geolaine baumgarten ávila

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UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL
JEANCARLO KUSIAK HINTZ
MEIO AMBIENTE: PRINCÍPIOS E TUTELA DO DIREITO AMBIENTAL
Ijuí (RS)
2016
JEANCARLO KUSIAK HINTZ
MEIO AMBIENTE: PRINCÍPIOS E TUTELA DO DIREITO AMBIENTAL
Trabalho de Conclusão do Curso de
Graduação em Direito objetivando a
aprovação no componente curricular
Trabalho de Curso - TC.
UNIJUÍ - Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do
Sul.
DCJS - Departamento de Ciências
Jurídicas e Sociais.
Orientador: MSc. Aldemir Berwig
Ijuí (RS)
2016
Dedico o meu TCC para uma pessoa especial.
Ela não está mais aqui neste plano, porém foi
quem deu forças para que eu não desistisse de
ir atrás daquilo que buscava. Muitos obstáculos
foram impostos durante esses últimos anos,
mas pelo seu exemplo, não fraquejei. Obrigado
por tudo meu irmão.
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, que me deu vida. Fоі sustento е mе dеυ coragem para
seguir adiante. Agradeço aos meus professores, que me fizeram enxergar além de
realidades superficiais е propor sempre υm novo mundo dе possibilidades.
Ao Professor Aldemir Berwig cоm quem partilhei о qυе era um projeto e hoje
veio а sеr esse trabalho. Nоssаs conversas durante е para além dоs grupos dе
estudos foram fundamentais.
Por fim, agora, agradeço а todos оs professores pоr mе proporcionarem о
conhecimento, nãо apenas racional, mаs а manifestação dо caráter nо processo dе
formação profissional, nãо somente pоr terem mе ensinado, mаs por terem mе feito
aprender. А palavra mestre, nunca fará justiça аоs professores dedicados аоs quais
sеm nominar terão оs meus eternos agradecimentos.
4
“Isto sabemos: a Terra não pertence ao
homem; o homem pertence à Terra. Isto
sabemos: todas as coisas estão ligadas, como
o sangue que une uma família. Há uma ligação
em tudo.
O que ocorre com a terra recairá sobre os filhos
da terra. O homem não teceu a teia da vida: ele
é simplesmente um de seus fios. Tudo o que
fizer à trama, a si próprio fará.”
Trecho da carta enviada pelo Chefe Índio
Seatlle ao Presidente dos Estados Unidos em
1854, sobre a proposta de compra das terras
de seu povo.
RESUMO
O presente trabalho, intitulado “Meio ambiente: princípios e tutela do direito
ambiental”, volta-se ao estudo dos mecanismos de tutela e de preservação do meio
ambiente equilibrado. Assim, busca-se estudar o direito ambiental de acordo com a
Constituição e com as leis vigentes, o respeito ao código ambiental. Aborda as
sanções e a responsabilidade que o proprietário da propriedade tem em relação à
preservação do meio ambiente em que ele está inserido, bem como o dever de
fiscalização e de tutela do poder público, a fim de preservar para esta e para as
próximas gerações um meio ambiente sadio, conforme assegura o artigo 225 da
Constituição Federal de 1988.
Palavras-Chave: Direito ambiental; Princípios ambientais; Mecanismos de tutela do
meio ambiente; Responsabilidades Administrativa, Civil e Penal.
ABSTRACT
This work, entitled "Environment: principles and protection of environmental
law ", back to the study of the protection mechanisms and preservation of a balanced
environment. Thus, we seek to study the environmental law according to the
constitution and the laws, respect the environmental code. Addressing the sanctions
and responsibility that the owner of the property has in relation to preservation of the
environment in which it is inserted, and the duty of supervision and government
custody, in order to preserve for this and future generations one healthy environment,
as ensures Article 225 of the Federal Constitution of 1988.
Keywords: Environmental law; Environmental principles; Environmental Protection
Mechanisms; Responsibilities Administrative, Civil and Criminal.
7
SUMÁRIO
RESUMO ........................................................................................................................................ 5
ABSTRACT ................................................................................................................................... 6
SUMÁRIO ...................................................................................................................................... 7
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................. 8
1 ASPECTOS NORTEADORES DO DIREITO AMBIENTAL......................................... 11
1.1 O surgimento do direito ambiental..........................................................................12
1.2 Conceito de Meio Ambiente ....................................................................................13
1.3 As origens históricas do direito ambiental brasileiro..............................................16
1.4 O direito ambiental na Constituição Federal de 1988............................................19
2. PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL ...................................................................... 24
2.1 A importância dos princípios gerais do direito .......................................................24
1.2. Princípios do direito ambiental...............................................................................25
2.1 Dever de preservação do meio ambiente ..............................................................28
2.2.1 Deveres comuns da sociedade ...........................................................................28
2.2.1 Deveres do proprietário de imóvel ......................................................................30
2.2.3 Dever de fiscalização dos órgãos públicos .........................................................34
3. A TRÍPLICE RESPONSABILIDADE DO DIREITO AMBIENTAL ........................... 39
3.1 O conceito de dano ambiental ................................................................................39
3.2 A tutela civil ambiental ............................................................................................41
3.2.1 A solidariedade no dano ambiental .....................................................................43
3.2.2 O objetivo da reparação ambiental na esfera civil e o bem jurídico tutelado ....44
3.2.3 O termo de ajustamento de conduta como forma de composição civil dos
danos ambientais ..........................................................................................................45
3.3 A tutela administrativa ambiental ............................................................................46
3.3.2 O poder de polícia ................................................................................................48
3.3.3 O processo administrativo ambiental ..................................................................49
3.3.4 A prescrição das infrações administrativas ambientais ......................................50
3.4 A tutela penal ambiental .........................................................................................51
3.4.1 A responsabilização da pessoa jurídica ..............................................................52
3.4.2 Lei dos crimes ambientais ...................................................................................52
3.4.3 A ação penal ........................................................................................................54
CONCLUSÃO ............................................................................................................................. 56
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................... 58
8
INTRODUÇÃO
O presente trabalho, intitulado “Meio ambiente: princípios e tutela do direito
ambiental” volta-se ao estudo dos princípios e tutela da preservação do meio
ambiente equilibrado. Assim, busca-se estudar o direito ambiental de acordo com a
Constituição e com as leis vigentes, o respeito ao código ambiental. Abordando as
sanções e a responsabilidade que o proprietário da propriedade tem em relação à
preservação do meio ambiente em que ele está inserido, bem como o dever de
fiscalização e de tutela do poder público, a fim de preservar para esta e para as
próximas gerações um meio ambiente sadio, conforme assegura o artigo 225 CF/88
de 1988.
Nesta perspectiva, a escolha do tema foi motivada pela necessidade de
ampliação da discussão de um tema que muito tem a ver com a vida humana, mas
que tem sido praticamente desprezado quando se verifica apenas um superficial
debate econômico. Nota-se que o crescimento da discussão sobre este assunto se
mostra cada dia maior, reflexo disso pode ser percebido nos concursos públicos da
área jurídica, que, em sua maioria, incluem a matéria no rol de suas perguntas.
Diante deste tema, o problema a ser tratado, tido como objetivo geral deste
estudo foi estudar o direito ambiental de acordo com a Constituição e com as leis
vigentes, o respeito ao Código Ambiental, as sanções elencadas na lei dos crimes
ambientais e o comprometimento que os proprietários e o poder público devem ter
para respeitar e zelar pelo meio ambiente.
Assim, os principais objetivos aqui utilizados foram os seguintes:
9
a) pesquisar os deveres do proprietário com sua propriedade;
b) pesquisar os deveres do poder público com o meio ambiente;
c) pesquisar as formas de tutela e proteção do meio ambiente, além desses
mecanismos de proteção que a lei trás, as formas de punição ao agente causador
do dano nas respectivas esferas.
De modo que, para realizar este estudo utilizou-se como metodologia
pesquisa do tipo exploratória. Utilizando no seu delineamento da coleta de dados em
fontes bibliográficas disponíveis em meios físicos e na rede de computadores.
Na busca dos dados foi feito uso do método de abordagem hipotéticodedutivo, observando os seguintes procedimentos:
a) seleção de bibliografia e documentos afins à temática, em meios físicos e
na Internet, e interdisciplinares, capazes e suficientes para que o pesquisador
construa um referencial teórico coerente sobre o tema em estudo, responda o
problema proposto, corrobore ou refute as hipóteses levantadas e atinja os objetivos
propostos na pesquisa, bem como desenvolva um mínimo de conhecimento
necessário acerca do tema e de seus desdobramentos jurídicos e sociais;
b) leitura e fichamento do material selecionado;
c) reflexão crítica sobre o material selecionado; e,
d) exposição dos resultados obtidos através de um texto escrito monográfico
Assim, o primeiro capítulo, aborda os aspectos que norteiam o direito
ambiental: desde o surgimento, passando pelo conceito de meio ambiente, pelas
origens históricas do direito ambiental brasileiro, e em especial, o direito ambiental
na Constituição Federal de 1988.
10
Já o segundo capítulo, trata dos princípios do direito ambiental. Assim, na
primeira parta abordamos a importância dos princípios gerais do direito, e logo após
tratamos dos princípios do direito ambiental. Em um segundo momento, analisamos
o dever de preservação do meio ambiente, entre eles, os deveres comuns da
sociedade, os deveres do proprietário do imóvel, e por fim, o dever de fiscalização
dos órgãos públicos.
Ao passo que no terceiro capítulo será abordado a tríplice responsabilidade
ambiental, ou seja, as formas de tutela do meio ambiente nas três projeções: Civil,
Administrativa e Penal, independentes uma da outra. Buscando sempre o
entendimento doutrinário vigente do direito ambiental, bem como a legislação
balizadora do referido tema.
Por derradeiro, nota-se o avanço nas discussões a nível nacional e
internacional no interesse em dar guarida e proteção ao meio ambiente, tal acepção
é uma das grandes preocupações da sociedade moderna que começa a sentir a
necessidade de por um freio no crescimento econômico exacerbado e que não
respeita a qualidade de vida. A este passo, a tutela do meio ambiente passa a ser
uma preocupação daqueles que tem um convívio em sociedade e com qualidade de
vida.
Neste passo, o objetivo deste trabalho volta-se à análise do regramento
jurídico constitucional, infraconstitucional, bem como a interpretação dos princípios,
que são basiladores e norteadores do Direito, ademais, será visto que em caso de
descumprimento destes preceitos fundamentais da vida em sociedade o Estado
poderá se valer de medidas que visam cessar ou punir eventuais transgressores do
ordenamento jurídico ambiental.
11
1 ASPECTOS NORTEADORES DO DIREITO AMBIENTAL
Nos últimos tempos verificamos uma crescente preocupação com a
conscientização ambiental. Verifica-se que os bens ambientais e os recursos são
finitos, ou seja, esgotáveis, a partir daí surgindo a necessidade de bem utilizar esses
recursos ou gerenciá-los. O direito ambiental nasce com o propósito de salvaguardar
a continuidade dos recursos naturais visando garantir à atual e as próximas
gerações melhor qualidade de vida. Dessa forma, temos em um primeiro momento o
nascimento de uma conscientização e, posteriormente, o regramento jurídico como
ciência tutelando essa forma de vida.
