A IMPORTÂNCIA DA REFORMA TRIBUTÁRIA

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A IMPORTÂNCIA DA REFORMA TRIBUTÁRIA PARA O
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo evidenciar a importância da reforma tributária para o
desenvolvimento por meio de argumentos de empresários, economistas, juristas,
políticos e autoridades governamentais. Após o exame do sistema tributário nacional e
de seus principais problemas, conclui-se não só pela necessidade da reforma tributária,
mas de uma reforma mais ampla, a reforma fiscal. A reforma tributária depende da
fixação de limite de crescimento para os gastos governamentais. A lei de
responsabilidade fiscal vigente simplesmente exige o equilíbrio entre despesas e
receitas. Os governos podem elevar as despesas uma vez aumentem a carga tributária e
fechem a equação fiscal. Desde o governo Collor-Itamar, em todos os governos os
gastos primários cresceram acima do PIB.
Palavras-chaves: direito financeiro, direito tributário, sistema tributário nacional,
tributos, carga tributária, gastos governamentais, dívida pública, desenvolvimento,
competitividade, infra-estrutura, governança,
8
LISTA DE ABREVIATURAS
ADIN – Ação Declaratória de Inconstitucionalidade
BRIC - Brasil, Rússia, Índia e China
CF – Constituição Federal
CIDE – Contribuição de Intervenção sobre o Domínio Econômico
CND – Certidão Negativa de Débito
COFINS – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social
CPMF – Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira
CSLL – Contribuição Social sobre o Lucro Líquido
CTN – Código Tribunal Nacional
DRU – Desvinculação de Receita da União (Emenda Constitucional nº 42, de 19 dez. 2003)
ICMS – Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS)
IE – Imposto de Exportação
II – Imposto de Importação de Produtos Estrangeiros
IPCA – Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo
IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados
IR- Imposto de Renda
ISS – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza
IVA-E – Imposto sobre o Valor Adicionado Estadual
IVA-F- Imposto sobre o Valor Adicional Federal
LC – Lei Complementar
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PASEP – Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público
PIB – Produto Interno Bruto
PIS – Programa de Integração Social
PPP – Parcerias Público-Privadas
SIMPLES NACIONAL - Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
Sped - Sistema Público de Escrituração Digital
STN – Sistema Tributário Nacional
WCY – World Competitiveness Yearbook
9
LISTA DE SIGLAS
ABRACE – Associação Brasileira Grandes Consumidores Industriais e Consumidores Livres
BCB – Banco Central do Brasil
BIRD – Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento ou Banco Mundial
CADIN – Cadastro Informativo dos Créditos de Órgãos e Entidades Federais Não-Quitados
CDES – Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
CDL-CE – Câmara de Dirigentes Lojistas do Ceará
CFC – Conselho Federal de Contabilidade
CMA – Comissão de Meio Ambiente, Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal
CNI – Confederação Nacional da Indústria
CSRF - Câmara Superior de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda
FEA-USP - Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo
FEBRABAN – Federação Brasileira dos Bancos
FECOMÉRCIO-CE – Federação do Comércio do Estado do Ceará
FECOMÉRCIO-SP – Federação do Comércio do Estado de São Paulo
FGV – Fundação Getúlio Vargas
FIEC – Federação das Indústrias do Estado do Ceará
FIEP – Federação das Indústrias do Estado do Paraná
FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
FIPE-USP – Fundação Instituto e Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo
FMI – Fundo Monetário Internacional
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBPT – Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário
IBRE – Instituto Brasileiro de Economia
ICET – Instituto Cearense de Estudos Tributários
IFC - International Finance Corporation
IIF - Instituto de Finanças Internacionais
IMD – International Institute for Management Development
INSS – Instituto Nacional da Seguridade Social
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
OAB-CE – Ordem dos Advogados do Brasil – Seção do Ceará
OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PGFN – Procuradoria Geral da Fazenda Nacional
PUC-RJ – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
SINDIRECEITA – Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal
SPED – Sistema Público de Escrituração Digital
SRFB – Secretaria da Receita Federal do Brasil
STF – Supremo Tribunal Federal
STJ – Superior Tribunal de Justiça
TCU – Tribunal de Contas da União
TRF-5ª Região – Tribunal Regional Federal da 5ª Região
UFC – Universidade Federal do Ceará
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
USP – Universidade de São Paulo
10
SUMÁRIO
Introdução
I – Diagnóstico do Sistema Tributário Nacional (STN)
1.1 Sistema tributário nacional (STN)
1.2 Excesso normativo e complexidade
1.3 Carga tributária
1.4 Gastos governamentais
1.5 Dificuldades enfrentadas pelas empresas
1.5.1 CND
1.5.2 Obrigações acessórias
1.5.3 Fiscalização
1.5.4 Excesso de exação e abuso de autoridade
1.5.5 Irresponsabilidade dos agentes públicos
1.5.6 Coação ilegal
1.5.7 Impugnação de auto-de-infração – Primeira Instância Administrativa
1.5.8 Recurso de decisão de Primeira Instância
1.5.9 Sigilo fiscal
1.5.10 Crime de sonegação fiscal
II – O STN como obstáculo ao crescimento econômico
III – Necessidade da reforma tributária
IV – Proposta Bernard Appy
Conclusão
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
7
13
13
16
21
40
44
44
46
47
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54
55
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59
62
69
79
82
83
11
INTRODUÇÃO
O Brasil é o 70º no ´ranking´ mundial do grau de liberdade econômica, numa
lista de 157 países, segundo a pesquisa ´Index of economic freedom 2007´, elaborada
pela ´Heritage Foundation´ em parceria com o ´The Wall Street Journal´ (Diário do
Nordeste, Fortaleza, 22 jan. 2007, Negócios, p. 4).
2.
A pesquisa considera dez categorias de liberdade econômica (id.):
a) nos negócios;
b) no comércio;
c) liberdade fiscal;
d) de intervenção do governo;
e) monetária;
f) de investimentos;
g) financeira;
h) de corrupção;
i) do trabalho; e
j) direitos de propriedade.
3.
`O sistema fiscal confuso, as barreiras ao investimento, a gestão governamental
da maior parte dos setores elétrico e de petróleo e de uma parte significativa do sistema
bancário, o Judiciário fraco e um sistema regulatório complicado` estão entre os
principais obstáculos à liberdade econômica do Brasil (id.).
4.
O País sofre com uma burocracia ´altamente ineficiente e corrupta´,
responsável pela redução das liberdades para negócios e investimentos (id.).
5.
O Brasil precisa sair da pasmaceira econômica na qual está imerso: a mais alta
carga tributária, a mais alta carga burocrática, os mais altos encargos trabalhistas e uma
previdência tendente a gerar um furo definitivo nas contas orçamentárias do governo,
alerta Ives Gandra da Silva Martins em conferência proferida em 26 set. 2006 na sede
da Lex Editora, por ocasião de nova edição de seu livro ´O Estado de Direito e o Direito
do Estado´. Um país atrai investimentos pela estabilidade da moeda e pela segurança
12
jurídica. Quem faz um investimento quer saber se terá as mesmas regras daqui a dez
anos. Para garantir os investimentos, os países estão oferecendo baixos tributos e baixos
encargos. A carga tributária da China é a metade da do Brasil.
6.
O Brasil não conseguirá firmar-se como líder regional e não conseguirá um
assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas; o “custo Brasil” continuará
prejudicando o desenvolvimento econômico; o Brasil não conseguirá aprovar todas as
reformas institucionais. Essas previsões fazem parte do relatório “América Latina em
2020. Dois passos para a frente, um e meio para trás”, elaborado a partir da análise de
especialistas convidados pelo Conselho Nacional de Inteligência (NIC), órgão do
governo americano encarregado de realizar previsões de médio e longo prazos. O Brasil
chegará a 2020 discutindo reformas institucionais, como “custo Brasil”, guerra fiscal,
carga tributária excessiva, inflação e dívida externa. Não haverá um crescimento
econômico significativo. O principal motor da economia serão as exportações para os
EUA, a União Européia, a China e a Índia. O Brasil tentará superar suas limitações
estruturais por meio de seu robusto setor de “agribussiness”. Como boa notícia, o
relatório aponta a “democracia pulsante”, um fator de estabilidade para o restante da
região. Os países da América Latina não conseguirão diminuir a pobreza e a
desigualdade, impedindo o desenvolvimento (“AL dará ‘meio passo’ até 2020, prevê
estudo”, Folha de S. Paulo, São Paulo, 11 jan. 2004, p. A18).
7.
O Brasil ficou de fora da lista dos países emergentes com possibilidade de
transformarem-se em potências mundiais em 2007. Publicada pelo ´World
Competitiveness Yearbook´, organizado pelo ´International Institute Management
Development (IMD), baseado na Suíça, a lista aponta a China, Cingapura, África do Sul
e Dubai, dentre os emergentes a converterem-se em potência. Todos esses países têm
como característica comum os atrativos para investimentos, boa estrutura e
transparência na economia. O Brasil, por falta de clareza na direção política, não é um
país previsível. Ninguém pode prever sobre o próximo ano ou até mesmo amanhã,
afirma Stéphane Garelli 1 , professor do IMD. Um grande problema para a não-inclusão
(1) Folha de S. Paulo, São Paulo, 25 dez. 2006, p. B2.
13
na lista foi a ausência da reforma tributária. Essa reforma não aconteceu e todo o mundo
a esperava.
8.
O Brasil caiu do 66º para o 72º lugar no ´ranking´ de competitividade do
´Relatório global de competitividade 2007-2008´ elaborado pelo Fórum Econômico
Mundial, instituição sediada na Suíça. A lista, com 131 países, é liderada pelos EUA
(Folha de S. Paulo, São Paulo, 01 nov. 2007, p. B9 e B11):
TABELA 1 – Ranking da competitividade
1º
2º
3º
4º
5º
6º
EUA
Suíça
Dinamarca
Suécia
Alemanha
Finlândia
7º Cingapura
8º Japão
9º Reino Unido
10º Holanda
FONTE: Fórum Econômico Mundial (Folha de S.
Paulo, São Paulo, 01 nov. 2007, p. B9)
9.
O relatório avalia doze pilares principais:
I – instituições - ou ambiente institucional dentro do qual funciona o sistema
formado pelos indivíduos, empresas e governos para geração de lucro e riqueza na
economia (Finlândia, 1º; Brasil, 104º);
II – infra-estrutura (Alemanha, 1º; Brasil, 78º);
III – estabilidade macroeconômica (Kuait, 1º; Brasil, 126º);
IV – saúde e educação primária (Finlândia, 1º, Brasil, 84º);
V – educação superior (Finlândia, 1º; Brasil, 64º);
VI – eficiência do mercado de bens – ou ´mix´ certo de produtos e serviços de
acordo coma demanda (Hong Kong, 1º; Brasil, 97º);
VII – eficiência do mercado de trabalho (EUA, 1º; Brasil, 104º);
VIII – sofisticação do mercado financeiro (Hong Kong, 1º; Brasil, 73º);
IX – disponibilidade tecnológica - ou adoção dos avanços para o aumento da
produtividade (1º Suécia; Brasil, 55º);
X – tamanho de mercado (EUA, 1º; Brasil, 10º);
14
XI – sofisticação dos negócios (Alemanha, 1º; Brasil, 39º); e
XII – inovação - ou criação de novas tecnologias para o aumento da
produtividade (EUA, 1º; Brasil, 44º) (id., p. B11).
10.
São os quesitos nos quais o Brasil apresenta maiores desvantagens
competitivas: I – extensão e efeito da tributação, 131º lugar (último lugar); II –
burocracia, 128º; III – gastos do governo ineficientes, 127º; e IV – qualidade da
educação primária, 123º (id., p. B11).
11.
O Brasil piorou na pontuação, mas na essência ficou na mesma, avalia Xavier
Sala-i-Martin 2 , professor da Universidade da Columbia e um dos responsáveis pela
elaboração do ´ranking´. A estabilidade macroeconômica brasileira melhorou
dramaticamente, mas ainda há questões, como inflação, juros, etc. O País ainda não
pontua bem no pilar de ambiente institucional, em direitos de propriedade, proteção
intelectual, confiança pública em políticos, eficiência em gastos do governo, tributação,
etc. Mas pontua muito bem em sofisticação empresarial e inovação. Há uma economia
no Brasil integrada à rede mundial econômica e, como ela tem de competir com os
melhores países do mundo, desenvolveu sofisticação e é forçada a inovar pela
sobrevivência, conclui Sala-i-Martin.
12.
Apesar de a imposição fiscal não ter sido o único fator para a queda de
competitividade nacional, ela foi, sem dúvida alguma, elemento relevante ao lado da
burocracia esclerosada, do nível de corrupção detectado por organismos internacionais
nas estruturas administrativas e da regulação excessiva por meio de uma inflação
legislativa, de acordo com a análise de Ives Gandra da Silva Martins 3 .
13.
Como o Brasil tem uma carga tributária superior, cresce então, à evidência,
menos em relação aos demais países componentes dos Brics. A cada aumento na carga
corresponde a um aumento no valor da perda do crescimento do PIB, efeito denominado
´crowding out´ (expulsão), conforme estudo de natureza econométrica de Paulo Rabello
de Castro. Assim, a imposição fiscal atende ao interesse dos detentores do poder, mas, à
evidência, não é do interesse público nem da sociedade (id.).
(2) Folha de S. Paulo, São Paulo, 01 nov. 2007, p. B11.
(3) Uma carga tributária irracional´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 13 nov. 2007, p. A3.
15
14.
O Brasil aparece em 1º lugar no ´ranking´ mundial da burocracia fiscal (tempo
gasto pelas empresas para o cumprimento de suas obrigações tributárias), de acordo
com o estudo ´Paying taxes 2008´, elaborado pelo Banco Mundial, International
Finance Corporation (IFC) e PricewaterhouseCoopers. Comparando os sistemas de 178
países, o estudo aponta uma média mundial de 56 dias por ano para o cumprimento
pelas empresas de suas obrigações fiscais, trabalhistas e previdenciárias. No Brasil, a
média é quase o dobro (108 dias e 8 horas ou 2.600 horas por ano) (Folha de S. Paulo,
São Paulo, 24 nov. 2007, p. B13).
TABELA 2 Ranking da burocracia fiscal (negativo)
horas
1º
Brasil
2.600
2º
Ucrânia
2.085
3º
Camarões
1.400
4º
Belarus
1.188
5º
Armênia
1.120
6º
Nigéria
1.120
7º
Bolívia
1.080
8º
Vietnã
1.050
Nota: horas gastas por ano para cumprimento das obrigações
FONTE: Banco Mundial, IFC e PricewaterhouseCoopers
(Valor, São Paulo 24 nov. 2007, p. B13)
TABELA 3 Ranking da burocracia fiscal (positivo)
horas
1º
Maldivas
0
2º
Emirados Árabes
12
3º
Cingapura
49
4º
Luxemburgo
58
5º
Omã
62
6º
Suíça
63
7º
Nova Zelândia
70
8º
Santa Lúcia
71
Nota: horas gastas por ano para cumprimento das obrigações
FONTE: Banco Mundial, IFC e PricewaterhouseCoopers (Valor,
São Paulo 24 nov. 2007, p. B13)
16
15.
Ainda de acordo com o mesmo estudo, o Brasil está na 137ª posição no
´ranking´ mundial da complexidade do sistema tributário (considera não apenas o custo
representado pelos tributos, mas também o número de tributos e o tempo gasto na
execução dos procedimentos necessários). O Brasil perde competitividade tanto pela
alta carga tributária como pela complexidade para o cumprimento das obrigações (id.).
16.
A liderança do Brasil na burocracia fiscal é um problema a ser superado, mas
se deve, em grande parte, às 27 administrações tributárias diferentes do ICMS, justifica
Paulo Ricardo Cardoso 4 , secretário adjunto da Secretaria da Receita Federal do Brasil.
17.
Na elaboração da monografia, o autor realizou pesquisas (sistema legal,
jurisprudência, entrevistas e opiniões) para, com base no método sistemático-dedutivo,
dar uma visão da importância da reforma tributária e do ajuste fiscal. Embora não
contemple contribuição doutrinária, a monografia pretende, mesmo a título de gota
d´água nos oceanos, prestar uma colaboração ao aperfeiçoamento do Estado brasileiro.
18.
O Cadastro Central de Empresas somou 5,7 milhões de empresas/organizações
em todo o País em 2005, 42,1% das quais tinham menos de 5 anos de idade, 62,5%
tinham menos de 10 anos e apenas 2,9% tinham mais de 30 anos de idade (responsáveis
por 20% do total de pessoas ocupadas). Das unidades criadas em 1997, 19% fecharam
em 1998 e apenas 51,6% estavam sobrevivas em 2005. As 5,7 milhões de
empresas/organizações ocupavam 39,6 milhões de pessoas (81,4% assalariadas e 18,6%
sócios), e desse total as empresas de menor porte, com até 4 pessoas ocupadas,
participavam com 83,0%, tudo de acordo com a pesquisa ´Demografia das empresas
2005´, divulgada pelo IBGE (Folha de S. Paulo, São Paulo, 30 nov. 2007, p. B6).
(4) Valor, São Paulo, 26 nov. 2007, p. E1.
17
I – DIAGNÓSTICO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL
1. 1 Sistema tributário nacional
1.
O Sistema Tributário Nacional (STN) deve viabilizar a consecução dos
objetivos fundamentais da República previstos no art. 3º da Constituição Federal (CF):
Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o
desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e
reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos,
sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas
de discriminação.
2.
A arrecadação tributária justifica-se na medida da utilização dos recursos pelo
Estado para alcançar os objetivos fundamentais da República, pondera Denise Lucena
Cavalcante 5 .
3.
O STN é o conjunto das normas de natureza tributária previstas na Constituição
Federal. A existência de princípios tributários, limitadores do exercício da competência
impositiva, aplicáveis às entidades políticas tributantes, caracteriza o STN, explica
Kiyoshi Harada 6 .
4.
O STN é um sistema parcial dentro de um sistema jurídico global (sistema
constitucional), formado por um conjunto unitário e ordenado de normas subordinadas
aos princípios fundamentais, reciprocamente harmônicos, destinadas a organizar os
elementos constitutivos do Estado (id., p. 324).
5.
Pode-se entender também o STN como o conjunto de tributos federais,
estaduais e municipais (id. p. 325).
(5) ´Dos tributos para as finanças públicas: ampliação do foco´. In: ´Nomos – revista do curso
de mestrado em direito da UFC´. Fortaleza: UFC, n. 25, jan-dez/2006, p. 67.
(6) ´Direito financeiro e tributário´. 15a. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 324.
18
6.
A CF 7 prevê o STN no capítulo I do seu título VI: CAPÍTULO I - DO
SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL - Seção I - DOS PRINCÍPIOS GERAIS; Seção
II - DAS LIMITAÇÕES DO PODER DE TRIBUTAR; Seção III - DOS IMPOSTOS
DA UNIÃO; Seção IV - DOS IMPOSTOS DOS ESTADOS E DO DISTRITO
FEDERAL; Seção V - DOS IMPOSTOS DOS MUNICÍPIOS; e Seção VI - DA
REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS.
7.
O referido capítulo I corporifica 18 artigos (arts. 145 a 162).
8.
O art. 146 cuida do mais relevante instrumento do sistema tributário, a lei
complementar, ressalta Ives Gandra da Silva Martins 8 .
9.
A Lei nº 5.172, de 25 out. 1966, denominada Código Tributário Nacional
(CTN), foi recepcionada como a lei complementar prevista no art. 146 da CF.
10.
O atual sistema tributário previsto na CF é uma carta de direitos do
contribuinte contra a excessiva e reconhecida carga tributária do Brasil, único país do
mundo a outorgar, constitucionalmente, competência impositiva aos municípios 9 .
11.
O constituinte optou por um sistema rígido, pelo qual o Fisco só pode exigir
com base em previsão legal. Nada obriga o contribuinte se em lei não estiver (id., p. 9).
12.
Essa rigidez plasma o STN com os princípios da estrita legalidade, da
tipicidade fechada e da reserva absoluta da lei (id., p. 10).
13.
Originária de projeto do professor Rubens Gomes de Souza, de 1954, a Lei nº
5.172, de 25 out. 1966, recebeu oficialmente o nome de Código Tributário Nacional
(CTN) pelo Ato Complementar nº 36, de 14 mar. 1967. À época, o CTN uniu mais de
duas mil distintas legislações regionais ou locais espalhadas pelo Brasil. Atualmente, do
ponto de vista subjetivo, temos dois órgãos arrecadadores no mesmo nível federal (a
Secretaria da Receita Federal e a Secretaria da Receita Previdenciária), 26 Estados, um
(7) A CF contém 250 artigos distribuídos em nove títulos: I – dos princípios fundamentais; II –
dos direitos e garantias fundamentais; III – da organização do Estado; IV – da organização dos poderes; V
– da defesa do Estado e das instituições democráticas; VI – da tributação e do orçamento; VII – da ordem
econômica e financeira; VIII – da ordem social; e IX – das disposições constitucionais gerais.
(8) ´Curso de direito tributário´. 7a. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 14.
(9)´Curso de direito tributário´. 7a. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 14.
19
Distrito Federal e aproximadamente 5,5 mil municípios com poderes tributários. Do
ponto de vista objetivo, temos 84 tributos diferentes (14 impostos, 34 taxas e 36
contribuições). A disciplina do ICM (atual ICMS) e do ISS foi amputada do CTN e ele
deixou de concentrar as principais normas gerais e especiais do direito tributário
brasileiro. Do ponto de vista valorativo, o CTN sempre visou a resguardar a liberdade e
segurança jurídica do contribuinte contra o Estado, pondera Douglas Yamashita 10 .
14.
A relação econômica fundamental entre o indivíduo e o Estado é a tributação
de um lado e o provimento de bens públicos de outro lado. Da ética dessa relação
recíproca depende, em grande parte, o funcionamento do sistema econômico, sustenta
Celso Luiz Martone 11 , professor titular do FEA-USP, eleito em 2007 ´Economista do
Ano´ pela Ordem dos Economistas do Brasil.
15.
Os tributos devem ser gerais (a base teórica de incidência coincide com a base
efetiva e não existe evasão), transparentes (a alíquota, base de incidência e valor podem
ser facilmente percebidos pelo contribuinte), previsíveis (as regras estáveis no tempo
permitem o cálculo econômico e o planejamento dos agentes no longo prazo) e criar o
mínimo de distorções no funcionamento dos mercados (id.).
16.
A dívida pública é o diferimento de impostos e se justifica em dois casos: a)
cobertura de gasto governamental em situações imprevisíveis; e b) financiamento do
investimento público, cujos benefícios se distribuem no futuro (id.).
