Limite e continuidade Noção intuitiva de limite Considere a função f ( x ) = x 2 − 1. Esta função está definida para todo x ∈ℜ , isto é, qualquer que seja o número real xo , o valor f ( xo ) está bem definido. Exemplo 1. Se xo = 2 então f ( xo ) = f (2 ) = 2 2 − 1 = 3 . Dizemos que a imagem de xo = 2 é o valor f (2 ) = 3 . Graficamente: x2 − 1 . Esta função está definida x −1 ∀x ∈ℜ − {1} . Isto significa que não podemos estabelecer uma imagem quando x assume o valor 1. Considere agora uma outra função g (1) = g( x ) = 12 − 1 0 = ??? 1−1 0 Quando dividimos a por b procuramos um número c tal que o produto bc resulte em a. a 6 = c ⇔ bc = a . Por exemplo, = 2 ⇔ 3 ⋅ 2 = 6 . 3 b 0 = x ⇔ 0 ⋅ x = 0 , para qualquer valor de x ∈ ℜ , isto é, infinitos valores de x . Daí a 0 indeterminação no valor de x... Se fizermos 0 simboliza uma indeterminação matemática. Outros tipos de indeterminações matemáticas 0 serão tratados mais adiante. Álvaro Fernandes 3 Como a variável x não pode assumir o valor 1 na função g, vamos estudar o comportamento desta função quando x está muito próximo de 1, em outras palavras, queremos responder a seguinte pergunta: Qual o comportamento da função g quando x assume valores muito próximos (ou numa vizinhança) de 1, porém diferentes de 1? A princípio o estudo do limite visa estabelecer o comportamento de uma função numa vizinhança de um ponto (que pode ou não pertencer ao seu domínio). No caso da função f, qualquer valor atribuído a x determina imagem única, sem problema algum. Mas na função g, existe o ponto x = 1 que gera a indeterminação. x2 − 1 Estudemos os valores da função g( x ) = quando x assume valores próximos de 1, x −1 mas diferente de 1. Para isto vamos utilizar as tabelas de aproximações. Observação: Podemos nos aproximar do ponto 1: • por valores de x pela direita: • por valores de x pela esquerda: Tabelas de aproximações As tabelas de aproximações são utilizadas para aproximar o valor da imagem de uma função (se existir) quando a variável x se aproxima de um determinado ponto. Atribuindo a x valores próximos de 1, porém menores (pela esquerda) do que 1: (tabela A) x g(x) 0 1 0,5 1,5 0,75 1,75 0,9 1,9 0,99 1,99 0,999 1,999 0,9999 1,9999 Atribuindo a x valores próximos de 1, porém maiores (pela direita) do que 1: (tabela B) x g(x) 2 3 1,5 2,5 1,25 2,25 1,1 2,1 1,01 2,01 1,001 2,001 1,0001 2,0001 Observe que podemos tornar g(x) tão próximo de 2 quanto desejarmos, bastando para isso tomarmos x suficientemente próximo de 1. De outra forma, convencionaremos: “O limite da função g(x) quando x se aproxima de (tende a) 1 é igual a 2”. Simbolicamente escrevemos: lim g( x ) = 2 x →1 Álvaro Fernandes ou x2 − 1 lim = 2. x →1 x −1 4 Observação: Os dois tipos de aproximações que vemos nas tabelas A e B são chamados de limites laterais. ∗ Quando x tende a 1 por valores menores do que 1 (tabela A), dizemos que x tende a 1 pela esquerda, e denotamos simbolicamente por x → 1− . Temos então que: lim− g( x ) = 2 ou x →1 lim− x →1 Obs: O sinal negativo no expoente do no 1 simboliza apenas que x se aproxima do número 1 pela esquerda. x2 − 1 =2 x −1 ∗ Quando x tende a 1 por valores maiores do que 1 (tabela B), dizemos que x tende a 1 pela direita, e denotamos simbolicamente por x → 1+ . Temos então que: lim+ g( x ) = 2 ou x →1 lim+ x →1 x2 − 1 =2 x −1 Obs: O sinal positivo no expoente do no 1 simboliza apenas que x se aproxima do número 1 pela direita. Definição intuitiva de limite (para um caso geral) Seja f uma função