O primeiro instrumento de defesa internacional e um dos mais importantes foi
a declaração de Estocolmo em junho de 1972. Naquele momento a Organização das
Nações Unidas (ONU) reuniu 113 países, a fim de discutir as diretrizes ambientais
do planeta para os próximos anos, tendo em vista que começou a se verificar o início
da escassez dos recursos naturais bem como o planeta começava a apresentar os
sintomas da degradação ambiental, dentre estes países estavam os considerados
desenvolvidos e aqueles que buscavam desenvolvimento. Verificou-se, naquela
oportunidade, um conflito entre esses dois blocos de países, os primeiros já
enfrentavam os malefícios da falta de recursos em função do progresso
desordenado no tocante a poluição, do outro lado os países em desenvolvimento
que, como o próprio nome sugere, queriam crescer, se desenvolver e ganhar
dinheiro trazendo assim a chamada linha desenvolvimentista. Esses países
desenvolvidos motivados pelas dificuldades que enfrentavam trouxeram ideias
chamadas de linhas preservacionistas. Desse confronto surgiram então 26 princípios
conhecidos como o Código ou Declaração do Meio Ambiente de Estocolmo.
Desses 26 princípios saem duas ideias consagradas, sendo que a primeira é
a necessidade do dever de conscientização e segunda o reconhecimento do direito
ao progresso como um direito fundamental do homem, o que significa dizer que
todos têm o direito de progredir, crescer e se desenvolver, mas em contrapartida
todos tem o dever de preservar de cuidar do meio ambiente para as presentes e
12
futuras gerações. É a ideia de desenvolvimento social e preservação ambiental,
aspecto que norteia todas as discussões relacionadas ao direito ambiental desde
sua criação até os dias de hoje, achar o ponto de equilíbrio entre esses dois
conceitos é uma tarefa, na prática, bastante difícil.
1.1 O surgimento do direito ambiental
A relação homem-natureza sempre existiu, o homem diretamente ligado ao
ambiente natural. Resume-se que o homem sempre explorou a natureza a fim de se
beneficiar, explorar as riquezas ou modificá-las de acordo com suas necessidades
econômicas. Estas forças econômicas foram as principais responsáveis pelo
desenvolvimento econômico da sociedade e consequentemente a exploração sem
limites dos recursos naturais. A revolução industrial no século XVIII teve como
principal característica o capitalismo, a produção em série e exploração de recursos,
nesse sentido, nessa busca pelo desenvolvimento industrial a relação entre a
sociedade e meio ambiente ficou desconexa, tendo a sociedade crescendo cada vez
mais e o meio ambiente encolhendo. A poluição cresce desenfreadamente quando
surge a necessidade do estado tutelar o meio ambiente, quer seja pela constatação
do esgotamento dos recursos naturais ou quer seja pelo ganho econômico de
tributos.
Em junho de 1972 então, surge a Declaração do Meio Ambiente de
Estocolmo (Declaração de Estocolmo 2015) elencando 21 princípios basilares do
direito ambiental e tratado como o mais importante reconhecimento do direito
ambiental Humano, pois, reconheceu que todo tem um só planeta e a necessidade
de uma proteção internacional do meio ambiente, elevando assim o tema à categoria
de um bem público global.
Chegamos a um momento da história em que devemos orientar nossos atos
em todo o mundo com particular atenção às consequências que podem ter
para o meio ambiente. Por ignorância ou indiferença, podemos causar
danos imensos e irreparáveis ao meio ambiente da terra do qual dependem
nossa vida e nosso bem-estar. Ao contrário, com um conhecimento mais
profundo e uma ação mais prudente, podemos conseguir para nós mesmos
e para nossa posteridade, condições melhores de vida, em um meio
ambiente mais de acordo com as necessidades e aspirações do homem. As
perspectivas de elevar a qualidade do meio ambiente e de criar uma vida
13
satisfatória são grandes. É preciso entusiasmo, mas, por outro lado,
serenidade de ânimo, trabalho duro e sistemático. Para chegar à plenitude
de sua liberdade dentro da natureza, e, em harmonia com ela, o homem
deve aplicar seus conhecimentos para criar um meio ambiente melhor. A
defesa e o melhoramento do meio ambiente humano para as gerações
presentes e futuras se converteu na meta imperiosa da humanidade, que se
deve perseguir, ao mesmo tempo em que se mantém as metas
fundamentais já estabelecidas, da paz e do desenvolvimento econômico e
social em todo o mundo, e em conformidade com elas (DECLARAÇÃO DE
ESTOCOLMO, 2015).
Este freio que deveria ser dado na poluição mundial foi visto como uma forma
de retardo no crescimento, mesmo para alguns países já desenvolvidos, o que fez
com que muitos deixassem de assinar não só a declaração de Estocolmo, mas
inúmeros outros pactos mundiais com relação à redução dos níveis de poluentes,
esta falta de comprometimento mundial por parte de alguns países, aliado ao fato de
diversos problemas locais que nunca chegam ao conhecimento mundial acaba
gerando uma espécie de bolha de contaminação e destruição que aos poucos vai
destruindo o planeta.
Esses aspectos demonstram que, já faz muitos anos que os direitos ambientais
saíram das esferas locais e se tornaram problemas mundiais e que as soluções para
estes problemas estão nas decisões políticas sérias e na conscientização de cada
indivíduo. E que em um mundo completamente divergente dificilmente se chegará a
algum acordo em que todos estejam completamente de acordo, mas é necessário
que alguns cedam pelo bem do todo.
1.2 Conceito de Meio Ambiente
O conceito de meio ambiente é extremamente abrangente e influente.
Podemos considerar que é tudo aquilo que nos circunda, que está ao nosso redor,
mesmo quando estamos em casa longe do meio ambiente natural, normalmente
conhecido como natureza, pelo senso leigo, pois o artigo primeiro da Lei n° 6.938/81
é amplo quando se trata de conceituar meio ambiente. Ele aborda o conjunto de
condições, leis, influências e interações que são de ordem física química e biológica
e que regem a vida em todas as suas formas.
A Lei n° 6.938/81 refere-se a este conjunto da seguinte forma:
14
Art. 3º [...]
I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de
ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em
todas as suas formas;
II - degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das
características do meio ambiente;
III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades
que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais
estabelecidos;
IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado,
responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de
degradação ambiental;
V - recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e
subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos
da biosfera, a fauna e a flora (BRASIL, 2015).
Este conceito tem por propósito abranger aspectos naturais do meio
ambiente, a ideia de conjunto de condições, leis e interações como algo único
insolúvel. Esse conceito amplo, entretanto, dificulta sua compreensão no tocante aos
detalhes. Assim, a doutrina é quem faz a sua parte nessa história, expondo que a
definição mais adequada seria o meio ambiente em quatro aspectos: meio ambiente
natural, o artificial, o cultural e o do trabalho. É o entendimento de Deon (2010, p.
34), ao ensinar que:
[...] o conceito deve ser ampliado para abarcar todos os elementos
mencionados. Assim, poderíamos conceituar o meio ambiente como o
conjunto de elemento naturais, artificiais, culturais e do trabalho, suas
interações, bem como as condições, princípios, leis e influencias que
permitem, abrigam e regem a vida em todas as suas formas [...]
Quando nos referimos a meio ambiente natural, portanto, estamos nos
referindo a ideia de natureza, ou seja, fauna e flora, de forma que o fenômeno do
meio ambiente natural é da água, do solo, da fauna, da flora e do ar: esses são os
cinco aspectos do meio ambiente natural e sempre ligados a ideia de natureza.
O homem foi utilizando e modificando esse meio ambiente natural no qual
vive, de acordo com sua necessidade. Ele foi se utilizando de recursos para ir
modificando o ambiente, criando dessa forma o meio ambiente artificial, ou seja, o
espaço urbano construído pelo homem, aquilo que resultou de sua interação com o
15
natural, tudo aquilo que o homem explorou no ambiente natural, extraiu e modificou,
torna-se meio ambiente artificial. Quando uma rodovia, por exemplo, liga duas
cidades, temos uma substituição do meio ambiente natural pelo artificial, entretanto
apesar de modificado, ainda, temos o meio ambiente, mesmo que artificial
conceituado pela lei.
Se tudo aquilo que nos envolve faz parte do meio ambiente em que vivemos,
então tudo aquilo o que vestimos, a forma como nos portamos, o que usamos e o
que comemos dizem repeito ao meio ambiente cultural em que vivemos. Dessa
forma o artigo 216 da CF/88 cita o patrimônio cultural, tal como modo de fazer, viver
e criar as formas de expressão. Isto são traços culturais que identificam o povo,
assim, o meio ambiente cultural se remete ao artigo 216-A da CF/88.
Art. 216-A. O Sistema Nacional de Cultura, organizado em regime de
colaboração, de forma descentralizada e participativa, institui um processo
de gestão e promoção conjunta de políticas públicas de cultura,
democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da Federação e a
sociedade, tendo por objetivo promover o desenvolvimento humano, social
e econômico com pleno exercício dos direitos culturais.
§ 1º O Sistema Nacional de Cultura fundamenta-se na política nacional de
cultura e nas suas diretrizes, estabelecidas no Plano Nacional de Cultura, e
rege-se pelos seguintes princípios.
I - diversidade das expressões culturais;
II - universalização do acesso aos bens e serviços culturais;
III - fomento à produção, difusão e circulação de conhecimento e bens
culturais;
IV - cooperação entre os entes federados, os agentes públicos e privados
atuantes na área cultural;
V - integração e interação na execução das políticas, programas, projetos e
ações desenvolvidas;
VI - complementaridade nos papéis dos agentes culturais;
VII - transversalidade das políticas culturais;
VIII - autonomia dos entes federados e das instituições da sociedade civil;
IX - transparência e compartilhamento das informações;
X - democratização dos processos decisórios com participação e controle
social;
XI - descentralização articulada e pactuada da gestão, dos recursos e das
ações;
XII - ampliação progressiva dos recursos contidos nos orçamentos públicos
para a cultura (BRASIL, 2015).
Para entender o que é meio ambiente temos que nos deter ao artigo 225 da
CF/88, que conceitua o meio ambiente como “bem de uso comum e essencial do
povo” (BRASIL, 2015). Essa expressão trouxe alguns atributos ao conceito de meio
ambiente, os quais são de extrema importância para que possa compreender ainda
16
mais esse conceito de meio ambiente. A primeira característica é considerar um bem
de uso comum do povo. Note-se que quando se refere a expressão “bem” está
referindo ao objeto de uma relação jurídica e não ao sujeito, ou seja, o sujeito é o
homem que tutela em face do bem de uso comum. Vejamos o que prescreve o artigo
225 da CF/88:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de
espécies ou submetam os animais a crueldade (BRASIL, 2015).
Uma característica que deve ser destacada é a palavra “uso”, quando do
estudo do conceito de meio ambiente. Exemplificando: no direito de propriedade
verificamos que o proprietário possui alguns poderes inerentes ao direito de
propriedade, entretanto eles não mais são absolutos, pois o proprietário deve usá-lo
de forma equilibrada e que não cause danos ou prejudique a natureza, ou seja, em
outras palavras, seria direcionar as tutelas criadas para a natureza em face do
homem, dessa forma o homem seria o principal beneficiário do equilibro da natureza
voltando ele ser o centro do universo e beneficiando-se das leis criadas para tutelar
a natureza. Essa visão também é chamada de visão antropocêntrica.