17.
A capacidade contributiva ou capacidade econômica significa, no dizer de
Emílio Giardrea, a possibilidade de o indivíduo suportar o ônus tributário ou, no dizer
de Alfredo Augusto Becker, a possibilidade de contribuir para as despesas da
coletividade, em razão de sua força econômica, assinala Régis Frota Araújo 12 .
18.
A nossa Lei Maior, em seu art. 145, § 1º, consagra o princípio da capacidade
contributiva.
19.
A CF dá competência tributária (entendida como o poder para editar leis
instituidoras de tributos) à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios. A
(10) ´Aos 40 anos, o CTN precisa de um check-up´. Valor, São Paulo, 30 out. 2006, p. E2.
(11) ´Financeiro´. São Paulo: Acrefi, n. 47, ago-set/2007, p. 8.
(12) ´Direito constitucional econômico e tributário´. Fortaleza: ABC, 2007, p. 106.
20
Carta Magna não cria tributos, mas confere competência a esses entes federados para a
sua instituição por meio de lei, geralmente lei ordinária. A lei instituidora do tributo há
de prever, no mínimo, a descrição abstrata do fato gerador da obrigação principal
(hipótese de incidência), a base de cálculo e as alíquotas (ou valor fixo), além do sujeito
ativo e dos sujeitos passivos, lecionam Marcelo Alexandrino e Paulo Vicente 13 .
20.
O Direito Tributário é parte do Direito Financeiro, ramo do Direito Público
destinado a normatizar a atividade financeira do Estado. A norma geral é a Lei nº 4.320,
de 17 mar. 1964 (lei orçamentária), e a Lei Complementar nº 101, de 04 maio 2000 (lei
de responsabilidade fiscal), de acordo com o entendimento de Denise Lucena
Cavalcante 14 .
21.
O Direito Tributário tem por objeto somente o tributo e normatiza a relação
entre o fisco e o contribuinte. A norma geral é a Lei nº 5.172 – CTN.
1.2 Excesso normativo e complexidade
22.
O STN é complexo no sentido de burocrático, de moroso, de gigantesco, de
ineficiente. Essa complexidade detecta-se no campo da legislação tributária, assim como
no domínio da administração tributária, observa Germana de Oliveira Moraes, juíza
federal 15 No campo da legislação tributária, a normatividade constitucional é clara e a
jurisprudência constitucional dá sinais de amadurecimento, mas a legislação
infraconstitucional é caótica (mais de 3.000 normas federais, sendo 200 sobre o IR,
além de milhares de normas dos 27 Estados-membros e dos 5.561 municípios).
23.
O sistema tributário brasileiro, na avaliação de Helenilson Cunha Pontes 16 ,
doutor em Direito pela USP, tem como algumas características centrais: a) instabilidade;
(13)´Direito tributário na Constituição e no STF: teoria e jurisprudência´. 11a. ed. Rio de
Janeiro: Impetus, 2006.
(14) `Direito financeiro na ordem constitucional´. In: ´Estudos de direito constitucional e
urbanístico: em homenagem à profª Magnólia Guerra´, Rodrigues, Francisco Luciano Lima (Org.). São
Paulo: RCS Ed., 2007, p. 111.
(15) “A reforma tributária desejável” in “Filosofia e Constituição”, Rio de Janeiro: Letra Legal
Editora, 2004, p. 143).
(16) ´Sistema tributário, carga tributária e capacidade contributiva´. In: ´Grandes questões
atuais do direito tributário – 8º volume´. São Paulo: Dialética, 2004, p. 139.
21
b) complexidade; e c) objetivo arrecadatório ´tout court´ (objetivo exclusivamente de
geração da receita, sem qualquer preocupação com a sua qualidade)..
24.
O pior aspecto do sistema tributário brasileiro é, provavelmente, sua extrema
complexidade. Há aproximadamente 52 encargos impostos pelo governo, avalia o
estudo “Barreiras Jurídicas, Administrativas e Políticas aos Investimentos no Brasil”,
elaborado pelo BIRD, a pedido do governo brasileiro, divulgado em ago. 2001.
25.
Chegamos a um limite de carga tributária: hoje ela beira o conceito de
irracionalidade e vai frear o crescimento, afirmou o ex-presidente FHC 17 em palestra
realizada em convenção da Associação Paulista de Supermercados – APAS.
26.
Quando se fala em reforma tributária, toda vez aumenta-se imposto. Os
indutores do crescimento não estão limitados apenas à queda de juros, mas também à
retomada de confiança interna e externa. A retomada da confiança passa por respeito a
contratos e melhoria nos dispositivos legais, acrescentou FHC.
27.
O Brasil cria, por dia, em média, 36 normas tributárias (4 do governo federal) e
554 normas gerais, de 05 out. 1988 (início da vigência da nova CF) a 05 out. 2005,
segundo o IBPT. No total, os governos editaram 225.626 normas tributárias (25.466
federais, 68.230 estaduais e 2.437.253 municipais) e 3.434.805 normas gerais (134.718
federais, 862.834 estaduais e 2.437.253 municipais). Dessa parafernália normativa,
vigoram 16,2 mil normas tributárias. No período de 1988 a 2005, a carga tributária
aumentou de 20,01% para 37,50% do PIB. As empresas brasileiras estão sujeitas a mais
de 60 tributos, dentre impostos, taxas e contribuições. Como comparação, a China tem
25 tributos e carga fiscal na casa de 17% (Folha de S. Paulo, São Paulo, 06 out. 2005, p.
B1).
28.
O fenômeno patológico-tributário ocorre no Brasil há muitos anos. De 1926 a
1955, cerca de cem normas alteraram a legislação do imposto de renda. Depois de 1955,
mais de uma vintena de leis e decretos continuaram a alterar a referida legislação. A
segurança jurídica perde-se dentro da proliferação das leis tributárias, afirma Alfredo
Augusto Becker 18 .
(17) Folha de S. Paulo, São Paulo, 13.maio.2004, p. B6.
(18) Teoria geral do direito tributário. 3a. ed. São Paulo: Lejus, 1998, p. 6/8.
22
29.
Se fossem integralmente aplicadas as leis tributárias, todos os contribuintes
seriam passíveis de sanções, incluindo a cárcere, não tanto em virtude da fraude, mas
principalmente pela desorientação motivada no contribuinte pelo caos da legislação
tributária (id., p.9).
30.
Quase todas as empresas (96%), numa consulta a 250 empresas paulistas com
faturamento acima de R$ 100 milhões/ano, operam com alguma irregularidade tributária
(pendência com a Receita Federal, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo ou o
INSS), concluiu levantamento realizado pela Docs Inteligência Fiscal, empresa de
consultoria. Por falta de recolhimento de tributos, erros nas declarações e não-entrega de
declarações nos prazos, dentre outros motivos, 93,6% das 250 empresas consultadas
receberam entre 21 a 50 autuações (por empresa), em 2004. O levantamento constatou
ainda: 80% das empresas enviam três vezes por semana funcionários às repartições
públicas; 67,2% das empresas consideram o atendimento do fisco “péssimo” e
“confuso”; 12% das empresas, “regular”; 20% das empresas, “bom”; e 0,8% das
empresas, “ótimo” e “completo”. A burocracia tributária é muito grande no Brasil por
conta do excesso de normas e de obrigações dos contribuintes, observa Fábio Pereira
Ribeiro 19 , presidente da Docs.
31.
É inaceitável a criação de 36 normas tributárias por dia, em média, no Brasil.
Esse fervor torna o crescimento econômico incompatível com nossas potencialidades e
nos faz reféns de um cipoal normativo a desafiar, até mesmo, os melhores especialistas.
O Senado Federal abriu uma luta contra a burocracia. É preciso simplificar as relações
do Estado com o cidadão e as empresas, bem como afastar a burocracia geradora da
ineficiência e geradora de corrupção, afirmou Renan Calheiros, presidente do Senado
Federal, em seu discurso na abertura em 21 nov. 2005 do III Encontro de Cortes
Supremas dos Estados-partes do Mercosul e Associados.
32.
O sistema fiscal brasileiro está entre os mais complexos e onerosos do mundo.
A carga fiscal é pesada, seja quanto à complexidade administrativa, seja quanto às
alíquotas (´Doing business in Brazil´. Washington: Banco Mundial, 2006, p. 9/10).
(19) Folha de S. Paulo, São Paulo, 29 out. 2005, p. B1.
23
33.
De 05 out. 1988 (data da promulgação da atual Constituição Federal) a 05 out.
2006 (seu 18º aniversário), foram editadas no Brasil 26.104 normas tributárias federais
(1 CF; 12 EC; 19 leis complementares; 942 leis ordinárias; 165 medidas provisórias
originárias; 973 medidas provisórias reeditadas; 1.496 decretos; e 22.486 normas
complementares), correspondente a 18,41% do total de normas. Os Estados produziram
ainda 69.488 normas tributárias, enquanto os municípios, 134.024. O total de normas
tributárias soma 229.616, segundo Gilberto Luiz do Amaral, presidente do IBPT 20 .
34.
É preciso simplificar muito o sistema tributário (o cipoal tributário é colossal),
aumentar o número de contribuintes (com 43% da população, as regiões Sudeste e Sul
respondem por 81% da arrecadação federal) e reduzir as alíquotas, assinala Antônio
Ermírio de Moraes 21 .
35.
O sistema tributário brasileiro é um caos. Enquanto nos países desenvolvidos
(União Européia e EUA) simplifica-se, no Brasil as autoridades tributárias têm vocação
para complicar, na expectativa de aumentar a arrecadação, mesmo indevidamente, à
custa dos incautos e desnorteados contribuintes. Com tantos regulamentos e
dificuldades (partindo do princípio segundo o qual todos os governantes são honestos e
todos os contribuintes sonegadores), as autoridades tributárias terminam por exibir o
mais complexo, o mais inseguro e o mais absurdo sistema tributário jamais visto em
qualquer nação, avalia Ives Gandra da Silva Martins22 .
36.
Tendo em conta a baixa qualidade dos serviços públicos prestados e o nível de
carga tributária, o Brasil sufoca o cidadão com tributos como nenhum outro país. O
problema não reside apenas na complexidade do sistema,
senão também nas
autoridades encarregadas de executá-lo. As autoridades fiscais e previdenciárias geram
abundância de regulamentação hermenêutica e autuam fantasticamente os contribuintes
não iniciados no caos normativo (id.).
37.
Acresce-se a tradicional postura do Ministério Público, para o qual o cidadão
está sujeito à caótica interpretação emanada das autoridades quanto à legislação
(20) Valor, São Paulo, 06 out. 2006, p. E1.
(21) Folha de S. Paulo, São Paulo, 12 nov. 2006, p. A2.
(22) ´As amarras legais do Brasil´. Gazeta Mercantil, São Paulo, 07 fev. 2007, p. A-8.
24
brasileira, à excessiva inflação legislativa e à estupenda multiplicação de obrigações
desnecessárias impostas pelo ´regulamentarismo´ brasileiro (id.).
38.
Na ´retrógrada democracia brasileira´, o Estado é tudo, o governo absoluto e o
cidadão um mero ´administrado´, cujo único ´direito´ é seguir as normas editadas ora
num sentido, ora noutro. Sustentados pelos contribuintes, os integrantes dos Poderes, a
multiplicarem-se como cogumelos, sentem-se cada vez mais ´donos do Poder´ e não
servidores públicos (id.).
39.
Para a maioria dos enquistados na burocracia e na política, o cidadão deve
servir ao Poder e não o Poder à sociedade. Com a inflação legislativa, com a
desidratação regulatória e com os preconceitos do Estado contra os verdadeiros
geradores de desenvolvimento (empresários, trabalhadores e profissionais liberais), sem
falar no triste espetáculo das negociações de cargos e de corrupção, o Brasil não corre
nenhum risco de melhorar (id.).
40.
O governo federal somente nos nove primeiros meses de 2007 editou 246
novas normas tributárias (6 leis, 70 decretos, 30 MPs e 140 atos normativos), sem
contar atos declaratórios, segundo levantamento de Martinelli Advocacia Empresarial.
As mudanças foram principalmente em obrigações acessórias. As empresas são
obrigadas a sustentar, além da carga normal, outra carga, representada pelas obrigações
acessórias, comenta Marciel Costa, da Hering 23 .
41.
Há vinte séculos, os romanos cunharam, por intermédio de Tácito, a expressão
´plurimae leges, corruptissima republica´, vale dizer, a multiplicidade das leis
corrompe24 as instituições e, por conseguinte, confunde os cidadãos, afirma Marco
Maciel 25 .
42.
O parlamento, na observação de Prudente de Morais Neto, não é fábrica a
recomendar-se pelo número de projetos elaborados ou pela rapidez com a qual são
(23) Gazeta Mercantil, São Paulo, 27 set. 2007, p. A-14.
(24) O Brasil caiu da 70ª para a 72ª posição no ´ranking´ do Índice de Percepções de
Corrupção, divulgado em 2007 pela Transparência Internacional (TI). Nova Zelândia, Finlândia e
Dinamarca, com nota 9,4, destacam-se no topo do ´ranking´. O Brasil recebeu nota 3,5 (Folha de S.
Paulo, São Paulo, 27 set. 2007, p. A18).
(25) ´Consolidação legislativa´. Diário do Nordeste, Fortaleza, 30 set. 2007, p. 3.
25
produzidos ... Às vezes, a maior virtude de um parlamento está precisamente no número
de projetos eliminados ou depurados ou, então, corrigidos ou substituídos, depois de
estudo quanto possível minucioso dos assuntos (id.).
43.
A complexidade do sistema tributário não é uma tendência necessariamente
má, sobretudo quando destinada a uma melhor efetivação da justiça fiscal ou para a
ampliação da base tributável, de maneira a possibilitar uma melhor repartição dos ônus
tributários pelos diversos setores da sociedade. Seguramente o Estado preferiria uma
tributação mais simples, fácil e efetiva, mas a própria complexidade das relações
econômicas e sociais requer um sistema tributário igualmente complexo e capaz de
refletir todas as sutilezas dessas relações, pondera Gabriel Lacerda Troianelli, mestre
em Direito Tributário26 .
1.3 Carga tributária 27
44.
O aumento de tributos 28 implica redução da atividade econômica, inflação e
desemprego: redução da atividade econômica porque desestimula as iniciativas
empresariais; inflação porque o aumento do custo da atividade é automaticamente
repassado para os preços dos bens e serviços; desemprego porque é inevitável a redução
da atividade produtiva, lembra Hugo de Brito Machado 29 , presidente do ICET.
45.
Nos últimos anos, observa Machado, temos tido significativo aumento da carga
tributária, além da intensificação da pressão fiscal sobre o contribuinte por meio da
ampliação das obrigações acessórias, também causadoras de elevação de custo para as
(26)´Consulta fiscal como causa de suspensão de exigibilidade do tributo´ (Revista Dialética de
Direito Tributário. São Paulo: Dialética, n. 14, nov. 2007, p. 25).
(27) Inclui as seguintes espécies de tributos, de acordo com a classificação adotada por Hugo
de Brito Machado Segundo (´Direito tributário e financeiro´. São Paulo: Atlas, 2005, p. 19): impostos,
taxas, contribuições de melhoria, contribuições e empréstimos compulsórios
(28) O tributo é vetusta e fiel sombra do poder político há mais de vinte séculos. Onde se ergue
um governante, o tributo se projeta sobre o solo de sua dominação, observa Aliomar Baleeiro
(´Limitações constitucionais ao poder de tributar´. 7a. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 1).
(29) “Tributos, inflação e desemprego”. Diário do Nordeste, Fortaleza, 30 jan. 2004, p. 2.
26
empresas, ou por meio de exigências indevidas, fundadas em novas e geralmente
equivocadas interpretações das leis e regulamentos fiscais (id.).
46.
O governo tem sido muito rápido para criar impostos, mas lento para cumprir
suas responsabilidades. A falta de gerenciamento é um dos mais graves problemas do
País. É preciso reverter o colapso da nossa infra-estrutura com a mesma rapidez com a
qual o governo cria e cobra impostos, observa Antônio Ermírio de Moraes 30 .
47.
O sistema tributário brasileiro engloba 61 impostos e contribuições, além de 95
obrigações acessórias para as empresas. A Receita Federal edita anualmente uma média
de 300 normas contendo 55.767 artigos e 33.374 parágrafos (Folha de S. Paulo, São
Paulo, 30 jan. 2005, p. B3).
48.
No México, a carga tributária não ultrapassa os 20% do PIB. Na China
comunista, com 25 impostos e contribuições, a carga tributária é de 16,7% (Primeira
Leitura, São Paulo, mar. 2005, p. 26).
49.
No Brasil, a tributação corresponde a 33,24% do faturamento do setor privado
e a 47,58% dos custos das empresas (id.).
50.
No Brasil, os impostos consomem 54% do valor adicionado ao preço do
produto. Fora do Brasil, esse percentual é só de 14%. A carga tributária e, também, o
custo do dinheiro tornam muito difícil competir produzindo no Brasil (id.).
51.
As empresas têm, em média, 25 dias para o pagamento dos impostos, enquanto
o prazo médio para a entrada da receita é de 57 dias. O pagamento dos impostos é
realizado antes do recebimento da receita. Essa antecipação, além de obrigar as
empresas a recorrer a operações de crédito, configura um confisco antecipado do
faturamento, comprometedor da saúde das empresas e do capital de giro dos
empreendedores, na opinião de José Martonio Alves Coelho 31 , presidente do CFC. De
5,5 milhões de empresas pesquisadas, 54% ou 3 milhões possuem débitos tributários.
(30) Folha de S. Paulo, São Paulo, 21 nov. 2004, p. A2.
(31) O Povo, Fortaleza, 04 set. 2005, p. 34.
27
52.
O Brasil é o líder absoluto no quesito da carga tributária (as empresas
brasileiras gastam 2.600 horas por ano para pagar a carga tributária; em 2º lugar, vêm a
Ucrânia, com 2.185 horas, e em 3º, Camarões, com 1.300 horas). No quesito “prazo
para abrir um negócio”, no Brasil gasta-se 152 dias (somente 4 países estão à frente do
Brasil). No quesito “prazo para obter licenças”, no Brasil gasta-se 460 dias (somente 6
países estão à frente do Brasil). No quesito “custo para demitir pessoal”, no Brasil gastase 165 semanas de salários (somente 3 países estão à frente do Brasil) (Folha de S.
Paulo, São Paulo, 13 set. 2005, p. B5).
53.
A arrecadação de tributos federais e de receitas previdenciárias atingiu R$
364,136 bilhões em 2005 contra R$ 322,555 em 2004, crescimento nominal de 12,89%
e real de 5,65% (correção pelo IPCA). O ´IR´ (R$ 127,4) é o principal tributo, seguido
da ´contribuição previdenciária´ (R$ 110,5); Cofins (R$ 89,9); CPMF (R$ 29,9); CSLL
(R$ 27,0); IPI (R$ 27,0); PIS (R$ 22,6); imposto de importação (R$ 9,3) (Folha de S.
Paulo, São Paulo, 20 jan. 2006, p. B4).
54.
A carga tributária brasileira 32 atingiu 37,82% do PIB em 2005, segundo o
IBPT (relação entre o PIB e o total da arrecadação: R$ 1.937,60 / R$ 732,87). O total da
arrecadação alcançou R$ 732,87 bilhões, sendo 70,1% de tributos federais (R$ 514,42);
25,6% de tributos estaduais (R$ 187,87); e 4,1% (R$ 30,57) de tributos municipais. Em
2004, a carga tributária em relação ao PIB situou-se em 36,80% e o total da arrecadação
somou R$ 650,15 (Folha de S. Paulo, São Paulo, 31 mar. 2006, p. B7).
55.
A carga tributária acumula expansão de 16,4 pontos porcentuais do PIB a partir
da nova Constituição (1988 a 2005). A média da carga tributária dos países
industrializados, calculada pelo FMI com base em 21 países, no período de 2003 e
2004, é de 38,80%. A média da carga tributária nos países com o mesmo nível de
desenvolvimento do Brasil é de 27,44%, de acordo com o FMI (O Estado de S. Paulo,
São Paulo, 02 abr. 2006, p. B1 e B3).
(32) A definição de carga tributária é obtida a partir da análise da arrecadação tributária total
em comparação ao Produto Interno Bruto (PIB). Traduz a parcela do PIB transferida ao setor público por
meio de tributos. Indica o custo de financiamento do Estado imposto à sociedade brasileira, explica
Helenilson Cunha Pontes ´Sistema tributário, carga tributária e capacidade contributiva´ in ´Grandes
questões atuais do direito tributário – 8º volume´. São Paulo: Dialética, 2004, p. 146).
28
56.
O excesso tributário vem comprometendo seriamente a capacidade
empreendedora da indústria de água mineral e desestimulando novos investidores,
afirma Carlos Alberto Lancia 33 , presidente da Associação Brasileira das Indústrias de
Água Mineral. O setor de águas minerais é agravado não só com impostos, mas também
com o malfadado instituto da ´Substituição tributária´, por força do qual as fontes
recolhem antecipadamente ao Estado o imposto devido pelos seus revendedores.
57.
O peso dos impostos em determinados produtos, de acordo com o IBPT:
cerveja, 56,00%; luz, 45,80%; açúcar, 40,50%; detergente, 40,50%; saco de cimento,
39,50%; TV 29 polegadas, 38,00%; café, 36,52% (‘Frente antiimposto tem 1 mi de
assinaturas’. Folha de S. Paulo, São Paulo, 29 abr. 2006, p. B9).
58.
O cidadão trabalha pelo menos 145 dias do ano (4 meses e 25 dias) para o
Fisco, com base em 2006, de acordo com o IBPT. Nos anos 1990, esse parâmetro era de
102 dias; nos anos 1980, 77 dias; e nos anos 1970, 76 dias (Jornal do Senado. Brasília:
Senado Federal, nº 121, 08 a 14 maio 2006, p. 16).
59.
A carga tributária brasileira sobre o agronegócio é muito superior à de países
concorrentes. O peso é de 39% no Brasil, 31% nos EUA e 29% na Argentina. A elevada
carga tributária dá impulso à informalidade e prejudica o crescimento das empresas
legais. A informalidade da mão-de-obra é estimada em 70% na agropecuária. A mão-deobra rural temporária deve somar 4,2 milhões de trabalhadores, número equivalente ao
da permanente, enquanto o número de propriedades rurais situa-se em torno de 4,5
milhões (´Anuário Exame – Agronegócio´. São Paulo: Ed. Abril, jun. 2006, p. 34).
60.
