CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI – FACECAP - PEDAGOGIA- O LÚDICO NAS AULAS DE MATEMÁTICA LÍGIA BENTO LEITE Capivari, SP 2011 CAMPANHA NACIONAL DAS ESCOLAS DA COMUNIDADE FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI – FACECAP - PEDAGOGIA- O LÚDICO NAS AULAS DE MATEMÁTICA Monografia apresentada ao Curso de Pedagogia da FACECAP/CNEC Capivari, para obtenção do título de Pedagogo, sob a orientação da Profª. Rejane Aparecida Armelin Stefano. LÍGIA BENTO LEITE Capivari, SP 2011 FICHA CATALOGRÁFICA Leite, Lígia Bento O lúdico nas aulas de matemática/ Lígia Bento Leite. Capivari-SP: CNEC, 2011. 33p. Orientadora: Profª Rejane Aparecida Armelin Stefano Monografia apresentada ao Curso de Pedagogia. 1.Matemática. 2.Lúdico. 3. Piaget. I. Título. CDD 372.7 “Brincar com crianças, não é perder tempo, é ganhá-lo; se é triste ver meninos sem escolas, mais triste ainda é vê-los sentados sem ar, com exercícios estéreis sem valor para a formação do homem”. Carlos Drummond de Andrade AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus por me amar incondicionalmente e sem restrições, respeitando minhas limitações e me dando força para continuar. Agradeço e dedico esta pesquisa a toda minha família, que me apoiou e me entendeu nos momentos de minha ausência. Também ao meu amado Fábio, o qual contribuiu e contribui muito com meu crescimento, sempre me ajudando a caminhar. À Professora Rejane e à Professora Teresa, que estiveram sempre prontas para me auxiliar, exigindo cada dia mais, pois acreditam em mim e em minha capacidade. Agradeço a todas as minhas amigas e meus amigos pelo carinho e persistência. Juntos cumprimos mais uma etapa de nossa história. LEITE, Lígia Bento. O Lúdico nas Aulas de Matemática. Monografia de Conclusão de Curso. Curso de Pedagogia. Faculdade Cenecista de Capivari – CNEC. 33 p., 2011. RESUMO O presente trabalho, por meio da pesquisa bibliográfica, aborda as contribuições dos estudos de Piaget e da perspectiva construtivista para novas vivências nas aulas de matemática. Explora a definição de lúdico como operação que tem como objetivo despertar o prazer e divertir os que participam e discute algumas tendências pedagógicas para esta disciplina, sendo enfatizada a relevância de se trabalhar com jogos e brincadeiras, proporcionando aos alunos um aprendizado significativo por meio da interação, socialização, expressão, comunicação e construção do conhecimento, diferenciando-se das aulas tradicionais expositivas e do brincar por brincar, sem mediação, propiciando um trabalho pedagógico voltado para que a criança desenvolva estratégias de raciocínio lógico matemático. Palavras-chave: 1. Matemática. 2. Lúdico. 3. Piaget. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................ 08 1. CAMINHOS DA MATEMÁTICA .......................................................... 10 1.1. Escola tradicional e escola nova .................................................... 11 1.2. As visões: inatista, ambientalista e interacionista .......................... 12 2. PIAGET E O CONSTRUTIVISMO ........................................................ 15 2.1. O equilíbrio .................................................................................... 17 2.2. A etapa sensório-motora ................................................................ 18 2.3. A etapa pré-operacional ................................................................. 19 2.4. A etapa operatório concreta ........................................................... 20 2.5. A etapa operatório formal .............................................................. 21 3. O LÚDICO E SUA IMPORTÂNCIA ...................................................... 23 4. CONSTRUTIVISMO, LÚDICO E AS AULAS DE MATEMÁTICA ... 26 CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................... 29 REFERÊNCIAS ........................................................................................... 31 INTRODUÇÃO Refletindo sobre as metodologias tradicionais e as dificuldades dos alunos dos anos iniciais do ensino fundamental, este trabalho realiza uma discussão sobre as influências do lúdico no processo de ensino aprendizagem nas aulas de matemática, considerando que: (...) o brincar é uma ferramenta a mais que o educador pode lançar mão para favorecer o desenvolvimento e a aprendizagem dos alunos, proporcionando um ambiente escolar planejado e enriquecido, que possibilite a vivência das emoções, os processos de descoberta, a curiosidade e o encantamento, os quais favorecem as bases para a construção do conhecimento. (SANTOS, 2010, p.7). Por meio dos jogos e das brincadeiras as crianças inventam, aprendem, socializam, desenvolvem a autonomia e formam o seu “eu”, sua personalidade de uma forma prazerosa. Muitas vezes os adultos não entendem uma brincadeira de criança, porém nesta ela constrói seu mundo e realiza assimilações à realidade. Pensando a matemática como uma disciplina abstrata, para que o aluno dos anos iniciais desenvolva a habilidade de abstrair, é necessário partir do concreto. Neste processo de ensino e aprendizagem, vê-se uma considerável oportunidade de realizar o trabalho com jogos e brincadeiras. Brincar não se refere a “passar o tempo”, mas sim a uma atividade planejada, dirigida e mediada pelo docente. A questão central deste trabalho é: qual a importância de se utilizar o lúdico como metodologia, tornando as aulas mais prazerosas e significativas? Se os professores têm como objetivo o aprendizado dos alunos, e estes por sua vez, têm grande interesse em jogos, competições e brincadeiras, o lúdico apresenta-se como um forte artifício para o processo de ensino e aprendizagem. O presente estudo tem como objetivo discutir brevemente a história do ensino da Matemática no Brasil, identificar as contribuições de Piaget e do construtivismo para esta disciplina e promover reflexão acerca da importância dos jogos e das brincadeiras nas aulas de Matemática. Para tanto, tivemos como principal instrumento a pesquisa bibliográfica, buscando pontos convergentes sobre o tema em diversos autores, dos quais Piaget, Santos, Faria, Aranão, Davis e Oliveira, Fiorentini e os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática se destacam. Atrelado a estes, pode-se concluir a importância do lúdico para a aprendizagem e a possibilidade de utilizá-lo como método de ensino. 