) f é contínua em cada intervalo ]xi−1 , xi [, ∀i ∈ {1, . . . , N}; + (b) existem os limites f (x− i ), para i = 1, . . . , N bem como f (xi ), para i = 0, . . . , N − 1. 2. Diz-se que f é seccionalmente suave em [a, b] se f for seccionalmente contínua em [a, b] e a sua função derivada f for também uma função seccionalmente contínua em [a, b]. 19 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Em linguagem mais sugestiva podemos dizer que uma função f é seccionalmente suave em [a, b] se f e a sua derivada são contínuas em [a, b], ou então ambas as funções têm somente um número finito de descontinuidades em [a, b] onde todavia os respectivos limites laterais existem. Para a demonstração da referida condição suficiente de convergência pontual necessitamos dos seguintes resultados auxiliares. Lema 7 Seja f uma função periódica de período 2l. Então, se f é integrável no intervalo [−l, l], tem-se para qualquer número real λ: l l+λ f (x)dx = f (x)dx. −l −l+λ Dem. Notemos em primeiro lugar que é válida a igualdade b b+2l f (x)dx = f (x)dx, a (12) a+2l para o que é suficiente fazer a mudança de variável y = x + 2l no integral da esquerda. De (12) e das propriedades dos integrais resulta então l+λ −l −l+2l −l+λ+2l f = f+ f+ f −l+λ −l+λ −l −l+2l l −l+λ l −l f+ f+ f= f. = −l+λ −l −l −l Lema 8 (Integral de Dirichelet) Seja f uma função periódica de período 2π integrável em [−π, π]. Então, a soma parcial, Sk , da série de Fourier de f é dada por π 1 f (x + u) Dk (u)du, (13) Sk (x) = 2π −π em que Dk (u) = 1 + 2 kn=1 cos nu (a função Dk (u) designa-se por núcleo de Dirichelet). Dem. Da definição de soma parcial e das fórmulas (7) e (8) sai que π 1 Sk (x) = f (t)dt + 2π −π k 1 π 1 π (cos nx) f (t) cos ntdt + (sen nx) f (t) sen ntdt + π −π π −π n=1 k 1 1 π f (t) cos n(t − x) dt, + = π −π 2 n=1 20 1 / A g o sto / 2 0 0 5 atendendo a que cos(α − β) = cos α cos β + sen α sen β. Fazendo neste último integral a substituição t − x = u, vem π−x k 1 f (x + u) 1 + 2 cos nu du. Sk (x) = 2π −π−x n=1 Como a função integranda é periódica de período 2π, o lema 7 garante que esta igualdade é equivalente a (13). Lema 9 O núcleo de Dirichelet, Dk (u), verifica as seguintes igualdades: k sen(k+ 12 )u se u = 2mπ (m inteiro) sen 12 u cos nu = Dk (u) = 1 + 2 1 + 2k se u = 2mπ (m inteiro) n=1 e 1 π Dk (u)du = 1. π 0 Dem. Se u = 2mπ (m inteiro), cos nu = 1 e, portanto, 1+2 kn=1 cos nu = 1 + 2k. Caso u = 2mπ, a fórmula da soma duma progressão geométrica e a igualdade eix = cos x + i sen x permitem concluir que Dk (u) = 1 + 2 k n=1 cos nu = k inu e −iu 2 −iu k −iu + = e + ··· + e +e n=−k 2 k + 1 + eiu + eiu + · · · + eiu e−iu − e−i(k+1)u 1 − ei(k+1)u + = 1 − e−iu 1 − eiu iu/2 −iu −i(k+1)u e −e e e−iu/2 1 − ei(k+1)u = iu/2 + e 1 − e−iu e−iu/2 1 − eiu 1 1 sen k + 12 u ei(k+ 2 )u − e−i(k+ 2 )u . = = eiu/2 − e−iu/2 sen 12 u π Para provar a última parte do lema basta notar que 0 cos nudu = 0. Tem-se então k 1 π 1 π 1+2 Dk (u)du = cos nu du π 0 π 0 n=1 π k 2 π 1 1du + cos nudu = 1. = π 0 π n=1 0 O próximo resultado auxiliar é apresentado sem demonstração. Esta pode contudo ser vista em [5]. 