A atual carga tributária brasileira tem um peso significativo no custo das
empresas e chega a inviabilizar certos setores, principalmente aqueles os sujeitos à
concorrência chinesa mais de perto, avalia José Roberto Mendonça de Barros 34 ,
economista.
61.
O Brasil é o 6º país no ´ranking´ dos maiores cargas tributárias, com base em
2004:
(33) ´Inferno tributário´. Diário do Nordeste, Fortaleza, 04 maio 2006, p. 2.
(34) Valor, São Paulo, 13 jun. 2006, p. A12.
29
TABELA 4 Ranking das maiores cargas tributárias
% PIB
1º
Suécia
50,70%
2º
Noruega
44,90%
3º
França
43,70%
4º
Itália
42,20%
5º
Reino Unido
36,10%
6º
Brasil
35,90%
7º
Nova Zelândia
35,40%
8º
Espanha
35,10%
9º
Alemanha
34,60%
10º
Canadá
33,00%
Nota: Relação ´carga tributária/PIB´
FONTE: Folha de S. Paulo, São Paulo, 25 ago. 2006, p. B4
62.
A carga tributária brasileira atingiu 37,37% do PIB em 2005, o maior pico da
história (35,88% em 2004, 34,92% em 2003 e 35,61% em 2002). Essa carga está
distribuída entre as três esferas de governo da seguinte forma: União, 26,18%; Estados,
9,62%; e municípios, 1,57%. Na gestão de FHC, de 1995 a 2002, a carga tributária
subiu de 29,46% para 35,61%. Na gestão Lula, de 2003 a 2005, a carga tributária
elevou-se de 34,92% para 37,37%. O aumento da carga tributária em 2005 foi saudável,
porque fruto da maior lucratividade das empresas e do ganho de eficiência da
administração tributária, disse Jorge Rachid 35 , secretário da Receita Federal. A elevação
da carga não decorreu da criação de nenhum tributo nem do aumento de alíquota ou
ampliação de base de cálculo.
63.
A política tributária foi duramente criticada em recente congresso de
tributarista, comentou Ives Gandra da Silva Martins 36 .
64.
Segundo a conclusão geral dos tributaristas, pratica-se no Brasil apenas uma
política de arrecadação para cobrir o desvario dos gastos supérfluos, inúteis,
demagógicos, duvidosos, aéticos e esclerosados de uma máquina política e burocrática
partilhada entre os detentores do poder (id.).
(35) Folha de S. Paulo, São Paulo, 25 ago. 2006, p. B4.
(36) Gazeta Mercantil, São Paulo, 30 ago. 2006, p. A-15.
30
65.
A carga tributária sobre o setor de energia elétrica deve atingir 51,5% da
receita bruta das empresas em 2006, segundo estudo da PriceWaterhouseCoopers. Em
2005, a tributação correspondeu a 43,7% da receita bruta das empresas. A elevada carga
tributária é entrave ao desenvolvimento do mercado de energia e, por conseqüência, do
crescimento do País (Diário do Nordeste, Fortaleza, 30 ago. 2006, Negócios, p. 3).
66.
Os consumidores industriais brasileiros arcam com uma carga fiscal de 36%
embutida na tarifa de energia elétrica, a maior carga num grupo de 14 países (em
seguida, vêm os austríacos e os italianos). Já os consumidores residenciais suportam
uma carga fiscal de 36%. Num rol de 27 países, corresponde à quarta energia elétrica
mais cara, atrás da Suécia, Noruega, Holanda e Dinamarca (Gazeta Mercantil, São
Paulo, 30 ago. 2006, p. C-2).
67.
Com a carga tributária ao redor de 39% do PIB, o governo virou ´sócio
majoritário´ de qualquer negócio formal no Brasil, de acordo com as análises
empresariais. Os tributos consomem 45%, em média, do ´Valor Agregado Empresarial
(VAE)´, a riqueza gerada pelas empresas formais. Os tributos correspondem a maior
fatia do VAE, composto de quatro componentes: 1) salários (27%); 2) impostos (45%);
3) juros e aluguéis (9%); e 4) lucros e dividendos (19%) (Folha de S. Paulo, São Paulo,
03 set. 2006, p. B4).
68.
A carga tributária potencial (ou seja, se todos os contribuintes pagassem todos
os tributos corretamente) é de 59,38% do PIB, segundo Gilberto Luiz do Amaral 37 ,
presidente IBPT. A evasão fiscal (sonegação e informalidade) corresponde a 39,11% de
toda a arrecadação tributária. A Receita Federal teve acesso ao estudo, mas deixou de
comentar alegando insuficiência de detalhes sobre a metodologia e a origem dos dados
utilizados.
69.
A carga tributária sobre os salários é de 42,50%, com base em 2005, segundo o
estudo ´Carga tributária sobre salários no Brasil´ elaborado pelo IBPT. O custo médio
da tributação para os empregados é de 20,43%.
(37) Folha de S. Paulo, São Paulo, 17 set. 2006, p. B1.
31
70.
O Brasil está no último lugar no ´ranking´ do tempo gasto pelas empresas para
o cumprimento das obrigações tributárias em dia, segundo relatório envolvendo 175
países elaborado pelo Banco Mundial e pela PricewaterhouseCoopers. As empresas
brasileiras consomem 2.600 horas por ano para manter as obrigações tributárias em dia.
A América Latina é uma das regiões nas quais prevalecem sistemas tributários mais
complexos. Uma das exceções é o Chile. Emirados árabes (12 horas), Cingapura (30
horas) e Irlanda (76 horas) destacam-se dentre os países com sistemas de tributação
mais simples (Folha de S. Paulo, São Paulo, 08 nov. 2006, p. B3).
71.
Ainda de acordo com o mesmo relatório, o peso dos impostos sobre o lucro
líquido das empresas brasileiras é de 71,7% (22,4% em impostos diretos, 42,1% em
tributos sobre a mão-de-obra e 7,2% em taxas e contribuições outras), um dos mais altos
do mundo. Na França, o peso é de 68,2%; Rússia, 54%; Japão, 52,8%; EUA, 46,0%;
Tailândia, 40,2%; e Chile, 26,3%. Os tributos são um dos cinco maiores obstáculos para
os negócios, segundo a opinião de 90% dos empresários entrevistados (id.).
72.
Os municípios brasileiros aumentaram em 47,61% sua arrecadação tributária
de 2002 a 2006, de acordo com a Confederação Nacional dos Municípios, baseada em
estudo envolvendo 3.089 municípios (total de 5.564). Somente o ISS subiu 63,13%
(Folha de S. Paulo, São Paulo, 29 nov. 2006, p. B5).
73.
Uma das aberrações do sistema tributário é a manutenção da alíquota da CPMF
em 0,38% quando as aplicações financeiras passaram a render menos de 1,00% ao mês.
Incidente etapa por etapa do processo produtivo, sem compensação de uma para outra, a
CPMF corresponde a cerca de 3% no preço final das mercadorias entregues aos
consumidores. As empresas e os consumidores continuam a carregar esse peso morto,
afirma Mirian Leitão 38 .
74.
O Estado se apropriou de 66,8% do aumento da produção, de 1991 a 2005,
com base na variação absoluta do PIB e a variação da carga tributária. A alíquota média
de tributação no Brasil está em 37,5%, mas de 1991 a 2005 a alíquota marginal
(incidente sobre o aumento da produção) foi de dois terços. O efeito dessa conta é uma
sociedade na qual não há estímulo para o empreendimento. O brasileiro típico está
(38) Diário do Nordeste, Fortaleza, 09 jan. 2007, Negócios, p. 3.
32
desestimulado e todo mundo quer fazer concurso público e evitar riscos, conclui Renato
Fragelli 39 , diretor da Escola de Pós-Graduação em Economia da FGV (EPGE-FGV).
75.
A COFINS é hoje, depois do Imposto de Renda (IR), o tributo mais importante
do governo federal, correspondente a 23,56% da arrecadação da União (R$ 92,4 bilhões
em 2006), ante 3,6% em 1992. Somada à contribuição para o PIS/PASEP (outro tributo
sobre o faturamento), equivale a 29,74% da arrecadação da União, ante 35% do IR. A
tributação sobre o faturamento das empresas é hoje uma carga muito pesada, alerta Júlio
de Oliveira 40 , advogado.
76.
O faturamento é uma fase anterior ao lucro e tributá-lo desestimula a produção.
Para estimular a economia, o início do processo produtivo deveria ser desonerado. A
incidência dos tributos deveria recair sobre as etapas mais próximas do consumidor,
conclui Oliveira (id.).
77.
A Cofins não é realmente um bom tributo, observa Everardo Maciel 41 , ex-
secretário da Receita Federal. Mas a partir de 1980, máxime após a promulgação da
Constituição de 1988, a União sofreu uma combinação perversa de perda de receita
(transferências para outros entes da Federação) com aumento de despesa (aumento das
atribuições). O governo federal resolveu elevar de maneira a forte a arrecadação da
Cofins e de outras contribuições por não estar obrigado a repartir com Estados e
municípios as receitas desses tributos.
78.
O governo introduziu a não-cumulatividade da Cofins (2004), mas em troca
elevou a alíquota de 3% para 7,6%, lembra Maciel. Essa mudança provocou um
aumento extraordinário da arrecadação. Apenas 7% das empresas optam pela tributação
com base no lucro real; 20% optam pelo lucro presumido e 73% pelo Simples. Assim,
para 93% das empresas, a tributação da Cofins é cumulativa e, para apenas 7%, a
tributação é não-cumulativa (id.).
79.
A carga tributária no Brasil passou, entre 2005 e 2006, de 37,8% para 38,8%
do PIB. Essa a informação mais negativa dos números divulgados sobre 2006. A carga
(39) Folha de S. Paulo, São Paulo, 03 fev. 2007, p. B5.
(40) Valor, São Paulo, 26 fev. 2007, p. A3.
(41) Valor, São Paulo, 26 fev. 2007, p. A3.
33
tributária e o volume de gastos do governo federal obrigam o Brasil a ter o sistema
tributário mais irracional e antimercado entre as nações do mundo emergente. Esse
aleijão é o maior limitador de nosso crescimento, sentencia Luiz Carlos Mendonça de
Barros 42 , economista.
80.
O Brasil pratica uma das mais elevadas carga tributária sobre os automóveis.
Em alguns casos, chega a responder por quase 50% do preço do veículo. O País tem
plenas condições de crescer sua produção e firmar-se como um grande fabricante de
veículos, pois já dispõe de extraordinário domínio tecnológico na área, mão-de-obra
altamente eficiente e um mercado interno promissor. Para acelerar esse crescimento,
será imprescindível a revisão da política tributária vigente, afirma José Carlos Pinheiro
Neto 43 , vice-presidente da General Motors do Brasil.
81.
A volatilidade do ordenamento tributário, diante das constantes alterações nas
alíquotas e na aplicação dos tributos, notadamente no imposto sobre importações, o
PIS, a Cofins e a CSLL, inviabiliza o planejamento, inibe os investimentos e fragiliza a
segurança de investidores nacionais e estrangeiros na legislação e nos próprios fiscais.
As várias alterações na CPMF e, agora, a pretensão de estender sua vigência confirmam
a incerteza tributária do País no cumprimento da lei, além do apetite insaciável do
governo, avalia Shubert Machado 44 , diretor do ICET.
82.
O peso dos impostos é o principal fator econômico de entrave ao crescimento
na avaliação dos consumidores. A carga tributária foi citada por 33,4% dos
consumidores entrevistados em pesquisa realizada pela FGV sobre os fatores de entrave
ao crescimento. Em seguida, vêm: taxa de juros elevada (21,6%), desequilíbrio nas
contas públicas (16,5%), inflação (14,9%) e carência de investimento (6,7%). Na
avaliação de 90,8% dos entrevistados, aspectos não-econômicos podem afetar o
crescimento da economia. Os aspectos mais citados foram corrupção (38,6%), nível
educacional (21,9%), segurança pública (14,7%) e estrutura político-partidária (8,3%)
(Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 mar. 2007, p. B8).
(42) Folha de S. Paulo, São Paulo, 02 mar. 2007, p. B2.
(43) ´O carro não é um sofá!´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 10 mar. 2007, p. B2.
(44) Diário do Nordeste, Fortaleza, 20 mar. 2007, Negócios, p. 3.
34
83.
A carga tributária é considerada pelos empresários o principal fator de
limitação dos investimentos. De acordo com a ´Sondagem Conjuntura da Indústria de
Transformação´, divulgada em 18 maio 2007 pela FGV, 49% dos empresários citam a
alta carga tributária como o principal motivo limitador dos investimentos; na seqüência,
vêm a incerteza sobre a demanda, 32%; o custo do financiamento, 18%; a limitação dos
recursos da empresa, 18%; a taxa de retorno inadequada, 18%; outros, 15%; limitação
do crédito, 4% (Folha de S. Paulo, São Paulo, 19 maio 2007, p. B9).
84.
A carga tributária atingiu 34,5% do PIB em 2006, de acordo com o Ministério
da Fazenda, e bateu recorde pelo terceiro ano consecutivo. É certamente um número
alto, admitiu o ministro Guido Mantega 45 , da Fazenda.
85.
A estrutura tributária (continuou o ministro) é injusta, ineficiente e irracional.
Vamos continuar fazendo novas desonerações de modo a equiparar nossa carga
tributária com a de países concorrentes do Brasil. O nosso objetivo maior é achar a
maneira de reduzir a carga tributária sobre a folha de pagamento, porque haverá melhor
efeito econômico, concluiu o ministro (id.).
86.
A elevação da carga tributária de 33,7% do PIB em 2005 para 34,5% em 2006,
conforme divulgou o ministro Guido Mantega 46 , da Fazenda, embora não seja
informação surpreendente, é preocupante. A carga tributária no Brasil é excessiva, além
de estar mal distribuída entre os setores. Ela prejudica a competitividade, inibe
investimentos e estimula a informalidade. Em termos de prestação de serviços à
população, é pífia a contrapartida de tamanho peso de tributo. A alíquota da CPMF
poderia ser reduzida a fim de mitigar as distorções causadas na economia. Por ter
incidência cumulativa, a CPMF prejudica a competitividade, em especial dos setores
com processo produtivo mais complexo. O ministro da Fazenda incorre em equívoco ao
manifestar-se contrário a essa redução.
87.
A realidade tributária é dramática. O caminho não é retirar recursos do cidadão
para mal aplicá-los, mas deixar tais recursos com a sociedade a fim de gerar empregos e
desenvolvimento. Enquanto for postergando a reforma tributária (as leis atuais
(45) Folha de S. Paulo, São Paulo, 13 jul. 2007, p. B3.
(46) ´A vez da CPMF´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 15 jul. 2007, p. A2.
35
permitem o atual nível indecente de tributação), o desenvolvimento nacional continuará
abaixo de nossos concorrentes diretos, apesar das excepcionais condições da economia
mundial, conclui Ives Gandra da Silva Martins 47 .
88.
A carga tributária brasileira é injusta (o dobro da média dos países
emergentes), além de ser mal distribuída, complexa e inibidora de um progresso
econômico muito maior (ao nível de China, Rússia, Índia e até a Argentina). Quanto
mais injusto um sistema tributário, mais sanções e penas são ´legalizadas´ para
desestimular o descumprimento do iníquo ônus fiscal (id.).
89.
Aumento em até 140% de vencimentos de servidores não-concursados; criação
de 600 novos cargos de confiança com salários principescos; e destinação de quase R$ 3
bilhões para anistiados ou pretensos perseguidos do governo militar são gastos a serem
suportados pela obscena carga tributária lançada às costas da sociedade. Com gastos
desnecessários, não há como reduzir a confiscatória carga tributária, além de faltar
recursos para investimentos e serviços públicos à altura (veja-se o caos aéreo) (id.).
90.
O Brasil não cresce mais porque sua estrutura administrativa é desproporcional
às necessidades nacionais e pouco eficiente, além de gerar inaceitáveis obstáculos à
livre iniciativa (id.).
91.
A carga tributária muito alta, o sistema tributário complexo e o excesso de
burocracia poderão determinar, se não for realizada uma reforma, conseqüências
drásticas ao País. A reforma deverá trazer mais empresas para a formalidade e reduzir a
informalidade, afirma Valdir Pietrobon 48 , presidente da Federação Nacional das
Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias,
Informações e Pesquisas (Fenacon).
92.
O Brasil optou pelo pior dos mundos. O PIB se expande a um ritmo inferior ao
dos seus pares emergentes, enquanto continua a reproduzir-se uma ordem social
desigual, injusta e caótica. Com a atual carga tributária, o País poderia ter uma rede de
programas sociais e de serviços de educação e saúde capaz de tornar a paisagem social
brasileira muito mais civilizada, num tempo histórico relativamente curto. Mas os
(47) ´A verdade sobre impostos no País´. Gazeta Mercantil, São Paulo, 11 jul. 2007, p. A-10.
(48) Revista Fenacon em Serviços. Brasília: Fenacon, n. 121, maio/jun. 2007, p. 10.
36
recursos são muito mal utilizados. Montanhas de dinheiro são gastas para a obtenção de
resultados sociais pífios (Rio de Janeiro: FGV, jul. 2007) (Folha de S. Paulo, São Paulo,
06 jul. 2007, p. B2).
93.
Um bom exemplo de programa disfuncional é o da aposentadoria por tempo de
contribuição. Outro ponto irracional da política social é a gratuidade da universidade
pública, benefício a recair quase todo nas mãos da elite socioeconômica. O caminho
racional seria um sistema de bolsas, combinando mérito e origem socioeconômica. O
Brasil gasta com o estudante universitário aproximadamente o dobro do Chile e o triplo
dos países da OCDE. A partir de agora, o Brasil deveria dar prioridade a uma agenda do
aprimoramento do Estado do bem-estar social e proceder a uma revisão da política
social, com foco na eficiência, a fim de conseguir mais resultados com menos recursos,
conclui a Carta do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) publicada em Conjuntura
Econômica (id.).
94.
O resultado previdenciário (arrecadação menos benefícios) é negativo (R$ -
42,0 bilhões em 2006), mas o saldo operacional (recebimentos – pagamentos) é positivo
(R$ 1,2 bilhão em 2006). O resultado previdenciário, utilizado para denominar o déficit
da Previdência Social, não inclui recursos significativos, provenientes da Cofins,
CPMF, CSLL e receita de concursos de prognóstico. Se computada a totalidade das
fontes de recursos garantidas pela Carta Magna 49 e deduzida a total, a Previdência
Social vem apresentando superávit, de acordo com Denise Gentil 50 , professora do
Instituto de Economia da UFRJ, cujos estudos também questionam o destino dos
recursos excedentes..
95.
Os integrantes do CDES solicitaram ao presidente Lula a criação de limite para
a carga tributária, considerada excessiva. O parâmetro seria o nível de tributação
adotado por outros países em desenvolvimento, aproximadamente de 27%. Uma vez
extrapolado o limite, um mecanismo de redução de alíquotas seria aplicado para ajustar
(49) O orçamento da Seguridade Social é composto das receitas provenientes: I – da União; II
– das contribuições sociais; e III – de outras fontes. O art. 194 do Decreto nº 3.048, de 1999, estabelece a
forma pela qual a Seguridade Social é financiada, explica ítalo Romano Eduardo (´Curso de direito
previdenciário: teoria, jurisprudência e mais de 900 questões´. 3a. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006, p.
25).
(50) Folha de S. Paulo, São Paulo, 10 jul. 2007, p. B2.
37
o excedente. A atual carga tributária reduz a competitividade e estimula a sonegação. O
ministro Guido Mantega, da Fazenda, defendeu a redução gradual da carga tributária,
mas se mostrou contra a imposição de limite. Os conselheiros postularam ainda a
redução progressiva da CPMF. A reforma tributária vai sair, disse o presidente Lula. Ele
defendeu também outras reformas, como a política e a trabalhista. Nós precisamos
melhorar a saúde, melhorar a educação, desonerar isso, desonerar aquilo, enxugar o
Estado e baixar os impostos, completou o presidente Lula 51 .
96.
A tarifa cobrada do consumidor industrial cresceu 150% em sete anos,
principalmente devido à criação de mais de dez novos encargos na última década. Esses
novos encargos, somados aos tributos já existentes, representam 51% do valor da tarifa
de energia elétrica ou 100% do custo real.A energia elétrica se tornou um elemento
arrecadatório. A excessiva carga tributária também impacta dramaticamente novos
investimentos em geração, embora o governo federal tenha tomado algumas medidas
para reduzir os encargos sobre o imobilizado. A energia no Brasil está-se tornando tão
cara quanto a de países sem as mesmas condições favoráveis locais. O País precisa
estimular novos investimentos em energia e, dentre as medidas a serem adotadas, está a
desoneração tributária de projetos de geração e transmissão, afirma Jorge Gerdau
Johannpeter 52 , presidente do Conselho de Administração do Grupo Gerdau.
97.
As tarifas residenciais de energia elétrica no Brasil custam cerca de 65% acima
dos preços pagos pelos consumidores residenciais norte-americanos e estão entre as
mais elevadas do mundo. A tarifa média das 65 distribuidoras de energia no País está
em torno de US$ 172 por MW/h, de acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel), ante US$ 104 nos EUA, segundo a ´Energy Information Administration (EIA).
Na Espanha, a tarifa média é de US$ 165; em Portugal, US$ 184; na Inglaterra, US$
186; e Irlanda, US$ 258 (Diário do Nordeste, Fortaleza, 07 jul. 2007, Negócios, p. 7).
98.
O fornecedor de mercadorias e serviços deverá indicar, em nota fiscal, todos os
tributos embutidos no preço de venda, de acordo com proposta aprovada pela Comissão
de Meio Ambiente, Direitos Humanos e Legislação Participativa (CMA) do Senado
(51) Valor, São Paulo, 18 jul. 2007, p. A7.
(52) ´Energia para crescer´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 22 jul. 2007, p. B6.
38
Federal (PLS 174/06). O esclarecimento dos consumidores acerca dos impostos
incidentes sobre mercadorias e serviços está previsto no art. 150 da CF. Exemplos de
carga tributária: Cachaça, 83,07%; cigarro, 81,68%; cerveja em lata, 56,00%; xampu,
52,33%; refrigerante, 47,00%; conta de luz, 45,00%; ferro de passar, 44,35%; creme
dental, 42,00%; brinquedo, 41,98%; detergente, 40,50%; televisão, 38,00%; café,
36,52%; leite, 33,63%; carne e frango, 18,00% (Jornal do Senado, Brasília: Senado
Federal, n. 170, 21 a 27 maio 2007, p. 10).
99.
