ALGA - Eng. Civil e Eng. Topográ…ca - ISE - 2010/11 - Geometria Analítica 88 Geometria Analítica A noção de recta em R2 e R3 ; tal como a noção de plano em R3 já foram abordados no ensino secundário. Neste capítulo faz-se um revisão desses conceitos e generaliza-se ao espaço Rn estas noções e outras associadas. Rectas no plano Em geometria euclidiana existe uma única recta que passa por dois pontos dados. Para se saber se um ponto está ou não sobre uma recta é necessário encontrar uma propriedade que só os pontos que estão sobre a recta possuem. Comecemos com um exemplo. Considere-se no plano a recta que passa nos pontos (1; 2) e (2; 3) : O vector u = (2; 3) (1; 2) = (1; 1) é um vector que tem a direcção dessa recta Qualquer ponto da recta pode ser obtido a partir de um dos pontos dados somando múltiplos deste vector. Assim, podemos, por exemplo, de…nir esta recta através da igualdade: (x; y) = (1; 2) + (1; 1) ; 2R A uma equação desta forma chama-se equação vectorial da recta. A equação (1) dá lugar a um sistema de duas equações: ( x=1+ y =2+ As equações deste sistema têm o nome de equações paramétricas da recta. Explicitando o valor de na primeira equação e substituindo na segunda obtém-se: ( =x 1 y =2+x 1 ou seja, obtém-se a equação x+y =1 a que se chama equação geral ou equação cartesiana da recta. (1) ALGA - Eng. Civil e Eng. Topográ…ca - ISE - 2010/11 - Geometria Analítica 89 Se nesta equação explicitarmos o valor de y obém-se: y =x+1 a que se chama equação reduzida da recta. Em geral, se quisermos a equação da recta que passa no ponto A = (a1 ; a2 ) e tem a direcção do vector u = (u1 ; u2 ) temos que repetir este procedimento. Seja X = (x; y) um ponto geral sobre a recta, então existe um número real tal que (x; y) = (a1 ; a2 ) + (u1 ; u2 ): Donde passamos para as equações paramétricas: ( x = a1 + u 1 y = a2 + u 2 Explicitando agora o valor de e …nalmente na primeira equação e substituindo na segunda vem 8 x a1 > < = u1 u2 > : y = a2 + (x a1 ) u1 y= u2 x + a2 u1 u2 a1 u1 A equação reduzida de uma recta é da forma y = mx + h, em que m = u2 e h = a2 u1 u2 a1 : u1 u2 é o valor da tangente do ângulo que a recta faz com o eixo u1 dos xx. A este valor chama-se declive da recta. u2 Por outro lado o valor h = a2 a1 é o que se obtém para y quando se faz x = 0: A este u1 Como se vê facilmente m = ALGA - Eng. Civil e Eng. Topográ…ca - ISE - 2010/11 - Geometria Analítica 90 valor chama-se ordenada na origem. Na …gura acima estão representadas rectas de diferentes declives todas a passar na origem. É fácil perceber que as rectas que passam na origem têm equação reduzida y = mx (com excepção do eixo dos yy que tem equação x = 0) Rectas paralelas Rectas paralelas fazem todas o mesmo ângulo com o eixo dos xx, logo têm todas o mesmo declive. As rectas da …gura têm todas declive 1 e têm ordenada na origem diferente. Pode-se então escrever que a equação geral desta família de rectas é da forma y = x + h, variando o h consoante o ponto onde a recta intersecta o eixo dos yy: Exemplos 1. Determinar a equação da recta paralela à recta 2x + 3y = 6 que passa na origem. 2 Começamos por escrever a equação da recta na forma reduzida: y = x + 2. Vemos 3 2 assim que a recta dada tem declive : Procuramos agora entre todas as rectas com 3 ALGA - Eng. Civil e Eng. Topográ…ca - ISE - 2010/11 - Geometria Analítica 91 2 qual é a que passa no ponto (0; 0) : A equação geral das rectas paralelas 3 2 à recta dada é y = x + h. É claro que para a recta passar na origem terá que ser 3 2 h = 0: A recta pretendida é y = x ou seja, 2x + 3y = 0: 3 declive 2. A recta r passa nos pontos (4; 9) e ( 1; 2) : A recta s é paralela à recta r e passa no ponto (5; 4) : Determine uma equação da recta s: Um vector com a direcção da recta r é u = (4; 9) ( 1; 