Para concluir este ponto, podemos dizer que o direito ambiental é um bem
difuso, ou seja, ele diz respeito a sociedade em sua totalidade, não pode ser dividido
ou fracionado sem que afete a sociedade como um todo, ele não pertence ao
particular ou ao estado, ele é um bem que pertence a todos e dessa forma, deve ser
protegido por todos.
1.3 As origens históricas do direito ambiental brasileiro
O Brasil é um dos países onde as normas ambientais são consideradas
rígidas e avançadas na garantia e preservação do meio ambiente. Isso decorre de
um longo caminho percorrido, o qual iniciou em momento histórico anterior à
ratificação da declaração do meio ambiente de Estocolmo. Conforme Farias (2006),
17
a evolução da legislação ambiental no Brasil se deu em diferentes fases: a fase de
exploração, a fragmentária e a holística. Essas fases históricas não possuem
momentos ou marcos que possam afirmar precisamente o momento em que se
deram.
O primeiro momento histórico na legislação ambiental brasileira é o que está
descrito como fase de exploração. Está caracterizado pela inexistência de
preocupação com o meio ambiente, salvo por alguns dispositivos legais protetores
de recursos naturais, talvez em decorrência do interesse do estado em recolher
tributos nesta fase histórica. Está localizado em 1830, e preocupa-se com a
legislação sobre a extração de alguns recursos naturais do meio ambiente. Dessa
forma, temos uma codificação de crimes contra o meio ambiente em 1830 que
tipifica como crime o corte ilegal de madeira e a Lei nº 601/1850, que discrimina
ilícitos como desmatamentos de áreas e incêndios provocados ou criminosos.
Art. 2º. Os que se apossarem de terras devolutas ou de alheias, e nellas
derribarem mattos ou lhes puzerem fogo, serão obrigados a despejo, com
perda de bemfeitorias, e de mais soffrerão a pena de dous a seis mezes
do prisão e multa de 100$, além da satisfação do damno causado. Esta
pena, porém, não terá logar nos actos possessorios entre heréos
confinantes (BRASIL, 2015).
Segundo o que ensina Farias (2006), só eram punidos aqueles que
praticassem crimes contra o interesse da Coroa ou dos grandes comerciantes da
época. Com a proclamação da República, a falta de interesse da União pela questão
ambiental continuou. Nesta fase histórica, ainda não existia uma preocupação em
dar guarida ao meio ambiente, salvo alguns dispositivos cujo objetivo seria a
proteção
de alguns
recursos
isolados,
os
quais
eram
muito
explorados
economicamente, como o pau-brasil.
A segunda fase histórica que podemos relacionar ao direito ambiental
brasileiro antes da declaração de Estocolmo é chamada de setorial e se caracterizou
pelo começo dos controles legais às atividades que exploravam o meio ambiente o
seu como marco inicial, é o final da década de 1920. O controle era feito de forma
inaugural, talvez porque regido pela política da necessidade utilitarista, baseada na
ideia apenas de compor conflitos de vizinhança e de assegurar o direito de
18
propriedade. Foi a partir do final da década de 1920 que surgiu uma legislação
ambiental mais completa.
O que marca o Estado brasileiro após a década de 1930 com relação ao meio
ambiente é a estruturação de um controle federal sobre o uso e ocupação do
território brasileiro, bem como de seus recursos naturais. Passa-se a travar uma de
disputa entre o governo da União e seus entes federativos. Os recursos ambientais
como a água, fauna, e flora passaram a ser protegidos por uma legislação
diferenciada. Dessa forma, os recursos hídricos passaram a ser tutelados pelo
Código das Águas ou Decreto-Lei nº 852/38, os recursos da pesca passaram a
serem tutelados pelo Código de Pesca ou Decreto-Lei nº 794/38, a fauna passou a
ser tutelada pelo Código de Caça ou Decreto-Lei nº 5.894/43, o solo e o subsolo
tiveram a tutela no Código de Minas ou Decreto-Lei nº 1.985/40, e a flora por sua
vez, pelo Código Florestal ou Decreto nº 23.793/34.
A década de 1960 passou a ser a segunda etapa da fase setorial, e foi
marcada pela edição de normas com maiores rigores às questões ambientais em
comparação com a fase anterior. Nesse momento foram criados e modificados
importantes instrumentos de proteção e tutela ambiental, tais como o Estatuto da
Terra ou Lei nº 4.504/64, o Código Florestal ou Lei nº 4.771/65, a Lei de Proteção à
Fauna ou Lei nº 5.197/67, o Código de Pesca ou Decreto-Lei nº 221/67 e o Código
de Mineração ou Decreto-Lei nº 227/67. No entanto, o Estado ainda detinha sua
atenção somente àqueles recursos naturais que pudessem ter ou que tivessem valor
econômico. Ficou conhecida por fase de gestão de recursos naturais, passando o
Estado a regulamentar o uso dos recursos naturais por meio de concessões a
particulares que poderiam explorar a fauna e a flora e todos os seus recursos
naturais.
Ainda na análise de Farias (2006), a terceira fase ou fase holística ficou
conhecida a partir do momento em que o direito ambiental passou a ser entendido
como um todo, percebendo que para sua proteção não bastaria apenas fragmentos
de Leis, mas sim um conjunto de normas sistematizadas e interligadas entre si.
19
No ano 1972 onde o Brasil se tornou signatário da declaração de Estocolmo.
Surgem em decorrência, mais precisamente no ano de 1981, a implantação no país
da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, Lei nº 6.938/81, a qual estabelece
uma ideia diferenciada sobre planejamento e gestão ambiental e se firma e ganha
espaço como um novo ramo da Ciência Jurídica. São inúmeros os dispositivos
jurídicos que preveem a proteção legal ao meio ambiente.
Após, no ano de 1985, surgiu um importante instrumento de tutela que até
hoje é muito utilizado, principalmente pelo Ministério Público, na defesa do meio
ambiente, além de outros direitos difusos: se trata da Lei da Ação Civil Pública (Lei
n° 7.347/85) a qual trouxe um importante instrumento processual para defesa do
meio ambiente.
No ano de 1988, com a promulgação da Constituição Federal do Brasil, notase um grande divisor de águas no direito ambiental. Foi a primeira Constituição que
trouxe um capítulo inteiro reservado ao meio ambiente. O artigo 225 da CF/88,
diferentemente da referência ambiental de outras constituições, esta reservou um
capitulo interiro para este tema. Apesar de ser apenas um artigo (artigo 225)
estabelece muitas informações, princípios e garantias que lá estão delineados.
Em 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento, também conhecida como ECO 92, no Rio de Janeiro, teve como a
sua maior importância consagrar outros princípios constitucionais, além de prever a
Agenda 21, a qual estabelece metas mundiais para o controle da poluição. Debatida
desde
1972
tanto
pelos
países
desenvolvidos
como
pelos
países
em
desenvolvimento, a Agenda 21 trouxe novamente essa discussão sobre a
importância do desenvolvimento e da necessidade de preservação ou ainda
chamado de desenvolvimento sustentável.
1.4 O direito ambiental na Constituição Federal de 1988
A promulgação da CF/88 fez com que o meio ambiente fosse visto como uma
nova disciplina, sendo exposta de forma autônoma e normatizada. A nova matéria
passou a ser inserida e ganhou “status” de direito fundamental. Em capítulo próprio,
20
no artigo 225, trouxe a previsão de que ao Poder Público e à coletividade cabe a
função de fiscalização e preservação do meio ambiente, elencando, ainda, sanções
administrativas e penais a todos aqueles que de uma forma ou de outra causarem
danos ao meio ambiente ou se omitirem na suas atribuições de fiscalização.
O texto constitucional passou a prever mecanismos de defesa do meio
ambiente, dentre os quais, a delimitação de territórios a ser especialmente
protegidos, estudos de prévio impacto ambiental para a instalação de obra ou
atividade lesiva, promoção da educação ambiental, e diversos princípios,
abrangendo todos aqueles previstos na Declaração de Estocolmo, tudo com o
escopo de dar efetividade à defesa do meio ambiente ecologicamente equilibrado.
O “caput” do artigo 225 da CF/88, ao assegurar a proteção constitucional ao
direito ambiental em único capítulo, se dedicou a elencar normas, princípios e
ferramentas a fim de dar amparo jurídico à tutela do meio ambiente. Um único artigo,
porém completo, que definiu competências, domínio dos bens ambientais e
garantias processuais dando assim, amplo amparo jurídico ao meio ambiente.
Assim, vejamos o que dispõe o artigo, comentando um a um os seus incisos:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º. Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o
manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material
genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a
supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização
que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a
supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização
que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
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V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de
vida e o meio ambiente;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de
vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de
espécies ou submetam os animais a crueldade.
§ 2º. Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o
meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo
órgão público competente, na forma da lei.
§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados.
§ 4º. A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o
Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua
utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos
naturais
§ 5º. São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados,
por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas
naturais.
§ 6º. As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização
definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas (BRASIL,
2015).
Temos a partir do dispositivo constitucional a visão de que todos, sem
exceção, são destinatários da norma ambiental, sem benefício à particulares,
elevando o direito ambiental a um direito fundamental básico e exercício de
cidadania. Assim, colocando a responsabilidade pelo zelo à União, mas também
deixando de isentar a coletividade por práticas danosas ao meio ambiente.
Sobre o dispositivo supracitado, temos que destacar que a palavra “preservar”
significa acautelar-se de todas as medidas necessárias a fim de garantir o meio
ambiente preservado em seu estado natural sem alterações ou que faça com que o
poder público utilize-se de suas prerrogativas no sentido de obrigar os causadores
de eventos danosos a recuperar o ambiente degradado. Este ambiente pode ser
visto de forma ampla, ou seja, natural, artificial, cultural e do trabalho. Em sequência,
a palavra “preservar” está explícita no inciso segundo e compreende a diversidade
das espécies, pois é sobre a diversidade, inclusive genética, é que encontramos
22
inúmeros avanços científicos. Importante ressaltar que o inciso II, do artigo 225, da
CF/88, não quer incentivar a busca por estudos genéticos, mas sim impor limites às
empresas que façam este tipo de prática.
O inciso III, previu o dever dos entes federativos protegerem as riquezas
naturais propicias dos locais, através da criação das áreas de preservação, com
tutelas mais específicas. Exemplo disso são os bens especialmente protegidos por
lei: no Rio Grande do Sul, a Figueira está protegida pelo Código Florestal do Rio
Grande do Sul, Lei n° 7.989/95, no artigo 33, o qual dispõe que “fica proibido, em
todo o Estado do Rio Grande do Sul, o corte das espécies nativas de figueira, do
gênero ficus e das corticeiras do gênero erytrina” (RIO GRANDE DO SUL, 2016).
O inciso IV, se refere ao estudo prévio de impacto ambiental. A partir desse
inciso temos a segurança de que o desenvolvimento do país se dará com a mínima
intervenção na estrutura do meio ambiente e que eventuais danos deverão ser
reparados, ou seja, o desenvolvimento continua, mas agora de forma controlada em
face do meio ambiente.