definida num intervalo I ⊂ ℜ contendo a, exceto possivelmente no próprio a. Dizemos que o limite de f(x) quando x se aproxima de a é L ∈ℜ , e escrevemos lim f ( x ) = L , se, e somente se, os limites laterais à esquerda e à direita de a são iguais x→a à L, isto é, lim− f ( x ) = lim+ f ( x ) = L . Caso contrário, dizemos que o limite não existe, em x→a símbolo lim f ( x ) . x →a x→a Ainda com relação à função g( x ) = lim x →1 x2 − 1 , podemos então concluir, pela definição, que: x −1 x2 − 1 x2 − 1 = 2 , porque os limites lateriais lim+ x →1 x − 1 x −1 e lim− x →1 x2 − 1 são iguais a 2. x −1 De forma equivalente, lim g( x ) = 2 porque x →1 lim g( x ) = lim+ g( x ) = 2 . x → 1− x →1 Será necessário sempre construir tabelas de aproximações para determinar o limite de uma função, caso ele exista? Não! Há uma forma bem mais simples, como veremos a seguir. Álvaro Fernandes 5 Cálculo de uma indeterminação do tipo 0 0 0 , deveremos simplificar* a 0 expressão da função envolvida. Logo após, calculamos o limite da função substituindo, na expressão já simplificada, o valor de x. Sempre que nos depararmos com uma indeterminação do tipo * Para simplificar a expressão você deve utilizar fatoração, conjugado de radical, dispositivo prático de Briot-Ruffini para dividir polinômios, etc... Vejamos os exemplos seguintes. x2 − 1 . Exemplo 2. Determine lim g( x ) , onde g( x ) = x →1 x −1 0 que é uma indeterminação 0 matemática! Quando a variável x está cada vez mais próxima de 1, a função g está cada vez mais próxima de quanto? Devemos então simplificar a expressão da função g e depois fazer a substituição direta. Observe que substituindo x por 1 na função g obtemos g (1) = g (x ) = x 2 − 1 ( x − 1)( x + 1) = ( x + 1), ∀x ≠ 1 Então: = (x − 1) x −1 lim g ( x ) = lim x →1 x →1 (x − 1)(x + 1) = lim (x + 1) = 1 + 1 = 2 . x2 − 1 = lim x →1 x − 1 x →1 x −1 Logo, lim x →1 x2 − 1 = 2. x −1 Chegamos à mesma conclusão da análise feita pelas tabelas de aproximações, porém de uma forma mais rápida e sistemática. Não mais utilizaremos as tabelas de aproximações para casos semelhantes a este!! x2 − 1 x2 − 1 = 2 significa que a função g( x ) = está Vale lembrar que a expressão lim x →1 x −1 x −1 tão próxima de 2 assim como x está suficientemente próximo de 1, porém diferente de 1. Graficamente podemos verificar isso: x2 − 1 , ∀x ≠ 1. Gráfico da função g( x ) = x −1 Álvaro Fernandes 6 Exemplo 3. Determine lim x →1 0 x −1 (observe a indeterminação matemática no ponto x = 1 ). 0 x −1 2 x −1 x −1 x +1 = lim 2 ⋅ = lim x − 1 x →1 x − 1 x + 1 x →1 lim 2 x →1 (x − 1) (x − 1)(x + 1)( ) x +1 = lim x →1 1 (x + 1)( ) x +1 = 1 . 4 x −1 está cada vez x −1 mais próximo de 1/4 a medida que x se aproxima de 1 pela esquerda e pela direita. Se você construir as tabelas de aproximações, constatará que a função y = 2 0 x3 − 8 Exemplo 4. Determine lim (observe a indeterminação matemática no ponto x = 2 ). x →2 3 x 2 − 12 0 ( ) ) x3 − 8 x3 − 23 = lim = lim 3 x 2 − 12 x→2 3 x 2 − 4 x→2 lim x →2 ( (x − 2 )(x 2 + 2 x + 4 ) = lim x →2 3( x − 2 )( x + 2 ) (x ) + 2 x + 4 12 = =1 3( x + 2 ) 12 2 Constate através das tabelas de aproximações que se x → 2 então y = x3 − 8 → 1. 