2) = (5; 11) ; daqui se conclui 11 11 que o declive da recta r é : Qualquer recta paralela a r tem declive , ou seja terá 5 5 11 equação reduzida da forma y = x + h. Para que a recta passe no ponto (5; 4) tem 5 11 11 5 = 7: Então a equação da recta pretendida é y = x 7: que ser h = 4 5 5 Rectas ortogonais Considere-se a recta r = fA + u; 2 Rg e a recta s = fB + v; A recta r tem equação reduzida y = u2 x + a2 u1 2 Rg. Estas rectas são ortogonais se os vectores u e v forem ortogonais. Ou seja as rectas são ortogonais se u v = 0 y= v2 x + b2 v1 u2 a1 u1 e a recta s tem equação reduzida v2 b1 : v1 Como os vectores u e v são ortogonais é u v = u1 v1 + u2 v2 = 0: Desta última igualdade u2 v1 conclui-se que = : u1 v2 Então, tendo as equações reduzidas de duas rectas y = mx + h e y = m0 x + h0 , reconhece-se 1 que elas são ortogonais se m = : m0 Exemplos 1. Encontrar uma equação da recta perpendicular à recta 2x + 3y = 6 que passa na origem. ALGA - Eng. Civil e Eng. Topográ…ca - ISE - 2010/11 - Geometria Analítica 92 2 Já vimos que esta recta tem declive : Qualquer recta perpendicular a esta terá 3 3 3 declive : Como a recta deve passar na origem a sua equação tem que ser y = x: 2 2 2. A recta r passa nos pontos (4; 9) e ( 1; 2) : A recta s é ortogonal à recta r e passa no ponto (5; 4) : Determine uma equação da recta s: Um vector com a direcção da recta r é u = (4; 9) ( 1; 2) = (5; 11) ; daqui se conclui 11 5 que o declive da recta r é : Qualquer recta ortogonal a r tem declive , ou seja 5 11 5 terá equação reduzida da forma y = x + h. Para que a recta passe no ponto (5; 4) 11 5 69 5 69 tem que ser h = 4+ 5 = : Então a equação da recta pretendida é y = x+ : 11 11 11 11 Ângulo de duas rectas Duas rectas concorrentes de…nem quatro ângulos, iguais dois a dois (ângulos verticalmente opostos). A soma de dois dos ângulos diferentes é . De…ne-se ângulo de duas rectas como o menor destes ângulos. A determinação do ângulo de duas rectas passa pelo cálculo do ângulo entre dois vectores, um de cada recta. O ângulo obtido pode ser o maior ou o menor dos ângulos, conforme a escolha do sentido dos vectores foi feita. Como os ângulos são suplementares, obtido o valor de um dos ângulos facilmente se obtém o valor do outro. Exemplos 1. Encontrar o ângulo entre as rectas de equações y = x + 1 e 2x + 3y = 6 Temos que encontrar um vector com a direcção de cada uma das rectas. Uma maneira fácil de o fazer é encontrar dois pontos sobre uma recta e calcular um vector de…nido por esses dois pontos. Para a recta y = exemplo, u = (1; 0) x + 1 temos, por exemplo, (0; 1) e (1; 0), donde se obtém, por (0; 1) = (1; 1) : Para a recta 2x + 3y = 6 temos, por exemplo, (0; 2) e (3; 0), donde se obtém, por exemplo, v = (3; 0) (0; 2) = (3; 2) : ALGA - Eng. Civil e Eng. Topográ…ca - ISE - 2010/11 - Geometria Analítica 93 Temos que calcular o ângulo entre u e v para o que podemos recorrer à fórmula u:v = kuk kvk cos ^ (u; v) Temos então:cos ^ (u; v) = 5 (1; 1) (3; 2) = p p donde se conclui que k(1; 1)k k(3; 2)k 2 13 5 ^ (u; v) = arccos p p ' 0:19740 2 13 Neste caso veri…ca-se facilmente, pelo sentido dos vectores escolhidos, que este é realmente o menor ângulo. Rectas no espaço O processo de de…nir uma recta no espaço é idêntico ao que foi usado para de…nir uma recta no plano. Comecemos com um exemplo. Considere-se no espaço R3 a recta que passa nos pontos (1; 2; 3) e (2; 3; 1) : O vector u = (2; 3; 1) (1; 2; 3) = (1; 1; 2) é um vector que tem a direcção dessa recta. Um ponto X = (x; y; z) está sobre a recta se existir um real tal que (x; y; z) = (1; 2; 3) + (1; 1; 2). 