O inciso V, remete ao controle de produção e comercialização, além do
emprego de técnicas e métodos que comportem riscos para a vida e qualidade de
vida do meio ambiente. O Poder Público está autorizado a interferir na atividade
econômica em favor do direito ambiental através do controle e fiscalização da forma
como é explorado o meio ambiente ou da forma como são produzidos alguns
produtos que possam vir a gerar impactos ambientais, exemplo desses produtos são
a fabricação e o uso de agrotóxicos.
O inciso VI, estabelece a necessidade da educação ambiental em todos os
níveis de ensino, bem como a conscientização pública do dever de preservação do
ambiente. O legislador constitucional através deste inciso prevê a necessidade da
inclusão de toda a sociedade no dever de adquirir a conscientização ambiental não
somente aqueles que estão em uma sala de aula, mas no dia a dia da população em
geral. Um exemplo disso são as placas colocadas nas estradas: “cuidado posso
atravessar”.
23
O inciso VII, demonstra intenção não somente de preservar a vida ecológica,
mas também a intenção de proteger a fauna e a flora da extinção ou das práticas
cruéis. Demonstra que quando o legislador coloca as expressões fauna e flora é
pelo fato de que um não vive sem o outro, completando-se.
Diante do exposto, podemos concluir que a preocupação com a preservação
do meio ambiente é bem recente. Com a promulgação da Constituição Federal de
1988 ampliou-se o enfoque jurídico do tema. Assim, para melhor explicar como
funcionam os mecanismos do direito ambiental, no próximo capítulo trataremos dos
princípios que o disciplinam.
24
2. PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL
A criação de princípios jurídicos a serem observados surge da necessidade
de estabelecer um regramento ou certa padronização relacionada à conduta
humana, nos mais diversos domínios jurídicos. Neste sentido, de acordo com
Barroso (2010), é no Direito Constitucional que se encontram, basicamente, as
formas de ler e interpretar os diversos ramos do direito, através dos princípios
jurídicos. Na Constituição Federal é possível encontrar princípios relacionados as
mais diversas áreas, entre elas o Direito Ambiental. Desta forma, neste capítulo, em
um primeiro momento abordaremos os princípios gerais de direito para, em seguida,
adentrar no campo específico dos princípios do Direito Ambiental.
2.1 A importância dos princípios gerais do direito
Observar os princípios jurídicos contidos nas legislações é premissa para a
efetivação da plena justiça na sociedade. Na Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro, em seu artigo 4º, tem-se: "Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso
de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito". Percebese, portanto, a relevância dos princípios gerais do direito enquanto balisadores de
decisões jurídicas e da própria conduta humana em sociedade. Os princípios
irradiam-se, portanto, por todo o ordenamento jurídico.
Os
princípios
são
caracterizados,
conforme
Barroso
(2010),
pela
indeterminação de seu conteúdo, uma vez que são formados por um núcleo de
sentido que atua como determinador de regras, sendo capaz de prescrever, de
modo objetivo, as condutas a serem adotadas. Desta forma, é possível dizer que os
princípios transformam a aplicação das normas jurídicas ao longo do tempo,
possibilitando que a norma se adapte às diferentes realidades da sociedade.
No entendimento de Oliveira (2012, p. 47), os princípios "podem ser
entendidos enquanto normas que impõem um mandamento a ser concretizado,
cumprido em diferentes graus, pois ordenam que algo seja realizado dentro das
possibilidades jurídicas e reais existentes". É através dos princípios que os valores
existentes no plano da ética e transpassam ao mundo jurídico (BARROSO, 2010).
25
1.2. Princípios do direito ambiental
O Direito Ambiental é um ramo jurídico autônomo e, por este motivo, possui
suas próprias regras e princípios em relação à proteção ambiental. Entretanto, não
há uniformidade entre os doutrinadores quanto aos princípios do Direito Ambiental,
bem como no tocante a outros assuntos correlatos. Desta forma, buscou-se utilizar o
entendimento de Machado (2005), Milaré (2011), Oliveira (2012) e Sirvinskas (2005),
para elencar o seguinte rol de princípios ambientais:
a) Princípio do direito humano;
b) Princípio do desenvolvimento sustentável;
c) Princípio democrático/ da participação;
d) Princípio da prevenção/precaução;
e) Princípio do poluidor-pagador;
f) Princípio do usuário-pagador;
g) Princípio da informação;
h) Princípio da função socioambiental da propriedade;
i) Princípio do limite;
j) Princípio do acesso equitativo aos recursos naturais;
k) Princípio da responsabilidade social;
l) Princípio da cooperação entre os povos.
O primeiro princípio, do direito humano, fundamenta-se no na Declaração de
Estocolmo de 1972 que, conforme Sirvinskas (2005) elenca o ser humano como o
centro das preocupações referentes ao desenvolvimento sustentável. Machado
(2005), por sua vez, denomina este como o princípio do direito à sadia qualidade de
vida, relacionado ao fato de que todo ser humano tem o direito de viver em um
ambiente sadio e, portanto, de ter uma vida saudável (MILARÉ, 2011).
Já o princípio do desenvolvimento sustentável refere-se à proteção do meio
ambiente como algo intrínseco ao desenvolvimento econômico e social (OLIVEIRA,
26
2012). Esta característica encontra-se elencada, inclusive, na Constituição Federal,
em seu artigo 170, VI.
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano
e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado
conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos
de elaboração e prestação (BRASIL, 2015).
Desta forma, o princípio do desenvolvimento sustentável significa que as
atividades econômicas devem ser desenvolvidas utilizando-se de todos os meios
disponíveis e buscando o mínimo de degradação ambiental possível (OLIVEIRA,
2012). Trata-se, portanto, do uso racional dos recursos naturais não renováveis
(SIRVINSKAS, 2005).
A participação popular é o cerne do princípio democrático, que prevê a
possibilidade de que os cidadãos participem das decisões envolvendo o meio
ambiente, principalmente através das políticas públicas ambientais (SIRVINSKAS,
2005). Neste diapasão, Oliveira (2012, p. 53) entende ser este o princípio da
participação, que "determina uma atuação conjunta do Poder Público e da sociedade
na proteção do meio ambiente”. Através deste princípio, busca-se a promoção de
políticas públicas e privadas relacionadas à educação ambiental, formada por ações
voltadas à conscientização e preservação dos recursos naturais através da
participação ativa da sociedade e da Administração Pública.
O princípio da prevenção ou precaução, por sua vez, refere-se ao
impedimento de ocorrência de danos ao meio ambiente, "por meio da imposição de
medidas de proteção antes da implantação de empreendimentos e atividades
consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras" (OLIVEIRA, 2012, p. 49). A
diferença entre prevenção e precaução consiste no conhecimento dos possíveis
riscos: se os riscos são conhecidos, trata-se de prevenção; se desconhecidos, tratase de precaução.
Já o princípio do poluidor-pagador destaca que "deve o poluidor arcar com as
despesas de prevenção dos danos ao meio ambiente, oriundos do desenvolvimento
27
de sua atividade" (OLIVEIRA, 2012, p. 51). Para Sirvinskas (2005), trata-se da
responsabilidade objetiva daquele que ocasionou prejuízo ao meio ambiente,
independente da existência de culpa.
O princípio do usuário-pagador pressupõe que o usuário, ou seja, o indivíduo
que utilizar os recursos ambientais deverá pagar por isto, por se tratar de bem de
uso comum. Importante ressaltar que não se trata de uma penalidade imposta pelo
uso (OLIVEIRA, 2012).
Outro princípio, o da informação, refere-se ao acesso público às informações
de cunho ambiental e, conforme Oliveira (2012) encontra-se consagrado também na
Política Nacional do Meio Ambiente e em outros dispositivos legais.
O princípio da função socioambiental da propriedade, por sua vez, reitera e
complementa o disposto na Constituição Federal, artigo 5º, XXIII: “a propriedade
atenderá a sua função social" (BRASIL, 2015). Trata-se da conscientização acerca
da sustentabilidade ambiental, englobando as propriedades urbanas e rurais, bem
como os bens móveis e o descarte adequado dos resíduos gerados a partir da
utilização dos bens móveis e imóveis (OLIVEIRA, 2012).
Já o princípio do limite impõe ao Poder Público "dever de estabelecer os
padrões de emissão de partículas, ruídos e a presença de corpos estranhos no
ambiente, tendo em vista a necessidade de proteção da vida e do próprio ambiente"
(OLIVEIRA, 2012, p. 54). Desta forma, uma vez ultrapassados tais limites, a
Administração Pública possui o dever de agir, impondo as medidas coercitivas
necessárias (SIRVINSKAS, 2005).
O princípio do acesso equitativo aos recursos naturais é desta forma colocado
por Machado, (2005, p. 57).
A prioridade do uso dos bens ambientais não implica exclusividade de uso.
Os usuários prováveis ou simplesmente os que desejam usar os bens e não
os usam precisam provar suas necessidades atuais. Os usuários só
poderão usar os bens ambientais na proporção de suas necessidades
presentes, e não futuras.
28
Desta forma, busca-se o uso racional dos recursos naturais no presente,
visando a preservação da qualidade de vida das gerações futuras.
A responsabilidade social também figura como princípio, devendo ser
observado, principalmente, pelas instituições financeiras quando da concessão de
financiamentos de projetos (SIRVINSKAS, 2005). Assim, a concessão de
financiamentos fica condicionada à apresentação de critérios mínimos relacionados
à responsabilidade social, envolvendo estudos de impactos ambientais, entre outros
aspectos.
Por fim, o princípio da cooperação entre os povos pressupõe a preservação
ambiental de maneira globalizada, considerando que a degradação ambiental não
produz efeitos nocivos localizados, sendo possível verificar prejuízos sem limites de
fronteira. Assim, este princípio atribui ao Governo brasileiro o dever de cooperar com
outros países, sempre que necessário, no tocante a aspectos relacionados à
preservação do meio ambiente (OLIVEIRA, 2012).
2.1 Dever de preservação do meio ambiente
A proteção ao meio ambiente é dever de todos os cidadãos e também do Poder
Público, uma vez que o §1º deste artigo elenca as incumbências do Poder Público
para a efetividade do direito ao meio ambiente. Para compreender este viés do
Direito Ambiental, abordam-se os aspectos relacionados aos deveres comuns da
sociedade, com ênfase nos deveres dos proprietários de imóveis. Tal é tema
constante de discussão na sociedade atual. Conforme já verificado o disposto no
artigo 225 da Constituição Federal.
2.2.1 Deveres comuns da sociedade
Toda a sociedade é responsável pela preservação do meio ambiente,
conforme anteriormente exposto, através da previsão constitucional do artigo 225,
sendo cada um na medida de suas responsabilidades aquele que possui
diretamente o bem deverá respeitar o mínimo de cuidados estabelecidos em leis e
29
os demais fiscalizando ou contribuindo para a preservação do meio ambiente
equilibrado.
Como bem coloca Sirvinskas (2005, p. 45):
A responsabilidade pela preservação do meio ambiente não é somente do
Poder Público, mas também da coletividade. Todo cidadão tem o dever de
preservar os recursos naturais por meio dos instrumentos colocados à sua
disposição pela Constituição Federal e pela legislação infraconstitucional.