A arrecadação federal cresceu 10% no 1º semestre de 2007 e a carga tributária
federal deverá bater novo recorde (Folha de S. Paulo, São Paulo, 19 jul. 2007, p. B3):
TABELA 5 Crescimento da carga tributária no Brasil
% PIB
1998
27,76
1999
29,05
2000
30,32
2001
31,19
2002
32,06
2003
31,95
2004
32,68
2005
33,38
2006
34,23
Nota: Relação ´carga tributária/PIB´
FONTE: SRFB e IBGE (Jornal do Senado. Brasília: Senado
Federal, 22 a 28 out. 2007, p. 5)
100. A necessidade da reforma do sistema tributário tem dois pontos de consenso:
a) a elevada carga tributária, agregada ao pequeno retorno propiciado em questões
fundamentais, como saúde, educação, infra-estrutura e saneamento; e b) a complexidade
das atuais regras, responsáveis pela sensação generalizada de insegurança aos
investimentos no País. O discurso da reforma possível reflete a falta de uma verdadeira
intenção do governo de mudar o sistema atual e permanecer na confortável posição de
preservar os altos níveis de arrecadação. Uma efetiva reforma tributária para reduzir a
39
carga e simplificar o sistema é uma utopia, conclui Luiz Roberto Peroba 53 , advogado,
sócio da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados.
101. A Receita Federal segue cada vez mais agressiva para elevar o nível de
arrecadação tributária, como a edição de
regras sem qualquer fundamento para
desconstituir atos jurídicos praticados de maneira legítima; cobrança de tributos por
declarações e lançamentos automáticos; pressão sobre os tribunais administrativos para
proferirem decisões de acordo com atos da administração; questionamento dessas
decisões quando proferidas a favor dos contribuintes; e edição de anistias e programas
de recuperação fiscal com regras complexas, de maneira a não permitir a qualquer
contribuinte acompanhá-las e cumpri-las. Inexiste a tentativa de oferecer ao cidadão um
tratamento com atenção e respeito (id.).
102. O grande volume de operações fiscais e as modificações constantes na
legislação
têm como reflexo a estruturação de área tributária nas empresas, com
necessidade de profissionais especializados, a fim de evitar a autuação. O profissional
de tributos se transformou em peça estratégica dentro das empresas (Valor, São Paulo,
25 jul. 2007, p. D6).
103. O Brasil não tem futuro se não houver uma mudança tributária e fiscal. A hora
da reforma é agora. A arrecadação cresce de forma explosiva. É hora de mudar até
porque chegou ao limite a paciência da sociedade. O setor público absorve mais de 35%
das riquezas produzidas no País a cada ano para cobrir gastos e não oferece serviços
públicos de qualidade nem realiza os investimentos em infra-estrutura indispensáveis ao
funcionamento da economia, adverte Rodrigo da Rocha Loures 54 , presidente da
Federação das Indústrias do Estado do Paraná (FIEP) e presidente do Conselho de
Política Industrial da CNI.
104. Pelo terceiro ano consecutivo, a carga tributária bate recorde sobre recorde e
supera todas as expectativas. O enriquecimento do Estado, em detrimento da sociedade,
observa uma escala ascendente há muito tempo, especialmente nos últimos doze anos. O
(53) ´Reforma tributária: o que ainda se pode esperar do governo´. Valor, São Paulo, 25 jul.
2007, p. E2.
(54) ´Uma reforma fiscal-tributária já´. Gazeta Mercantil, São Paulo, 26 jul. 2007, p. A-3.
40
mais grave não é somente a carga tributária elevada, mas a condição de o contribuinte
pagar duas vezes pelos serviços essenciais. O acesso à escola, ao atendimento à saúde
pública e à segurança, como serviços básicos, é pago a primeira vez por meios dos
tributos recolhidos inapelavelmente. Como o atendimento deixa muito a desejar, o
contribuinte recorre, quase sempre, a serviços terceirizados, oferecidos por empresas
particulares, em busca de qualidade. Essa duplicidade de pagamento é reconhecida pelo
IPEA. Constata estudo dessa agência governamental: “Os consumidores são obrigados a
assumir custos crescentes, com redução da renda disponível, em razão da ausência ou
precariedade da provisão pública, em especial nas áreas de saúde, previdência e
educação” (´Carga sem retorno´. Diário do Nordeste, Fortaleza,, 27 jul. 2007, p. 2).
105. A redução do valor dos tributos e a simplificação da legislação, principais
argumentos para a reforma tributária, podem ser alcançados sem necessidade de
alteração da Constituição. A reforma do texto constitucional, segundo as expectativas,
poderá elevar a carga tributária, já estratosférica, além da possibilidade de supressão de
direitos e garantias dos contribuintes. Os Estados e os municípios querem uma fatia
maior da arrecadação e o contribuinte poderá pagar a conta da disputa com a União,
analisa Erinaldo Dantas Filho55 , presidente da Comissão de Estudos Tributários da
OAB-CE.
106. O Brasil precisa muito de uma reformulação de seu sistema tributário para a
redução da carga tributária e também para a simplificação da legislação, diz Cid Alves,
presidente do SINDILOJAS (id.).
107. A reforma tributária precisa tratar de uma série de distorções do sistema. O
peso excessivo dos tributos emperra o desenvolvimento da economia. Também é
preciso diminuir a burocracia. O comércio sente perversamente o impacto da carga em
duas mãos: a) pela diminuição do poder aquisitivo do consumidor e, em conseqüência
do consumo; e b) pela redução da capacidade de investimento do empresário, avalia
Honório Pinheiro, presidente do CDL (id.).
108. Os mais pobres são os verdadeiros injustiçados pela má qualidade do sistema
tributário. Dois terços da arrecadação vem dos tributos indiretos, justamente os
(55) ´Risco ao contribuinte´. Diário do Nordeste, Fortaleza, 29 jul. 2007, Negócios, p. 7.
41
cobrados sobre a produção e a venda de forma indiscriminada, independentemente da
renda do indivíduo. A alta carga tributária inibe o crescimento econômico de forma
harmônica e gera muito menos emprego. Novamente os mais pobres pagam a conta e
certamente porque o sistema tributário é, além de ineficiente, injusto, segundo o
ministro Guido Mantega, da Fazenda.
109. Somente em função da produtividade tributária, há espaço para o aumento da
carga tributária em pelo menos dez pontos percentuais do Produto Interno Bruto (PIB),
razão pela qual apresentamos ao CDES proposta de limite para a arrecadação. A partir
da definição desse limite, o governo teria de devolver o aumento verificado na carga
tributária por meio da diminuição automática e proporcional, no ano seguinte, de todas
as alíquotas de impostos em vigor. Os governos preferem garantir, no entanto, receitas
ilimitadas para, assim, com folga na tesouraria, executar sua programação sem sustos.
Mas se trata de erro político e técnico. Parte importante das empresas está estressada por
conta de tanto anos carregando dissabores, como o câmbio desarticulado e juros e
impostos elevados, pondera Antoninho Trevisan 56 , contador, presidente da Trevisan
Outsourcing, Consultoria e Educação e da BDO Trevisan Auditores, membro do CDES.
110. Os presentes para o Dia dos Pais em 12 ago. 2007 embutem tributos com
variação de 13,18%, no caso de livros, a 71,36%, no caso de perfume importado,
segundo o IBPT. A carga tributária do charuto é de 62,76%; uísque, 62,52%; vinho,
53,70; jóias, 51,64%; DVD, 51,59%; água de colônia nacional, 51,58%; e caneta de
marca, 48,98% (Diário do Nordeste, Fortaleza, 07 ago. 2007, Negócios, p. 1).
111. A CPMF é um dos piores tributos já inventados. Com uma arrecadação de
tributos equivalente a uma elevada porcentagem do PIB (quase 35%), o governo
brasileiro deveria fazer melhor uso dos recursos públicos, avalia Anne Krueger 57 , exdiretora do FMI.
112. A carga tributária nacional, em 2006, foi equivalente a 34,23% do PIB, a maior
da série histórica, de acordo com a Receita Federal. A carga de tributos federais foi
(56) ´Quem fica com os ganhos da produtividade tributária?´. Valor, São Paulo, 30 jul. 2007, p.
A14.
(57) Diário do Nordeste, Fortaleza, 25 ago. 2007, Negócios, p. 6.
42
equivalente a 23,75% do PIB; de tributos estaduais, a 9,02%; e de tributos municipais,
1,46% (Valor, São Paulo, 22 ago. 2007, p. A6).
113. O erro vem de longe. Desde 1994, quando houve um salto na carga tributária
como proporção do PIB, essa carga vem mantendo o mesmo padrão de aumento: cerca
de um ponto percentual do PIB por ano. O País cresceu em alguns anos, em outros não
cresceu, mas a carga sempre subiu. A questão fiscal é o ponto a impedir o crescimento
sustentado do Brasil, concluiu Celso Luiz Martone 58 , professor da FEA-USP, ao receber
o título de Economista do Ano pela Ordem dos Economistas.
114. A tendência do governo tem sido de aumento de carga tributária com o
aumento de gastos e corte de investimentos, exatamente o caminho oposto escolhido
pelo Chile (carga de 20% sobre o PIB). O governo brasileiro aumenta gastos com
custeio e, para compensar, eleva a carga com vários efeitos sobre o crescimento, como
redução das oportunidades de trabalho, inibição dos investimentos, impedimento da
melhoria tecnológica. O aumento da carga está chegando a um padrão insustentável,
alerta Martone (id.).
115. O Brasil tem a maior carga tributária na exploração de nove tipo de minerais,
entre doze analisados, de acordo com estudo da Ernst & Young (Valor, São Paulo, 26
set. 2007, p. A5).
116. O Brasil continua como um dos países mais difíceis do mundo para a
realização de negócios. O País caiu uma posição em relação ao ´ranking´ de 2006 e
voltou a ser, entre 178 países, o 122º melhor para a realização de negócios, de acordo
com relatório ´Doing business´ do Banco Mundial, em sua 5ª edição A Cingapura vem
em 1º lugar no ´ranking´, seguida da Nova Zelândia e dos EUA. O estudo do Banco
Mundial avalia os países a partir da maior ou menor dificuldade dos empresários em
abrir um negócio, obter licenças de construção, contratar mão-de-obra, registrar
propriedades e obter crédito. Também leva em conta a proteção aos investidores, a
carga tributária, a facilidade para exportar e importar, o respeito aos contratos e o grau
de dificuldade para fechar uma empresa. Na proteção aos investidores, o Brasil fica em
(58) Diário do Nordeste, Fortaleza, 23 ago. 2007, Negócios, p. 7.
43
64º lugar. Em compensação, despenca para o 137º lugar quando é avaliado do ponto de
vista da carga tributária (Valor, São Paulo, 26 set. 2007, p. A4).
117.
O aumento da arrecadação federal se deve em parte à contínua melhoria do
aparelho arrecadatório. Muitas vezes é fruto da ganância dos agentes de fiscalização, a
exigirem tributos sobre situações não ensejadoras de obrigação tributária para o
contribuinte. Mas o grande aumento da arrecadação decorre mesmo da irresponsável
elevação da carga tributária. O governo persegue o aumento da receita e ignora
completamente a força aniquiladora do peso da carga tributária sobre a economia, avalia
Renato Ayres Martins de Oliveira 59 , advogado.
118. O Brasil é um dos países menos competitivos do mundo. No ´ranking´ do
´Índice Fiesp de Competitividade das Nações 2007 (IC-FIESP), o País manteve o 38º
lugar entre os 45 países representativos de cerca de 95% do PIB mundial. Os EUA
destacam-se na 1ª posição (índice 93,9), seguidos da Suécia (76,8), Japão (76,3), Suíça
(75,1) e Noruega (74,4). Entre os fatores negativos para o ambiente de negócios no
Brasil, com índice abaixo da média (17,3), desponta a carga tributária (Folha de S.
Paulo, São Paulo, 11 out. 2007, p. B13).
119. O Brasil ainda tem um longo caminho pela frente em termos de melhoria da
situação fiscal e da redução da relação entre a dívida pública e o tamanho do PIB, de
acordo com avaliação do FMI (Folha de S. Paulo, São Paulo, 18 out. 2007, p. B6).
120. A carga tributária alta é um fato conhecido por todos e sentido no bolso dos
brasileiros. A solução não está meramente em levantar a bandeira de redução da carga
tributária. É preciso mais: é preciso controlar e reduzir os gastos públicos e impedir a
aplicação indevida dos recursos. O cidadão-contribuinte, além de pagar tributos, deve
acompanhar com rigor o destino dado a eles, ressalta Denise Lucena Cavalcante,
doutora em Direito, procuradora da Fazenda Nacional 60 .
121. A carga tributária do setor elétrico brasileiro continua sendo uma das maiores
do mundo, senão a maior. Supera a carga de países como Áustria, Noruega, Itália,
(59) Revista da FIEC. Fortaleza: FIEC, n. 4, set. 2007, p. 11.
(60) ´Dos tributos para as finanças públicas: ampliação do foco´. In: ´Nomos – revista do curso
de mestrado em direito da UFC´. Fortaleza: UFC, n. 25, jan-dez/2006, p. 67.
44
França, Reino Unido e EUA. Enquanto não houver uma redução de tributos, será
impossível falar em tarifas mais módicas e os produtos nacionais continuarão perdendo
espaço para a concorrência internacional, alerta Antônio Inácio Sousa 61 , vice-presidente
executivo da Associação Brasileira Grandes Consumidores Industriais e Consumidores
Livres (Abrace).
1.4 Gastos governamentais
122. Há 13 anos, os gastos dos governos brasileiros, nas três esferas, aumentam num
percentual equivalente ao dobro do aumento do PIB. Os gastos primários cresceram, em
termos reais, 5,7% ao ano, enquanto a economia expandiu-se em 2,9% ao ano. Diante
desse quadro, o governo federal suspende qualquer esforço de cortar gastos, contrata
mais funcionários sob o pretexto de o Estado sofrer de raquitismo; aumenta anualmente
a carga tributária e pede a prorrogação da CPMF, diz Rogério Werneck, professor da
PUC do Rio de Janeiro. O superávit primário do governo foi possível pelo aumento da
carga tributária. O contribuinte foi o único a fazer o ajuste. O governo só elevou as
despesas. O governo precisa ser detido na sua sanha arrecadatória. O Estado não é
raquítico no Brasil. Mas os contribuintes estão ficando raquíticos diante de um governo
cada vez mais pesado, cada vez mais incapaz em qualquer dos serviços públicos,
conclui Mirian Leitão 62 .
123. A finalidade do tributo é o suprimento de recursos ao Estado para o alcance
eficiente do bem-comum. Dois pontos essenciais envolvem o debate do modelo de
tributação atual: a construção de um sistema mais simples de administração e a
diminuição da carga total de tributos. O governo federal reconhece a complexidade
tributária, principalmente entre os tributos a incidir sobre os bens e serviços. Também
reconhece a multiplicidade de formas de apuração, alíquotas e bases de cálculo
aplicáveis aos tributos. Essa multiplicidade abrange mais de cinco mil legislações
diferentes. Evidentemente, a criação do IVA vem a facilitar a vida do contribuinte. Mas
não se pode discutir a reforma tributária somente pela ótica da arrecadação. Há de ser
(61) ´Carga tributária é o grande problema´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 30 out. 2007, p. G3.
(62)
45
discutida também a observância da qualidade dos gastos governamentais e o regime de
repartição da arrecadação entre os entes federados instituído pela Carta de 1988. A
participação da União cresceu de 18,57% do PIB em 1998 para 24,57% em 2006,
enquanto a participação dos Estados cresceu apenas de 7,36% para 9,12% e a dos
municípios, de 1,45% para 1,52%, frisa Paulo Antenor de Oliveira 63 , presidente do
Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal (Sindireceita).
124. A Polícia Federal e a Receita Federal angariaram poderes fantásticos no novo
governo e exercem o poder adotando linha paralela e independente das funções
atribuídas pela lei. A Polícia Federal provoca receios até na mais alta Corte da
República e, para alguns de seus ministros, vivemos num Estado policial. A Receita
Federal bate recordes sucessivos de arrecadação de origem legítima e ilegítima, com
eliminação gradual do direito de defesa do contribuinte. Via ´penhora on line´, vai
incorporando como receita própria tributos contestados na Justiça e, quando perde
questões em Juízo, não devolve o indébito, usando estratégias como o não-pagamento
de precatórios e até a nulificação do instituto da ´coisa julgada´, mediante a oposição de
embargos declaratórios de natureza protelatória ao infinito. O Estado provoca e conta
com a lentidão da Justiça para não cumprir as condenações, embora ponha a culpa no
Judiciário pela morosidade no exame do direito de defesa do contribuinte. O Brasil tem
o dobro da média da carga tributária dos países emergentes, com pífia prestação de
serviços públicos, assinala Ives Gandra da Silva Martins 64 .
125. O tamanho do funcionalismo é exagerado para um país com a nossa capacidade
financeira e a baixa qualidade do serviço prestado. O governo dos EUA gasta o
equivalente a 1,2% de seu PIB com o pagamento de salários dos servidores civis. No
Brasil, esse custo é de 2,7% do PIB. São 22.000 cargos de confiança (sem concurso). O
número de funcionário do Executivo subiu de 810 mil em 2002 para 1 milhão em 2007
(´A origem da crise mundial´. Veja. São Paulo: Abril, n. 2.024, 05 set. 2007, p. 80).
126. O projeto do Orçamento para 2008 dá à União a segunda maior autorização
anual para contratações de servidores e dirigentes desde o primeiro mandato do
(63) ´Reforma ou novo pacto tributário?´. Gazeta Mercantil, 03 set. 2007, p. A-4.
(64) ´Reforma ou novo pacto tributário?´. Gazeta Mercantil, 03 set. 2007, p. A-4.
46
presidente Lula. Permite nomeações, admissões e contratações de até 56,3 mil pessoas
nos três Poderes, 40 mil das quais no Executivo (Folha de S. Paulo, São Paulo, 05 set.
2007, p. A5).
127. Ainda de acordo com o projeto de Orçamento para 2008, o déficit da
previdência dos servidores públicos subirá de 1,39% para 1,42% do PIB. O princípio
mais importante da reforma previdenciária aprovada por emenda constitucional em
2003 (EC nº 41) ainda não entrou em vigor até hoje: a aplicação, para os novos
servidores públicos, do mesmo teto utilizado para o valor das aposentadorias do
Instituto Nacional do Seguro Social, hoje de R$ 2.894,28 por mês. A complementação
das aposentadorias dependerá de contribuição a ´fundos de pensão´, ainda não criados
(Folha de S. Paulo, São Paulo, 05 set. 2007, p. A5).
128. O Brasil é o 14º em gastos previdenciários em ´ranking´ com 113 países
elaborado pela OCDE. Os gastos previdenciários correspondem a 11,7% do PIB. Com
gastos equivalentes a 17,6% do PIB, a Itália encabeça o ´ranking´ (Diário do Nordeste,
Fortaleza, 06 set. 2007, Negócios, p. 6).
129. A política fiscal do governo Lula, expressa na proposta orçamentária para
2008, passou do ponto e vai criar problemas mais sérios para a gestão da economia nos
próximos anos. O Orçamento de 2008 mostra a continuação do processo de crescimento
dos gastos do governo acima de 12% ao ano em termos reais, alerta Luiz Carlos
Mendonça de Barros 65 .
130. As despesas públicas aumentam a cada ano e a Receita Federal precisar apertar
as exigências impostas aos contribuintes para manter a receita tributária ascendente. A
produção em massa de legislações e normas tributárias é subproduto da voracidade
arrecadatória. Poucos conseguem estar em dia com todas as dívidas e normas tributárias.
Oito em cada dez empresas do País têm alguma pendência tributária, afirma João
Geraldo Piquet Carneiro 66 , presidente do Instituto Hélio Beltrão.
131. Tenho preocupação com a economia brasileira, principalmente fiscais, pois o
governo parece estar com a opção perigosa de piorar muito a situação fiscal com
(65) ´Passando do ponto´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 07 set. 2007, p. B2.
(66) Veja, São Paulo: Abril, n. 2.025, 12 set. 2007, p. 11.
47
imprudências como aumento do salário mínimo e gasto com pessoal, avalia Gustavo
Loyola 67 , ex-presidente do BCB.
132. Ninguém governa sem a CPMF, afirmou o presidente Lula. A prorrogação da
CPMF torna-se prioridade incontornável para a sobrevivência do Estado porque não se
cogita de racionalizar a máquina administrativa, de diminuir os gastos com
funcionalismo, de mudar as regras da previdência ou de empreender uma reforma
tributária profunda. Também porque, tanto na situação como na oposição, não há
lideranças dispostas a governar de outro modo e a propor modificações reais numa
estrutura tributária injusta, opressiva, arcaica e exasperadoramente complexa (`Realismo
e disparate´ (editorial). Folha de S. Paulo, São Paulo, 21 set. 2007, p. A2).
133. A economia está crescendo e pressionando a infra-estrutura, como na questão
aérea, dos portos e da energia elétrica. O governo não está investindo nas áreas sob seu
comando nem está criando condições para o investimento do setor privado, seja por
meio das Parcerias Público-Privadas (PPP), ainda no papel, seja por meio de marco
regulatório estável e confiável. É preciso dar sustentabilidade a atual fase de expansão
da economia. Num espaço de três décadas, o Brasil cresceu a metade do resto do
mundo. Só chegamos a uma média de 2,5% ao ano, ante uma média de 5%, alerta
Celso Luiz Martone 68 .
134. A lei de responsabilidade fiscal permite a expansão dos gastos, uma vez
mantido o orçamento equilibrado. Os governantes resolveram então continuar
ampliando as despesas por meio do aumento da receita. A carga tributária, como
resultado, explodiu. Cresce há 13 anos consecutivos, cerca de um ponto do PIB ao ano.
A única forma de controlar o governo é colocar-lhe um freio, ou seja, a limitação do
orçamento (em percentual do PIB). O pior do sistema tributário são as contribuições
federais: além da CPMF, a contribuição para o financiamento da seguridade social
(COFINS), a contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) e o programa de
integração social (PIS). Elas representam 10% do PIB. A prorrogação da CPMF serve
(67) Valor, São Paulo, 29 jun. 2006, p. D2.
(68) Isto É Dinheiro, São Paulo: Três, n. 522, 26 set. 2007, p. 24.
48
para continuar expandindo violentamente o Estado, sob todas as formas, avalia Celso
Luiz Martone (id.).