21 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Lema 10 (de Riemann-Lebesgue) Seja f uma função integrável num intervalo [a, b]. Então b b lim f (x) cos λxdx = 0 e lim f (x) sen λxdx = 0. λ→∞ λ→∞ a a Podemos finalmente provar a anunciada condição suficiente de convergência pontual da série de Fourier: Teorema 11 Seja f uma função seccionalmente suave no intervalo [−π, π]. Então a sua série de Fourier converge em cada ponto x do intervalo ] − π, π[ para 12 [f (x+ ) + f (x− )] . Nos pontos x = −π e x = π a série converge para o valor 12 [f (−π) + f (π)] . Dem. Consideremos a extensão de período 2π da função f : [−π, π[→ IR e designemos esta extensão também por f. Então, atendendo ao lema 9 temse: 1 π f (x + u)Dk (u)du − f (x+ ) π 0 1 π 1 π = f (x + u)Dk (u)du − f (x+ )Dk (u)du π 0 π 0 1 π = f (x + u) − f (x+ ) Dk (u)du π 0 sen k + 12 u 1 π + du = f (x + u) − f (x ) π 0 sen 12 u 1 π f (x + u) − f (x+ ) u 1 = u du. (14) sen k + π 0 u 2 sen 12 u + (x ) é fiComo f (x) é seccionalmente suave, tem-se que limu→0+ f (x+u)−f u f (x+u)−f (x+ ) u + nito dado ser igual a f (x ).Consequentemente, o limite de u sen 1 u 2 quando u → 0+ é finito, donde se conclui que esta função é seccionalmente contínua em [0, π] e, portanto, integrável neste intervalo. A aplicação do lema de Riemann-Lebesgue permite concluir que (14) tende para zero e assim 1 π lim f (x + u)Dk (u)du = f (x+ ). k→∞ π 0 Analogamente se veria que 1 0 lim f (x + u)Dk (u)du = f (x− ). k→∞ π −π 22 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Somando as duas últimas igualdades e aplicando (13) obtémos lim Sk (x) = k→∞ 1 f (x+ ) + f (x− ) , 2 como era desejado. A fórmula dada para os casos em que x = −π e x = π deduz-se imediatamente se atendermos a que, para a extensão de f atrás definida, se tem f (−π − ) = f (π) e f (π + ) = f (−π). O teorema anterior estende-se de forma evidente às funções periódicas de período 2π seccionalmente suaves: Corolário 12 Seja f uma função definida em IR, periódica de período 2π e seccionalmente suave em [−π, π]. Então, a série de Fourier de f é convergente para cada x ∈ IR, sendo a sua soma igual a 12 [f (x+ ) + f (x− )] . Observação 4 Se, além de verificar as hipóteses deste corolário, a função f for contínua em IR então f (x) é a soma da sua série de Fourier, qualquer que seja x ∈ IR. Este facto resulta de nestas condições se ter f (x+ ) = f (x− ) = f (x) o que implica que 12 [f (x+ ) + f (x− )] = f (x). Exemplo 10 Mostrar que a série do exemplo 5 tem por soma a função π2 1 representada na fig.8 e deduzir daí que ∞ n=1 n2 = 6 . Vimos no exemplo 8 que a série do exemplo 5 é a série de Fourier da função da fig.8. Como esta função é contínua em IR, periódica de período 2π e seccionalmente suave em [−π, π], conclui-se da nota anterior que a sua série de Fourier converge para f (x), qualquer que seja x ∈ IR. Portanto, ∞ π2 cos nx f (x) = +4 (−1)n , 3 n2 n=1 donde, fazendo em ambos os membros x = π, obtemos a igualdade ∞ cos nπ π2 π = +4 (−1)n . 3 n2 n=1 2 Assim, 2π2 3 =4 ∞ n n (−1) n=1 (−1) n2 , ou seja, ∞ 1 π2 . = n2 6 n=1 23 1 / A g o sto / 2 0 0 5 1.3.3 Série de Fourier de uma função de período T Seja f uma função periódica definida em IR de período T integrável num T intervalo [c, c + T ] (c ∈ IR). Então, como a função g(y) = f 2π y é periódica de período 2π, é simples obter a série de Fourier de f . Com efeito, ∞ a0 T y = g(y) ∼ + an cos ny + bn sen ny (15) f 2π 2 n=1 e, portanto, fazendo a mudança de variável x = T y 2π e pondo ω = a0 + an cos nωx + bn sen nωx, 2 n=1 2π T tem-se ∞ f (x) ∼ em que e 