Percebe-se, portanto, uma responsabilidade coletiva pela preservação de um
bem que é, de fato, de todos. A sociedade deve exercer de maneira ativa a sua
participação nas decisões relacionadas às políticas públicas de preservação, bem
como se colocar também como fiscalizadora de ações nocivas, denunciando aos
órgãos competentes.
Desta forma, além de ser necessário que cada um faça sua parte no conjunto
social no sentido de evitar a degradação, é preciso que se possibilite aos órgãos
competentes a identificação de causadores de danos, para que os mesmos possam
ser devidamente penalizados, na forma da lei.
O artigo 14, § 1º da Lei n° 6.938/81, que disciplina a Política Nacional do Meio
Ambiente, dispõe que:
Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor
obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar
os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua
atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade
para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados
ao meio ambiente (BRASIL, 2015).
Percebe-se, portanto, que a responsabilidade civil ambiente é objetiva, uma
vez que o poluidor é obrigado a indenizar ou reparar os danos por eles causados.
Trata-se da aplicação de dois princípios já elencados neste estudo: o do poluidorpagador e o Princípio do usuário-pagador.
O poluidor-pagador tem o dever de indenizar em virtude dos danos causados
(através de multas ou de reparações, por exemplo); já o usuário-pagador tem o
30
dever de ressarcir, na forma de taxas de uso, por exemplo, pela utilização de
recursos naturais que, apesar de pertencerem à coletividade, são utilizados de
maneira individual.
Não resta dúvida de que é necessário fortalecer a sociedade civil. É
necessário ampliar cada vez mais a democracia participativa e a ecologia
social. Só assim é possível construir novos critérios ético-políticos que
orientarão o caminho de um consenso mundial em torno da gestão dos
bens ambientais, bens públicos de primeira grandeza (CORRÊA; BACKES,
2006, p. 108).
De fato, é preciso haver conscientização por parte da sociedade de que
alguns recursos não são renováveis e com o uso desenfreado, o esgotamento deles
está próximo. É preciso assumir uma postura sustentável.
2.2.1 Deveres do proprietário de imóvel
Conforme já exposto neste estudo, a propriedade deve atender à sua função
social (de acordo com a Constituição Federal) e, neste diapasão, esta função social
significa, também, uma função ambiental. Desta forma, as propriedades urbanas ou
rurais devem zelar por um dos princípios do Direito Ambiental: o princípio da função
socioambiental da propriedade.
A observância do princípio da função social e ambiental da propriedade é
obrigação propter rem que se prende ao titular do direito real do imóvel. Não
importa, portanto, a alegação de que o atual proprietário do imóvel não é
responsável pela ocorrência anterior do dano ambiental (MACHADO, 2014).
O exercício do direito à propriedade não mais deve ser considerado sob o
ponto de vista individual: é preciso pensar na coletividade. Assim, o proprietário do
imóvel possui alguns deveres perante a sociedade, no sentido de auxiliar na
promoção da preservação ambiental e na diminuição da degradação dos recursos
naturais, sob todas as suas formas.
Cabe ressaltar que “a função ambiental dinamiza o uso da propriedade,
aperfeiçoando-a mediante estimulação do proprietário à preservação e recuperação
dos bens ambientais sob seu domínio” (MACHADO, 2014). Significa, portanto, que o
proprietário de um imóvel deve considerar o impacto de seu uso perante a
31
coletividade e o meio ambiente, bem comum a todos, como bem coloca o Código
Civil, em seu artigo 1.228, §1º:
O direito de propriedade deve ser exercido conforme os fins econômicos e
sociais e por forma a que restem preservados, de acordo com a lei especial,
a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio
histórico e artístico, assim como evitada a poluição do ar e das águas
(BRASIL, 2016).
Deste artigo, é possível perceber que o legislador elencou algumas áreas
específicas, relacionadas à preservação do meio ambiente: fauna e flora, belezas
naturais, equilíbrio do meio ambiente, ar e águas. Quando da utilização da
propriedade, o proprietário deve atentar para que este uso não cause prejuízos ao
meio ambiente, sob os aspectos citados no supracitado artigo, além de outros
aspectos citados no ordenamento jurídico brasileiro.
Os municípios devem construir suas próprias bases relacionadas à função
social da propriedade e, no caso da zona urbana, ao crescimento das cidades de
maneira ordenada. Assim, o artigo 182 da Constituição Federal dispõe que:
A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público
municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo
ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o
bem-estar de seus habitantes (BRASIL, 2015).
Neste sentido, os municípios devem possuir seu próprio Plano Diretor, que se
trata de um documento oficial elaborado com o intuito de promover o crescimento
ordenado dos territórios municipais, tanto na área urbana quanto rural. Neste
sentido, a Constituição Federal, no artigo 182, § 2º, coloca que “a propriedade
urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de
ordenação da cidade expressas no plano diretor”.
Sobre a propriedade rural, a função social também é colocada pela
Constituição Federal, em seu artigo 186:
Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende,
simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em
lei, aos seguintes requisitos:
I - aproveitamento racional e adequado;
32
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do
meio ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos
trabalhadores
(BRASIL, 2015).
É possível perceber que a função socioambiental da propriedade rural
contempla aspectos relacionados ao uso racional do imóvel, à utilização adequada e
conforme a lei da mão de obra, à utilização adequada dos recursos naturais e
preservação do meio ambiente em que está inserida, entre outros aspectos que,
embora não estejam explícitos neste dispositivo constitucional, devem ser
observados pelos proprietários.
Um aspecto bastante relevante e que deve ser considerado pelos
proprietários de imóveis refere-se às denominadas APPs (Áreas de Preservação
Permanente). Cabe aos proprietários a sua preservação, conforme disposto no
artigo 7º do Código Florestal: “A vegetação situada em Área de Preservação
Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a
qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado” (BRASIL,
2015). Para fins de delimitação do que é, de fato, uma APP, o Código Florestal
elenca os fatores que caracterizam este tipo de área.
Outro fator também elencado pelo Código Florestal como dever dos
proprietários refere-se à reserva legal, definida no artigo 3°, III, como:
Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada
nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de
modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a
conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a
conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna
silvestre e da flora nativa (BRASIL, 2015).
Desta forma, cabe ao proprietário a observância do manejo sustentável da
propriedade rural, sendo responsável pela manutenção da vegetação nativa e pela
conservação da biodiversidade natural existente na área em que o imóvel se
encontra. Importante ressaltar que não existe previsão, no ordenamento jurídico
brasileiro, de reserva legal relacionada aos imóveis da área urbana.
33
Em relação ao proprietário urbano, a legislação brasileira é bastante escassa.
Não há grandes responsabilizações quanto ao uso dos imóveis urbanos, conforme
bem coloca Cherubini (2014), que ressalta alguns aspectos importantes: a produção
de resíduos sólidos e a possível poluição do solo através do mau uso de pátios ou
terrenos, por exemplo.
Na área urbana, a produção de resíduos sólidos chega a proporções
alarmantes. O descarte destes resíduos se dá em áreas específicas, denominadas
aterros sanitários, mas que, em virtude de suas características, podem provocar
grandes prejuízos ao meio ambiente nas áreas em que se encontram instalados.
Desta forma, há que se ressaltar a relevância e urgência de políticas públicas ou
legislações mais eficientes, no sentido de conscientizar a população (proprietários ou
locatários de imóveis) quanto à necessidade de diminuição na produção de vários
tipos de resíduos.
Está posto o desafio urgente: a sociedade deve agir na mudança radical de
seus processos produtivos e de seus padrões de consumo. É preciso mudar
os rumos do atual modelo de desenvolvimento e buscar um novo modelo
civilizatório capaz de alcançar a utopia da sustentabilidade (CORRÊA;
BACKES, 2006, p. 111).
O mau uso de pátios ou terrenos, por sua vez, implica em situações que
envolvem desde a disposição de materiais que possam contaminar o solo quanto à
inobservância de manutenção e limpeza em terrenos baldios, por exemplo. Sobre os
terrenos baldios, muitos municípios adotam um Código de Posturas, que depende
de uma fiscalização ativa e que, atualmente, demonstra-se deficitária em muitas
situações.
A função social da propriedade implica, inclusive, na aplicação de sanções
caso não seja essencialmente cumprida, conforme os dispositivos constantes na
CF/88, no § 4º do artigo 182. Dentre as situações, a Constituição Federal coloca a
possibilidade de desapropriação de imóvel urbano não edificado, subutilizado ou não
utilizado, mediante indenização através de títulos da dívida pública. Outra situação a
ser considerada é a possibilidade de usucapião urbano ou concessão de uso de
imóveis que não estejam de acordo com as exigências do Plano Diretor.
34
A propriedade rural também pode ser desapropriada caso esteja em
desacordo com os fins sociais, conforme dispõe o artigo 184 da CF/88. Percebe-se,
portanto, que o proprietário do imóvel, tanto urbano quanto rural, deve atentar para
este princípio da função social e, mais modernamente, função socioambiental da
propriedade, sob pena de sofrer sanções específicas quanto ao seu direito de posse
e propriedade, além de outras situações já mencionadas neste estudo, concernentes
à necessidade de preservação do meio ambiente e reparação de eventuais danos
causados.
Isto posto, concebe-se que:
Há de se estabelecer um equilíbrio de deveres para com os proprietários
urbanos, cobrando-se também destes mais deveres de proteção ao meio
ambiente. Do contrário, as limitações ao exercício de propriedade rural
podem funcionar como fatores estimulantes do êxodo rural, com migração
do pequeno agricultor para as áreas de vulnerabilidade na grande cidade.
Porque, a continuar o quadro de fiscalização e punição atual, o grande
produtor continuará explorando a propriedade rural, nem sempre com
observância das limitações ambientais, confiante na impunidade e mais
preocupado com o resultado da produção atual do que com a entrega do
patrimônio ambiental às futuras gerações (CHERUBINI, 2014).
É preciso, portanto, que se instaure certa igualdade e equidade entre os
deveres dos proprietários de imóveis urbanos e rurais. O cuidado com o meio
ambiente e a sua preservação, tendo em vista as gerações vindouras, deve ser
realizado por todos, individual e coletivamente, buscando-se a manutenção da
qualidade de vida e a garantia de um futuro sustentável.
2.2.3 Dever de fiscalização dos órgãos públicos
Considerando as questões envolvendo o dever de preservação do meio
ambiente, é preciso atentar para o fato de que, em muitas situações, este dever não
é observado, havendo a degradação ambiental. Neste sentido, é salutar colocar a
relevância da fiscalização por parte do Poder Público.
O dano ambiental afeta a coletividade, visto que o meio ambiente é de uso
comum do povo. Além disso, trata-se de um dano de difícil reparação (por isso a
importância da responsabilização civil pelo dano prejuízo causado). Ainda: é difícil
35
mensurar o dano ambiental e, por este motivo, torna-se tarefa praticamente
impossível calcular a totalidade deste tipo de dano (MILARÉ, 2011).
A Constituição Federal elencou, em seu artigo 23, as competências comuns
da União, dos Estados, do DF e dos Municípios em relação ao meio ambiente.
Art. 23. [...]
III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico,
artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os
sítios arqueológicos;
IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e
de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;
[...]
VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas
formas;
[...]
VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;
XI - registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de
pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios;
(BRASIL, 2015).