1.5 Dificuldades enfrentadas pelos empresários
1.5.1 CND
135. A comprovação do pagamento de tributos é uma maratona das mais
desgastantes para as empresas brasileiras: 92,7% dos grupos empresariais retardaram ou
perderam negócios devido a dificuldades em conseguir a tempo a Certidão Negativa de
Débitos (CND), segundo pesquisa com 117 grupos escolhidos dentre os elencados no
anuário ´200 Maiores´ publicado por Valor. As dificuldades para conseguir a certidão
não apenas atrapalham a vida das empresas, como também sobrecarregam o Judiciário,
assinala Elidie Bifano, consultora da PricewaterhouseCoopers, empresa realizadora da
pesquisa. Para 60,4% das empresas entrevistadas, o impedimento para a obtenção da
CND decorre de diferenças irrelevantes. As ações das empresas para apurar e pagar
impostos, como a manutenção de livros, o preparo e a entrega de documentos e a
atualização de informações, representam os custos da tributação oculta, explica Elidie
Bifano 69 .
136. O ´Cadastro informativo (CADIN) dos créditos de órgãos e entidades federais
não-quitados´ é agora regulado unicamente pela Lei nº 10.522, de 2002. O Decreto nº
5.913, de 27 set. 2006, revogou explicitamente o Decreto nº 1.006, de 09 dez. 1993,
instituidor do CADIN, já tacitamente revogado devido à superveniência da Lei nº
10.522.
137. As dificuldades para a obtenção da CND são um entrave tipicamente brasileiro
aos negócios. Na Alemanha, Argentina, Austrália, Canadá, Chile, EUA e França,
inexiste documento similar à CND. Na China, Espanha, Índia, Indonésia, México e
Portugal, existe a certidão, mas em nenhum deles o documento atrapalha a atividade
empresarial como no Brasil. Neles, o uso da CND tem particularidades. Na China, por
(69) Valor, São Paulo, 28 jun. 2006, p. A2.
49
exemplo, é exigida apenas para remessa de recursos ao exterior. Na Índia, com a
simplificação das regras tributária a certidão passou a ser utilizada como um direito do
contribuinte de demonstrar o cumprimento de suas obrigações fiscais. Pré-requisito para
as empresas participarem de licitações públicas ou obterem empréstimos em bancos
oficiais, a CND é um obstáculo à atividade empresarial, de acordo com muitas
companhias brasileiras. Numa pesquisa com 117 grupos empresariais, 92,7% relataram
ter perdido ou atrasado negócios em funções de dificuldades em obter a CND no tempo
necessário, concluiu estudo da Pricewaterhouse-Coopers (Valor, São Paulo, 03 ago.
2007, p. A2).
138. Apenas uma entre 38 companhias listadas na Bovespa conseguiu obter
automaticamente a CND, de acordo com pesquisa acadêmica coordenada pelo prof.
Fábio Pereira Ribeiro, do Centro Universitário Monte Serrat (Unimonte). A falta de
obtenção da CND não significa necessariamente a existência de passivo fiscal em
aberto, esclarece Fábio Ribeiro 70 .
139.
Segundo pesquisa da PricewaterhouseCoopers, 92,6% das 117 maiores
empresas do País (área da indústria, comércio, serviços e finanças) afirmam já ter
perdido ou retardado negócios pela dificuldade de obter a certidão negativa de débito
(CND) para comprovar sua regularidade fiscal. Ainda segundo a pesquisa, 50,8% das
empresas indicam, como o problema mais freqüente para a obtenção da CND, o retorno
de débitos já baixados no sistema da Receita Federal (Valor, São Paulo, 31 out. 2007, p. E1).
140.
Apontada por alguns como entrave no dia-a-dia das empresas, a CND, emitida
conjuntamente pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) e pela Procuradoria
Geral da Fazenda Nacional (PGFN), é, na verdade, um instrumento de moralização há
muito tempo almejado pela Fazenda Nacional e representa um aperfeiçoamento do
sistema. Hoje, são expedidas por mês cerca de 1,2 milhões de CNDs conjuntas pela
internet e apenas cerca de 16 mil são emitidas nas unidades da Receita e da PGFN,
afirma Jorge Rachid 71 , secretário da Receita Federal do Brasil.
(70) Gazeta Mercantil, São Paulo 19 set. 2007, p. A-12.
(71) ´A CND não é um entrave para as empresas´. Valor, São Paulo, 09 nov. 2007, p. E4.
50
141.
Proposta de ampliação do prazo de validade da CND e de flexibilização das
normas para a sua emissão foi apresentada ao ministro Guido Mantega, da Fazenda, por
um grupo de empresas, entre as quais a Ambev e a Sadia (Valor, São Paulo, 16 nov. 2007, p. E1).
1.5.2 Obrigações acessórias 72 .
142. As obrigações acessórias 73 (burocracia fiscal), como guias de recolhimento,
declarações preenchidas e despesas de pessoal com controladoria, além de créditos de
impostos não recebidos, podem elevar em dez pontos percentuais a carga tributária
sobre o setor produtivo, de acordo com Roberto Pasqualin 74 , tributarista.
143. Os custos operacionais tributários, representados não só pelos custos para
garantir o recolhimento dos tributos, como também pelos gastos para cumprir todas as
obrigações acessórias 75 (custo de conformidade á tributação), têm grande impacto
dentro das empresas, de acordo com pesquisa realizada pela ´DOCS Inteligência Fiscal´.
Para a maioria das empresas (55%), o custo de conformidade corresponde a 1% do
faturamento anual. (Gazeta Mercantil, São Paulo, 03 maio 2006, p. A-10).
144. A quantidade de exigências fiscais, pelo sistema de trabalho requerido,
interfere na competitividade dos negócios das empresas, além de gerar altos custos,
(72) A obrigação acessória tem o objetivo de viabilizar o controle dos fatos relevantes para o
surgimento de obrigações principais. O inadimplemento de uma obrigação tributária, seja principal ou
acessória, é uma não-prestação, da qual decorre uma sanção, explica Hugo de Brito Machado (´Curso de
direito tributário´. 27a. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 140).
(73) Mesmo quando instituídos por lei, configurem ou não obrigações tributárias acessórias, os
deveres administrativos impostos aos contribuintes devem obedeciência aos princípios da razoabilidade e
da proporcionalidade. Se ferem tais princípios, são inconstitucionais, afirma Hugo de Brito Machado
(´Obrigação tributária acessória e os princípios da legalidade e da razoabilidade´ in ´Grandes questões
atuais do direito tributário – 8º volume´. São Paulo: Dialética, 2004, p. 139).
(74) DCI, São Paulo, 13 abr. 2006, Legislação, p. A4.
(75) Dispõe o CTN:
Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.
§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento
de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.
§ 2º A obrigação acessória decorrente da legislação tributária e tem por objeto as prestações,
positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.
51
avalia Fábio Pereira Ribeiro 76 , presidente da Docs Inteligência Fiscal, autor de
´Inteligência Fiscal na Controladoria´.
145. As
atividades
de
atendimento
regulatório
(atendimento
às
diversas
necessidades de órgãos do governo) consomem 7,6% do tempo administrativo das
empresas brasileiras. Na América Latina, a média é 4,1%. As companhias abertas
destinam, em média, 0,33% do seu faturamento às despesas necessárias para custear a
burocracia para cumprir as obrigações fiscais por conta do grande número de normas.
Quanto menor a empresa, maior o percentual; nas empresas com faturamento anual
inferior a R$ 100 milhões, pode atingir 1,7%. O alto custo e a dificuldade para cumprir
as obrigações fiscais decorrem da excessiva quantidade de normas regulando a área,
concluiu pesquisa encomendada pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo
(FECOMÉRCIO-SP) e realizada por economistas da Fundação Instituto e Pesquisas
Econômicas da Universidade de São Paulo (FIPE-USP) (Gazeta Mercantil, São Paulo,
29 maio 2006, p. A-8).
146. O desenvolvimento econômico, segundo a professora Maria Helena Zockun,
coordenadora da pesquisa, depende da redução do número de tributos, imposição de
alíquotas únicas por tributo, neutralidade dos tributos quanto às fontes de rendimentos,
redução nu número de normas, regras claras, ausência de exceções, estabilidade das
regras e formulários simples (id.).
147. O Brasil é o pior de todos na comparação do Banco Mundial no quesito de
tempo necessário para um contribuinte administrar e recolher tributos. As empresas
brasileiras gastam, em média, 2.600 horas por ano com a administração tributária,
enquanto as empresas de Cingapura gastam 49 horas (Exame, São Paulo: Abril, n. 903,
10 out. 2007, p. 169).
1.5.3 Fiscalização 77
(76) Valor, São Paulo, 12 maio 2006, p. E12.
(77) A fiscalização é um poder-dever conferido às entidades tributantes de executarem atos de
verificação do cumprimento de obrigações tributárias, segundo o entendimento de Eliana Raposo Maltinti
(´Direito tributário´. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 123).
52
148. A Receita Federal realizou 59.030 autuações em 2004: 12.059 pessoas jurídicas
e 46.971 pessoas físicas. O valor das autuações soma R$ 78,9 bilhões (Folha de S.
Paulo, São Paulo, 01 fev. 2005, p. B4).
149. O índice de aproveitamento das autuações fiscais pela Receita Federal é de
12% sobre os valores totais cobrados nos autos, informa Jorge Rachid 78 , secretário da
Receita Federal. O Conselho de Contribuintes, tribunal administrativo examinador da
validade das autuações, tem derrubado 50% dos autos 79 .
150. O avanço dos tentáculos do Estado contra o cada vez mais indefeso cidadão é
uma característica do Estado moderno. No Brasil, o cidadão não é cidadão, mas um
mero administrado. O administrador é um verdadeiro senhor feudal da Idade Média. O
cidadão é, cada vez mais, um mero escravo da gleba. Seus representantes, por serem
autoridades, fazem lei sem a participação do contribuinte, quase sempre em causa
própria, e depois assenhoram-se dos mais variados instrumentos de pressão para
assegurar-se de ‘direitos’, muitas vezes ilegítimos. No campo tributário, o Estado é
avassalador, e o tributo é o mais importante instrumento do poder. O retorno em
serviços públicos é apenas um efeito colateral. Na cobrança do IPTU, a administração
prefere por facilidade a utilização do correio para a entrega da notificação do
lançamento dos débitos. Com a presunção de recebimento, cabe ao contribuinte provar a
falta da entrega da notificação (produção de prova negativa), uma prova não-difícil, mas
impossível, afirma Ives Gandra da Silva Martins 80 .
151. Nos países latino-americanos, ´o princípio da ilegalidade eficaz´ pode ser tão
importante como o da ´legalidade´. Toda a arrecadação realizada ilegalmente pelo
Estado e não contestada pelo contribuinte, por temor, falta de recursos ou
conhecimento, transforma-se igualmente em receita orçamentária. Essa tese foi
(78) Valor Econômico, São Paulo, 11 set. 2003, p. A3.
(79) Cabe à legislação tributária regular a competência e os poderes das autoridades
administrativas em matéria de fiscalização, na forma do art. 194 do Código Tributário Nacional (CTN).
Mas a Administração Pública está vinculada ao princípio da legalidade, previsto no art. 37 da
Constituição Federal (CF), e deve garantir ao contribuinte o direito previsto no art. 5º, II (não será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei). O art. 145, § 1º, da CF prevê
expressamente a vinculação da atividade de fiscalização à lei, assinala Hugo de Brito Machado Segundo
(´Código tributário nacional: anotações à Constituição, ao código tributário nacional e às leis
complementares 87/1996 e 116/2003´. São Paulo: Atlas, 2007, p. 371)
(80) ‘A prova negativa’. Gazeta Mercantil, São Paulo, 29 mar. 2006, p. A-12.
53
discutida em Congresso Interamericano realizado em Buenos Aires, em 1978, lembra
Ives Gandra da Silva Martins 81 .
1.5.4 Excesso de exação e abuso de autoridade
152. O excesso de exação do agente fiscal constitui crime tipificado no artigo 316
do Código Penal, afirma Ives Gandra da Silva Martins 82 , advogado tributarista. Apesar
da notoriedade de inúmeras ações, por parte do Fisco, maculadoras dos direitos do
cidadão, por vezes lançando mão de procedimentos vexatórios, raramente o contribuinte
utiliza o art. 316.
153. Dispõe o 1º do art. 316 do Código Penal:
“Se o funcionário público exige tributo ou contribuição social que sabe
ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio
vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: Pena – reclusão, de 3 (três) a 8
(oito) anos, e multa”.
154. O princípio da segurança jurídica estabelecido na Constituição, aplicado no
Direito Tributário, envolve, segundo José Juan Ferreiro Lapatza 83 , professor catedrático
da Universidade de Barcelona, a formulação de normas claras, precisas e coerentes de
modo a resguardar os seguintes requisitos: os cidadãos deverão perceber com clareza
seus direitos e obrigações; os agentes fiscais deverão ser os executores da lei, sem
qualquer margem para interpretações caprichosas ou arbitrárias; os juízes encarregados
de decidir as controvérsias entre a Fazenda e os cidadãos deverão ser a ´boca da lei´, de
modo a poder corrigir, com a mínima margem de dúvida, qualquer desvio.
155. O sistema tributário movimenta-se sob complexa aparelhagem de freios e
amortecedores a limitar os excessos acaso detrimentosos à economia e à preservação do
regime e dos direitos individuais, assinalou Aliomar Baleeiro 84 .
(81) ´Sistema tributário desfigurado´. Gazeta Mercantil, São Paulo, 24 jan. 2007, p. A-9.
(82) “O tributo participativo”. Folha de S. Paulo, São Paulo, 13 dez. 2005, p. A3).
(83) ´Direito tributário: teoria geral do tributo´. 1a. ed. São Paulo: Manole, 2007, p. 38.
(84) ´Limitações constitucionais ao poder de tributar´. 7a. ed. Rio de Janeiro: Forense,1997,p. 2
54
156. No Direito Tributário, como a atividade da Administração é plenamente
vinculada, o contribuinte não pode ter seus direitos legalmente estabelecidos alterados
com suposto fundamento no interesse público, alerta Raquel Cavalcanti Ramos
Machado 85 .
157. Há limitações ao poder de tributar, a respeito do qual afirmou John Marshall,
juiz da Suprema Corte dos EUA: ´O poder de tributar é o poder de destruir´ (´The power
to tax is the power to destroy´), lembra Ives Gandra da Silva Martins 86 .
158. A CF de 1988, nos arts. 145 a 156 (Sistema Tributário), prevê limites à
tributação. Dentre esses limites, a legalidade estrita (art. 150, I) e não lata, como no art.
5º, I; a tipicidade fechada e não aberta; e a reserva da lei formal de maneira absoluta e
não elástica, como no direito privado. De acordo com o princípio da legalidade estrita,
somente a exigência contida nitidamente na lei pode ser cobrada. O Fisco tem o poder
amplo de criar a tributação por ato legislativo, mas, após a sua publicação, não pode
alargar ou estender esse poder por meio de interpretações extensivas, integrações
analógicas ou atos desconsiderativos, exigindo tributos por aproximação legal. A
aplicação da lei tributária não pode sujeitar-se a opiniões de agentes fiscais,
comprometidos em gerar, cada vez mais, receitas para um Estado incapaz de reduzir as
despesas correntes e enxugar a parte esclerosada da máquina administrativa. No direito
tributário, voltado para a defesa do contribuinte, o julgador, na dúvida, decide a favor
do contribuinte (CTN, art. 112) (id.).
1.5.5 Irresponsabilidade dos agentes públicos
159. O Brasil vive hoje a insegurança jurídica máxima com alguns magistrados
deferindo mandados inespecíficos de buscas em escritórios ou determinando a prisão de
contribuintes e advogados, sem haver sequer autos de infração lavrados e sem dar
acesso aos interessados às secretas peças de acusação, observa Ives Gandra da Silva
Martins 87 .
(85) ´Interesse público e direitos do contribuinte´. São Paulo: Dialética, 2007, p. 130.
(86) ´O veto à emenda 3´. Gazeta Mercantil, São Paulo, 04 abr. 2007, p. A-11.
(87) Gazeta Mercantil, São Paulo, 06 jul. 2005, p. A-9.
55
160. Há a violação ao direito de defesa, assegurado pelo artigo 5º, LV, da CF, e, no
caso de prisão, ao direito de liberdade, outro direito fundamental. O contribuinte, uma
vez autuado, poderia exercer a faculdade legal de efetuar o pagamento do tributo, ao
invés de contestar a exigência, e extinguir a punibilidade de eventual crime, na forma da
lei penal tributária. O procedimento pode ensejar, contra a União, pesadas indenizações
por danos patrimoniais e morais, passíveis de serem ressarcidas dos próprios agentes
públicos causadores dos prejuízos, mediante o ajuizamento de ações de regresso
imprescritíveis, adverte Ives Gandra Martins (id.).
161. “Não sou antifazendário, não alimento nenhuma ansiosidade contra o governo,
mas acontece que raramente o Direito está do lado do Estado, que é quem, através de
seus agentes, mais fere as leis e os regulamentos lesando claros direitos do cidadão”,
esclareceu Raimundo Cavalcante Filho 88 , advogado, ex-juiz de uma das Varas da
Fazenda Pública, a respeito de decisões em favor do contribuinte.
162. A prática de ilegalidades pelos agentes públicos ocorre pelo sentimento da
irresponsabilidade. Não são obrigados a reparar o dano sofrido pela vítima da
ilegalidade. O Tesouro Público suporta o ônus da indenização quando a vítima da
ilegalidade procura os seus direitos. O caminho deve ser a responsabilização do agente
público pelos danos decorrentes de suas práticas ilegais, pontifica Hugo de Brito
Machado 89 .
163. Se o Poder Público, quando se houver temerária e levianamente na defesa de
interesses ilegítimos, passar a ser punido, certamente abandonará práticas pelas quais
transforma suas prerrogativas em arbitrariedades. A defesa de interesses ilegítimos
prejudica o contribuinte e o próprio Estado. A violação dos direitos fundamentais do
contribuinte (e os direitos instituídos no princípio da legalidade são cláusulas pétreas)
deve determinar a punição do Estado, principalmente quando, tendo conhecimento dos
fatos inibidores de sua ação, continua pretendendo mudar os fatos para se beneficiar de
um confisco tributário, opina Ives Gandra da Silva Martins 90 .
(88) Diário do Nordeste, Fortaleza, 11 out. 2005, p. 2.
(89) “Autoridade e direito”. Diário do Nordeste, Fortaleza, 23 out. 2005, p. 3.
(90) ´Exceção de pré-executoriedade´. Gazeta Mercantil, São Paulo, 05 jul. 2006, p. A-8.
56
164. Quem mais descumpre a lei e as decisões do Poder Judiciário é a Fazenda
Pública, tanto a federal como a estadual e a municipal, afirma Hugo de Brito
Machado 91 .
165. A fórmula mais adequada de combate ao arbítrio estatal é a responsabilização
pessoal do agente público. Enquanto o agente público puder sentir-se irresponsável por
seus atos ilegais, o arbítrio continuará crescendo. Quando a vítima consegue, por meio
de ação contra o ente público, reparação do dano sofrido, o ônus dessa reparação recai
sobre toda a comunidade de contribuintes, e a autoridade responsável pela ilegalidade
continua praticando, de forma irresponsável, outras ilegalidades (id.).
166. O mercado financeiro vive verdadeira insegurança jurídica pela prática cada
vez mais corrente de a Secretaria da Receita Federal do Brasil instituir tratamentos
tributários por meio de decisões e atos normativos muitas vezes carentes de bases legais
ou até mesmo incompatíveis com leis tributárias em vigor sobre a mesma matéria. Caso
não haja um maior comprometimento com a legislação tributária em vigor quando da
edição de decisões administrativas e atos normativos, a insegurança jurídica tenderá a
aumentar e provocará um enorme prejuízo ao País, seja pelas conseqüências negativas
no mercado financeiro e de capitais, seja pela geração de discussões judiciais
desnecessárias a tornar ainda mais lento nosso Poder Judiciário, avalia André Bazzo
Lauletta 92 , sócia do escritório Mattos Filho Advogados.
1.5.6 Coação ilegal
167. A Certidão de Dívida Ativa, emitida pela Administração Tributária, serve tãosomente para aparelhar o processo executivo fiscal e o seu protesto é desnecessário e
ilegal, conforme entendimento do STJ. Afigura-se impróprio o requerimento da falência
do contribuinte pela Fazenda Pública, detentora de instrumento específico para a
cobrança do crédito tributário. O pedido de falência não pode servir de instrumento de
coação moral para satisfação de crédito tributário (Resp 287.824). Os princípios da
estrita legalidade, tipicidade fechada e reserva absoluta da lei formal colocam uma
(91) Diário do Nordeste, Fortaleza, 28 ago. 2006, p. 2.
(92) ´Insegurança jurídica no mercado financeiro´. Valor, São Paulo, 29 out. 2007, p. E4.
57
camisa de força ao desmedido poder impositivo do governo. As exigências do governo
ultrapassam sempre as reais e justas necessidades do Estado. A elasticidade do princípio
da legalidade, a flexibilidade do tipo privado e a reserva abrangente da lei formal,
técnicas exegéticas da obrigação privada, não são de possível aplicação no direito
tributário, ensina Ives Gandra da Silva Martins 93 .
168. O Fisco, por dispor de procedimento adequado para a execução de seus
créditos tributários, deve eximir-se de efetivar medidas restritivas à atividade do
contribuinte, especialmente providências coativas a dificultar ou impedir o desempenho
da mercancia, de acordo com a jurisprudência do STJ. A Fazenda Estadual de Mato
Grosso negou a um supermercado a autorização para a emissão de talonários de notas
fiscais, em virtude de supostos débitos de ICMS (irregularidade fiscal). Condicionou a
autorização ao imediato pagamento da dívida. O TJMT considerou ilegal a medida da
Fazenda Estadual. O STJ manteve a decisão do TJMT. A recusa da Fazenda Estadual
agride o livre exercício da atividade da mercancia e não é a via correta para compelir o
contribuinte a pagar o seu débito, de acordo com o STJ (Resp 798842, julgado em 02
jun. 2006).
169. Decisão judicial (sentença da 10ª Vara da Fazenda Pública) suspendeu o
protesto em cartório das empresas devedoras do Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS) no Estado de São Paulo. Desde 2005, a Procuradoria
Fiscal do Estado de São Paulo adotou o protesto em cartório como forma de coagir o
contribuinte ao pagamento, observa Hélcio Honda 94 , assessor jurídico da Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). O protesto significa inscrever o nome dos
inadimplentes em bancos de dados de proteção ao crédito, como a SERASA. Se o
contribuinte está em dificuldade, o protesto aumenta essa dificuldade, afirma Honda. O
fisco dispõe de poderes além de suficientes para a recuperação de seus créditos, sem a
necessidade de uso do protesto da certidão de dívida ativa, afirmou o juiz Valentino de
Andrade. Em out. 2005, a Primeira Turma do STJ julgou ilegal o protesto de empresas
inadimplentes pela Fazenda de Minas Gerais..