8 > < x=1+ Esta equação pode ser transformada no sistema . y =2+ > : z=3 2 8 > < =x 1 Agindo de modo análogo ao descrito no plano temos: y =1+x > : z = 5 2x ( ( y =1+x z = 7 2y Ou seja a equação cartesiana da recta é ou z = 5 2x z = 5 2x Vemos assim que para caracterizar uma recta no espaço precisamos de duas condições. Como veremos mais à frente cada uma das condições corresponde a um plano, sendo portanto a recta de…nida como intersecção de dois planos. ALGA - Eng. Civil e Eng. Topográ…ca - ISE - 2010/11 - Geometria Analítica 94 Planos no espaço Para determinar um plano em R3 são necessários três pontos não colineares, ou um ponto e dois vectores linearmente independentes, ou um ponto e um vector ortogonal ao plano. Repare-se que se tivermos três pontos A; B e C não colineares, podemos construir dois vectores linearmente independentes (u = C Ae v=B A), assim como com um ponto e dois vectores linearmente independentes se podem obter três pontos não colineares. Um plano em R3 é um conjunto de pontos da forma M = fP + u + v; ; 2 Rg, em que u e v são linearmente independentes. Um ponto do plano X = (x; y;8 z) pode assim ser obtido > x = p1 + u1 + v 1 < fazendo (x; y; z) = (p1 ; p2 ; p3 ) + (u1 ; u2 ; u3 ) + (v1 ; v2 ; v3 ) ou seja y = p2 + u2 + v 2 ; > : z = p3 + u3 + v 3 para algum par de valores reais para e para : Exemplos 1. Encontrar o plano que contém os pontos A = (1; 1; 0); B = (0; 1; 1) e C = (1; 0; 1) : De…nir dois vectores linearmente independentes: u = B A = (0; 1; 1) (1; 1; 0) = ( 1; 0; 1); v = C A = (1; 0; 1) (1; 1; 0) = (0; 1; 1); O plano pretendido é o conjunto dos pontos da forma (x; y; z) = (1; 1; 0) + ( 1; 0; 1) + (0; 1; 1) 8 > < x=1 para algum par de valores reais e : Esta igualdade conduz ao sistema : y=1 > : z= + Para que este sistema seja possível os valores de x; y e z têm que obedecer a uma certa condição. É essa condição que vai conduzir à equação cartesiana do plano. Vejamos em que condições é que este sistema, nas incógnitas 3 2 2 1 0 x 1 1 0 6 7 6 1 y 1 5 !4 0 1 4 0 1 1 z 0 0 e ; tem solução: 3 x+1 7 y + 1 5: x+y+z 2 Para que este sistema seja possível é obrigatório que seja x+y+z 2 = 0: Esta condição é aquela a que devem obedecer todos os pontos sobre o plano. A x + y + z chama-se equação cartesiana do plano representado na …gura seguinte: 2=0 ALGA - Eng. Civil e Eng. Topográ…ca - ISE - 2010/11 - Geometria Analítica 95 Tem particular importância conhecer-se as intersecções dos planos com os eixos e com os planos coordenados. Para este exemplo vê-se facilmente que as intersecções com os eixos são (2; 0; 0) ; (0; 2; 0) e (0; 0; 2) : Quanto às intersecções com os planos coordenados temos: Intersecção com o plano xOy : Intersecção com o plano xOz : Intersecção com o plano yOz : ( ( ( x+y+z 2=0 z=0 x+y+z 2=0 y=0 x+y+z 2=0 x=0 ! ! ! ( ( ( x+y =2 z=0 x+z =2 z=0 y+z =2 z=0 2. É também possível de…nir um plano através de um ponto por onde o plano passe e um vector normal ao plano. Com efeito, se um vector é normal a um plano então é normal a todos os vectores do plano. Seja P um ponto que se sabe pertencer ao plano e n um vector ortogonal ao plano. Sendo X um ponto genérico do plano, então n é ortogonal ao vector X P , ou seja (X P ) n = 0: Vejamos como utilizar este conhecimento para de…nir o plano do exemplo anterior. Já determinámos dois vectores do plano u = ( 1; 0; 1) e v = (0; 1; 1): Um vector ortogonal ao plano será ortogonal a ambos os vectores simultaneamente e pode ser facilmente obtido efectuando o produto externo de u e de v: 3 2 " # " # " e1 e2 e3 0 1 1 1 7 6 e1 det e2 + det " det " 4 1 0 1 5 = det 1 1 0 1 0 1 1 1 0 0 1 # e3 = = e1 + e2 + e3 = (1; 1; 1) : Assim, (X () (x P ) n = 0 () ((x; y; z) 1; y (1; 1; 0)) (1; 1; 1) = 0 1; z) (1; 1; 1) = 0 () x 1+y 1 + z = 0; obtendo-se a equação do plano x+y+z 2 = 0: Ângulo de dois planos O ângulo entre dois planos é de…nido pelo ângulo entre duas rectas que sejam, respectivamente, ortogonais a cada um dos planos.