Publicações E ste é um tema freqüente nas consultas ao Departamento Jurídico do Secovi Rio. Costuma ser trazido por síndicos, que apresentam fatos e desejam saber se podem demitir o empregado por justa causa. A maioria dos casos relatados pode ser enquadrada em uma das hipóteses descritas no art. 482 da CLT, que ensejam tal modalidade de resolução contratual. Tratase, porém, de um assunto muito polêmico. Para que a justa causa seja aplicada, cabe ao empregador comprovar a ocorrência das infrações do empregado ao contrato de trabalho, de forma expressa e incontestável, para que o juiz possa decidir com justiça. Assim, o tema central desta matéria é apresentar os requisitos básicos recomendados pela doutrina para que a justa causa seja deferida pelo julgador. Inicialmente, cabe trazer uma discussão doutrinária. Precisamos saber se as hipóteses de justa causa são somente aquelas previstas no art. 482 da CLT, chamadas pela doutrina de “genéricas”, ou se também se aplicam normas previstas em outros dispositivos da CLT e leis esparsas, chamadas de “específicas”, como, por exemplo, a que trata da declaração falsa na utilização do valetransporte (Decreto nº 95.247/87, art. 7º, § 3º). Esse assunto é muito importante e atual, pois a recomendação do Secovi Rio é a de que o valetransporte seja concedido através do fornecimento do RioCard. Trata-se de uma modalidade que possibilita saber quais os meios de transporte utilizados e declarados pelo empregado. Assim, é possível constatar se ele solicitou mais transporte do que necessita ou se outras pessoas utilizam o benefício concedido pelo condomínio ao funcionário em função da relação de emprego. Para que seja aplicada a justa causa, deve haver uma legislação anterior que diga que o ato praticado pelo empregado é motivador do término do contrato. O caráter determinante da falta A atualidade ou imediatidade da falta é requisito muito importante, pois a relação de emprego é uma relação de confiança e de boa-fé, e a falta grave a rompe. Assim, quando uma falta é cometida, o empregador deve agir de forma imediata, logo após tomar conhecimento da infração contratual, ou a partir do momento em que ficar comprovada a culpa do empregado, no caso de procedimento administrativo instaurado pelo empregador para averiguação, cujo decurso do tempo variará de acordo com a complexidade do fato ou normas da empresa. A demora na aplicação de punição pode comprometer a imputação da justa causa, pois pode ser entendida como renúncia ou perdão tácito pelo empregador. Assim, se, embora comprovada a infração grave, o empregado continuar trabalhando por período relativamente longo e com a demora da ação do empregador, a justa causa não mais poderá ser aplicada. Esse requisito será analisado pelo juiz. Embora não haja lei específica, a aplicação de penalidades pedagógicas, no sentido de conduzir o empregado ao cumprimento do contrato, é aceita pela doutrina e jurisprudência. O empregador pode fazer uma advertência verbal, advertência escrita ou suspensão ou, até mesmo, demitir o empregado por justa causa com a finalidade de preservar a boa ordem na empresa. A doutrina entende que, nas faltas dolosas (intencionais), não há necessidade de respeito a essa gradação, podendo ser aplicada diretamente a demissão. É o caso, por exemplo, de agressão física ao empregador sem justo motivo. Já para as faltas culposas (negligência, imprudência e imperícia), devem ser aplicadas penali- COLETÂNEA DE ARTIGOS JURÍDICOS | 01 Demissão por justa causa | publicações SECOVI RIO | dades mais leves e de forma gradativa. Estas só se tornam graves em função da reiteração dos fatos, como faltas e atrasos constantes, crônicos. Recomendamos que, sempre que possível, seja observada essa gradação, pois, como o julgamento se prenderá a cada caso concreto, quanto mais documentado o condomínio estiver, mais fácil será a prova. Outro requisito importante é que o empregado não seja punido duas vezes pelo mesmo fato, pois, nesse caso, a segunda penalidade será anulada. Assim, o empregador não pode suspender o empregado