(93) Gazeta Mercantil, São Paulo, 24 maio 2006, p. A9.
(94) Valor, São Paulo, 29 set. 2006, p. E1.
58
170. O Fisco não pode negar autorização para a impressão de documentos
indispensáveis à atividade do contribuinte, como talão de notas fiscais, como forma de
obrigar o contribuinte a quitar seus débitos. A negativa de autorização é coação ilegal,
segundo o STJ (Resp 789781, julgado em 09 mar. 2007).
1.5.7 Impugnação de auto de infração – Primeira instância administrativa 95
171. A Receita Federal realizou autuações no valor de R$ 79 bilhões, em 2004.
Historicamente, ao longo de 24 meses, em torno de 22% dos valores autuados são pagos
ou parcelados. Esse percentual chega perto de 50% se somados os valores inscritos na
Dívida Ativa da União. O contribuinte tem direito de recorrer administrativa e
judicialmente. No processo administrativo, regulado pelo Decreto nº 70.235, de 1972, o
contribuinte pode questionar o delegado da Receita Federal, em determinados casos.
Não satisfeito, pode pedir a impugnação do débito à Delegacia da Receita Federal de
Julgamento, composto por oito auditores. Não satisfeito, pode ir para o Conselho de
Contribuintes. Dependendo da matéria, o contribuinte pode ir para a quarta instância, o
Conselho Superior de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda. Não satisfeito, pode
ainda buscar a Justiça e começar tudo de novo em primeira instância, explica Jorge
Rachid, secretário da Receita Federal (Folha de S. Paulo, São Paulo, 10 abr. 2005, p.
B4).
172. O contencioso administrativo contempla então duas instâncias: 1) a primeira
formada por julgadores da Receita, composta por oito auditores; 2) a segunda formada
por conselhos paritários, quatro representantes da Fazenda e quatro dos contribuintes.
Pago o débito tributário, o contribuinte tem direito à extinção do processo penal, na
forma da Lei nº 9.430, de 1996 (id.).
173. O órgão julgador de primeiro grau, no âmbito administrativo, é meramente
homologador do lançamento impugnado, e a impossibilidade de interposição de recurso,
(95) O processo tributário, instrumento de composição de litígio de natureza tributária, pode
desenvolver-se no âmbito administrativo e judicial. Se o resultado for desfavorável ao contribuinte, ele
poderá ingressar com a ação judicial competente ou aguardar a oportunidade própria para embargar a
execução fiscal. A impugnação instaura a fase litigiosa do procedimento fiscal, leciona Kiyoshi Harada
(´Direito financeiro e tributário´. 15a. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 547)
59
diante das inconstitucionais exigências de depósito e de arrolamento, importa em
definitiva constituição do crédito tributário e a imediata execução fiscal (art. 201 do
CTN), avalia Luís Carlos Frota Campelo 96 , advogado.
174. No âmbito dos tributos administrados pela Receita Federal, a legislação
determina, para seguimento do recurso voluntário, o arrolamento de bens no valor de
30% da exigência fixada na decisão de primeiro grau (art. 33, § 3º, do Decreto-Lei nº.
70.235/1972). No âmbito do INSS, a legislação determina depósito de 30% em dinheiro
(art. 126, § 1º, da Lei nº. 8.231/1991) (id.).
1.5.8 Recurso de decisão de primeira instância 97
175. Em 2005, o Conselho de Contribuintes acatou 1.969 recursos de contribuintes e
negou 1.907. Pela primeira vez, as decisões em favor dos contribuintes superaram as
decisões em favor da Receita Federal. Em 2004, foram 1.202 recursos acatados e 1.483
negados (Exame, São Paulo: Abril, n. 877, 27 set. 2006, p. 13).
176. O Conselho de Contribuintes, ligado ao Ministério da Fazenda, é órgão de
controle sobre atos da fiscalização da Receita Federal.
177. A garantia de jurisdição está colocada nas Constituições de todos os países
civilizados especialmente como garantia do administrado contra os arbítrios da
administração. No Brasil, os diversos incisos do artigo 5º da CF estabelecem limites da
autoridade em favor dos administrados. São direitos do indivíduo contra o Estado,
explica Hugo de Brito Machado 98 .
178. É um absurdo, continua Machado, admitir uma ação patrocinada pela
administração pública contra seus próprios atos, sob o fundamento da garantia
constitucional de jurisdição. Mas essa hipótese está prevista em parecer aprovado pelo
(96) Diário do Nordeste, Fortaleza, 22 maio 2005, p. 6.
(97) Vinculada como está ao princípio do Estado de Direito e à regra da legalidade, a
Administração Pública pode e deve rever seus próprios atos, uma vez estejam eivados de ilegalidades. É a
autotutela vinculada, mais propriamente chamada autocontrole da Administração Pública, observa Hugo
de Brito Machado Segundo (´Processo tributário´. São Paulo: Atlas, 2004, p. 126).
(98) “Conselhos de Contribuintes”. Diário do Nordeste, Fortaleza, 28 nov. 2004, p. 3.
60
procurador-geral da Fazenda Nacional. Esse parecer sustenta a possibilidade jurídica de
propositura, pela Fazenda Nacional, de ação questionando decisões dos Conselhos de
Contribuintes do Ministério da Fazenda, ou seja, ação para desconstituir um ato
administrativo. O parecer é uma reação à orientação jurisprudencial do STJ segundo a
qual as decisões dos Conselhos de Contribuintes podem ser anuladas pelo Ministro da
Fazenda pela via do recurso de hierarquia, quando proferidas com flagrante ilegalidade,
mas não pode o Ministro da Fazenda reformar as decisões quando envolverem simples
questão de interpretação tributária (id.).
179. A Câmara Superior de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda (CSRF) foi
autorizada a aprovar súmula de suas decisões reiteradas e uniformes pela Lei nº 11.196,
de 21 nov. 2005, artigo 113, introdutora do artigo 26-A ao Decreto nº 70.235, de 06
mar. 1972, regulador do processo administrativo fiscal.
180. O STF declarou a inconstitucionalidade da exigência de depósito prévio ou de
arrolamento de bens e direitos nos recursos administrativos ao Conselho de
Contribuintes do Ministério da Fazenda e ao Conselho Superior do Instituto Nacional
do Seguro Social (Folha de S. Paulo, São Paulo, 01 abr. 2007, p. B7).
181. A Portaria MF nº 147, de 25 jun. 2007, aprovou os Regimentos Internos dos
Conselhos de Contribuintes e da Câmara Superior de Recursos Fiscais.
182. O Primeiro, o Segundo e o Terceiro Conselhos de Contribuintes, órgãos
colegiados judicantes integrantes da estrutura do Ministério da Fazenda, têm por
finalidade julgar recursos de ofício e voluntário de decisão de primeira instância sobre a
aplicação da legislação referente a tributos administrados pela Secretaria da Receita
Federal do Brasil, observadas suas competências e dentro dos limites de sua alçada
(Primeiro Conselho: imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza,
adicionais, empréstimos compulsórios a ele vinculados e contribuições, inclusive
penalidade isolada; Segundo Conselho: IPI, IOF, PIS/Pasep, Cofins, CPMF,
contribuições sociais, etc.; e Terceiro Conselho: imposto sobre a importação e a
exportação, etc.).
183. A Câmara Superior de Recursos Fiscais, órgão colegiado judicante, integrante
da estrutura do Ministério da Fazenda, tem por finalidade julgar recurso especial e
61
voluntário contra decisão de Câmara de Conselho de Contribuintes e recurso
extraordinário contra decisão de Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais.
184. No Estado de São Paulo, 51% dos processos judiciais 99 em andamento são de
natureza tributária, e a principal razão para tantas ações é a complexidade da legislação
fiscal brasileira com 8.000 novas regras por ano (Exame, São Paulo: Abril, n. 876, 13
set. 2006, p. 107).
1.5.9 Sigilo fiscal
185. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, representante da União nos
processos de execução fiscal, foi autorizada, por despacho do ministro Antonio Palocci,
da Fazenda, publicado em 29 set. 2004 no D.O.U., a ter acesso, sem prévia autorização
judicial, à base de dados da Receita Federal, assim como à movimentação bancária do
contribuinte, fornecida mensalmente pelo Banco Central à Receita Federal (Folha de S.
Paulo, São Paulo, 25 nov. 2004, p. A9).
186. O despacho do ministro foi exarado em parecer da própria Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional segundo o qual “o Estado é um só” e o compartilhamento das
informações econômico-fiscais pelos órgãos da administração tributária federal não
configura quebra de sigilo. Na troca de informações entre os órgãos, não há violação de
sigilo, mas o compartilhamento do dever de sigilo, e a custódia da informação sigilosa
passa para o órgão solicitante (id.).
187. A quebra de sigilo na medida é flagrante, afirma Ives Gandra da Silva Martins,
advogado. Baseada na Lei Complementar nº 105/2001, essa medida, caso seja
considerada legal, ela é inconstitucional porque alarga o alcance da quebra de sigilo. Há
três ações de inconstitucionalidade contra a Lei Complementar nº 105/2001 (id.).
188. Todo o cidadão tem direito à sua privacidade e somente o Poder Judiciário tem
o poder de permitir a quebra de sigilo por parte do Fisco, explica Ives Gandra da Silva
(99) O processo judicial tributário é a série encadeada de atos através da qual o Estado-Juiz
presta a tutela jurisdicional para a solução definitiva dos conflitos entre o Estado-Fisco e os contribuintes,
explica observa Hugo de Brito Machado Segundo (´Processo tributário´. São Paulo: Atlas, 2004, p. 216).
62
Martins 100 . Nem os membros do Ministério Público, conforme decisões do STF, podem
quebrar o sigilo bancário (a não ser de servidores da administração pública direta ou
indireta) sem autorização judicial, pois carecem de imparcialidade própria do Poder
Judiciário.
189. O compartilhamento das informações econômico-fiscais concernentes às
pessoas físicas e jurídicas, de modo amplo e irrestrito pelo Poder Executivo, apenas sob
a condição da custódia, é uma aberração. A CF, em seu artigo 5º, X e XII, consagram o
princípio da privacidade, direito de todo cidadão, e deixa ao Judiciário a prerrogativa de
autorizar a quebra do sigilo solicitada por autoridades fiscais, nos casos de indícios de
sonegação (“Ditadura fiscal”. Estado de S. Paulo, São Paulo, 12 dez. 2004, p. A3).
190. A LC nº 105, de 2001, é norma tendente a abolir direito fundamental. O
Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADINs 2386, 2389, 2390, 2397 e 2406,
deverá declarar sua inconstitucionalidade, opina José Augusto Madeira Barros Neto 101 .
191. Havendo fundamentação satisfatória na decisão judicial autorizadora da quebra
dos sigilos bancário e fiscal, não ocorre violação a nenhuma cláusula pétrea da
Constituição, porque o direito garantido no texto constitucional tem natureza relativa e
pode ser quebrado quando assim imponha o interesse público, sempre anteposto ao
particular. A jurisprudência tanto do STF quanto do STJ garante essa interpretação,
afirma Castro Filho, ministro do STJ (Processo: RMS 18445).
192. A interpretação do dispositivo garantidor da inviolabilidade das comunicações
autoriza-nos a concluir ser vedada a comunicação dos dados apurados, mas é possível o
conhecimento dos dados em si, principalmente quando necessários à apuração dos fatos
em julgamento, assinalou o ministro. Os sigilos bancário e fiscal, protegidos no texto
constitucional, não são direitos absolutos e podem ser quebrados em face do interesse
público, a prevalecer sempre sobre o particular.
193. A Receita Federal investiga a suspeita de acesso imotivado aos dados fiscais de
cerca de 6 mil pessoas físicas e jurídicas por parte de servidores. A violação do sigilo
(100) “O grande irmão tributário”. Folha de S. Paulo, São Paulo, 08 dez. 2004, p. B2.
(101) ´A quebra do sigilo bancário e a administração tributária´. Revista Jurídica da FIC.
Fortaleza: FIC, 2006, v. 4, n. 7 (jan./jun.2006), p. 55.
63
fiscal só ocorre, de acordo com a Receita Federal, quando há o vazamento das
informações. Configurada a violação, a União estará sujeita a eventuais ações de
reparação por danos morais (Folha de S. Paulo, São Paulo, 30 mar. 2006, p. A16).
194. A Lei nº 10.174, de 09 jan. 2001 (introdutora de nova redação ao § 3º do art. 11
da Lei nº 9.311, de 24 out. 1996), permite a utilização de dados da CPMF para a
investigação de suposta prática de crime contra a ordem tributária. A investigação
poderá alcançar fatos pretéritos à edição da referida Lei, de natureza procedimental, de
acordo com o STJ (Valor, São Paulo, 05 set. 2007, p. E1).
1.5.10 Crime de sonegação fiscal
195. O exaurimento da instância administrativa, como condição para o ofertamento
de ação penal por crime de supressão ou redução de tributos, é questão pacificada pelo
STF. A imposição de recurso ao Conselho de Contribuintes dá ao contribuinte o direito
de solicitar o trancamento de eventual ação penal ajuizada pelo Ministério Público por
crime contra a ordem tributária, entende o ministro Hamilton Carvalhido, do STJ. Os
efeitos da prescrição, no entanto, ficam suspensos até o julgamento definitivo do
processo administrativo (Processo: RHC 15331, julgado em 05 jan. 2006).
196. O crime de sonegação fiscal ou, em linguagem tecnicamente mais adequada,
crime de supressão ou redução de tributo, está tipificado no art. 1º da Lei nº 8.137, de
1990. O Ministério Público tem preferido capitular o fato imputado ao denunciado em
outros dispositivos legais, como o de falsificação de documento público (CP, art. 297),
falsidade ideológica (CP, art. 299) ou uso de documento falso (CP, art. 305), dentre
outros. O propósito do MP é certamente agravar a situação do denunciado.
197. Mas a indevida capitulação pode implicar o cerceamento do direito de defesa
do acusado e pode dar ensejo ao deferimento de ‘habeas-corpus’ para o trancamento da
ação penal. Se imputado de crime de supressão ou redução de tributo, o acusado tem
direito ao prévio exaurimento da via administrativa e pode obter a extinção de sua
punibilidade pelo pagamento do tributo devido. Os atos praticados com a finalidade de
suprimir ou reduzir tributo, mesmo na hipótese de configurar falsificação de documento
público, falsidade ideológica ou uso de documento falso, configuram efetivamente o
64
crime de supressão ou redução de tributo, porquanto prevalece o dolo específico (a
finalidade induvidosa visada pelo autor). A falsificação do documento, a falsificação
ideológica e o uso de documento falso não passam de meios dos quais se vale o agente
para o cometimento do crime-fim, no caso o crime de supressão ou redução de tributos,
ensina Hugo de Brito Machado 102 .
198. Estados usam a ação criminal por sonegação para forçar o pagamento da dívida
pelos empresários, baseados em prática tradicional na administração tributária federal e
do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O Rio de Janeiro firmou convênio com
o Ministério Público local para a troca de informações sobre devedores do Estado,
inspirado na experiência bem-sucedida de Minas Gerais, pioneiro na medida, a partir do
início de 2005. Na mesma linha, já firmaram acordos de cooperação Santa Catarina, Rio
Grande do Sul e Pernambuco. Para escapar do risco de ações penais, os empresários
preferem pagar logo a dívida. A quitação, antes do ajuizamento da denúncia, livra o
sonegador da punição penal. O processo penal pode determinar, no caso de fraude, a
desconsideração da personalidade jurídica da empresa devedora e ajudar na ação de
execução proposta pelo Fisco. Boa parte dos R$ 300 milhões em fase de execução por
Minas Gerais é bens de sócios de empresas devedoras. A desconsideração da
personalidade jurídica da empresa é algo dificilmente constatado nas ações de
execuções fiscais (Valor, São Paulo, 30 jun. 2006, E1).
199. Qualquer omissão praticada por um neófito empresário ou por um acanhado
comerciante, no tocante ao recolhimento de tributos ou contribuições previdenciárias,
tem sido interpretada pelo fisco como ato desejado e intencional. O fisco olvida as
incontáveis ´exceções à regra´. Até mesmo operadores de direito, membros do
Ministério Público e magistrados têm desprezado a necessidade de demonstração de
´dolo específico´ do devedor no escopo de lesar os cofres públicos. Sem a separação do
joio do trigo, assistimos à multiplicação de ações penais contra contribuintes
fracassados nos negócios, à mingua de recursos financeiros para adimplir as obrigações.
Além de perderem os recursos investidos, passam a responder processos criminais. São
processos absolutamente ineficazes, estéreis e inócuos. Só servem para afogar e
102 ‘O erro na capitulação legal’. Diário do Nordeste, Fortaleza, 09 abr. 2006, p. 3.
65
estrangular ainda mais a máquina judiciária. A atmosfera é de terrorismo fiscal, revelada
pela perseguição implacável do Estado, e esse quadro se traduz numa violência
institucionalizada contra o cidadão, conclui Leandro Vasques 103 , advogado criminal,
mestre em Direito.
200. Aos acusados de crimes tributários tem sido freqüente a imputação do crime de
quadrilha ou bando. O Poder sempre pretende encontrar formas de contornar os limites
jurídicos. Mas o artifício de imputar o crime de quadrilha ou bando não afasta a
exigência de prévio exaurimento da via administrativa nem exclui a extinção da
punibilidade pelo pagamento da dívida. A própria configuração do crime de quadrilha
ou bando não deve ser admitida, se apontada como finalidade da associação somente o
cometimento de crimes tributários, porque esses crimes, em regra, não podem constituir
o objetivo de uma associação, afirma Hugo de Brito Machado 104 .
201. Há exacerbação na imputação do delito de formação de quadrilha (CP, art. 228)
a membros de empresa acusada de prática de crime contra a ordem tributária (Lei nº
8.137, de 1990, art. 1º). Se a sociedade se constituiu para fins lícitos, a eventual prática
de ilicitude fiscal é crime tributário e a conduta não tipifica formação de quadrilha,
avaliam Ernestina Rodrigues Pinto e José Oswaldo Corrêa 105 .
(103) ´Ponderações sobre a violência fiscal´. Diário do Nordeste, Fortaleza, 11 jul. 2006, p. 2.
(104) ´Crimes tributários´. Diário do Nordeste, 15 jul. 2007, p. 3.
(105) ´Crime tributário e formação de quadrilha´. Valor, São Paulo, 28 set. 2007, p. E2.
66
II – O STN COMO OBSTÁCULO AO CRESCIMENTO ECONÔMICO
202. Fazer negócios no Brasil é uma guerrilha. Convivemos com toda sorte de
distorções. Leis em excesso, custo alto do dinheiro e muitos impostos, também cobrados
de forma errada. A carga tributária já passou do limite da realidade econômica e o
sistema tributário é medieval. A estrutura de cobrança dos impostos, com exigência de
pagamento antecipado na fase de investimento, antes de iniciar a operação, é uma
cultura enterrada no mundo moderno, mas ainda não conseguimos romper esse traço
cultural, afirma Jorge Gerdau Johannpeter 106 , presidente do grupo Gerdau, com
dezesseis fábricas no exterior e dez no Brasil.
203. São pontos da ineficiência do Brasil, de acordo com estudo da Moody’s
(Gazeta Mercantil, São Paulo, 29 maio 2006, p. A-5).:
a) relação carga tributária/PIB: no Brasil é de 40%, enquanto na China é de
19%; na Coréia do Sul, 24%; Taiwan, 19%; Tailândia, 18%;
b) relação gastos públicos/PIB: no Brasil é de 40%, enquanto na China é de
28%; Coréia do Sul, 23%; Taiwan, 21%; Tailândia, 18%;
c) relação crédito/PIB: no Brasil é de 30%, enquanto na China é de 166%;
Coréia do Sul, 149%; Taiwan, 167%; Tailândia, 91%;
d) grau de abertura comercial: no Brasil é de 35%, enquanto na China é de
80%; Coréia do Sul, 70%; Taiwan, 130%; Tailândia, 140%.
204. Em 2005, o Brasil viabilizou crescimento de 2,3%, enquanto a China, 9,5%;
Coréia do Sul, 4%; Taiwan, 4%; Tailândia, 7%. Nos últimos 5 anos, o Brasil
experimentou crescimento médio de 2,2%, enquanto a China, 8,8%; Coréia do Sul,
4,3%; Taiwan, 3,6%; Tailândia, 5,6% (id.).
205. A carga tributária brasileira, atrelada ao nível de gastos governamentais, sufoca
o setor produtivo e impede as empresas de conseguirem atingir o máximo de sua
produtividade. O governo precisa reduzir seus gastos para permitir o aumento do
investimento.
(106) Veja, São Paulo, n. 1.902, 27 abr. 2005, p. 11.
67
206. Impostos
sobre
transações
bancárias,
como
a
CPMF,
provocam
desintermediação financeira (ou seja, tiram clientes dos serviços de bancos na América
Latina) e podem gerar ineficiência na economia, segundo a OCDE, com base em estudo
no qual ela comparou o resultado da tributação na Argentina, Brasil, Colômbia,
Equador, Peru e Venezuela. No Brasil, a CPMF promoveu alguma desintermediação
financeira, medida pelo montante de dinheiro fora dos bancos em relação aos ativos
líquidos das instituições bancárias. Os EUA, em 1898, introduziram o tributo na
América com a instituição de taxa de US$ 0,02 sobre os cheques a fim de financiar a
guerra contra a Espanha. No Brasil, a CPMF, introduzida em jan. de 1997, atualmente
com alíquota de 0,38%, substituiu o IPMF criado em jul. de 1993, suspenso pelo STF e
cobrado entre jan. a dez. de 1994 (Valor, São Paulo, 13 jul. 2006, p. C2).
207. Dois fatores separam o Brasil do ´grau de investimento´, segundo relatório da
´Standard & Poor´s (S&P)´ (Folha de S. Paulo, São Paulo, 29 ago. 2006, p. B3):
a) a elevada carga fiscal; e
b) as perspectivas de crescimento modestas (a economia cresceu apenas 2,4%
em média de 1995 a 2005).
208. Essas duas vulnerabilidades econômicas prejudicam o Brasil numa comparação
com países já classificados como ´grau de investimento´ (economias consideradas de
alto retorno para os investidores e baixo risco). Ainda a dois degraus abaixo do primeiro
nível do ´grau de investimento´, o Brasil tem por desafio a implementação das reformas
necessárias à aceleração do ritmo de crescimento e a redução das vulnerabilidades
fiscais. A melhoria das perspectivas de crescimento depende da implantação pró-ativa
de medidas econômico-fiscais e não-fiscais (id.).