8 Sendo assim, o primeiro capítulo expõe os caminhos da matemática, as práticas que a escola vivenciou, principalmente no ensino tradicional, em que o professor era o detentor do saber, e no escolanovismo ou escola nova, que propôs uma dialética entre professor e aluno. No segundo capítulo, há a discussão sobre a teoria de Piaget, o construtivismo, enfatizando que o conhecimento se dá de dentro para fora na criança. Este autor estabeleceu etapas cognitivas, com características e especificidades próprias. Uma vez explicada esta teoria, o capítulo três refere-se ao lúdico e sua importância na vida da criança, e como ele possibilita que ela aprenda a trabalhar suas emoções: ganhando, perdendo, experimentando novas situações, raciocinando e assimilando. No quarto capítulo há a discussão sobre o lúdico nas aulas de matemática atrelada aos estudos de Piaget, ressaltando a relevância de aprender a aprender, formando um cidadão que pense matematicamente. Em linhas gerais, há a preocupação de tornar as aulas de matemática mais prazerosas e significativas, minimizando a dificuldade de se trabalhar com jogos e brincadeiras, abordando as contribuições desta proposta, que permite ampliar a formação da criança para a vida e não simplesmente para o próximo ano letivo. 9 1. CAMINHOS DA MATEMÁTICA. Independentemente da época ou intensidade, todas as pessoas têm experiências com a matemática, sejam elas boas ou nem tanto prazerosas. A matemática é uma ciência muito antiga, e geralmente, nomeada como difícil, porém por permitir a flexibilidade em seus métodos de ensino, pode tornar-se fácil. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (2001), para se pensar a trajetória do ensino desta disciplina é preciso relembrar as reformas curriculares existentes. Nas décadas de 60 e 70, o ensino deste componente teve influência de um movimento chamado de Matemática Moderna, que considerava esta área como privilegiada para o pensamento científico e tecnológico, juntamente com a área de Ciências Naturais. Todavia esta reforma, ao tentar aproximar a matemática escolar da matemática pura mantendo um padrão que buscava universalizar uma linguagem e os componentes da aprendizagem, distanciou o ensino do aluno, efetuando propostas fora do alcance dos mesmos. O ensino passou a ter preocupações excessivas com abstrações internas à própria Matemática, mais voltadas à teoria do que à prática. A linguagem da teoria dos conjuntos, por exemplo, foi introduzida com tal ênfase que a aprendizagem de símbolos e de uma terminologia interminável comprometia o ensino do cálculo, da geometria e das medidas. (BRASIL, 1997, P. 21). Recebendo muitas críticas devido à inadequação desta proposta, nos anos 1980 o National Council of Teachers of Mathematics – NCTM – dos Estados Unidos, elaborou o documento “Agenda para Ação”, cujo estudo foi o foco do ensino da Matemática, que seria a resolução de problemas. Nos anos seguintes novas reformas ocorreram, influenciadas por estas ideias, buscando formar cidadãos preparados para a vida e não mais só para os estudos que viriam posteriormente. O papel ativo do aluno na construção do seu próprio conhecimento e a importância de atualizar-se com a tecnologia e conteúdos também são enfatizados nesta nova concepção. Isto, no entanto, não é tão simples, mesmo a matemática estando tão presente na vida do homem. Qual a forma correta de se ensinar matemática? Percebe-se que a resposta não pode ser dada de forma única e direta, uma vez que o pensamento matemático é uma construção humana que se desenvolve dentro de um contexto histórico-social, o qual sofre reflexos e aplicações, que devem ser entendidas por todos. 10 1.1. Escola tradicional e escola nova. A Matemática foi se modernizando com a necessidade de superar os estudos desenvolvidos. No Brasil, com a Escola Tradicional1, datada em meados do século XIX, esta disciplina ensinava técnicas de fazer contas e resoluções, listas de exercícios repetitivos, sendo o professor a autoridade e o aluno um ser passivo, ou seja, segundo Neto (1998) não era apenas ficar sentado escutando o professor, mas sim obrigado a fazê-lo, sem contribuições à aula. Esta metodologia não possibilitava que o aluno fosse sujeito do seu próprio conhecimento, já que somente o professor o possuía, tornando-se uma prática pedagógica muito distante da realidade do aluno e sem significado para o mesmo, que apenas absorvia o que o professor ensinava. Os pais pensam que a quantidade de conhecimentos na cabeça do filho é igual à quantidade de páginas escritas no caderno, por isso muitos “professores” usam “método” de escrever na lousa para o aluno copiar. Todo mundo fica feliz com a quantidade de matéria dada! (NETO, 1998, p. 49). Em contrapartida, este método não atingiu as expectativas, surgindo críticas e estudos contra o mesmo, dando espaço ao pensamento Escolanovista. A Escola Nova ou Renovada valoriza a ação do aluno, o qual deve manipular objetos e ferramentas, ler, assistir, olhar, escutar, tatear, cheirar, sendo motivado a vivenciar estas experiências. Conforme Saviani (2006), esta teoria destaca-se pela preocupação com os deficientes, salientando a partir de então as diferenças individuais. Observa-se que esta tendência acarreta grandes responsabilidades ao professor, cujo papel é mediar essas experiências. Também ao estudante, uma vez que se torna ativo, passa a ser centro no processo de ensino aprendizagem juntamente com o professor, dando contribuições à aula e tornando-se agente na construção de seu próprio conhecimento. Sendo aceita esta colaboração de ambos, há um novo olhar para o aprendizado. Nota-se que a didática não é estável e que novas teorias surgem com novos métodos de ensino, buscando um diferencial em cada etapa da história. Não se pode descartá-las, pois trouxeram muitas contribuições, cada uma com seus aspectos e singularidades. 1 A Escola Tradicional é, segundo Saviani (2006), a tendência que faz da escola um antídoto à ignorância, que transmite conhecimento acumulado, tendo o mestre como centro e detentor do saber e o aluno como passivo e assimilador. 