2 an = T 2 bn = T c+T c c c+T (16) f (x) cos nωxdx (n = 0, 1, 2, . . .) (17) f (x) sen nωxdx (n = 1, 2, . . .). (18) Vejamos como se deduz a expressão de bn (a fórmula para an , n = 0, 1, 2, . . . , obtém-se modo análogo). Ora, tendo em conta (15) e (8) temde 1 π T T se que bn = π −π f 2π y sen nydy. Então, a mudança de variável x = 2π ye o lema 7 conduzem a T 2 2 1 π T 2π y sen nydy = f f (x) sen n x dx bn = π −π 2π T − T2 T T +c+ T c+T 2 2 2π 2π 2 2 f (x) sen n x dx = f (x) sen n x dx. = T − T2 +c+ T2 T T c T obtém-se (18) como se queria. Finalmente, fazendo ω = 2π T De notar que tudo o que atrás foi dito sobre as séries de Fourier para funções de período 2π mantém-se em vigor para funções periódicas de período T qualquer. Em particular, no caso da função f ser par ou ímpar os cálculos dos coeficientes também agora se simplificam. De facto, se f é par, tem-se T an = T4 02 f (x) cos nωxdx, (n = 0, 1, 2, . . .) . bn = 0, (n = 1, 2, . . . .) Se f é ímpar, tem-se 24 1 / A g o sto / 2 0 0 5 an = 0, bn = 4 T (n = 0, 1, 2, . . .) T 2 f (x) sen nωxdx, 0 (n = 1, 2, . . .) . Por outro lado, a série de Fourier (16) pode igualmente ser escrita na forma complexa por +∞ cn einωx , n=−∞ onde 1 cn = T c c+T f (x) e−inωx dx, n = 0, ±1, ±2, . . . . (19) Exemplo 11 Calcular a série de Fourier da função periódica de período 2 definida em [0, 2[ por 1 se x ∈ [0, 1[ f (x) = . 0 se x ∈ [1, 2[ Como T = 2 e a função é integrável em [0, 2] vem, 1 2 2 2 a0 = f (x)dx = 1dx + 0dx = 1 2 0 0 1 e, para n = 1, 2, . . . , 1 1 2 2 sen(nπx) f (x) cos(nπx)dx = cos(nπx)dx = =0 an = 2 0 nπ 0 0 e bn 1 1 2 2 cos(nπx) = f (x) sen(nπx)dx = sen(nπx)dx = − 2 0 nπ 0 0 n 1 − (−1) 0 se n é par . = = 2 se n é ímpar nπ nπ Assim, a série de Fourier de f é 1 2 sen 1πx sen 3πx sen(2k + 1)πx + + + ··· + + ··· , 2 π 1 3 2k + 1 ou seja, 1 2 sen(2k + 1)πx f (x) ∼ + . 2 π k=0 2k + 1 ∞ 25 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Uma vez que a função f verifica trivialmente as condições dadas no corolário 12, conclui-se que a série converge para f (x) se x é um valor não inteiro e para 12 se x é inteiro. Suponhamos agora que a função f, periódica de período T e integrável num intervalo [c, c + T ], é a soma da sua série de Fourier (16), isto é, a0 an cos nωx + bn sen nωx + f (x) = 2 n=1 ∞ (20) com an e bn dados por (17) e (18), respectivamente. Então, pode considerarse f como a soma de: • um termo constante de amplitude T ; a0 2 igual ao valor médio de f em qualquer intervalo • uma infinidade numerável de harmónicas de períodos T, T2 , . . . , Tn , . . . . Em Física e Engenharia, a harmónica de período T , isto é, a primeira harmónica da série de Fourier, é conhecida por harmónica fundamental sendo as restantes designadas simplesmente por harmónicas. Uma vez que, qualquer que seja o valor de n, é válida a igualdade an cos nωx + bn sen nωx = An cos(nωx − ϕn ) em que An = a2n + b2n , tan ϕn = abnn a série (20) pode escrever-se na forma a0 An cos(nωx − ϕn ). + f (x) = 2 n=1 ∞ A quantidade An diz-se a amplitude da harmónica de ordem n, nω a pulsação e ϕn a fase. Se, para cada harmónica de ordem n, associarmos ao valor da pulsação nω a amplitude An obtemos o chamado espectro de frequência da função f, que se representa graficamente por um diagrama de barras. Habitualmente diz-se que se realiza a análise de Fourier de uma função quando se determina o seu espectro de frequências. Exemplo 12 Determinar o espectro de frequências da função do exemplo anterior. 