209. A governança dos países é avaliada pelo Banco Mundial com base nas
seguintes fontes de dados (relatório ´Governance matters 2006´, divulgado em 15 set.
2006):
a) voz e responsabilidade (mede direitos políticos, civis e humanos);
b) estabilidade política e ausência de violência (mede a probabilidade de
mudanças ou ameaças violentas ao governo, incluído o terrorismo);
c) eficácia do governo (mede a competência da burocracia e a qualidade da
prestação do serviço público);
68
d) qualidade do clima regulador (mede a incidência de políticas pouco
favoráveis ao mercado);
e) estado de direito (mede a qualidade da execução dos contratos, da atuação
da polícia e dos tribunais, incluída a independência judiciária e a incidência
de crime);
f) controle da corrupção (mede o abuso do poder público para benefício
privado, incluindo a corrupção de pequena e grande dimensão, além da
detenção do poder pelas elites).
210. O Brasil está na 66ª posição no ´ranking´ de competitividade global elaborado
pelo Fórum Econômico Mundial (57ª posição em 2005 e 49ª em 2004). Envolvendo 125
países, o ´ranking´ é liderado pela Suíça, seguida da Finlândia, Suécia, Dinamarca,
Cingapura, EUA, Japão, Alemanha, Holanda e Reino Unido. O item ´eficiência de
mercado´, um dos nove pilares de competitividade considerados pelo estudo, abrange o
quesito ´extensão e efeito da carga tributária´, no qual o Brasil aparece na última
posição, assinala Carlos Arruda 107 , da Fundação Dom Cabral, coordenador da pesquisa
localmente. O efeito da carga tributária na competitividade das empresas brasileiras é
assustador, complementa ele.
211. O Estado brasileiro, em vez de otimizar a gestão dos recursos, optou por
multiplicar a receita tributária para compensar o crescente déficit público. Não sobram
recursos para investimentos públicos. O sistema tributário apresenta claros sinais de
esgotamento, porque amarra o crescimento, reduz a geração de empregos e estimula a
sonegação. Tão grave quanto a estrutura de tributos é o processo incessante de emissão
de novas normas e instruções. Somente com uma reforma tributária o Brasil poderá
aumentar sua eficiência competitiva e reduzir as desigualdades sociais, concluiu Jorge
Gerdau Johannpeter 108 , presidente do grupo Gerdau.
212. O baixo crescimento do Brasil pode ser explicado fundamentalmente pela
política fiscal. Se eu tivesse de imaginar uma política fiscal para matar o crescimento de
um país, não conseguiria pensar em nada diferente da política fiscal brasileira, observa
Alexandre Schwartsman 109 , economista-chefe para a América Latina do ABN Amro Bank.
(107) Valor, São Paulo, 27 set. 2006, p. A2.
(108) ´Menos tributos para o país crescer´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 15 out. 2006, p. B4.
(109) Valor, São Paulo, 09 nov. 2006, p. A18.
69
213. No começo da década de 1990, o setor público gastava 22% a 23% do PIB em
despesas primárias e a carga tributária era de 24% a 26% do PIB. Mas os gastos
primários do setor público atingiram 34% do PIB em 2005, enquanto a carga tributária
subiu para 37% do PIB e o déficit nominal é de 3,5% do PIB. O investimento público
caiu. O Brasil não pode adotar o modelo dos países asiáticos e inverter a combinação de
juros altos e câmbio valorizado, pois inexistem nos países asiáticos desequilíbrios
fiscais importantes, pelo contrário. São países tipicamente superavitários nas contas
públicas, nos quais o gasto público é baixo e a poupança é elevadíssima (id.).
214. Apenas em 2017 o Brasil poderá crescer em torno de 5%, após fazer ampla
lição de casa, incluídas as reformas trabalhista, previdenciária e judiciária, além de
políticas efetivas de comércio exterior, avalia o IPEA, fundação pública vinculada ao
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (Folha de S. Paulo, São Paulo, 14
nov. 2006, p. B1).
215. O Brasil não pode alcançar crescimento de 5% nos próximos anos devido a
duas restrições: problemas no setor elétrico, incapaz de fornecer energia para sustentar
expansão dessa magnitude; e a baixa taxa de investimentos (Folha de S. Paulo, São, 15
nov. 2006, p. B7).
216. O ponto mais importante para a aceleração do crescimento do Brasil é a
redução e a simplificação da carga tributária, bem como a redução dos gastos públicos.
O governo deve enviar um sinal bastante claro ao mercado sobre um plano fiscal crível,
mesmo de longo prazo. Os bancos e os investidores sempre vêem o Brasil com imensas
possibilidades e oportunidades. Mas oportunidades passam. Há muita expectativa
positiva, mas ao mesmo tempo todos sabem das dificuldades políticas. Ninguém espera
nada espetacular, mas apenas bons sinais, como foi a Lei de Responsabilidade Fiscal no
passado, tipo de medida capaz de permitir aos investidores ´ancorar´ suas expectativas,
analisa Ramón Aracena 110 , economista responsável pelo monitoramento do Brasil no
Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês).
217. O governo brasileiro precisa cortar impostos e reduzir despesas, a fim de deixar
mais recursos para o setor privado fazer investimentos. Nos países com crescimento
(110) Folha de S. Paulo, São Paulo, 31 dez. 2006, p. B5.
70
mais acelerado, como o Chile, o total das despesas públicas é de cerca de 20% do PIB.
Na China, é menos ainda. Já no Brasil as despesas públicas representam 34% do PIB. O
tamanho do governo do Brasil é muito grande. Para reduzir os impostos, é preciso
diminuir as despesas e, em conseqüência, diminuir o tamanho da máquina estatal,
conclui Rodrigo Rato 111 , diretor-gerente do FMI.
218. São conquistas do Brasil: estabilidade de preços, superávit no balanço de
pagamento, redução da dívida externa e melhoria no gerenciamento da dívida pública
interna. Mas há uma paralisia no processo de implementação de políticas
macroeconômicas, um afrouxamento e uma deterioração da qualidade da política fiscal
(aumento do salário mínimo acima do nível defendido pela própria equipe econômica e
crescimento do déficit da previdência). O aumento do salário mínimo, além da
produtividade, tem de ser repassado como custo e preço para a sociedade. A aceleração
do crescimento é uma possibilidade difícil de ser alcançada no segundo mandato do
presidente Lula, avalia Paulo Leme 112 , diretor de pesquisa de países emergentes do
Goldman Sachs.
219. A política econômica, segundo ele, continuará alicerçada em inflação baixa,
balanço de pagamentos sólido e meta de superávit primário. Qualitativamente, no
entanto, houve ligeira deterioração, notável a partir de março de 2006 (saída do ministro
Antonio Palocci). Mudou a convicção de manter superávits primários maiores, de conter
o crescimento do gasto corrente e de continuar implementando reformas estruturais
(como a lei de falência), fundamentais para o aumento da produtividade. Faltam ao
governo lucidez, convencimento e orientação para a adoção das medidas necessárias a
um programa abrangente e complexo destinado à retomada do crescimento sustentável.
Esse programa inclui reformas estruturais, ajuste fiscal, abertura da economia, reformas
microeconômicas e do mercado trabalhista (id.).
220. O Brasil não cresce porque não merece. E se converte numa economia com
mentalidade de funcionário público, com espírito de acomodação e dependência do
Estado. Os dessarranjos dos anos 1980 e a Constituição de 1988 levaram à
(111) Valor, São Paulo, 09 jan. 2007, p. C8.
(112) Valor, São Paulo, 15 jan. 2007, p. A14.
71
hiperinflação, ao endividamento e ao forte aumento da carga tributária. O resultado é o
crescimento medíocre atual, sentencia Fábio Giambiagi 113 , autor de ´Raízes do atraso –
as dez vacas sagradas que acorrentam o país´.
221. O livro propõe duas idéias-força: a) o país precisa caminhar para uma
economia na qual o bem-estar dependa do esforço, da criatividade e do êxito dos
indivíduos, e não do apoio do governo; e b) o papel do Estado é ajudar as pessoas a
buscar esse êxito, e não apenas transferir renda. O Brasil está-se convertendo em ´showcase´ de políticas sociais voltadas para o bem-estar de clientelas específicas. O elemento
comum desses programas é o fornecimento de recursos públicos em troca de nada (id.).
222. O Brasil está deixando passar a oportunidade de realizar as mudanças
necessárias para ganhar velocidade de crescimento. O País poderia crescer à taxa de 8%
ao ano se eliminasse obstáculos como juros altos, política tributária asfixiante,
burocracia excessiva ao empreendedorismo e leis trabalhistas inflexíveis. O Brasil
possuiu muitos recursos naturais, vasto mercado interno e já demonstrou capacidade
tecnológica, como no caso da Embraer, assinala Malcolm Stevenson Forbes Jr. 114 ,
presidente da Editora Forbes.
223. Os juros não são mais um limitador importante de nosso crescimento. Se algo
precisa ser feito pelo governo para consolidar o atual bom momento, esse algo é o
campo fiscal, afirma Luiz Carlos Mendonça de Barros 115 .
224. O Brasil investiu pouco em infra-estrutura porque, além da crise fiscal, havia
pouca exigência em razão do baixo crescimento. Por causa do ritmo de crescimento
atual, seja do comércio exterior (o atual governo conseguiu duplicar o movimento de
exportações e importações, ora em US$ 260 bilhões) como da economia interna, tornase necessário priorizar investimentos em infra-estrutura e, principalmente, criar as
condições para o setor privado participar desses investimentos. O Estado jamais terá
capacidade para fazer os investimentos necessários. Nas estradas, os recursos do setor
privado virão por meio de concessões. O governo conseguiu a aprovação pelo TCU de
(113) Folha de S. Paulo, São Paulo, 04 mar. 2007, p. B6.
(114) Folha de S. Paulo, São Paulo, 30 maio 2007, p. B4.
(115) Folha de S. Paulo, São Paulo, 08 jun. 2007, p. B2.
72
um modelo de concessão e deverá colocar em licitação sete lotes de rodovias até out. de
2007. Esses lotes, o filé ´mignon´ da malha federal, são rentáveis e não exigirão
recursos do governo. No setor de energia, dentre outros projetos, acabamos de ter a
licença ambiental para a construção da hidrelétrica do rio Madeira, assinalou, por fim, o
ministro Guido Mantega 116 , da Fazenda.
225. O Brasil precisa crescer e, para tanto, necessita de um Estado mais leve e mais
eficiente. Só dessa forma podemos pensar numa estimulação decisiva dos investimentos
produtivos em nosso País e, portanto, em mais emprego e mais renda. Os problemas da
infra-estrutura dependem de recursos públicos e também da facilitação de investimentos
privados nos setores de energia, porto, aeroportos, rodovias, ferrovias e tantos outros.
Da mesma maneira, a melhoria do ensino, da educação e das condições de segurança
dependem basicamente de investimentos governamentais. Em suma, dinheiro não está
faltando para o governo. Falta é uma boa gestão dos recursos arrecadados. É hora de
economizar gastos correntes para reverter o excesso de arrecadação em investimentos
de longo prazo, conclui Antônio Ermírio de Moraes 117 , empresário.
226. A partir de 2008, quando entrará em vigor a nota fiscal eletrônica e o Sistema
Público de Escrituração Digital (SPED) 118 , haverá a integração dos fiscos e toda a
economia passará a ser monitorada pela Receita Federal e pelas fazendas estaduais,
alerta José Fernando Castelo Branco Ponte 119 , presidente do Conselho Temático de
Economia, Finanças e Tributação (Cofin) da FIEC.
(116) Valor, São Paulo, 09 ago. 2007, p. A14.
(117) ´O governo e a CPMF´. Diário do Nordeste, Fortaleza, 12 ago. 2007, p. 3.
(118) O Decreto nº 6.022, de 22 jan. 2007, instituiu o Sistema Público de Escrituração Digital
(SPED). A Secretaria da Receita Federal do Brasil, por meio da Instrução Normativa RFB nº 777, de 19
nov. 2007, regulou a escrituração contábil digital (ECD), para fins fiscais e previdenciários, a ser exigida
das empresas tributadas com base no lucro real, a partir de jan. de 2008. Os dados da ECD serão
encaminhados pelas empresas ao SPED. O Fisco também passará a exigir a escrituração fiscal digital
(EFD)(Valor, São Paulo, 21 nov. 2007, p. E1). .
(119) ´Aumento de tributos, até quando?´. Revista da FIEC. Fortaleza: FIEC, n. 4, set. 2007, p.
16).
73
III – NECESSIDADE DA REFORMA TRIBUTÁRIA
227. O governo não quer a reforma tributária, mas sim a reforma fiscal, ou seja,
alterações na ponta das receitas e na ponta das despesas. A redução das despesas deve
acontecer para permitir a sobra de recursos para o aumento dos investimentos públicos.
Nunca, nos últimos 15 anos, o Brasil teve uma situação tributária tão favorável como a
atual. O governo tem mantido uma estabilidade (e até aumento) da receita tributária.
228. Conseguiu essa situação em virtude de quatro fatores: a) a economia tem
crescido, embora timidamente; b) a Receita Federal reduziu a sonegação com mais
fiscalização e ações de impacto em empresas (como Schincariol e Daslu), além do
acompanhamento da CPMF, por meio da qual identifica movimentações financeiras
atípicas; c) o estoque de prejuízos das empresas praticamente desapareceu nos últimos
anos e, em conseqüência, diminuíram as deduções nos impostos; d) as empresas
esgotaram os recursos de planejamento tributário, pois os últimos governos fecharam as
brechas possibilitadoras dessas manobras.
229. De todas as pessoas jurídicas existentes no Brasil, cerca de 95% utilizam
sistema de tributação simplificada (Simples e o pagamento do imposto de renda com
base no lucro presumido, e esses dois sistemas se revelaram muito eficazes). Apenas 5%
das pessoas jurídicas optam pelo pagamento do imposto de renda pelo regime do lucro
real, e dessa parcela de 5%: 2,5% não apuram lucro e, por conseguinte, não pagam
imposto; e 2,5%, um grupo de até cinco mil empresas, respondem por 80% da
arrecadação federal. O governo está estrangulando esse grupo de empresas. Sufocados,
muitos empresários já deixaram a atividade produtiva e foram investir fora do País. O
governo terá de mudar a tributação em cascata (folha de pagamento, faturamento, caso
da Cofins e do PIS), a fim de permitir a sustentação de seu principal grupo de empresas,
conclui Roberto Quiroga 120 , um dos principais juristas da área tributária.
(120) Isto É Dinheiro. São Paulo: Ed. Três, n. 478, 15 nov. 2006, p. 20.
74
230. As reformas da previdência, tributária, política e trabalhista, além da agrária,
foram prometidas pelo presidente Lula no discurso de posse do primeiro mandato, em
2003. Essas reformas impulsionariam um novo ciclo de desenvolvimento nacional. Mas,
ao fim do primeiro mandato, a reforma previdenciária de 2003 ainda não foi
regulamentada e a reforma tributária serviu, essencialmente, para prorrogar a CPMF e a
DRU, bem como elevar a Cofins. A reforma tributária deve ter sido incluída novamente
no discurso de 2007 porque o governo terá, necessariamente, de prorrogar a CPMF e a
DRU, afirma Alexandre Marinis 121 , economista, citado por Mirian Leitão.
231. Dentre as reformas, a reforma tributária é a prioritária para melhorar a vida da
população, segundo 63% de entrevistados da chamada elite brasileira (integrantes do
Congresso e do governo, empresários e jornalistas). A reforma da previdência vem em
segundo lugar (49%), seguida da reforma do Judiciário (31%), da reforma da legislação
trabalhista (16%), da reforma agrária (15%), da reforma do sistema presidiário (11%),
da reforma política (6%) e da reforma do sistema educacional (2%). Ainda de acordo
com pesquisa realizada em nov. 2006 pela ´Ipsos Public Affairs´, dentre os problemas
brasileiros, o principal a ser resolvido é a má qualidade da educação (63%), seguida da
má qualidade da assistência médica (35%), da falta de desenvolvimento econômico
(32%), dos crimes e violência contra as pessoas (31%), da falta de emprego (28%) e da
corrupção e desvio de verbas (16%) (Folha de S. Paulo, São Paulo, 14 jan. 2007, p. B4).
232. Uma legião de 1,7 milhão de jovens entre 15 e 17 anos abandonou as aulas, por
falta de vontade de estudar, e está fora da escola (id., p. A2).
233. O PAC 122 pouco guarda do espírito original da proposta. Triste fato, afirma
Alexandre Schwartsman 123 .
234. O controle do gasto corrente foi adiado e, em seu lugar, encontramos uma nova
rodada de aumento do gasto público, agora destinado a investimentos em infraestrutura. Em vez de reforço do marco regulatório para induzir o investimento privado,
(121) Diário do Nordeste, Fortaleza, 04 jan. 2007, Negócios, p. 7.
(122) Segundo o Decreto nº 6.025, de 22 jan. 2007, o Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC) é um conjunto de ´medidas de estímulo ao investimento privado, ampliação dos investimentos
públicos em infra-estrutura e voltadas à melhoria da qualidade do gasto público e ao controle da expansão
dos gastos correntes no âmbito da Administração Pública Federal´.
(123) Folha de S. Paulo, São Paulo, 24 jan. 2007, p. B2.
75
mais recursos públicos foram comprometidos. A disponibilidade de recursos para o
setor privado não deve aumentar nem será reduzida a carga tributária. Não se pode
esperar uma resposta em termos de expansão do investimento privado adicional.
235. O Brasil, apesar dos esforços recentes, continua na contramão mundial em
matéria de tributos. Em 2006, a carga tributária alcançou o recorde de 38,8% do PIB.
Hoje, a maioria dos países trabalha com um só tributo sobre o consumo, o imposto
sobre o valor agregado (IVA). No Brasil, entretanto, dezenas de tributos incidem sobre
produtos, mercadorias e serviços, em nível municipal, estadual e federal, e criam
instrumentos de controles burocráticos a torna complexa a vida dos contribuintes. Com
esse emaranhado tributário, perde-se competitividade e lógica econômica. Para mudar
essa situação, é preciso transformar o atual sistema tributário, arcaico e burocrático, e a
adotar o IVA, destinado a absorver o IPI, ICMS, ISS, PIS e Cofins e a reduzir a
cumulatividade dos impostos, um dos fatores a emperrar o crescimento, observa Jorge
Gerdau Johannpeter 124 .
236. O governo apresentou proposta de reforma tributária aos governadores
envolvendo mudanças profundas no ICMS, tributo arrecadado pelos Estados e
responsável pelo maior quinhão na asfixiante carga tributária nacional. As alíquotas
divergem bastante entre produtos e Estados. O sistema provoca a ´guerra fiscal´ entre
Estados, engalfinhados em disputa por investidores (´O destino da reforma´. Folha de S.
Paulo, São Paulo, 11 mar. 2007, p. A2).
237. De um conjunto de 3.359 municípios, apenas 95 (menos de 3%) podem ser
classificados como eficientes na cobrança dos impostos municipais, de acordo com
estudo da FGV. Muitos dos municípios foram criados apenas para atender a interesses
políticos pessoais ou de grupos. Não foram considerados fatores como a montagem de
uma estrutura administrativa para cobrar impostos e aplicar os recursos arrecadados e
condições econômicas para sustentar essa estrutura. Sem recursos próprios, esses
municípios se tornaram dependentes de transferências da União e dos Estados. Em tese,
os recursos transferidos pela União e pelos Estados se destinam a determinados
programas, destinados a favorecer diretamente a população, como projetos sociais e de
(124) ´A reforma necessária´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 04 mar. 2007, p. B7.
76
infra-estrutura. Mas, sem fiscalização adequada, parte dos recursos acaba sendo
utilizada para cobrir custos da máquina administrativa (O Estado de S. Paulo, São
Paulo, 09 abr. 2007, p. A3).
238. A máquina estatal está inchada, investe pouco, desperdiça muito e é
extremamente cara (37% do PIB), além de garantir estabilidade a bons e maus
funcionários, alerta Antônio Ermírio de Moraes 125 .
239. Vivemos hoje o melhor momento pós-milagre econômico. O momento de
agora é mais sustentável, principalmente porque está ocorrendo num ambiente
democrático. Mas o Brasil tem de procurar fazer uma série de aprimoramentos na área
fiscal, na área previdenciária, além de outras reformas, como a política e a do Judiciário,
observa Roberto Setúbal 126 , presidente do Banco Itaú.
240. Dependendo do indicador, o Brasil vive ou não um bom momento, adverte
Paulo Skaf 127 , presidente da FIESP. Se falarmos em inflação, o Brasil vive um bom
momento; se falarmos em estabilidade econômica, também; se falarmos em balança
comercial, também. Mas se falarmos em relação ao câmbio, em redução de gastos
públicos ou em desoneração, em reformas estruturais ou em desburocratização, não é
verdade. Outros pontos também deixam a desejar, como a questão do desenvolvimento,
da infra-estrutura e da segurança pública. O Brasil deve aproveitar o atual momento
para dar partida às reformas tributária, previdenciária e trabalhista.
241. A sociedade civil, pela primeira vez, está-se unindo para apresentar sua
proposta de reforma tributária ao governo. Grupo multissetorial, formado por 30
entidades, dentre as quais a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP),
Federação Brasileira dos Bancos (FEBRABAN), Sindicato das Empresas de Imóveis
(SECOVI) e Central Única dos Trabalhadores (CUT), tem-se reunido para fechar uma
proposta consensual e levá-la ao governo. Quando as mudanças nas leis tributárias são
conduzidas apenas pelo governo, o resultado sempre foi, invariavelmente, uma colcha
(125) ´A ineficiência do Estado´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 15 abr. 2007, p. A2.
(126) Folha de S. Paulo, São Paulo, 20 maio 2007, p. B6.
(127) Folha de S. Paulo, São Paulo, 20 maio 2007, p. B6.
77
de retalhos a tornar o sistema mais complexo, além do aumento da carga, afirma
Antoninho Trevisan 128 , coordenador dos trabalhos.
242. Um dos aspectos estruturais mais negativos da economia brasileira é, sem
dúvida, o tamanho do gasto público e sua baixa qualidade, assim como uma elevada
carga tributária de características regressivas
129
. Tal situação representa pesado ônus
em termos de crescimento econômico, tanto por causa da ineficiência do Estado no
desempenho de suas funções primordiais, quanto pelo próprio tamanho e característica
da carga tributária em nosso País. O governo parece ignorar a gravidade do problema ao
abster-se de adotar, até o momento, iniciativas com vistas a reverter essa situação, avalia
Gustavo Loyola 130 .