11 1.2. As visões: inatista, ambientalista e interacionista. As práticas pedagógicas fundamentam-se em teorias, que se modificam conforme pensamentos, críticas e exigências acerca do desenvolvimento da aprendizagem, de acordo com as necessidades da sociedade. Na concepção inatista acredita-se que a criança já nasce pronta, com uma bagagem genética, ou seja, seu cérebro já está estruturado devido à hereditariedade, como menciona Davis e Oliveira (1994). Percebe-se que as expressões: “dom”, “intuição”, “aptidão” e “vocação” são utilizadas pelos inatistas. Sendo assim, se o aluno possui estruturas inatas, basta um bom treinamento destas, e há a promoção dos “bem dotados”. Percebe-se que, uma vez que se considera o inatismo da criança, em muitos casos não seria útil o papel do professor. Se um aluno é julgado como não sendo inteligente, não haveria nada que o professor pudesse fazer, pois ele não nasceu pronto. De acordo com Davis e Oliveira (1994), esta concepção gera preconceitos prejudiciais em sala de aula, os quais podem ser vistos até hoje camuflados de aptidões, prontidão e coeficiente de inteligência. No inatismo, o ambiente interfere o mínimo possível no processo de desenvolvimento espontâneo da pessoa, exatamente o contrário do que pressupõe a visão ambientalista que, a partir de estímulos, entende o ser humano como reativo à ação do ambiente. Logo, estes estímulos e consequências presentes no meio determinam comportamentos. A ênfase está em propiciar novas aprendizagens, por meio da manipulação dos estímulos que antecedem e sucedem o comportamento. Para tanto, é preciso uma análise rigorosa da forma como os indivíduos atuam em seu ambiente, identificando os estímulos que provocam o aparecimento do comportamento-alvo e as consequências que o mantém. (DAVIS e OLIVEIRA, 1994, p. 33). É visível que o papel do professor é de grande contribuição como mediador das situações, e no planejamento das atividades, o que era minimizado na visão inatista. Duhalde e Cuberes (1998) destacam que o ensino de Matemática, por ser uma disciplina abstrata, deve ser contextualizado, logo o planejamento do trabalho a ser realizado é uma etapa importante. Segundo Neto (1998) os estudos interacionistas discordam dos inatistas, por desprezarem o papel do ambiente, e dos ambientalistas, por ignorarem fatores maturacionais e acreditarem nas pressões do meio. Esta teoria afirma que o conhecimento é construído pelo próprio sujeito a partir de sua interação com o ambiente, havendo reciprocidade. A criança conhece porque atua, atua porque conhece. Atuando, forma esquemas mentais de ação, e 12 possuindo estes esquemas, pode atuar. Nesta dialética acontece a construção do conhecimento. Observa-se que o professor deve criar um meio rico e motivador para as crianças, sendo o mediador entre o sujeito e o ambiente, tendo o conhecimento prévio do estudante como base para novas construções. Desta concepção interacionista surgem correntes teóricas, como a de Vygotski e Piaget. Lev Seminovitch Vygotski (1896-1934) nasceu na Rússia e durante sua curta vida, escreveu importantes obras, sendo chamado sócio interacionista. Ele e seus seguidores baseavam o desenvolvimento, como cita Davis e Oliveira (1994, p. 49), “na concepção de um organismo ativo, cujo pensamento é construído paulatinamente num ambiente que é histórico e, em essência, social”. Em seu trabalho defende a ideia de que há uma interação contínua, ou seja, o social e o biológico estão em constante transformação, construindo-se numa visão histórico cultural. Vygotski, ao reconhecer o ambiente social em que a criança vive, pressupõe que ao mudar de ambiente, seu desenvolvimento será mutável, não podendo ser estabelecido um padrão único de desenvolvimento humano. A criança já nasce inserida em um mundo social e histórico, e formula uma visão deste através da interação com as outras pessoas mais experientes, desta forma esta construção acontece do social para o individual. Assim sendo, o desenvolvimento e a aprendizagem são processos que estão atrelados, ou seja, quanto mais se aprende, mais se desenvolve. Como explicita Davis e Oliveira (1994), para este teórico, a linguagem tem função central no desenvolvimento, já que a criança pensa porque fala, logo, isto possibilita a aquisição da imaginação, o uso da memória e o planejamento de ação. O processo de aprendizagem provoca avanços e retrocessos no desenvolvimento da criança. A possibilidade de aprender com o outro e de fazer junto é o que Vygotski chama de zona de desenvolvimento proximal. À distância entre o nível de desenvolvimento atual – determinado pela capacidade de solução, sem ajuda, de problemas – e o nível potencial de desenvolvimento – medido através da solução de problemas sob a orientação ou em colaboração com as crianças mais experientes. (DAVIS e OLIVEIRA, 1994, p. 53). Vygotski assim explica que o que o aluno não consegue hoje sozinho, com a ajuda do professor ou de um mediador, amanhã poderá conseguir, permitindo a elaboração de habilidades e conhecimentos novos, por meio da mediação de alguém mais experiente. 13 A concepção histórico cultural é convergente em alguns aspectos com os estudos desenvolvidos por Jean Piaget (1896-1980) formado em Biologia e Filosofia, que pesquisou como se dá o conhecimento, começando a se interessar pelas respostas “erradas” das crianças, sendo chamado de construtivista. Piaget concebia-as como seres ativos, atentos e geradores de hipóteses, porém privilegiava os fatores biológicos, sendo que, os aspectos internos preponderam sobre os externos, postulando um desenvolvimento universal de estágios. De acordo com Davis e Oliveira (1994), Piaget acreditava que os conhecimentos eram elaborados espontaneamente pelas crianças, dependendo do estágio em que se encontravam, partindo da visão egocêntrica para a mais socializada e objetiva dos adultos. Este teórico minimiza o papel da interação social, pois pressupõe que a aprendizagem subordina-se ao desenvolvimento, então, presume-se que no estágio certo a criança irá aprender. Como aborda Duhalde e Cuberes (1998) a didática deste teórico é voltada à ação e ao papel ativo do sujeito, às experiências diretas, exploração de objetos, materiais e situações, buscando nos afazeres diários uma forma diferente de aprendizado. Ao contrário de Vygotski, para Piaget o pensamento aparece antes da fala, logo, a criança fala porque pensa, uma vez que pensar também é uma forma de expressar-se. 14 2. PIAGET E O CONSTRUTIVISMO. Formou-se em Biologia e para completar seus estudos, mais tarde graduou-se em Filosofia. Preocupou-se em pesquisar como o sujeito aprende, ou seja, o processo de construção do conhecimento humano, analisando que este resulta das relações do sujeito com o ambiente, privilegiando a maturação biológica. Observando também o desenvolvimento cognitivo de seus filhos durante a infância, Piaget elaborou sua teoria, e presumiu que o conhecimento se dá de dentro para fora, sendo assim, mesmo havendo mediação por parte de alguém mais experiente, a aprendizagem é dependente do processo de desenvolvimento do sujeito. Desenvolvimento cognitivo e aprendizagem não se confundem: o primeiro é um processo espontâneo, que se apóia predominantemente no biológico. Aprendizagem, por outro lado, é encarada como um processo mais restrito, causado por situações específicas (como a freqüência à escola) e subordinado tanto à equilibração quanto à maturação. (DAVIS e OLIVEIRA, 1994, p. 46). Piaget