26 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Dado que T = 2, tem-se ω = 2π = π e, portanto, as pulsações nω tomam os T valores π, 2π, . . . , nπ, . . . . Por outro lado, como an = 0, para n = 1, 2, . . . , obtemos 0, se n é par An = . 2 |bn | = nπ , se n é ímpar Esta sucessão constitui o espectro de frequência da função do exemplo anterior, o qual se encontra representado na fig. 9. De notar que limn→∞ An = 0, facto que mais geralmente se observa em todas as séries de Fourier. Com efeito, pelo lema de Riemann-Lebesgue, tem-se limn→∞ an = limn→∞ bn = 0 o que implica que limn→∞ An = limn→∞ a2n + b2n = 0. An 1 0.5 π 2π 3π 4π 6π nω 5π Figura 9: Espectro de frequência 1.3.4 Séries de Fourier de funções importantes nas aplicações Vamos agora ver as séries de Fourier de algumas funções que aparecem habitualmente nas aplicações. Exemplo 13 (Onda quadrada) T T Desenvolver em série de Fourier a função de período T definida em − 2 , 2 por (ver fig. 10) −1 se x ∈ [− T2 , 0[ . f (x) = 1 se x ∈ [0, T2 [ Como f é ímpar tem-se an = 0. Pondo ω = bn 2π T tem-se, T T 2 4 4 − cos nωx 2 = f (x) sen nωxdx = T 0 T nω 0 T 4 4 1 − cos nω = [1 − (−1)n ] . = nωT 2 2nπ Assim, como a função f verifica as condições do corolário 12 conclui-se que 4 sen(2k + 1)ωx , f (x) = π k=0 2k + 1 ∞ 27 ∀x = m T (m ∈ ZZ). 2 1 / A g o sto / 2 0 0 5 1 -T/2 0 T/2 T -1 Figura 10: Onda quadrada Para x = m T2 (m ∈ ZZ) a série tem soma nula. Exemplo 14 (Onda triangular em série de Fourier a fun T )T Desenvolver ção de período T definida em − 2 , 2 por f (x) = |x| (ver fig. 11). -T -T/2 0 T/2 T Figura 11: Onda Triangular Como f é par tem-se bn = 0. Por outro lado, continuando a considerar ω = tem-se, T T 2 2 4 4 T a0 = |x| dx = xdx = T 0 T 0 2 e T T 2 2 sen nωx 4 4 sen nωx T2 4 an = x cos nωxdx = − x dx T 0 T nω T 0 nω 0 T 4 4 − cos nωx 2 − πωn se n é impar 2 . = − = 0 se n é par nωT nω 0 28 2π T 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Assim, dado que a função f verifica as condições da nota 4 é válida a igualdade ∞ 4 cos(2k + 1)ωx T , ∀x ∈ IR. f (x) = − 4 πω k=0 (2k + 1)2 Exemplo 15 (Onda dente de serra) T T Desenvolver em série de Fourier a função de período T definida em − 2 , 2 por f (x) = x (ver fig. 12). -T -T/2 0 T/2 T Figura 12: Onda dente de serra Como f é ímpar tem-se an = 0. Pondo ω = bn 2π T tem-se, T T 2 − cos nωx − cos nωx 2 4 4 x dx x sen nωxdx = − T nω T 0 nω 0 0 4 sen nωx T2 2 2 cos nπ + = − = (−1)n+1 . nω T nω nω nω 0 4 = T T 2 Uma vez mais, como a função f verifica as condições do corolário 12 é válida a igualdade 2 sen nωx f (x) = , (−1)n+1 ω n=1 n ∞ Para x = T 2 ∀x = T + mT (m ∈ ZZ). 2 + mT (m ∈ ZZ) a série tem soma nula. Exemplo 16 (Onda sinusoidal rectificada) Desenvolver em série de Fou π rier a função de período T definida por f (x) = sen T x (ver fig. 13). Neste caso é cómodo utilizar a fórmula (19). Fazendo então r = Tπ (a pulsação ω será portanto igual a 2r) e tendo em conta que sen rx = 2i1 (eirx − e−irx ) 29 1 / A g o sto / 2 0 0 5 1 -T 0 2T T Figura 13: Onda sinusoidal rectificada tem-se cn = = = = = 1 T 1 T −inωx f (x) e dx = (sen rx) e−2inrx dx T 0 T 0 T i(1−2n)rx 1 − e−i(1+2n)rx dx e 2iT 0 i(1−2n)rx T e e−i(1+2n)rx 1 − 2iT i(1 − 