243. O Brasil é o 49º país no ´ranking´ do ´World Competitiveness Yearbook WCY´ (Relatório da Competitividade Mundial), de 2007 (44º lugar em 2006),
elaborado pelo ´International Institute for Management Development (IMD)´, Suíça.
Abrangendo 55 países, o estudo é composto por quatro itens (desempenho econômico,
eficiência governamental, eficiência empresarial e infra-estrutura). No item eficiência
governamental, o Brasil ficou na 54ª posição. A baixa eficiência do governo
(burocracia, a carga tributária e o quadro fiscal) onera os custos de produção e afeta
todos os demais pilares do estudo, explica Carlos Arruda 131 , professor da Fundação
Dom Cabral, responsável pela coleta de dados para o WCY.
244. A Fitch Ratings em 10 maio 1007 elevou a nota de risco de crédito do Brasil de
´BB´ para ´BB+`, com perspectiva estável (melhor nota do ´grau especulativo´, como
Azerbaijão, Egito, El Salvador, Guatemala, Macedônia, etc.) e colocou o País a apenas a
um nível do ´grau de investimento´ (de ´BBB-´, qualidade boa, como Rússia, México,
(128) Folha de S. Paulo, São Paulo, 25 maio 2007, p. B1.
(129) O cânone da capacidade contributiva fundamenta-se na ´teoria do sacrifício´, segundo a
qual os encargos tributários devem ser repartidos de modo a todos suportarem o mesmo sacrifício (critério
de neutralidade), ensina Marciano Seabra de Godoi (´Justiça, igualdade e direito tributário´. São Paulo:
Dialética, 1999, p. 215).
Há duas formas básicas de abordar a progressividade: uma fundamentação segundo a própria
noção de capacidade contributiva e igualdade de sacrifícios (utilidade marginal decrescente dos recursos
econômicos); e outra fundamentação segundo o valor constitucional da busca da redução das
desigualdades econômicas e sociais (princípio do Estado Social) (id., 218)
(130) Valor, São Paulo, 28 maio 2007, p. A13.
(131) Folha de S. Paulo, São Paulo, 10 maio 2007, p. B3.
78
Índia, etc., a ´AAA´, a melhor qualidade de crédito, somente EUA) (Folha de S. Paulo,
São Paulo, 11 maio 2007, p. B5).
245. O Brasil mostra capacidade de enfrentar potenciais choques de origem externa,
mas, para receber o ´grau de investimento´, precisa implementar as mudanças capazes
de permitir a alavancagem do crescimento, como desburocratização, reforma tributária e
a independência das agências reguladoras e do Banco Central. Deve ainda aumentar o
esforço fiscal e fazer a reforma da previdência, observa Rafael Guedes 132 , diretorexecutivo da Fitch.
246. O Brasil apresenta hoje uma situação de coexistência de estabilidade
doméstica, baixa vulnerabilidade externa e bons fundamentos. O País colhe,
adicionalmente, os frutos das reformas estruturais colocadas em prática nas últimas
décadas, com ênfase nos últimos dez anos. Outro ponto de destaque é a estabilidade
política e a inexistência de problemas de governabilidade. O único ponto a denotar
ceticismo é quanto às reformas. O presidente Lula não demonstra estar convencido da
necessidade de avançar na agenda de reformas. A conta por essa ausência de reformas
só deverá ser paga, principalmente em termos de crescimento, no médio prazo, conclui
estudo da consultoria Tendências (Folha de S. Paulo, São Paulo, 20 maio 2007, p. B6).
247. São cinco as características desejáveis de um tributo 133 , segundo Joseph
Stiglitz 134 , prêmio Nobel de Economia em 2001: a) eficiência econômica, ou seja, a
não-distorção dos preços relativos; b) simplicidade administrativa, tanto para o fisco
como para o contribuinte; c) flexibilidade, ou seja, capacidade de ajustar-se
automaticamente às mutantes condições econômicas; d) transparência, pois o
(132) Folha de S. Paulo, São Paulo, 11 maio 2007, p. B5.
(133) Adam Smith apresentou em ´Riqueza das nações´ quatro regras amplamente conhecidas,
em seu tempo, como pilares básicos de todo sistema tributário racional: economia, certeza, comodidade e
justiça. Essas quatro regras vêm merecendo aceitação generalizada e a passagem do tempo tem
confirmado seu valor, assinala ensina José Juan Ferreiro Lapatza (´Direito tributário: teoria geral do
tributo´. 1a. ed. São Paulo: Manole, 2007, p. 4).
(134) Valor, São Paulo, 01 ago. 2007, p. E2.
79
contribuinte deve saber quem paga o imposto e quanto paga; e e) equidade ou justiça135 ,
ou seja, tratar igualmente situações iguais e desigualmente situações desiguais 136 .
248. A CPMF é hoje o tributo mais perverso a incidir sobre a renda de todos os
brasileiros, principalmente sobre o ganho dos mais pobres. É um verdadeiro fenômeno
de tributação por seu efeito cascata ou de cumulatividade (cobrança nas diversas fases
da cadeia produtiva). Impacta diretamente no custo final de todos os produtos e
serviços. O efeito negativo da cumulatividade da CPMF sobre a competitividade das
indústrias brasileiras é de 61%, segundo levantamento da Fundação Getúlio Vargas
(FGV). O sistema tributário nacional faz o seu peso recair preponderantemente sobre as
famílias mais pobres, por sua característica de regressividade 137 , e determina forte
aumento de custos dos produtos e serviços, pelo excesso de impostos, taxas e
contribuições, de acordo com Maria Helena Zockun 138 , coordenadora de pesquisa da
Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE). O Brasil necessita de uma
reestruturação ampla no sistema tributário, defende ela.
249. A CPMF é um tributo irracional a dificultar a vida dos cidadãos e a atrapalhar
o desenvolvimento econômico. É uma forma de encarecer o custo do dinheiro e
dificultar o desenvolvimento nacional. Além do Brasil, pouquíssimos países adotaram a
CPMF (talvez nenhum outro país ainda a mantenha), avaliou Ives Gandra Martins 139 .
(135) Dispõe a CF:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os
seguintes tributos: I - impostos; II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização,
efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a
sua disposição; III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.
§ 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a
capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para
conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o
patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
(136) A capacidade contributiva é o atributo a qualificar alguém aos olhos do legislador para
sujeito passivo da relação tributária, assinalou Aliomar Baleeiro (´Limitações constitucionais ao poder de
tributar´. 7a. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 740).
(137) A distribuição da carga tributária entre os membros da sociedade norteia-se por três
princípios, intimamente ligados entre si, ensina José Juan Ferreiro Lapatza, professor catedrático da
Universidade de Barcelona (´Direito tributário: teoria geral do tributo´. 1a. ed. São Paulo: Manole, 2007,
p. 22): a) princípio da generalidade (todos devem suportar as cargas tributárias); b) princípio da igualdade
(todos são iguais no momento de contribuir para o sustento do Estado); e c) princípio de capacidade
econômica (todos devem pagar tributos, mas de acordo com sua capacidade contributiva).
(138) Diário do Nordeste, Fortaleza, 09 ago. 2007, Negócios, p. 4.
(139) Diário do Nordeste, Fortaleza, 08 ago. 2007, Negócios, p. 3.
80
250. Quando o consumidor brasileiro souber quanto paga de imposto em cada
transação de compra, poderá exercer plenamente a cidadania. Efetuará o
acompanhamento e a cobrança aos governantes da aplicação dos impostos. A falta de
transparência é mãe da regressividade 140 , da elevada carga tributária, da injustiça social
e da inadequação do sistema tributário. A reforma dessa estrutura pode transformar os
´consumidores pagadores´ em ´cidadãos cobradores´. A regressividade, ou seja, a forma
como a carga tributária é dividida entre as famílias 141 , é uma das conseqüências danosas
da tributação nacional. A proporção dos impostos diminui à medida do aumento da
renda, conforme evidencia estudo da USP: as famílias com até dois salários mínimos de
ganho arcam com um total de impostos equivalente a 48% dessa renda; as famílias com
mais de 30 salários mínimos de ganho, 26%, alerta Francisco Dornelles 142 .
251. O processo de elaboração e aprovação da Lei Geral da Microempresa repete a
experiência brasileira quando se trata de assuntos tributários: a motivação inicial,
normalmente carregada de desejos de desoneração tributária, simplificação de processos
e estímulos às atividades empresariais, modifica-se completamente quando confrontada
com os interesses dos fiscos federal e estaduais, observa Luiz Gastão Bittencourt 143 ,
presidente do Sistema Fecomércio-CE.
252. A CPMF foi criada em nosso governo porque naquele momento precisávamos
de recursos. Mas agora há abundância de recursos e a CPMF pode ser reduzida, afirma
FHC 144 , ex-presidente da República.
253. A defesa da extinção da CPMF segue a lógica de construção de um sistema
tributário sem cumulatividade, competitivo, com padrões internacionais. A tributação
(140) No imposto progressivo, o indivíduo paga de forma proporcional a sua renda ou riqueza,
explica José Juan Ferreiro Lapatza, professor catedrático da Universidade de Barcelona (´Direito tributário:
teoria geral do tributo´. 1a. ed. São Paulo: Manole, 2007, p. 20).
(141) Capacidade contributiva e capacidade econômica não se confundem. A capacidade
contributiva vincula-se ao poder tributante, mas a capacidade econômica é a exteriorização da
potencialidade econômica de alguém, independentemente de sua vinculação ao referido poder, explica
Ives Gandra da Silva Martins (´A abertura de espaços comunitários, carga tributária, capacidade
contributiva e efeito-confisco´ in ´Grandes questões atuais do direito tributário – 8º volume´. São Paulo:
Dialética, 2004, p. 230).
(142) ´Carga tributária invisível´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 12 ago. 2007, p. A3.
(143) ´Comércio´. Fortaleza: Fecomércio-CE, n. 93, jun. 2007, p. 5.
(144) Valor, São Paulo, 14 ago. 2007, p. A11.
81
sobre movimentações bancárias foi adotada por alguns países, mas já foi afastada,
observa Jorge Gerdau Johannpeter 145 .
254. Reformas essenciais para um crescimento vigoroso da economia não foram
feitas. Em conseqüência, a economia brasileira cresceu timidamente durante o ciclo de
expansão mundial, em comparação com a de outros países emergentes. Enquanto a
China crescia 10% ao ano e a Índia 9%, o Brasil avançou em média 2,7%, de 2000 a
2006. Retomar a agenda de reformas ganha tons dramáticos de urgência agora para o
Brasil (Época, São Paulo: Globo, n. 483, 20 ago. 2007, p. 38).
255. A reforma tributária deve iniciar com a reestruturação dos gastos do governo e,
em seguida, com a adequação da carga tributária aos novos níveis de gastos, além da
racionalização e simplificação do atual sistema, opina Emerson Kapaz 146 , empresário,
presidente da ALEK Consultoria Empresarial (Valor, São Paulo, 01 nov. 2007, p. A12).
256. A proposta da CPMF como tributo temporário não foi uma idéia para sanar
dificuldade fiscal transitória. Fez-se o tributo temporário para o Executivo ter de voltar
ao Congresso periodicamente para prorrogá-lo e ter de distribuir favores políticos,
avalia Gustavo Franco 147 , economista, ex-presidente do Banco Central do Brasil.
257. O Brasil enfrenta os seguintes desafios: a) necessidade de aumentar o
investimento público; b) diminuição da carga tributária; c) diminuição da expansão da
dívida interna; d) perseguição de superávits nominais, como ocorre no Chile; e)
contenção do aumento dos gastos correntes. Se o Brasil não vencer esses desafios, não
corre o risco de quebrar, mas corre o risco de não conseguir ter um crescimento
condizente com seu potencial. Embora os superávits primários se tenham tornado uma
política de Estado, mantida mesmo com a mudança de governo, o Brasil continua num
processo permanente (e, de certa forma, inconseqüente) de aumento de gastos. Desde o
período Collor-Itamar, em todos os governos os gastos primários cresceram acima do
(145) ´O futuro da CPMF´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 19 ago. 2007, p. B4.
(146) Valor, São Paulo, 01 nov. 2007, p. A12.
(147) Época, São Paulo: Globo, n. 494, 05 nov. 2007, p. 76.
82
PIB. O remédio indicado para o Brasil são as reformas consistentes, afirma Fábio
Giambiagi 148 , citado por Mirian Leitão.
258. O Brasil precisa enfrentar, com urgência, o desafio da reforma tributária. O
objetivo é reduzir a carga atual para aumentar as condições competitivas do País no
mercado global. O peso da carga tributária é sinal do grau de eficiência e é determinante
na disputa por investimentos e na geração de mais empregos. Numa caminhada de cinco
quilômetros (uma analogia simples para exemplificar a gravidade da situação atual), o
brasileiro compete carregando uma mochila de 34 quilos nas costas; o russo, com uma
de 24 quilos; o irlandês, com uma de 12 quilos; o coreano, com uma de 27 quilos; e o
mexicano, com uma de 28 quilos. Quem tem a mochila mais leve deverá ser o vencedor,
alerta Jorge Gerdau Johannpeter 149 .
259. A América Latina desfruta do mais longo período de crescimento econômico
ininterrupto desde a década de 1970, e o Brasil se destaca como exemplo de grande
sucesso, como mostra a nova edição do trabalho ´Perspectivas econômicas: as Américas
do FMI´. Mas a região continua altamente sensível a uma desaceleração global
acentuada, ao aperto dos mercados de crédito ou à deterioração das relações de troca.
Uma maneira de atenuar esses riscos é a consolidação e a ampliação das melhorias
recentes nos fundamentos macroeconômicos. Um dos pontos a exigir aperfeiçoamentos
é a política fiscal. Em 2006, toda a América Latina registrou superávits primários
históricos, mas, em geral, os gastos públicos estão crescendo a um ritmo acelerado.
Mantida essa tendência, a situação das finanças públicas está ameaçada. Contas públicas
ajustadas ajudam os países a absorver melhor a entrada de capitais e dar respaldo à
política monetária, conclui Anoop Singh 150 .
(148) Diário do Nordeste, Fortaleza, 10 nov. 2007, Negócios, p. 11.
(149) ´O peso da bagagem´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 11 nov. 2007, p. B9.
(150) ´América Latina: à altura dos desafios´. Folha de S. Paulo, São Paulo, 18 nov. 2007, p.
A3.
83
IV – PROPOSTA BERNARD APPY
151
260. A complexidade e a falta de neutralidade do sistema tributário têm
representado um grande entrave ao crescimento, afirmou Bernard Appy 152 , secretárioexecutivo do Ministério da Fazenda, em reunião com os governadores ocorrida em 06
mar. 2007.
261. As principais distorções do sistema tributário (continuou Appy) decorrem da:
a) complexidade, resultante de: I) multiplicidade de legislações e competências
tributárias; II) multiplicidade de alíquotas e bases de cálculo aplicáveis aos
diversos tributos; e
b) inexistência de neutralidade: I) incidências cumulativas; II) defeitos das
incidências sobre o comércio exterior; III) guerra fiscal.
262. São distorções dos tributos federais:
a) multiplicidade de tributos e regimes de tributação sobre bens e serviços
(PIS/Cofins, IPI, CIDE-combustíveis);
b) PIS/Cofins – a sobreposição dos regimes cumulativo e não-cumulativo
prejudica a neutralidade e a alocação eficiente dos recursos;
c) CIDE-combustíveis – não confere crédito à produção, implicando ônus nas
cadeias produtivas.
263. As principais distorções do ICMS são:
a) a guerra fiscal (custo baixo ou nulo para o Estado outorgador do benefício
fiscal, mas elevado para o conjunto dos Estados);
b) graves distorções na tributação do comércio exterior: I) favorecimento das
importações em detrimento da produção nacional (como o ICMS pertence
ao Estado destinatário da importação, os Estados têm concedido uma série
de benefícios fiscais para importações); II) dificuldades para desonerar as
exportações em função do acúmulo de créditos pelos exportadores (o Estado
do exportador reluta em dar aproveitamento aos créditos acumulados em
face de recolhimentos em outros Estados sobre operações de aquisição de
insumos para as exportações).
(151) As redes de varejo já se manifestaram contra a proposta, conhecida como ´proposta
Bernard Appy´. Na forma atual, a reforma trará maior complexidade, maior evasão e aumento de alíquota
(Folha de S. Paulo, São Paulo, 09 out. 2007, p. B3).
(152) Disponível:
Acesso: 17 mar. 2007.
<http://www.fazenda.gov.br/portugues/releases/2007/r060307-RT.pdf>.
84
264. São distorções do sistema tributário sobre o investimento:
e) os regimes aplicados aos tributos indiretos não estão permitindo a
desoneração integral dos investimentos (longos prazos de apropriação dos
créditos: ICMS, 48 meses; PIS/Cofins, 24 meses);
f) o ICMS dificulta a desoneração dos investimentos (o Estado recebedor dos
investimentos arca com o ônus do ICMS incidente sobre máquinas e
equipamentos, em geral pago a outro Estado);
g) impacto negativo sobre a competitividade, tanto maior quanto mais elevados
os juros.
265. As distorções nos tributos sobre bens e serviços têm como conseqüência:
a) desestímulo aos investimentos produtivos;
b) insegurança jurídica;
c) inexistência de neutralidade no comércio exterior, em prejuízo da produção
nacional;
d) alto custo de cumprimento das obrigações tributárias; e
e) elevado nível de sonegação e elisão.
266. Os principais objetivos da reforma tributária devem ser:
a) instituir um sistema de tributos indiretos neutro e simples, racionalizando o
sistema tributário e elevando a eficiência econômica; este objetivo envolve
(I) a desoneração dos investimentos produtivos, (II) a eliminação das
distorções do comércio exterior prejudiciais à produção nacional
(desoneração das exportações e tratamento isonômico às importações) e (III)
a simplificação e desburocratização (redução dos custos de cumprimento
das obrigações tributárias);
b) eliminar as distorções prejudiciais aos investimentos;
c) ampliar a base de contribuintes e reduzir a informalidade.
267. A reforma proposta abrange:
a) substituição dos tributos sobre bens e serviços (ICMS, IPI, PIS, Cofins,
CIDE-combustíveis) por dois impostos sobre o valor adicionado: I) estadual
(IVA-E), baseado no princípio do destino (fim da guerra fiscal); e II) federal
(IVA-F);
b) formulação de uma política de desenvolvimento regional como alternativa
efetiva e transparente à guerra fiscal.
268. As principais características dos novos IVA (concluiu Appy) serão:
a) uniformidade nacional (lei complementar única e regulamentação nacional);
85
b) bases amplas (bens e serviços);
c) não-cumulativo;
d) alíquotas (lei federal para o IVA-F e lei estadual para o IVA-E);
e) fiscalização (especializada segundo a competência tributária e integrada em
termos de cadastro e bases de dados);
f) operações interestaduais (imposto a ser cobrado integralmente no Estado de
origem, mas apropriado pelo Estado de destino, reduzindo o risco de
sonegação).
269. Vamos consolidar, em harmonia com o Congresso Nacional e com os Estados,
a legislação unificada do ICMS, simplificando as normas, reduzindo alíquotas, com
previsão de implantar um único imposto de valor agregado a ser distribuído
automaticamente para União, Estados e municípios, afirmou em 01 jan. 2007 o
presidente Lula no discurso, pronunciado no Congresso Nacional, por ocasião de sua
investidura no segundo mandato de governo.
270. A carga tributária pode ser menor. Estamos em fase final de projeto de reforma
tributária junto com os Estados. ´Ninguém quer mais diminuir a carga tributária do que
eu´, disse o presidente Lula 153 .
271. Ao final das negociações da prorrogação da CPMF na Comissão de
Constituição e Justiça do Senado Federal, o governo promete, como compensação, o
envio de um projeto de reforma tributária. Mas o ano de 2008 será de eleições
municipais, em 2009 o governo já se estará enfraquecendo e em 2010 será o fim do
mandato. O ano da reforma tributária era 2007, uma oportunidade perdida, lamenta
Mirian Leitão 154 .
272. Já há o desenho básico de uma reforma tributária: ela teria de unificar tributos,
diminuir o número de impostos, taxas e contribuições, uniformizar legislações e reduzir
a brutal carga sobre os contribuintes. Queixam-se os contribuintes, além da carga, da
complexidade do sistema tributário, das confusas interpretações da Receita Federal, das
mudanças de regras e bases de cálculo e da infinidade de alíquotas (id.).
(153) Folha de S. Paulo, São Paulo, 30 out. 2007, p. A7.
(154) ´Tempo perdido´. Diário do Nordeste, Fortaleza, 15 nov. 2007, Negócios, p. 7.
86
CONCLUSÃO
1.
O Brasil, para a viabilização de aumento permanente no potencial de
crescimento, precisa promover a redução do tamanho do setor público. A solução não é
só reforma tributária.
2.
O tamanho médio do setor público nos países emergentes é de 25%, enquanto o
do Brasil é de 40%. No período 1994-2007, a carga tributária saltou de 25% para 40%
(37% do PIB novo), num ritmo de mais de um ponto de percentagem do PIB ao ano. O
comportamento do gasto público é explosivo e é preciso revertê-lo. Se não houver
mudança de curso, tudo indica a continuidade do processo de expansão do gasto público
nos próximos anos.
3.
A redução do tamanho do setor público envolve o controle constitucional das
fontes de financiamento do setor público (tributos e endividamento).
4.
Esse processo, de início, deverá inverter a equação da política fiscal ora
adotada: ao invés de partir da fixação da despesa para depois buscar os recursos
necessários (restrição orçamentária frouxa ou ´soft budget constraint´), o orçamento
deverá partir da definição dos recursos disponíveis para depois fazer-se a alocação da
despesa entre os usos alternativos (restrição orçamentária rígida).
5.
Sob a alternativa de restrição orçamentária rígida, o governo poderá
implementar uma redução programada da carga tributária até a relação ´carga
tributária/PIB´ chegar a 27% do PIB e a dívida pública convergir para um nível
confortável.
6.
A alternativa de restrição orçamentária frouxa (ou de controle do resultado
fiscal) não coloca qualquer restrição ao crescimento do tamanho do setor público via
aumento da despesa pública e da carga tributária.
7.
Baseado na alternativa de restrição orçamentária rígida, o ajuste fiscal deve ser
visto como o processo destinado a reduzir, ao longo do tempo, o tamanho do setor
público a um nível capaz de permitir a construção de sistema tributário eficiente,
caracterizado pelo incentivo ao trabalho, à inovação e à acumulação de capital.
87
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