considerou quatro características fundamentais para o desenvolvimento: maturação biológica, experiência física e lógico matemática, transmissão ou experiência social e equilibração. A maturação se refere aos fatores biológicos, como o crescimento fisiológico e ao desenvolvimento do sistema nervoso. “No entender de Piaget, a influência do fator maturação sobre o desenvolvimento mental das crianças é maior durante os primeiros anos de vida” (FARIA, 1995, p.12) e com o passar do tempo os fatores ambientais ganham força no desenvolvimento. Para Piaget, há duas formas de experiência, a física e a lógico matemática. Na física, o indivíduo aprende ao tocar, cheirar, jogar, vivenciar e saborear objetos, sem as informações de outros mediadores, sendo assim, experimenta e descobre. Já as experiências lógico matemáticas permitem a aquisição da estrutura de série, de classe, de número, etc. “Para uma pessoa realizar uma experiência lógico matemática, como a de reunir ou classificar objetos, precisa ter descoberto, anteriormente, as características semelhantes e diferentes dos mesmos, ou seja, ter realizado uma operação física”. (FARIA, 1995, p. 14). Percebe-se que o indivíduo tem que realizar vivências com materiais concretos e tomar consciência dessas ações para que as experimentações matemáticas aconteçam. A transmissão social tem papel relevante para o desenvolvimento mental, principalmente quando as operações e as ações interiorizadas estão dominadas. De acordo com as ideias de Piaget, a transmissão social para a criança através da linguagem, só 15 acontecerá quando ela atingir o estágio para assimilar os conteúdos da comunicação, ou seja, o social depende de fatores biológicos. (...) não se trata de traçar uma fronteira entre o social e o não social, mas sim de, a partir de uma característica importante das relações possíveis entre pessoas de nível operatório – que representa o nível máximo de socialização do pensamento –, comparar graus anteriores de socialização. (LA TAILLE, 1992, p. 14). Por fim, a quarta característica fundamental para Piaget é a equilibração. Quando o indivíduo descobre, nota algo ou age, suas estruturas mentais se equilibram para que se acomode à nova situação ou ambiente, como será abordado posteriormente. Com base nestes fatores, é importante, segundo Aranão (1996), que o professor crie um ambiente rico em materiais e possibilidades para que o aluno, em sua espontaneidade, possa se desenvolver, escolhendo o que é mais interessante e significativo. Na concepção de Piaget, o professor não deve impor um conteúdo sem interação ou contextualização, mas sim mediar, uma vez que a aprendizagem acontece devido às relações: material x aluno, aluno x meio, aluno x professor. Percebe-se que o mestre é um artífice muito importante, já que prepara o material e o meio, mediando estas relações. Assim, este não deve impor conteúdos. Porém não se pode confundir espontaneidade com desregramento. O professor, conhecendo o currículo 2 que deverá ser abordado, de acordo com o ano em que leciona, deve instigar o estudante, para que ele seja curioso, estimulando a imaginação e a apreciação pela pesquisa, tornando-se diligente na elaboração de seu conhecimento. Na teoria piagetiana, a criança é livre para fazer sua escolha mediante as propostas de trabalho apresentadas na escola, dentro de um ambiente enriquecedor, mesmo que seja com materiais didático-pedagógicos e brinquedos construídos com material alternativo. Essa escolha dever ser assumida com responsabilidade, estabelecendo limites para a criança. (ARANÃO, 1996, p. 12). Assim como Aranão (1996), Brooks e Brooks (1997), observam que Piaget vislumbra no construtivismo a possibilidade de explicar como a criança entende e conhece seu próprio mundo. Compreende-se que, com os métodos que esta corrente propõe: analisar, criar, incitar, estimular, entre outros, o aluno não receberá respostas prontas e definidas pelo professor, mas terá opiniões e hipóteses para contribuir com a aula. 2 Neste caso, currículo refere-se às disciplinas e conteúdos presentes na grade de cada ano escolar. (Bueno, 2007). 16 Avaliando-se que a mente humana é um grupo de estruturas dinâmicas, a teoria piagetiana considera possibilidades de aprendizagem através da maturação das mesmas, de interações com o mundo e das experiências vivenciadas. Podemos observar: Por exemplo, as estruturas cognitivas requeridas para compreender que um cubo de madeira é duro, são rudimentares e muito menos complexas do que as estruturas necessárias para entender que um cubo tem comprimento, largura e altura, e que estes três fatores combinam para determinar o volume do cubo. (BROOKS e BROOKS, 1997, p. 40). Em seus estudos Jean Piaget concebeu que a criança e o adulto possuem diferentes processos mentais. Preocupou-se em investigar esta transformação de um período para o outro, definindo 4 etapas ou fases de desenvolvimento: sensório-motora, pré-operatória, operatório concreto e operatório formal. Antes de definir estes períodos, é preciso considerar a importância que Piaget enfoca no equilíbrio, acomodação e assimilação. 2.1. O equilíbrio. O meio social e físico dispõe à criança constantes mudanças, ou seja, propõe questões que exigem adaptação ou equilíbrio. Dados estes acontecimentos, o organismo se torna cada vez mais apto a buscar novas estruturas para se equilibrar. Para se alcançar o processo de equilibração, dois mecanismos são utilizados, a assimilação e a acomodação. Mencionando o exemplo citado por Rappaport (1981), a criança que sabe andar de bicicleta está acomodada, ou seja, está adaptada a esta situação. Deparandose com um veículo que possui algumas características da bicicleta, mas com pequenas alterações, ao tentar andar utilizando os mesmos esquemas da situação anterior, ela não conseguirá obter sucesso, havendo um desequilíbrio e, essa tentativa de se adaptar às características do novo veículo é denominada assimilação. Porém, quando ela está assimilando, os esquemas não sofrem transformações. Quando estes começam a se modificar para resolver a questão e a criança consegue andar no novo veículo, há a acomodação, pois os esquemas estão adaptados à situação. Para Piaget este processo de equilibração ocorre a todo o momento, se estende da criança até a fase adulta e em diversas situações. 