2n)r i(1 + 2n)r 0 1 −2 2 + 2iT i(1 − 2n)r i(1 + 2n)r 1 2 , π 1 − 4n2 atendendo a que ei(1−2n)rT = e−i(1+2n)rT = −1. Como cn é um número real 1 segue-se, por (10), que an = 2cn = π4 1−4n 2 , para n = 0, 1, 2, . . . e que bn = 0, para todo o n. Assim, recordando de novo a nota 4, conclui-se que 2 4 cos nωx f (x) = + , π π n=1 1 − 4n2 ∞ 1.4 ∀x ∈ IR. Aplicações das séries de Fourier As séries de Fourier aplicam-se à resolução de numerosos problemas oriundos da Física, da Engenharia e da própria Matemática. Referiremos seguidamente algumas aplicações. 1.4.1 Aplicação à resolução de equações diferenciais Veremos nesta subsecção a aplicação das séries de Fourier à resolução de uma equação diferencial ordinária. Para outras aplicações deste tipo ver, por exemplo, [1] ou [6]. 30 1 / A g o sto / 2 0 0 5 0 x (t ) Figura 14: Sistema massa-mola-amortecedor Consideremos o sistema constituído por uma mola vertical, com extremidade inferior fixa e um corpo de massa m preso à extremidade superior da mola e ligado a um amortecedor (fig.14). Supondo que o sistema é excitado por uma força f (t) em cada instante t (força de excitação), o deslocamento vertical do corpo, x(t) (isto é, a resposta do sistema medida no eixo vertical x em cada instante t), é governado pela equação diferencial mx + cx + kx = f (t), (21) em que c e k são constantes positivas que caracterizam o amortecimento do sistema e a rigidez da mola, respectivamente (para a dedução desta equação diferencial ver [6] ou [8]). Se f é uma força periódica sinusoidal (isto é, f (t) = a cos ωt + b sen ωt, em que a e b são constantes e ω é a pulsação da força), a solução geral de (21) é dada por x(t) = xh (t) + xp (t), onde xh (t) é a solução da equação homogénea associada e xp (t) é uma solução particular da forma x(t) = A cos ωt + B sen ωt, (22) com A e B constantes reais. Quando t tende para infinito (na prática, ao fim de um intervalo de tempo suficientemente longo) tem-se que xh (t) → 0 (verifique!). Consequentemente, a solução geral x(t) tende para a solução particular xp (t) quando t → ∞, dizendo-se então que esta última é a resposta do sistema em regime permanente. Pode assim afirmar-se que, em regime permanente, a resposta do sistema a uma excitação sinusoidal é uma oscilação harmónica de período igual ao da excitação. 31 1 / A g o sto / 2 0 0 5 O caso que nos interessa agora é aquele em que f é uma qualquer função periódica que coincide com a soma da sua série de Fourier. O exemplo seguinte mostra-nos, para uma destas funções, que a resposta do sistema em regime permanente é a soma de uma infinidade de oscilações harmónicas de períodos iguais ao período de f e a submúltiplos deste. Exemplo 17 Para o sistema de massa-mola-amortecedor descrito acima consideremos m = 1 Kg, c = 0, 02 Ns/m e k = 25 N/m. Então (21) escreve-se na forma: x + 0, 02x + 25x = f (t). (23) Supondo que f é a onda triangular de período 2π dada em [−π, π] por −t − π2 se − π ≤ t < 0 f (t) = , t − π2 se 0 ≤ t ≤ π pretende-se determinar a resposta do sistema em regime permanente. Designando por g(t) a função do exemplo 14 com T = 2π (e portanto ω = 1) tem-se ∞ π 4 cos(2k + 1)t , ∀t ∈ IR. g(t) = − 2 π k=0 (2k + 1)2 Notando que f (t) = g(t) − π2 vem 1 4 1 f (t) = − cos t + 2 cos 3t + 2 cos 5t + · · · . π 3 5 (24) Consideremos então a equação diferencial x + 0, 02x + 25x = − 4 cos nt (n = 1, 3, 5, . . .) n2 π (25) cujo lado direito é o termo geral da série de Fourier (24). Atendendo a (22), a solução desta equação em regime permanente é da forma xn (t) = An cos nt + Bn sen nt. (26) Calculando xn (t) e xn (t) e substituindo em (25) obtém-se 4(25 − n2 ) An = − n2 πD e Bn = − 0, 08 , nπD (27) em que D = (25 − n2 )2 + (0, 02n)2 . Seja x(t) = x1 (t) + x3 (t) + x5 (t) + · · · = ∞ x2k+1 (t) (28) k=0 32 1 / A g o sto / 2 0 0 5 a série de Fourier cujos termos são dados por (26). De (27) e do critério (teorema 1) conclui-se que esta série bem como as séries ∞de Weierstrass ∞ são uniformementeconvergentes. Consequenk=0 x2k+1 (t) e k=0 x2k+1 (t) ∞ temente, pelo teorema 4, k=0 x2k+1 (t) = x (t) e ∞ k=0 x2k+1 = x (t). Então, substituindo em (23) x(t), x (t) e x (t) pelas respectivas séries de Fourier obtém-se uma proposição verdadeira concluindo-se, portanto, que a primeira daquelas séries é solução da equação (23) em regime permanente. De referir finalmente que o procedimento utilizado no exemplo anterior para mostrar que (28) é solução de (23) constitui uma aplicação do importante princípio da sobreposição que, para este caso, se enuncia como segue: Se x1 e x2 são soluções da equação (23) com f = f1 e f = f2 , respectivamente, então x = x1 + x2 é solução da mesma equação com f = f1 + f2 . 1.4.2 Aproximação de uma função por um polinómio trigonométrico Vimos atrás que uma função periódica f seccionalmente suave pode ser decomposta na soma de uma infinidade de harmónicas que constituem a sua série de Fourier. Considerando a soma parcial de ordem k desta série, a0 Sk (x) = + (an cos nx + bn sen nx), 2 n=1 k (29) passamos então a dispor de um polinómio trigonométrico de ordem k que aproxima a função f . Supondo que f é periódica de período 2π, a questão que se põe agora é a de saber se (29) é a “melhor” aproximação de f por um polinómio trigonométrico de ordem k, no intervalo [−π, π]. Considerando o conjunto dos polinómios trigonométricos, Tk , de ordem k, entende-se por “melhor” polinómio que aproxima f em [−π, π] aquele que minimiza o valor de π E= [f (x) − Tk (x)]2 dx, (30) −π quantidade que mede o erro da aproximação de Tk a f no intervalo [−π, π]. E designa-se habitualmente por erro quadrático total de Tk relativo a f em [−π, π]. Então, o problema anterior consiste em determinar o polinómio trigonométrico Tk para o qual E tem o menor valor possível. Este polinómio é precisamente a soma parcial da série de Fourier (29) como se mostra no teorema seguinte: Teorema 13 (Propriedade mínima dos coeficientes de Fourier) Seja f uma função de periódica de período 2π integrável em [−π, π]. Então, para 33 1 / A g o sto / 2 0 0 5 qualquer valor de k fixo, o erro quadrático total (30) é mínimo se e só se os coeficientes de Tk forem os coeficientes de Fourier de f . O valor mínimo do erro é dado por π k 2 a f 2 (x)dx − π 0 + (a2n + b2n ) , (31) Emin = 2 −π n=1 sendo an e bn os coeficientes de Fourier de f. Dem. Seja A0 (An cos nx + Bn sen nx). + 2 n=1 k Tk (x) = 34 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Então, pela ortogonalidade das funções trigonométricas (lema 5) tem-se π E = [f (x) − Tk (x)]2 dx −π π f 2 (x) − 2f (x)Tk (x) + Tk2 (x) dx = π π −π π 2 f (x)dx − 2 f (x)Tk (x)dx + Tk2 (x)dx = −π −π π −π π A0 f 2 (x)dx − 2 f (x)dx − = 2 −π −π