Para que estes deveres possam ser realizados de maneira plena, existe, no
Brasil, um sistema responsável pela gestão do meio ambiente: o SISNAMA (Sistema
Nacional de Meio Ambiente). De acordo com Sirvinskas (2005), este Sistema é
composto por sete níveis de órgãos, quais sejam:
a) Órgão superior: Conselho de Governo, com a finalidade de assessorar a
Presidência da República nas políticas públicas e diretrizes ambientais
nacionais;
b) Órgão consultivo, deliberativo e normativo: CONAMA (Conselho Nacional de
Meio Ambiente), com a finalidade de assessorar o Conselho de Governo;
c) Órgão central: Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de preservar,
conservar e fiscalizar o uso dos recursos naturais;
d) Órgão executor: IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis), com a finalidade de assessorar o Ministério do Meio
Ambiente;
e) Órgãos setoriais: constituídos pela Administração Pública, tais como
Ministérios;
f) Órgãos seccionais: constituídos pelas entidades estaduais, tais como
Conselhos e Departamentos Estaduais;
36
g) Órgãos locais: são as entidades municipais, como as Secretarias e
Coordenadorias municipais.
Conforme pode ser percebido, as instâncias de fiscalização se realizam, em
sua maioria, pelos órgãos locais, ou seja, os mais próximos dos cidadãos. Quando
verificadas irregularidades, o órgão local pode solicitar auxílio ou encaminhar
diligências aos órgãos de níveis superiores, conforme a complexidade da situação.
Cada um desses órgãos possui o poder de polícia ambiental (SIRVINSKAS, 2005).
O poder de polícia administrativa ambiental é exercido mais comumente por
meio de ações fiscalizadoras, uma vez que a tutela administrativa do
ambiente contempla medidas corretivas e inspectivas, entre outras.
Malgrado isso, dentre os atos de polícia em meio ambiente, o licenciamento
ocupa lugar de relevo, uma vez que as licenças são requeridas como
condicionantes para a prática de atos que, não observadas as respectivas
cláusulas, podem gerar ilícitos ou efeitos imputáveis (MILARÉ, 2011, p.
1133).
Neste sentido, coloca-se, ainda, que:
No artigo 23, a CF faz uma lista de atividades que devem merecer a
atenção do Poder Público. O modo como cada entidade vai efetivamente
atuar em cada matéria dependerá da organização administrativa de cada
órgão público federal, estadual e municipal (MACHADO, 2005, p. 107).
Os deveres dos órgãos públicos, em relação ao meio ambiente, encontram-se
elencados no artigo 225 da CF/88. Dentre esses deveres, alguns estão relacionados
ao poder de fiscalização e de proibir atividades que sejam consideradas nocivas ao
meio ambiente, como bem coloca os incisos IV e V, além do § 3º do referido artigo.
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de
vida e o meio ambiente;
[...]
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados (BRASIL, 2015).
Existe, portanto, a responsabilidade de coibir práticas nocivas e, ao mesmo
tempo, de fiscalizar e aplicar as penalidades necessárias e cabíveis de acordo com
37
as competências de cada órgão. Neste sentido, existem algumas dificuldades
enfrentadas pelo Poder Público, pois:
O Brasil, apesar de possuir uma das melhores legislações ambientais do
mundo, não conta com um corpo técnico e uma equipe especializada
suficientes para a inspeção, prevenção e punição aos crimes ambientais.
Cabe ao Estado brasileiro dar as condições necessárias para que este
trabalho aconteça de forma eficiente (FONSECA E BRAGA, 2010, p 42).
Sem um efetivo técnico suficiente para a realização de ações fiscalizatórias,
torna-se cada vez mais difícil coibir ações que possam resultar em prejuízo ao meio
ambiente. Apesar de a legislação prever uma série de sanções, estas muitas vezes
não são aplicadas porque sequer os problemas são identificados, por falta de uma
fiscalização constante e eficiente.
Em muitos casos, o próprio Estado é o causador do dano ambiental. Nestas
situações, fala-se em responsabilidade objetiva, conforme o disposto no art. 37 § 6º
da CF/88 e no art. 3º, IV, da Política Nacional do Meio Ambiente.
A preservação ambiental é tão relevante, do ponto de visto do Poder Público
que, em 2011, a Lei Complementar nº 140 passou a regular ações administrativas
conjuntas entre os diversos órgãos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios,
objetivando promover a cooperação em prol da “proteção das paisagens naturais
notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas
formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora” (BRASIL, 2015), em seu
artigo 1º, caput.
São
previstos
consórcios,
convênios,
fundos
públicos,
entre
outros
instrumentos para a efetivação da proteção ambiental. A Lei prevê, ainda, ações
administrativas para a União, Estados, DF e Municípios, buscando garantir o
desenvolvimento
sustentável,
harmonizar
e
integrar
todas
as
políticas
governamentais.
Reitera-se, entretanto, o já colocado anteriormente.
A gestão dos recursos naturais no Brasil é uma das mais ineficientes do
planeta. A quantidade e gravidade dos crimes ambientais no Brasil tem
chamado a atenção dos organismos oficiais das nações unidas e opinião
38
pública mundial. A fiscalização e punição aos crimes ambientais no Brasil
são praticamente nulas (FONSECA; BRAGA, 2010, p. 50).
O que se pode perceber é que o dever de fiscalização do Poder Público em
relação ao meio ambiente existe e é significativamente embasado em legislações
específicas. Porém, na prática, esta fiscalização deixa a desejar, por uma série de
motivos, de ordem política, financeira, administrativa etc. Há que se rever estas
questões urgentemente, com vistas a garantir a sustentabilidade para as próximas
gerações, como bem coloca Corrêa e Backes (2006, p. 83).
A humanidade, nos umbrais do terceiro milênio, convive com a ameaça do
real comprometimento de todas as formas de vida na Terra. O domínio e a
destruição a que o homem submeteu o meio ambiente, mediante um
modelo de desenvolvimento fundado no pensamento racional moderno,
estão apontando para a insustentabilidade planetária.
A degradação ambiental não pode ser tema apenas de debates e produções
de dispositivos legais que, na prática, não são aplicados ou são aplicados
precariamente. É preciso investir na fiscalização e, sobretudo, na conscientização
individual e coletiva, principalmente no tocante aos proprietários de imóveis, que
devem atentar para os prejuízos que a sua propriedade pode causar ao meio
ambiente, buscando utilizá-la do melhor modo possível.
Por todo o exposto até aqui, podemos concluir que, em atenção à pluralidade
de princípios consagrados pelo direito e pela Constituição do Federal, haverá
momentos em que teremos choque de princípios, tais como a dupla função em
estabelecer o Direito de Propriedade individual e a atuação do Poder Público na
proteção ambiental desta propriedade. Árduos serão os desafios que ainda serão
enfrentados pelos operadores jurídicos do Direito Ambiental. Assim, deverá o poder
judiciário se socorrer dos princípios jurídicos do Direito ambiental para o dever de
garantir os direitos fundamentais individuais, mas sem descuidar do direito humano
fundamental ao meio ambiente, ao passo de que para fazer-se cumprir os princípios
do Direito ambiental é necessário pulso firme e legislação eficiente de
responsabilização daquele que descumpri-la. E é esta forma de responsabilização
que será o objeto do próximo capítulo.
39
3. A TRÍPLICE RESPONSABILIDADE DO DIREITO AMBIENTAL
O meio ambiente equilibrado e protegido é essencial para a sadia qualidade
de vida dos seres que habitam a terra, assim sendo, é vital que este meio seja
resguardado daqueles que porventura não acreditam na importância deste equilíbrio
ou, ainda, não entendem sua necessidade. Neste passo, para dar efetividade a esta
proteção, o poder público tem de adotar medidas necessárias, na esfera civil, penal
e administrativa, a fim de repelir e salvaguardar a biota ambiental de qualquer ação
que possa gerar degradação ambiental.
Assim sendo, em um primeiro momento abordamos à responsabilidade civil,
para em seguida tratar da responsabilidade administrativa e, por fim, estudar a
responsabilidade penal.
3.1 O conceito de dano ambiental
Inicialmente, é necessário fazer a distinção entre dano e ato ilícito. O ato ilícito
é meramente o ato de não observância da norma penal, ou seja, o agente causa um
ato que confronta o disposto nas normas ambientais. Não é necessário que o ato
ilícito cause danos ambientais, pois os danos podem inclusive ocorrer futuramente,
ou seja, muito tempo depois que ocorreu o ato ilícito. Exemplo clássico é o artigo 60
da Lei n° 9.605/98.
Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em
qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços
potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos
ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e
regulamentares pertinentes (BRASIL, 2016).
Veja que neste artigo a conduta delituosa não está na poluição, mas na falta
de autorização ou na não observância de normas legais regulamentadoras, ou seja,
a responsabilidade é gerada a partir de um ato ilícito, mas não propriamente de um
evento danoso. O que não significa dizer que o dano não ocorreu ou que não
ocorrerá futuramente.
40
Já o dano é a consequência advinda daquele ato ilícito praticado. Não há
nenhuma Lei que conceitue dano ambiental no ordenamento jurídico brasileiro,
entretanto o artigo 3º, II e III, “a” a “e”, da Lei n° 6.938/81, tenta definir este dano na
forma de degradação ambiental.
Art. 3º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
[...]
II - degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das
características do meio ambiente;
III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades
que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais
estabelecidos.
(BRASIL, 2016).
Portanto, o dano ambiental não possui definição legal. Porém, doutrinadores
como José Rubens Morato Leite, entendem que o dano pode ser conceituado como:
[...] o prejuízo causado a um bem juridicamente tutelado, e a sua extensão é
considerada para fins de reparação. Pode ter natureza individual ou coletiva,
econômica ou não econômica. Atinge valor inerente a pessoa humana ou coisa
juridicamente tutelada. Resulta de ato ou fato contrario ao ordenamento jurídico,
mas também pode ocorrer de ato ou fato praticado em conformidade coma Lei
(MORATO LEITE, 2011, p. 64).
Assim, torna-se necessário a verificação da ocorrência ou não do dano
ambiental, para que possamos classificar a tutela ambiental de forma correta. Nesse
sentido, temos duas categorias de tutela ambiental sobre o dano ocorrido: a inibitória
latu sensu, aplicável quando não há a verificação do dano ambiental, mas tão
somente do ato ilícito, e a reparatória, que é aplicável quando já ocorreu o dano
ambiental.
A tutela inibitória está abrangida pelos princípios ambientais da prevenção e
da precaução e sua finalidade é impedir o aparecimento do dano, seja impedindo
que a conduta lesiva se inicie ou cessando uma conduta lesiva que já está em curso.
A tutela reparatória, por sua vez, visa a reparação de um dano já ocorrido e tem
como base o princípio do poluidor-pagador, visando fazer com que o causador
41
devolva o status quo ao meio ambiente afetado. No caso de não ser possível
restaurar o ambiente original, a tutela reparatória pode prever multa pecuniária, além
de compensação ambiental em local diverso.
Importante mencionar que o Supremo Tribunal de Justiça já decidiu, em um
de seus julgados, a cerca da imprescritibilidade da reparação ambiental, ou seja, a
reparação ambiental não é passível de prazo prescricional, ela deve ser comprovada
nos autos e se perdurará até que se verifique a reparação.
3.2 A tutela civil ambiental
A responsabilidade civil ambiental está fundamentada no artigo 225, § 3º da
Constituição Federal.