17 2.2. A etapa sensório-motora. De acordo com Piaget e Inhelder (1999), este período estende-se nas crianças de 0 a 2 3 anos aproximadamente, quando estas ainda não apresentam pensamento, função simbólica e afetividade em relação a objetos e pessoas que não estão em seu campo visual, porém é nesta etapa que a criança desenvolve as subestruturas cognitivas que servirão de ponto de partida para construções intelectuais e afetivas. Este nível é subdividido em 6 estágios. Do primeiro até o terceiro estágio, não há separação entre acomodação e assimilação. O recém nascido não interage com o meio de forma intencional, as situações que são assimiladas e conhecidas, são apenas no momento em que ocorrem, puramente um reflexo. Toma-se como exemplo um objeto e o sujeito. No primeiro e segundo períodos, quando um objeto se ausenta da visão da criança, ele não é procurado. Já no terceiro estágio, quando o objeto desaparece, o sujeito representa seu desagrado, chorando. Do quarto estágio até o sexto, começa a haver equilíbrio entre a acomodação e assimilação. O indivíduo explora o objeto antes de assimilar, sendo assim, quando este se distancia de seu campo de visão e ação, a criança não apresenta os movimentos de acomodação dos outros estágios, mas seleciona as ações mais adequadas para atingir o objeto, o que evidencia que a criança sabe que “o objeto continua existindo, mesmo quando retirado do alcance dos seus olhos”. (GOULART, 2000, p. 29). Segundo Faria (1995), o comportamento passa a ser intencional, há um interesse pela matéria, marcando o início da inteligência prática, uma vez que a criança só procura um objeto porque ela supõe que ele continua existindo em algum lugar. Para Piaget e Inhelder (1999, p. 12), “à falta de linguagem e de função simbólica, tais construções se efetuam exclusivamente apoiadas em percepções e movimentos, ou seja, através de uma coordenação sensório motora das ações, sem que intervenha a representação ou o pensamento”. Na etapa sensório-motora, a criança tende ao egocentrismo, no sentido de que não separa o externo do interno, ou seja, não há a dissociação do seu corpo e do meio. Este egocentrismo diminui a partir da separação de seu próprio corpo do mundo e acaba quando se desenvolve a noção de objeto. 3 Segundo Piaget as idades apresentadas em todas as etapas são médias e aproximadas, podendo apresentar alterações. 18 De acordo com Davis e Oliveira (1994, p. 40), ao explorar seu corpo ela “percebe suas diversas partes, experimenta emoções diferentes, formando a base do seu autoconhecimento”. Pensa-se que, quanto mais objetos diversificados a criança manipular e experimentar, mais facilidade ela terá em estabelecer a noção de objeto, separando o interno do externo, construindo seu conhecimento. 2.3. A etapa pré-operacional. Esta etapa dá-se dos 2 aos 6-7 anos aproximadamente, quando se destaca a aquisição da linguagem oral, a possibilidade de classificação (mamíferos, gatos, angorá) e seriação (3 é maior que 2 e menor que 4). Também começam a ser elaborados os esquemas representativos ou simbólicos, ou seja, ações interiorizadas, bem como os pensamentos sustentados por conceitos. Sendo assim, a inteligência passa de prática, o “aqui agora” para representativa, utilizando-se símbolos, signos, imagens e conceitos. Nesta etapa o indivíduo busca explicações de fenômenos e classificações, tornando-se uma inteligência que permite a socialização devido aos signos linguísticos. O período préoperatório é separado em dois momentos: o que corresponde ao pensamento simbólico e préconceitual (2 até 4 anos) e o do pensamento intuitivo (4 aos 6-7 anos). No primeiro momento a criança ainda não formula conceitos propriamente ditos, logo a denominação pré-conceitos. O sujeito não tem ideia de classe geral (todos os gatos), nem das subclasses (alguns em especial), ou seja, sempre que a criança encontrar-se com um gato na rua acreditará que está vendo o primeiro com quem teve experiência. Quando já é possível manter um diálogo contínuo com o indivíduo há novas estruturações cognitivas, o que segundo Piaget, marca o pensamento intuitivo. Há dois aspectos muito interessantes neste segundo momento, a ideia de irreversibilidade e a falta de conservação. Como cita Davis e Oliveira (1994), a não conservação pode ser observada no seguinte exemplo: pede-se a uma criança que faça a contagem de duas fileiras com o mesmo número de elementos, dispostos da mesma maneira. Por não haver adquirido, ainda, a noção de conservação ao afastar os elementos da segunda fileira, deixando-os mais abertos, na presença da criança, ela dirá que a segunda tem mais elementos, mesmo tendo presenciado a alteração, como mostra a figura abaixo. 19 0000000000 0000000000 Figura 01 Na questão da irreversibilidade, pode-se tomar como exemplo a adição e a subtração a certa quantidade. Ao se pedir para uma criança que acrescente três laranjas a uma determinada quantidade e depois solicitar que retire, ela precisará recontar as laranjas, uma vez que não consegue entender que ficou com o número inicial de frutas. Isto ocorre, segundo Piaget, porque ela “ainda não é capaz de perceber que é possível retornar, mentalmente, ao ponto de partida” (DAVIS e OLIVEIRA, 1994, p. 43). Percebe-se que nesta fase o papel do professor é fundamental, pois irá mediar estas relações, elaborando atividades diversificadas e muitos exemplos, para que o aluno compreenda estas noções lógicas. No período pré-operatório é visível o pensamento egocêntrico, o qual depende das experiências infantis e o ponto de referência é a própria criança. As interpretações de Davis e Oliveira (1994) afirmam com base em Piaget, que as simples conversas das crianças sobre o vento, a sombra, a noite e as nuvens como explicações dos fenômenos, revelam a dificuldade entre a separação do “eu” e do mundo. Como a criança é o ponto de referência para suas opiniões, os fenômenos estão ligados a ela. A partir de uma vivência anterior dela de frio e suas sensações, se explica o movimento das nuvens. Note-se que, cabe ao adulto ou professor, interagir com a criança, problematizando situações que a façam entrar em conflito com estas que já estão acomodadas. 2.4. A etapa operatório concreta. Nesta fase, que vai dos 7 aos 12 anos, aproximadamente, e coincide com a etapa escolar, há a tarefa de dominar as operações mentais, ou seja, ações interiorizadas. Adição, subtração, divisão e multiplicação predominam, por isto o nome operatório. A partir desta idade, as ações interiorizadas se tornam reversíveis, móveis, flexíveis, e o real e a fantasia não se misturam em suas percepções. Há a denominação concreto, pois, de acordo com Davis e Oliveira (1994), Piaget cita que a criança necessita de exemplos ou materiais reais para poder pensar. Vê-se cada vez mais a importância de um ambiente rico, que crie possibilidades e evidentemente, a mediação do professor. 