π π k An f (x) cos nxdx − Bn f (x) sen nxdx + −2 n=1 π −π k −π π A20 2 dx + A2n cos2 nxdx + Bm + 4 −π −π n=1 k π An Bm cos nx sen nxdx +2 n,m=1 n=m π −π sen2 nxdx + −π k a A A2 0 0 f 2 (x)dx − 2π (An an + Bn bn ) + 0 + + = 2 2 −π n=1 k A2n + Bn2 +π π n=1 k (A0 − a0 )2 +π f (x)dx + π (An − an )2 + (Bn − bn )2 − = 2 −π n=1 k 2 a (a2k + b2k ) , −π 0 + 2 n=1 π em que an e bn são os coeficientes de Fourier. Então −π [f (x) − Tk (x)]2 dx é mínimo quando An = an , n = 0, 1, . . . , n e Bn = bn , n = 1, 2, . . . , n, isto é, quando Tk (x) = Sk (x). O valor mínimo de E, Emin , obtém-se imediatamente substituindo na expressão acima An e Bn por an e bn , respectivamente. π 2 Corolário 14 (Desigualdade de Bessel) Os coeficientes de Fourier de uma função f periódica de período 2π integrável em [−π, π] verificam a desigualdade de Bessel: ∞ a20 2 1 π 2 2 + (an + bn ) ≤ f (x)dx. 2 π −π n=1 35 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Dem. Como o erro quadrático total é não negativo, segue-se da fórmula (31) que π k a20 2 2 2 + f (x)dx − π (an + bn ) ≥ 0. 2 −π n=1 Passando ao limite esta desigualdade quando k tende para infinito, obtemos a desigualdade de Bessel. Apresentamos agora sem demonstração (ver, por exemplo, [5]) um outro resultado que provém da aplicação da teoria das séries de Fourier à aproximação de funções. Teorema 15 Seja f uma função periódica de período 2π contínua em IR. Então para cada > 0 existe um polinómio trigonométrico a0 (an cos nx + bn sen nx) + 2 n=1 k Tk (x) = tal que para qualquer x ∈ IR, |f (x) − Tk (x)| < . Os dois teoremas anteriores permitem provar a seguinte igualdade: Teorema 16 (Identidade de Parseval) Seja f uma função contínua periódica de período 2π. Então, os coeficientes de Fourier da função f verificam a igualdade de Parseval: ∞ a20 2 1 π 2 + f (x)dx = (an + b2n ). π −π 2 n=1 Dem. Pelo teorema 15 para cada > 0 existe um polinómio trigonométrico Tk de ordem k tal que |f (x) − Tk (x)| < . Esta desigualdade, o teorema 13 e o corolário 14 implicam que ∞ a20 2 1 π 2 + f (x)dx − (an + b2n ) 0 ≤ π −π 2 n=1 π k 2 a 1 f 2 (x)dx − 0 + (a2n + b2n ) ≤ π −π 2 n=1 π 1 π 1 2 [f (x) − Sk (x)] dx ≤ [f (x) − Tk (x)]2 dx = π −π π −π π 1 2 dx = 22 . < π −π Fazendo → 0+ o teorema fica demonstrado. 36 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Referências [1] Broman, A., Introduction to Partial Differential Equations—from Fourier Series to Boundary-value Problems, Dover Publications, New York, 1989. [2] Bugrov, I. S. e Nikolski, S. M., Matemática para Engenharia, Volume 3, Editora Mir, Moscovo, 1987. [3] Davis, P. J. e Hersh, R., A Experiência Matemática, Gradiva, Lisboa, 1995. [4] Ferreira, J. C., Introdução à Análise Matemática, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1987. [5] Figueira, M. S. R., Fundamentos de Análise Infinitesimal, Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências de Lisboa, 1996. [6] Kreyszig, E., Advanced Engineering Mathematics, John Wiley & Sons, New York, 1993. [7] Piskounov, N., Cálculo Diferencial e Integral, Volume II, Lopes da Silva Editora, Porto, 1987. [8] Sarrico, C., Análise Matemática—Leituras e Exercícios, Gradiva, Lisboa, 1997. [9] Strichartz, R. S., The Way of Analysis, Jones and Bartlett Publishers, Boston, 1995. [10] Tolstov, G. P., Fourier Series, Dover Publications, New York, 1976. 