Art. 225. [...]
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados (BRASIL, 2016).
Contudo, antes de falarmos na responsabilidade civil ambiental cabe verificar
que esta está prevista em nosso Código Civil nos artigos 186 e 927.
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito (BRASIL, 2016).
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente
de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade
normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para os direitos de outrem (BRASIL, 2016).
A responsabilidade civil é o dever que o causador do dano, seja ele direto ou
indireto tem de reparar o dano causado a outrem, este dano pode ser subjetivo ou
objetivo, no caso do dano subjetivo o agente causador agiu com culpa, ou seja,
negligência imprudência ou imperícia, sem o dolo, ao passo que a vontade direta de
42
causar o dano está expressa no caput do artigo 927, combinado com os artigos 186
e 187 do Código Civil.
Já para a teoria objetiva o agente causador do dano deve repará-lo,
independentemente de ter agido com culpa ou com dolo, conforme está expresso no
parágrafo único do artigo 927, retro mencionado.
Assim, analisando a teoria objetiva, temos duas correntes desta teoria, a
teoria objetiva do risco administrativo, quando o agente responde independente de
dolo ou de culpa. Nesta teoria devemos levar em consideração às excludentes de
ilicitude, tais como a culpa exclusiva da vítima, a força maior, o caso fortuito, pois
estas excluem a responsabilização do agente causador do dano. A outra teoria da
responsabilidade objetiva, e é esta que interessa ao direito ambiental, é a teoria do
risco integral, a qual não admite qualquer excludente de ilicitude, daí o termo
“integral”.
Esta teoria parte da premissa de que o agente não poderá, em hipótese
alguma, se eximir de seu dever de reparar e está fundamentada no artigo 225, § 3º
da Constituição Federal. Pressuposto para esta teoria nada mais é do que a
socialização do lucro, ou seja, aquele que causou dano ao meio ambiente
objetivando o lucro deve ser responsabilizado integralmente, tanto pelo risco como
pela desvantagem dela resultante, mesmo que em nada concorreu para o evento
danoso.
Por exemplo: um sujeito possui uma área de terra com a devida reserva legal,
entretanto, devido ao longo período de seca, parte da reserva legal pega fogo e
queima, nesse caso o proprietário tem o dever de reparar a parte que foi perdida, eis
que teoria integral, como já dito, leva em consideração o risco de acontecer. Isso
ocorre porque o cuidado preventivo do patrimônio ambiental é um dever do
proprietário, ou seja, apesar de ser uma atividade lícita, o proprietário a explora
economicamente, portanto deve arcar também com os possíveis riscos e
consequências danosas de sua atividade.
43
Mas, desde 1981, em nosso direito ambiental vige a responsabilidade civil
objetiva, prevista no artigo 14, da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, Lei n°
6.938/1981.
Art. 14. Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal,
estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à
preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela
degradação da qualidade ambiental.
§ 1º. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o
poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar
ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por
sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade
para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados
ao meio ambiente (BRASIL, 2016).
Porém, cumpre mencionar que quando se tratar de responsabilidade
ambiental de pessoa jurídica de direito público, na hipótese de omissão do poder de
polícia, a responsabilidade ambiental do Estado será subjetiva e não objetiva.
Entretanto, como não há base legal para tal teoria, ela está baseada nos julgados do
Superior Tribunal de Justiça (STJ).
3.2.1 A solidariedade no dano ambiental
A solidariedade dos indivíduos no caso de danos ambientais está prevista no
artigo 942 do Código Civil.
Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de
outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver
mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação
(BRASIL, 2016).
Dessa forma, mesmo que vários agentes tenham concorrido para causar o
dano ambiental, na esfera cível, pode-se atribuir a responsabilidade a todos ou
apenas à um deles individualmente, fazendo com que apenas um cumpra com o
dever de reparar, o que não impede que este que reparou, posteriormente se volte
contra os demais. Diferentemente é na esfera penal onde só pode ser
responsabilizado aquele que for apurado como autor ou coautor do dano ao meio
ambiente.
44
Neste sentido é o posicionamento de Tribunal de Justiça de Rio Grande do
Sul.
APELAÇÃO CÍVEL. MEIO AMBIENTE. TERRA ARRENDADA.
RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO PELO DANO AMBIENTAL
CAUSADO. SOLIDARIEDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. A
responsabilidade pelo cometimento de dano ambiental é objetiva independe de culpa - e solidária - podendo o órgão do Ministério Público
demandar contra um ou outro ou contra todos. A mera titularidade das terras
onde se concretizou o dano remete à responsabilização do proprietário.
RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70066206210, Primeira
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego
Canibal, Julgado em 09/03/2016) (RIO GRANDE DO SUL, 2016, a).
APELAÇÃO CÍVEL. MEIO AMBIENTE. QUEIMADA. SOLIDARIEDADE.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA. A responsabilidade pelo cometimento
de dano ambiental é objetiva - independe de culpa - e solidária - podendo o
órgão do Ministério Público demandar contra um ou outro ou contra todos.
Caso concreto em que o réu é filho do proprietário e admite ser o
responsável pela área, face á idade avançada de seu pai.. RECURSO
DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70066500729, Primeira Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado
em 09/03/2016) (RIO GRANDE DO SUL, 2016, b).
Dessa forma concluímos que a solidariedade no direito ambiental incidirá
sobre todos aqueles que de uma forma ou de outra concorreram para a degradação
ambiental, sempre levando em conta o nexo de causalidade entre a conduta e o
dano. Assim, uma vez caracterizada a solidariedade entre os poluidores, cada um é
obrigado pelo todo. Outrossim, na mesma linha de raciocínio, o titular do direito de
ação poderá demandar em face de um agente ou de todos conjuntamente, ou ainda,
daquele que tiver a melhor condição econômica de suportar a reparação do dano.
3.2.2 O objetivo da reparação ambiental na esfera civil e o bem jurídico
tutelado
O bem juridicamente protegido é a natureza em todas as suas formas, ou
seja, em toda a amplitude do que se constitua por natureza, fauna, flora, oceanos,
micro-organismos. Em suma todas as formas de vida e até mesmo o ambiente
cultural, artificial, ou físico de cada região pode ser considerado bem tutelado pelo
direito ambiental. Nesse sentido, temos que o bem tutelado do meio ambiente está
definido no artigo 3º da Lei n° 6.938/1981.
45
Art. 3º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de
ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em
todas as suas formas (BRASIL, 2016).
Outrossim, acerca do objetivo da reparação do dano ambiental, esta se impõe
a medida que dependemos dela para nossa sobrevivência. A reparação pode se dar
de duas formas, a reparação preventiva, onde normas de conduta, bem como
campanhas de conscientização são observadas, a fim de evitar que o dano
ambiental ocorra, e a reparação específica, que ocorre após o acontecimento do
dano ambiental. Esta reparação específica visa recuperar o ambiente natural
degradado até que ele retorne ao “status quo” anterior ao evento danoso.
Nesse sentido, Milaré (2001, p. 337), nos diz que:
Como o objetivo maior é dar efetividade à garantia ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado (Caput do artigo 225 da Carta Magna), sempre
que for possível, deve-se imputar ao poluidor a obrigação de reconstruir o
meio ambiente agredido.
De outra forma, caso essa reparação não seja possível, nada obsta em fazer
com que o agressor do meio ambiente utilize-se de outros meios para compensar o
dano ambiental. Essa compensação pode ser a construção de um espaço de estudo
destinado a preservação, a recuperação de área diversa daquela que foi degradada,
sendo que estes meios de compensação podem ser cumulados com pena
pecuniária pelo dano causado.
3.2.3 O termo de ajustamento de conduta como forma de composição civil dos
danos ambientais
O termo de ajustamento de conduta (TAC) é um importante, senão o mais
utilizado, meio de reparação ambiental. Ganhou previsão legal com a Lei n°
7.347/1985. Trata-se de um acordo extrajudicial entre as partes (poluidor e órgão
público), onde estas estabelecem a forma como se dará a reparação, os meios que
serão utilizados, um acompanhamento de profissional para a área, bem como o
tempo limite para sua implantação.
46
Com efeito, com a utilização do TAC, abre-se mais uma oportunidade para
que o infrator possa dar objetividade ao objetivo primordial de restauração
do ambiente ao seu estado original em detrimento da aplicação de sanções,
as quais podem deixar de serem aplicadas quando o termo é devidamente
cumprido (DEON SETTE, 2010, p. 134).
Dessa forma, os termos do contrato devem ser rigorosamente cumpridos pelo
causador do dano, eis que enquanto não cumprido o termo o infrator poderá ser
responsabilizado pelo não cumprimento deste, pois, conforme entendimento do
Supremo Tribunal Federal (STF) o dano ambiental é imprescritível.
3.3 A tutela administrativa ambiental
A tutela administrativa do direito ambiental encontra respaldo no artigo 225, §
3º, da CF/88.
Art. 225. [...]
§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados (BRASIL, 2016).
Antes do advento da Constituição federal de 1988, a Lei n° 6.938/81, em seu
artigo 9º, IX, já estabelecia algumas penalidades compensatórias para o caso de
danos gerados ao meio ambiente. Durante muito tempo essas sanções foram
previstas em legislações esparsas, que traziam em seu bojo as penalidades
administrativas a serem impostas no caso de descumprimento de seus comandos.
A própria Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, em seu artigo 14, I a IV
e parágrafos, já disciplinava sanções administrativas no caso de descumprimento de
medidas necessárias a preservação do meio ambiente.
Entretanto, houve um grande avanço na forma de responsabilização do
agente causador do dano ambiental, com a criação da Lei dos Crimes Ambientais,
Lei n° 9.605/98. Pois ela unificou as sanções administrativas por conduta infracional
ao meio ambiente com as penalizações. Tendo dedicado um capítulo inteiro
somente para as sanções administrativas, como por exemplo, a forma de apuração e
47
de condução do processo administrativo, além de outras formas de sanções em seu
artigo 72.
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes
sanções, observado o disposto no art. 6º:
I - advertência;
II - multa simples;
III - multa diária;
IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora,
instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza
utilizados na infração;
V - destruição ou inutilização do produto;
VI - suspensão de venda e fabricação do produto;
VII - embargo de obra ou atividade;
VIII - demolição de obra;
IX - suspensão parcial ou total de atividades;
XI - restritiva de direitos.
§ 1º. Se o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais infrações, serlhe-ão aplicadas, cumulativamente, as sanções a elas cominadas.
§ 2º. A advertência será aplicada pela inobservância das disposições desta
Lei e da legislação em vigor, ou de preceitos regulamentares, sem prejuízo
das demais sanções previstas neste artigo.
§ 3º. A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência
ou dolo:
I - advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de sanálas, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela
Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha;
II - opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da
Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha.
§ 4°. A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação,
melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
§ 5º. A multa diária será aplicada sempre que o cometimento da infração se
prolongar no tempo.
§ 6º. A apreensão e destruição referidas nos incisos IV e V do caput
obedecerão ao disposto no art. 25 desta Lei.
§ 7º. As sanções indicadas nos incisos VI a IX do caput serão aplicadas
quando o produto, a obra, a atividade ou o estabelecimento não estiverem
obedecendo às prescrições legais ou regulamentares.