20 O egocentrismo dá lugar às diversas relações e diferentes pontos de vista. Neste período, ao se deparar com um novo objeto, o sujeito esquematiza duas ou mais características para combiná-las em uma síntese mental. Uma criança, por exemplo, que teve contato com gatos de pêlos curtos e lisos, nas cores preta e manchada – representações anteriores –, ao ter contato com gatos de pêlos longos e arrepiados, nas cores cinzenta e branca – representações atuais –, pode conservar essas características no plano consciente e coordená-las, formando um significado genérico: classe dos gatos. Essa criança é capaz de assimilar objetos tão diversos, porque pode acomodar-se a eles. (FARIA, 1995, p. 49). A conservação também é vivenciada nesta etapa, tanto de quantidade, volume, espaço e velocidade, quanto de números, classes, séries, entre outros. A criança dos 7 aos 12 anos não precisa recontar a quantidade de números 04 de cada carreira, se já havia contado – o que acontece na etapa pré-operacional –, pois consegue conservar este número. Para Piaget, neste momento o indivíduo ainda não consegue pensar no abstrato, pois, suposições e enunciados dificultam o raciocínio. Pensa-se que, uma vez que a criança precisa do concreto, de vivências e objetos reais para abstrair, nesta fase – que coincide com a iniciação escolar – seria interessante o trabalho com jogos e brincadeiras lúdicas, as quais estimulam o raciocínio lógico da criança e demais aspectos que elas constituirão na próxima fase, a operatório formal. 2.5. A etapa operatório formal. A última etapa definida por Piaget se dá dos 12 aos 16 anos, aproximadamente. A criança constrói ideias utilizando símbolos matemáticos, palavras e outras formas de linguagem. É possível criar hipóteses e trabalhar com proposições, sem que o aluno acredite que são fatos verdadeiros, podendo admiti-las para resolução de problemas. O sujeito não precisa mais somente do concreto e das interpretações dos objetos para abstrair, mas forma suas próprias relações para raciocinar, através das formas de linguagem ou símbolos. De acordo com Coll, Palacios e Marchesi (1995, p. 276) “estas relações, que serão analisadas de maneira lógica pelo sujeito desta fase, serão comparadas posteriormente com a realidade, por meio da experimentação”. Segundo Faria (1995) neste momento, dois tipos de reversibilidade são possíveis: a inversão das classes aditivas e multiplicativas, que produzem anulação: + A – A = 0; e a 4 Referente à Figura 01 da página 20. 21 reciprocidade, em que as recíprocas são equivalentes: A<B = B>A. Esta etapa é socializante, pois há a possibilidade, através da linguagem verbal, que se compartilhe destas hipóteses e suposições. O fato da participação da vida em sociedade e a construção da personalidade são características da afetividade neste período, como explicita Piaget em seus estudos. O pensamento dos estudantes dos 12 aos 16 anos tem um caráter hipotético-dedutivo, pois já conseguem estabelecer hipóteses para as resoluções, o que permite as problematizações pelo professor, para desenvolver a criticidade e autonomia. Depois dos 16 anos, as operações formais consolidam-se em sistemas, se prolongando até a fase adulta, na qual há a operacionalização em nível mental. 22 3. O LÚDICO E SUA IMPORTÂNCIA. Piaget foi um dos teóricos que deu ênfase aos estudos sobre o lúdico, comprovando em suas pesquisas o impulso aos jogos e brincadeiras desde os primeiros meses de vida do bebê. A palavra lúdico vem do latim ludus e significa toda operação que tem como objetivo despertar o prazer e divertir os que participam, ou seja, refere-se aos jogos e brincadeiras5. Como cita Rizzi e Haydt (1998, p.15): Brincando e jogando, a criança aplica seus esquemas mentais à realidade que a cerca, apreendendo-a e assimilando-a. Brincando e jogando, a criança reproduz as vivências, transformando o real de acordo com seus desejos e interesses. Por isso, pode-se dizer que, através do brinquedo e do jogo, a criança expressa, assimila e constrói a realidade. Como já destacado neste trabalho, a assimilação é um processo importante, que consolida as tentativas até a equilibração. Percebemos que o lúdico apresenta-se como uma ferramenta interessante para o desenvolvimento dos esquemas mentais, uma vez que os mobiliza para resolver questões, impulsionando a criança naturalmente. O lúdico mostra-se assim, um fator em favor da assimilação. Entretanto, Marcelino (1999) discute que muitos professores acreditam que o lúdico seria uma forma de gratificação. Eles dizem: “primeiro o dever depois o prazer”. Mas por que não se pode ter os dois juntos? Nota-se que dever, de acordo com o minidicionário da língua portuguesa Bueno (2007) significa: ter obrigação de; ter dívidas; obrigação, dívida; débito. Já lúdico: o que se refere a jogos e brincadeiras. Se o prazer é algo gostoso, logo dever nos remete a algo que não é prazeroso. Presume-se que, crescer ouvindo isso faz com que a criança pense que primeiro ela é obrigada a fazer a lição e depois como recompensa ou alívio, poderá brincar, sem promover relações entre os dois, acentuando-se as divergências entre eles. As ideias de Marcelino (1999) encontram-se com as de Santos (1997), que menciona que o lúdico é uma necessidade do ser humano de qualquer idade e não pode ser vista apenas como diversão, uma vez que, trabalhado de forma contextualizada, traz muitos benefícios. “O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a aprendizagem, o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa saúde mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de socialização, comunicação, expressão e construção do conhecimento”. (SANTOS, 1997, p. 12). 5 Definição segundo Santos (1997). 23 Segundo Munari (2010), nem sempre as crianças foram vistas da forma como o são hoje, e com os jogos e brincadeiras não foi diferente. A escola tradicional negligenciava o jogo por ser destituído de significado funcional. Cada época e cada cultura têm uma visão específica, porém muitos estudos contribuíram para destacar a importância do lúdico para as crianças. De acordo com Santos (1997), pesquisas concluíram que as atividades lúdicas possibilitam a formação do autoconceito positivo, o desenvolvimento integral da criança, por oportunizar que se desenvolva afetivamente, conviva socialmente e opere mentalmente, além de permitir a inserção da criança na sociedade, uma vez que os jogos e brinquedos são produtos culturais. Por que as crianças gostam de brincar? Toda criança vive agitada e em intenso processo de desenvolvimento corporal e mental. Nesse desenvolvimento se expressa a própria natureza da evolução e esta exige a cada instante uma nova função e a exploração de nova habilidade. Essas funções e essas novas