37 1 / A g o sto / 2 0 0 5 Exercícios propostos 1. Mostre, considerando n, m ∈ ZZ, que: π (a) −π sin (mx) dx = 0; π 2π, se m = 0 ; (b) −π cos (mx) dx = 0, se m = 0 π (c) −π sin (nx) cos (mx) dx = 0; π π, se m = n ; (d) −π cos (nx) cos (mx) dx = 0, se m = n π π, se m = n (e) −π sin (nx) sin (mx) dx = ; 0, se m = n 2. Suponha que f é representável em série de Fourier. Mostre que: (a) Se f é ímpar, então 1 π an = f (x) cos (nx) dx = 0, para n = 0, 1, 2, . . . , etc π −π (b) Se f é par, então 1 π bn = f (x) sin (nx) dx = 0, para n = 1, 2, . . . , etc π −π 3. Justifique a verdade ou falsidade das seguintes afirmações: (a) A série de Fourier de f (x) = x2 ,x ∈ [−π, π] é f (x) ∼ ∞ bn sin nx. n=1 (b) Se f periódica de período 2π é ímpar, então g(x) = f (x) sin x definida em [−π, π] é par. (c) A série de Fourier associada a f (x) = x, x ∈ I = − π2 , π2 , converge uniformemente para f . (d) A série de Fourier associada à função h (t) = 5−3 cos (x)−2 sin (x) tem somente 3 coeficientes não nulos. 4. Determine a série de Fourier associada à função periódica: 38 1 / A g o sto / 2 0 0 5 (a) f (x) = x, x ∈ [−π, π]. 1 , x ∈ [0, π] . (b) f (x) = −1 , x ∈ [−π, 0[ (c) f (x) = x2 , x ∈ [−π, π]. 5. Considere a função periódica de período T = 2 definida em [−1, 1[ por f (x) = 1 + x2 . (a) Determine a série de Fourier associada a f em [−1, 1[ . (b) Diga, justificando, qual a soma da série anterior. 6. Considere a função periódica f de período T = 2a, definida por f (x) = |x| no intervalo −a < x < a, sendo a uma constante real. (a) Determine a série de Fourier associada a f. (b) Calcule justificando, a soma da série. 7. Considere a função 1 se x ∈ [k, k + 1[ com k inteiro par. f (x) = 0 se x ∈ [k, k + 1[ com k inteiro ímpar. (a) Indique o seu período e represente-a graficamente no intervalo [0, 4]. (b) Determine a série de Fourier associada a f . 8. Considere a função f periódica de período 2π, definida no intervalo ]0, 2π] por π−x f (x) = 2 (a) Determine a série de Fourier associada a f . (b) Utilizando a série obtida em (a), mostre, justificando, que π 1 1 1 = 1 − + − + ... 4 3 5 7 9. Considere a função periódica f de período T = 2π com a seguinte representação geométrica (a) Determine a série de Fourier associada a f em [−π, π[ . 39 1 / A g o sto / 2 0 0 5 y π -π -3π π 0 3π x Figura 15: Função com período T = 2π. (b) Diga, justificando, qual a soma da série anterior e mostre que 2 π =8 ∞ n=1 1 . (2n − 1)2 10. Considere a função periódica f de período T = 3 com a seguinte representação geométrica y 3 -3 0 3 6 x Figura 16: Função com período T = 3. (a) Determine a série de Fourier associada a f em [0, 3[ . (b) Diga, justificando, qual a soma da série anterior. Soluções 3a) Falso; 3b) Verdadeiro; 3c) Falso; 3d) Verdadeiro; 4a) f (x) ∼ 4b) f (x) ∼ ∞ ∞ 2 n=1 4 m=0 (2m+1)π n (−1)n+1 sin (nx) ; sin [(2m + 1) x]; 4c) ∞ (−1)n π2 cos (nx) ; +4 f (x) ∼ 3 n2 n=1 40 1 / A g o sto / 2 0 0 5 5a) f (x) ∼ 4 3 + ∞ n=1 2 2 nπ (−1)n cos (nπx); 5b) 2 ∞ 4 2 (−1)n cos (nπx) ; f (x) = + 3 n=1 nπ 1 6a) f (x) ∼ π2 − π4 ∞ n=1 (2n−1)2 cos ((2n − 1) x); 7a) T = 2; 7b) f (x) ∼ ∞ n+1 1 1 1 + nπ sin (nx); 9a) f (x) ∼ sin (nπx); 8a) f (x) ∼ ∞ n=1 1 + (−1) n=1 2 n ∞ ∞ 1 4 π 3 3 + k=1 (2k−1)2 π cos [(2k − 1) x]; 10a) f (x) ∼ 2 − π k=1 n sin 2πnx ; 10b) 2 3 x se x ∈ ]0, 3[ g (x) = . 3 se x = 0 ∨ x = 3 2 41 1 / A g o sto / 2 0 0 5