3 x 2 − 12 0 2x3 + 3x − 5 Exemplo 5. Determine lim 2 (observe a indeterminação matemática no ponto x = 1 ). x →1 4 x − 3 x − 1 0 Vamos resolver este limite usando o dispositivo prático para dividir polinômios de Briot-Ruffini. Precisaremos antes do... Teorema de D’Alembert: Um polinômio f ( x ) é divisível por ( x − a ) , a ∈ ℜ , se, e somente se, a é uma raiz de f ( x ) , isto é, f (a ) = 0 . (x − a ) q(x ) f (x ) r (x ) ⇒ f ( x ) = ( x − a ) ⋅ q( x ) + r ( x ) . Assim, f (a ) = 0 ⇔ r (a ) = 0 . Como o ponto x = 1 anula os polinômios do numerador e denominador, então ambos são divisíveis por x − 1 . Assim, 2x3 + 3x − 5 = lim lim 2 x →1 4 x − 3 x + 1 x →1 2 x3 + 3x − 5 (x − 1) 2 4 x − 3x − 1 (x − 1) 2 x 2 + 2 x + 5 2(1) + 2(1) + 5 9 = (* ) = lim = = . x →1 4x + 1 4 (1) + 1 5 2 (* ) Usamos então o dispositivo de Briot- Ruffini para dividir estes polinômios... 1 2 2 0 2 3 5 -5 0 = resto ax 2 + bx + c = 2 x 2 + 2 x + 5 1 4 4 -3 1 -1 0 = resto ax + b = 4 x + 1 Obs.: Faça uma revisão deste dispositivo num livro de matemática do ensino médio. Álvaro Fernandes 7 Algumas fórmulas que auxiliam as simplificações nos cálculos dos limites. Produtos notáveis: 1º) Quadrado da soma: (a + b ) = a 2 + 2ab + b 2 . 2 2º) Quadrado da diferença: (a − b ) = a 2 − 2ab + b 2 . 3º) Produto da soma pela diferença: (a + b )(a − b ) = a 2 − b 2 . 2 4º) Cubo da soma: (a + b ) = a 3 + 3a 2 b + 3ab 2 + b 3 . 3 5º) Cubo da diferença: (a − b ) = a 3 − 3a 2 b + 3ab 2 − b 3 . 3 Fatorações: 6º) Fator comum: ax ± ay = a ( x ± y ) . 7º) Diferença de quadrados: a 2 − b 2 = (a + b )(a − b ) . 8º) Trinômio do 2º grau: ax 2 + bx + c = a(x − x' )( x − x' ' ) , onde x' e x' ' são as raízes obtidas pela −b± ∆ , onde ∆ = b 2 − 4 ac . fórmula de Bháskara x = 2a 3 3 2 2 9º) Soma de cubos: a + b = (a + b ) a − ab + b . 10º) Diferença de cubos: a 3 − b 3 = (a − b ) a 2 + ab + b 2 . ( ( ) ) Conjugado de radicais: a− b é 11º) Conjugado de 12º) Conjugado de 3 a −3 b é a + b , pois 3 ( a 2 + 3 ab + 3 b 2 ) ( a + b )= a − b . , pois ( a − b )⋅ ( a + ab + a− b ⋅ 3 3 3 2 3 3 ) b2 = a − b . Proposição (unicidade do limite). Se lim f ( x ) = L1 e lim f ( x ) = L2 , então L1 = L2 . Se o limite de uma função num ponto existe, x→a x→a então ele é único. Principais propriedades dos limites. Se lim f (x ) e lim g ( x ) existem, e k é um número real qualquer, então: x→a x→a a) lim [ f ( x ) ± g ( x )] = lim f (x ) ± lim g ( x ) . x→a x→a x→a b) lim k . f ( x ) = k .lim f ( x ) . x→a x→a c) lim [ f (x ) ⋅ g (x )] = lim f ( x ) ⋅ lim g (x ) . x→a d) lim x→a x→a x→a f (x ) f ( x ) lim = x→a , lim g ( x ) ≠ 0 . g (x ) lim g ( x ) x →a x→a e) lim k = k . x→a Álvaro Fernandes 8 Exemplo 6. Calcule lim x →1 x2 −7 usando as propriedades. 2x + 4 x 2 − 7 1 lim x 2 + lim − 7 1 (1)2 + (− 7 ) − 6 x2 −7 x2 −7 1 x 2 − 7 1 lim x →1 x →1 lim = ⋅ = = −1 = ⋅ x→1 = lim = ⋅ lim = ⋅ → x →1 2 x + 4 x →1 2( x + 2 ) x 1 2 x + 2 2 lim x + 2 2 lim x + lim 2 2 1+ 2 6 x →1 Ufa, quanto trabalho!!! −6 = −1 . 6 x →1 x →1 Bastaria substituir o ponto x = 1 diretamente na expressão, obtendo logo Atividades (grupo 1). Calcule os limites abaixo: 4 − x2 a) lim x →−2 2 + x x3 − 1 x →1 5 x − 5 x2 − 4x + 3 b) lim 2 x →3 x − x − 6 d) lim 8 + x3 x →−2 4 − x 2 e) lim x 4 − 16 8 − x3 1 − x2 g) lim x →−1 x + 2 + x h) lim 2− x−3 x 2 − 49 x→2 x →7 c) lim f) lim x →1 i) lim x →4 x −1 x −1 3− 5+ x 1− 5 − x Atividades (grupo 2). Calcule os limites indicados: x 2 − 1, x ≤ 0 a) f ( x ) = , x + 1, x > 0 x2 , x ≠ 2 , 3 , x = 2 calcule: lim f ( x ) , lim f ( x ) e lim f ( x ) . x →−1 x →2 x →0 b) g( x ) = calcule: lim g( x ) . 4 − x 2 , x < 1 c) h( x ) = , 5 − 2 x , x > 1 calcule: lim h( x ) . 2 x , x < 0 d) l ( x ) = 1 − x 2 , 0 ≤ x < 2 , 2 x − 6 , x ≥ 2 calcule: lim l ( x ), lim l ( x ), lim l ( x ) e Álvaro Fernandes x →2 x →1 x →0 x→2 x → −∞ lim l ( x ) . x → +∞ 9