e, no seu retorno ao trabalho, demiti-lo por justa causa, com base no mesmo fato que motivou a suspensão. Todos os requisitos aqui expostos devem ser observados com bastante cuidado pelo empregador para que a punição aplicada seja confirmada pela Justiça. A doutrinadora Alice Monteiro de Barros entende que também devem ser observados outros aspectos subjetivos, como o passado funcional do empregado, o tempo de serviço prestado à empresa, o nível educacional, a personalidade do faltoso, as condições emocionais em que a falta foi cometida, a forma como agiu o empregador com relação a comportamentos da mesma natureza praticados em circunstâncias semelhantes, bem como aspectos objetivos, entre eles a função exercida pelo empregado na empresa e o ambiente de trabalho. Exemplo: um pedreiro falar palavrões em seu ambiente de trabalho não constitui uma falta tão grave quanto a de um empregado que utiliza linguagem vulgar em um local de cortesia. Como se vê, a questão não é de fácil aplicação, bem como a Justiça Trabalhista, no exercício de equilibrar a relação contratual empregatícia, muitas vezes abranda as faltas cometidas pelo empregado, sendo esta situação facilitada quando o empregador não adota as medidas adequadas à configuração da justa causa. Por derradeiro, lembramos que é vedado ao empregador lançar anotações desabonadoras na Carteira Profissional do trabalhador. Ementas de jurisprudência TRT 1ª REGIÃO (RJ) PROC. Nº 01750-2002-022-01-00 JUSTA CAUSA. ATO DE IMPROBIDADE. ÔNUS DA PROVA. JUSTA CAUSA. ÔNUS DA PROVA. A imputação de improbidade ao empregado para o despedimento por justa causa é a mais grave das hipóteses contidas no artigo 482 da consolidação das leis do trabalho, razão pela qual deve ser provada de modo irrefutável por quem a alega. TRT 2ª REGIÃO (RJ) NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - 00797-2005-060-02-00 JUSTA CAUSA - PROVA ROBUSTA - ÔNUS DA RECLAMADA - ENCARGO CUMPRIDO - por se tratar de medida extrema e considerando os nefastos efeitos decorrentes de sua aplicação na vida profissional e até mesmo pessoal do trabalhador, para a caracterização da falta grave imputada ao empregado exige-se a produção de sólidos elementos de prova, encargo que compete ao empregador por força dos artigos 818 da CLT e 333, II do CPC, do qual se desincumbiu. RECURSO IMPROVIDO. TRT 2ª REGIÃO (RJ) NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - 00733-2005-301-02-00 RECURSO ORDINÁRIO. DISPENSA POR JUSTA CAUSA. EMPREGADO FLAGRADO 2 (DUAS) VEZES DORMINDO NO SEU POSTO DE SERVIÇO DURANTE O HORÁRIO DE TRABALHO. COMPORTAMENTO DESIDIOSO. A circunstância de um vigilante dormir mais de uma vez no seu posto de serviço durante o horário de trabalho configura desídia (alínea “e” do art. 482 da CLT), pois tal conduta revela falta de cumprimento de um dos deveres contidos no contrato de trabalho. Espera-se que o vigilante permaneça em estado de vigília para garantir a segurança patrimonial e até mesmo física do seu empregador. Ainda que o trabalhador tenha sido escalado para o turno da noite, não há justificativa para que o mesmo durma no seu posto de trabalho. Caso o trabalhador não tenha condições físicas de permanecer em guarda, deverá comunicar o seu superior hierárquico, mas o que não se pode admitir é que o empregado simplesmente ignore os seus deveres funcionais, o que por certo revela desinteresse de sua parte. TRT 2ª REGIÃO (SP) NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - 01149-2003-014-02-00 RECURSO ORDINÁRIO. JUSTA CAUSA. DESÍDIA. ART. 482, “E”, DA CLT. CARACTERIZAÇÃO. Trata-se de falta que, usualmente, exige reiteração do procedimento. As punições anteriores são necessárias, sob pena de se entenderem inexistentes as faltas, não para agravar a última penalidade, mas para do conjunto delas se inferir o elemento intencional, o “animus” culposo, aquela imprudência ou negligência caracterizadora da desídia. Somente após a confirmação de que, apesar das punições, não houve retorno ao redil dos diligentes é que, com a última infração, está caracterizada a justa causa.