habilidades, ao entrarem em ação, impelem a criança a buscar um tipo de atividade que lhe permita manifestar-se de forma mais completa. A imprescindível “linguagem” dessa atividade é o brincar, é o jogar. (ANTUNES, 1998, p. 37). Os estudos também demonstram que brincar é uma necessidade da criança, essencial para a saúde física e mental, e como está previsto no inciso IV, Art. 16 da Lei 8.069 de 13/07/1990, Estatuto da Criança e do Adolescente, é um direito das mesmas. Estas atividades consistem em formar conceitos, relacionar idéias, estabelecer relações lógicas, desenvolver expressões orais e corporais, reduzir a agressividade, reforçar habilidades sociais, integrar à sociedade e construir conhecimento. O jogo simbólico possibilita à criança vivenciar o mundo adulto e a mediação entre o real e o imaginário. Porém, isso não significa deixá-los brincar livremente, sem planejar, analisar e mediar as atividades, e muito menos uma ação imposta e obrigatória do professor. Como menciona Santos (2010), a ludicidade, como ciência, é fundamentada por três eixos: sociológico, uma vez que se utiliza do social e do cultural; psicológico, contribuindo para os processos de ensino aprendizagem do ser humano; pedagógico, já que há fundamentação teórica e experiências práticas e o eixo epistemológico, dado o jogo como ferramenta de desenvolvimento. (SANTOS, 2010). Para Piaget até a etapa operatório concreta, ou seja, até os 12 anos aproximadamente, a criança apresenta dificuldades em compreender o abstrato. Pensamos que os jogos e brincadeiras contribuem para que a abstração aconteça, uma vez que os alunos conseguem relacionar espontaneamente o real e o imaginário. 24 Os psicólogos aceitam, de maneira geral, que o desenvolvimento cognitivo é indissociável do afetivo e do social. Um aluno resolverá uma questão de álgebra, por exemplo, para atender a uma necessidade ou a um interesse. Ao longo de seu trabalho intervirão estados de prazer, de decepção, de esforço, de fadiga etc. Ao concluí-lo, poderão surgir sentimentos de sucesso, fracasso etc., que são produtos de atividade pessoal com repercussões no social. (FARIA, 1995, p. 7). Conclui-se que, com tantos benefícios e contribuições que o lúdico proporciona às crianças, seria interessante introduzi-lo no ensino da matemática. Uma vez que o lúdico e esta disciplina estão presentes na vida cotidiana do aluno, podem ser unidos para uma aprendizagem mais significativa, construindo o caminho do raciocínio lógico de uma forma prazerosa. 25 4. CONSTRUTIVISMO, LÚDICO E AS AULAS DE MATEMÁTICA. Posto que Piaget não elaborou uma teoria de ensino ou de aprendizagem no viés educacional, porém, por visar a importância de se trabalhar com materiais concretos, influenciou as renovações do ensino da matemática, alterando as práticas pedagógicas tradicionais. (...) trouxe maior embasamento teórico para a iniciação ao estudo da Matemática, substituindo a prática mecânica, mnemônica e associacionista em aritmética por uma prática pedagógica que visa, com o auxílio de materiais concretos, à construção das estruturas do pensamento lógico-matemático e/ou à construção do conceito de número e conceitos relativos ás quatro operações. (FIORENTINI, 1995, p.19). De acordo com as concepções construtivistas, o conhecimento matemático acontece nas relações do homem com o meio e com as atividades, assim sendo, os jogos e as brincadeiras são artifícios que o professor pode utilizar para que este conhecimento seja construído. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática enfocam quatro blocos de conteúdos a serem trabalhados no Ensino Fundamental: números e operações, espaço e forma, grandezas e medidas e tratamento da informação, tendo como principais objetivos formar cidadãos para a vida e valorizar o conhecimento prévio do aluno, usando como recurso trabalhar com a história da Matemática, com jogos, tecnologia da informação e situaçõesproblema significativas. Segundo Fiorentini (1995, p.21), para o construtivismo “o importante não é aprender isto ou aquilo, mas sim aprender a aprender e desenvolver o pensamento lógico-formal” utilizando os procedimentos como ferramenta de raciocínio, ou seja, a matemática é uma construção humana e formativa, e por este motivo, prioriza mais o processo de aprendizagem do que o produto. Percebe-se que a preocupação desta tendência é preparar o indivíduo para as situações-problema com as quais ele se deparará em sua vida e não fazê-lo decorar conceitos mecanicamente, não sabendo aplicá-los posteriormente. Nesta perspectiva, em que é preciso aprender a aprender atrelada aos parâmetros que norteiam esta disciplina, analisamos que Piaget valoriza o erro das crianças, por ser este um indicativo de como elas pensam e um dos fatores que permitem a construção do pensamento destas. Kamii (1994, apud FIORENTINI, 1995), aborda que o professor não deve corrigir a resposta do aluno automaticamente, mas investigar a partir do seu erro o que ele estava construindo e assim corrigi-lo, considerando suas elaborações e conhecimentos prévios. 26 Através do jogo, as crianças arriscam, experimentam, percebem, perdem e erram. O professor deve estar atento a estes indícios e considerar o raciocínio por ela apresentado, questioná-la para que ela possa chegar a novas respostas, processando então uma nova aprendizagem. Nos estudos de Smole (2007) percebe-se também uma nova visão para o erro, o qual por meio de jogos pode ser revisto, desencadeando novas tentativas, previsões e checagem, proporcionando a iniciativa, autoconfiança e autonomia. É pelo fato do jogo ser um meio tão poderoso para a aprendizagem das crianças, que em todo lugar onde se consegue transformar em jogo a iniciação à leitura, ao cálculo, ou à ortografia, observa-se que as crianças se apaixonam por essas ocupações comumente tidas como maçantes. (MUNARI, 2010, p. 99). Em geral, “uma das queixas dos professores de matemática é a de que os alunos frequentemente não sabem qual técnica matemática usar em uma situação nova”. Mesmo que estejam equivocados, vê-se que “não há questão de falta de conhecimento dos procedimentos matemáticos. Cada um deles poderia muito bem ter executado a operação apropriada se pelo menos soubesse qual era a operação apropriada”. (NUNES, 1997, p. 30). De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (1997, p. 48), o recurso aos jogos e brincadeiras é um dos caminhos para “fazer matemática” na sala de aula. Nesta disciplina, através destas ferramentas, os estudantes “passam a compreender e a utilizar convenções e regras que serão empregadas no processo de ensino e aprendizagem”. Sendo assim, utilizando recursos diferenciados, os alunos poderão apreender conceitos e saberão empregá-los, visto que a “matemática que as crianças aprendem deve lhes dar acesso a novos meios de pensar e deve aumentar seu poder para pensar matematicamente”. (NUNES, 1997 p. 32). Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática preocupam-se em formar cidadãos que entendem conceitos e ideias, e saibam adaptá-los em diferentes situações, em consonância com os estudos de Piaget. Também Duhalde e Cuberes (1998), reforçam a importância dos jogos na construção do conhecimento pela criança e mostram a necessidade de se ter um planejamento, contendo objetivos, os materiais que serão usados, o espaço e também o processo de desenvolvimento. O que deve ser observado é que, como qualquer outra ferramenta complementar, os jogos educacionais devem ser muito bem analisados pelo educador, tanto no aspecto motivacional junto aos seus alunos, quanto também, e principalmente, no aspecto pedagógico no processo de ensino-aprendizagem. (PIVA JUNIOR, 1999, p. 68). 27 Neste sentido Smole (2007) destaca que jogando apenas uma vez, o aluno provavelmente não entenderá por completo as regras. É preciso que a aula seja organizada e proponha o jogo várias vezes, para que assim os jogadores possam não só entender regras, mas também aprender de forma significativa. Imaginem duas passagens de um certo professor adentrando à sala de aula. Na primeira, diz explicitamente a classe o conteúdo da aula e começa a “passar” a lição no “quadro negro” (transmissão de conhecimento explícita). Na segunda, ele entra na sala e diz que naquele dia todos irão aprender, brincando ou jogando (transmissão de conhecimento implícita). Tentam imaginar os semblantes dos aprendizes nas duas situações. Certamente a segunda despertará maior interesse! (PIVA JUNIOR, 1999, p. 66). É relevante enfatizar que as aulas não devem ser baseadas somente neste tipo de atividade, a sistematização no caderno, os exercícios da apostila e livros didáticos são fundamentais para a aprendizagem. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática sugerem o uso destes recursos alternativos para a elaboração do conhecimento lógico matemático em conjunto com as demais atividades. De acordo com Santos (2010), em relação aos pais, muitos não compreendem claramente a função do jogo na escola, tanto por terem estudado nos métodos tradicionais, que enfatizam a importância da quantidade de canteúdo, quanto por desejarem que os filhos se alfabetizem e aprendam matemática. Neste sentido, é fundamental que os professores mostrem aos pais as diversidades do brincar na escola, explicando os objetivos e dando credibilidade às ações docentes. Em suma, para aprender a aprender, de uma forma prazerosa e significativa, os jogos e as brincadeiras tornam-se ferramentas importantes para que esta prática ocorra nas aulas de matemática, formando cidadãos preparados para pensar matematicamente. Por fim, o educador lúdico deve ser um profissional sério, que estuda, que pensa, que pesquisa, que experimenta, dando um caráter de cientificidade a seu trabalho e, ao mesmo tempo, uma pessoa que vivencia, que chora, que ri, que canta e que brinca, dando um caráter de humanização ao trabalho escolar. (...) Se ele agir assim em sala de aula possivelmente os alunos terão uma formação diferenciada. (SANTOS, 2010, p. 23-24). 28 CONSIDERAÇÕES FINAIS Após analisar os estudos concretizados nos textos anteriores, refletimos sobre a escola, suas práticas pedagógicas e o cotidiano do aluno, percebendo a possibilidade de trazer para esta instituição propostas que o dia a dia oferece, fazendo com que a criança perceba que a matemática e situações-problema estão presentes em sua vida, dentro e fora da escola. Em uma classe na qual o professor fornece coisas prontas e definitivas, os estudantes, muitas vezes, permanecem em uma zona de conforto, por não serem instigados a construir o conhecimento, mas apenas recebê-lo acabado. Por meio de aulas dinâmicas, com uso de jogos e brincadeiras, por exemplo, nas quais permite-se ao aluno arriscar, errar, refletir e tentar, possibilita-se a ele elaborar estratégias de resolução e raciocínio, que o acompanharão e poderão ser utilizadas posteriormente, transformando sua realidade e seu olhar para a matemática. O lúdico possibilita também uma nova relação entre o professor e o aluno. Em uma aula que instiga, provoca desafios e dinamicidade, haverá um novo olhar para o trabalho docente, proporcionando aprendizagens significativas e um diálogo contínuo entre o professor e o estudante, que se sentirá ativo no processo de construção de seu conhecimento. Não se ensinarão conceitos matemáticos por meio do lúdico, porém, servirá de base para a construção dos mesmos. Uma vez que os jogos e as brincadeiras estimulam as crianças a questionar, buscar respostas, arriscar e raciocinar, quando for proposto a elas conceitos, possivelmente os compreenderão com maior facilidade, estarão estimuladas e animadas com o novo, posto que já desenvolveram habilidades e competências previamente, e não como algo abstrato que nenhum interesse lhes desperta. São objetivos dos jogos e das brincadeiras o desenvolvimento cognitivo, as situações desafiadoras, a socialização, a possibilidade de colocações dos alunos e o entretenimento, sendo assim, as alterações esperadas na aprendizagem dos alunos como desenvolver habilidades de selecionar, assimilar, interpretar e validar significados se consolidarão. Como norteiam diversos documentos estudados neste trabalho, ao elaborar um plano de aula, é indispensável a reflexão de qual cidadão se quer formar. Por meio do lúdico, trabalhando o pessoal que reflete no coletivo, nossos alunos serão ativos, participativos, críticos, persistentes e questionadores, transformando a realidade em que atuam, aplicando estratégias de raciocínio e pensando matematicamente. Com isso, concluímos a real 29 necessidade do lúdico nas aulas de matemática, para que ela deixe de ser vista como uma disciplina difícil e maçante para a maioria. 30 REFERÊNCIAS ANTUNES, Celso. Jogos para a Estimulação das Múltiplas Inteligências. Petrópolis: Editora Vozes, 1998. ARANÃO, Ivana V. D. A Matemática Através de Brincadeiras e Jogos. Campinas: Papirus, 1996. BUENO, Silveira. Minidicionário da Língua Portuguesa. 2. ed. São Paulo: FDT, 2007. BALLAN, Luciana C. PANTAROTO, Sheila P. As influências do lúdico no processo ensinoaprendizagem. Trabalho de Conclusão de Curso – FACECAP. Capivari, 2006. BRASIL. Ministério da Educação. PCN-Matemática. Brasília: MEC-SEF, 1997. BROOKS, Jacqueline G. BROOKS, Martins G. 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