§ 8º. As sanções restritivas de direito são:
I - suspensão de registro, licença ou autorização;
II - cancelamento de registro, licença ou autorização;
III - perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais;
IV - perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento em
estabelecimentos oficiais de crédito;
V - proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de até
três anos. (BRASIL, 2016).
48
A criação da Lei dos Crimes Ambientais trouxe um enorme avanço para a
legislação ambiental. Entretanto, não podemos dizer o mesmo do Decreto
6.514/2008, que revogou as normas até então vigentes e particularizou a tutela
administrativa ambiental. Assim, através deste decreto o presidente da república,
transformou em meras sanções administrativas os tipos penais criados pela Lei dos
Crimes Ambientais.
3.3.2 O poder de polícia
O poder de polícia, como é chamado pela doutrina, é a faculdade que a
administração pública tem de proceder de ofício sobre a fiscalização e aplicação de
sanções a todos os atos que violem o interesse público ou coletivo. Este diploma
encontra amparo no artigo 78 do Código Tributário Nacional.
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública
que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a
prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público
concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da
produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas
dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à
tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais
ou coletivos.
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia
quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável,
com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei
tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder (BRASIL, 2016).
A aplicação do poder de polícia no direito administrativo ambiental ocorre em
razão da necessidade de fiscalização e de controle de atividades que causem
impactos ambientais, como por exemplo, a delimitação das áreas de reserva legal,
ou seja, a limitação do exercício de exploração de determinadas áreas se dá com o
objetivo de preservar, mesmo que minimamente, o ambiente natural de cada local.
O poder de polícia como é ato administrativo, está sujeito à requisitos para
sua correta eficácia, quais sejam: a competência do agente, a finalidade (interesse
público), forma, motivo e objeto. Cumpre lembrar, que o poder de polícia possui
certos limites, sob pena de se configurar o abuso de poder. Portanto, é sempre
necessário dosar o binômio Interesse Público e Interesse Individual, não sendo
49
correto extrapolar os limites do interesse público, passando por cima do interesse
individual e do direito de propriedade. Nesse sentido, não se pode descuidar do
devido processo legal, que é expressamente aplicável aos processos administrativos
em geral.
3.3.3 O processo administrativo ambiental
O processo administrativo ambiental constitui-se em uma série de atos com o
intuito de obter a regularidade do processo administrativo principal. Durante este
processo todos os atos adotados devem observar os princípios constitucionais da
legalidade, do contraditório e da ampla defesa, além de observar os requisitos
atinentes ao processo administrativo.
Estando previsto no artigo 70 da Lei n° 9.605/98, conforme já mencionado,
em decorrência do poder de fiscalização do ente público, o processo administrativo
se inicia com a lavratura do auto de infração ambiental e, conforme o artigo 71, I e II,
da Lei dos Crimes Ambientais, aquele que for autuado tem prazo de 20 dias para
oferecer defesa.
Art. 71. O processo administrativo para apuração de infração ambiental
deve observar os seguintes prazos máximos:
I - vinte dias para o infrator oferecer defesa ou impugnação contra o auto de
infração, contados da data da ciência da autuação;
II - trinta dias para a autoridade competente julgar o auto de infração,
contados da data da sua lavratura, apresentada ou não a defesa ou
impugnação. (BRASIL, 2016).
Entretanto, não se tratam de prazos peremptórios, pois a legislação ambiental
não adota o formalismo exacerbado, mas sim o moderado, que estabelece os meios
suficientes para o infrator oferecer defesa. Ademais, muitas vezes a defesa requer
pericias de profissionais habilitados, o que dificulta o correto cumprimento dos
prazos. Assim, apesar da necessidade do cumprimento destes prazos, nada obsta
que estes sejam dilatados a fim de buscar a verdade real dos f atos e, dessa forma,
respeitar o princípio da ampla defesa.
50
3.3.4 A prescrição das infrações administrativas ambientais
A prescrição é a perda da capacidade da pretensão punitiva, decorrente da
inércia do titular do direito violado em relação a sua pretensão. No caso das
infrações administrativas ambientais, o Decreto n° 6.514/08, em seus artigos 21 e 22
esclarece que se dará em cinco anos a prescrição da ação da administração para
realizar a apuração do dano ambiental. Se a infração for permanente o prazo
começa a contar a partir da data em que foi cessada a atividade danosa.
Art. 21. Prescreve em cinco anos a ação da administração objetivando
apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, contada da data da
prática do ato, ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia
em que esta tiver cessado.
§ 1°. Considera-se iniciada a ação de apuração de infração ambiental pela
administração com a lavratura do auto de infração.
§ 2°. Incide a prescrição no procedimento de apuração do auto de infração
paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho,
cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte
interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional
decorrente da paralisação e da reparação dos danos ambientais.
§ 3°. Quando o fato objeto da infração também constituir crime, a prescrição
de que trata o caput reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.
§ 4°. A prescrição da pretensão punitiva da administração não elide a
obrigação de reparar o dano ambiental. (BRASIL, 2016).
Art. 22. Interrompe-se a prescrição:
I - pelo recebimento do auto de infração ou pela cientificação do infrator por
qualquer outro meio, inclusive por edital;
II - por qualquer ato inequívoco da administração que importe apuração do
fato;
III - pela decisão condenatória recorrível. (BRASIL, 2016).
Assim, depois de decorrido o prazo de cinco anos, contados a partir da data
em que houve a apuração da infração ou da aplicação da multa, sem haja qualquer
meio que suspenda ou interrompa o prazo prescricional, opera-se o instituto da
prescrição da pretensão executória.
Por derradeiro, cumpre lembrar que, caso haja necessidade de reparação de
dano ambiental pelo agente causador do dano, esta obrigação deve ser tutelada
pelo ente da administração pública, eis que este poderá ajuizar ação civil pública
para sua reparação, independente da ocorrência da prescrição, tendo em vista que
51
conforme já decidido pelo Supremo Tribunal Federal, a reparação do dano ambiental
é imprescritível.
3.4 A tutela penal ambiental
A responsabilidade criminal ambiental, também aludida na CF/88, no artigo
225, § 3º, hoje está devidamente disciplinada através da Lei dos Crimes Ambientais,
Lei n° 9.605/98.
Anteriormente à Lei dos Crimes Ambientais, a proteção do meio ambiente era
sistematizada por Leis esparsas e pouco eficientes, tais como: Lei n° 4.771/65
(Código Florestal Brasileiro); Lei n° 5.197/67 (Código de Caça); Lei n° 6.453/77
(Danos Nucleares); Lei n° 6.766/79 (Parcelamento do Solo Urbano); Lei n° 7.802/89
(Lei do Uso Indevido de Agrotóxicos); Lei n° 7.804/89 (que alterou o artigo 15 da Lei
da Política Nacional do Meio Ambiente: poluição sob qualquer forma). Dentre outras
Leis que faziam a proteção do meio ambiente de forma pouco eficiente e com baixo
grau de punição.
Com a entrada em vigor da Lei Dos Crimes Ambientais, muitos dispositivos
legais destas leis foram revogados e inúmeras discussões vieram à tona. Como nos
diz Dantas (Saraiva 2011, p 81).
Sobre a Lei dos Crimes Ambientais em si, a doutrina tem tecido as
seguintes considerações: a) tem um caráter altamente criminalizador; b)
contém inúmeros conceitos vagos e genéricos, com um excesso de normas
penais em branco; c) possui inúmeras imperfeições técnicas; e d) teve o
mérito de sistematizar as condutas lesivas ao meio ambiente sob a ótica
penal, assim como as infrações administrativas ambientais.
Entretanto, apesar dessa divisão doutrinária entre os que defendem a Lei dos
Crimes Ambientais e aqueles que não a aprovam, o fato é que esta foi um enorme
passo dado em busca de salvaguardar o direito ambiental brasileiro. Trata-se de
uma Lei com capítulos destinados a tutelar as mais diversas situações, tais como a
fauna, a flora e biomas específicos, assim como combinar penas com multas e
obrigações. Também destinou um capítulo às infrações e ao processo administrativo
ambiental.
52
3.4.1 A responsabilização da pessoa jurídica
A Constituição Federal no seu artigo 225, § 3º, concretizou a possibilidade da
imposição das sanções penais à pessoa jurídica. Um notável avanço a nível
mundial, visto ser um dos primeiros ordenamentos jurídicos a contemplar a
responsabilização da pessoa jurídica no caso de danos ao meio ambiente.
Art. 225, § 3º. As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa,
civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a
infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual,
ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade
(BRASIL, 2016).
A pessoa jurídica infratora, uma empresa que viola um direito ambiental, não
pode ter sua liberdade restringida da mesma forma que uma pessoa comum, mas é
sujeita a penalizações. Neste caso, aplicam-se as penas de multa e/ou restritivas de
direitos, que são: a suspensão parcial ou total das atividades; a interdição
temporária de estabelecimento, obra ou atividade; a proibição de contratar com o
Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações. Também é
possível a prestação de serviços à comunidade através de custeio de programas e
de projetos ambientais; a execução de obras de recuperação de áreas degradadas;
e contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.
Importante ressaltar que, para que a pessoa jurídica seja responsabilizada, é
preciso que a pessoa física que atue em seu nome seja identificada, pois sem essa
identificação não haverá responsabilização, mas sim inépcia da inicial acusatória,
conforme entendimento atual dos tribunais superiores.
3.4.2 Lei dos crimes ambientais
De acordo com a Lei n° 9.605/98, os crimes ambientais são classificados em
cinco tipos diferentes:
a) Os crimes contra a fauna (art. 29 a 37): são as agressões cometidas contra
os animais silvestres, nativos ou em rota migratória, como a caça, a pesca, o
transporte e a comercialização sem autorização; os maus-tratos; a realização de
53
experiências dolorosas ou cruéis, as agressões aos habitats naturais dos animais, a
introdução de espécimes animal estrangeiras no país sem a devida autorização,
assim como a morte de espécimes devido à poluição.
b) Os crimes contra a flora (art. 38 a 53): são os crimes que causam
destruição ou dano a vegetação de áreas de preservação permanente, em qualquer
estágio, ou a unidades de conservação; que provocam incêndio em mata ou floresta;
fabricar, vender, transportar ou soltar balões que possam provocá-lo em qualquer
área; a extração, corte, aquisição, venda, exposição para fins comerciais de
madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal sem a devida
autorização ou em desacordo com esta; extrair de florestas de domínio público ou de
preservação permanente pedra, areia, cal ou qualquer espécie de mineral; impedir
ou dificultar a regeneração natural de qualquer forma de vegetação; destruir,
danificar, lesar ou maltratar plantas de ornamentação de logradouros públicos ou em
propriedade privada alheia; comercializar ou utilizar motosserras sem a devida
autorização.
c) A poluição e outros crimes ambientais (art. 54 a 61): todas as atividades
humanas produzem poluentes (lixo, resíduos e afins), no entanto, apenas será
considerado crime ambiental passível de penalização a poluição acima dos limites
estabelecidos por lei. Além desta, também é criminosa a poluição que provoque ou
possa provocar danos à saúde humana, mortandade de animais e destruição
significativa da flora. Assim como, aquela que torne locais impróprios para uso ou
ocupação humana, a poluição hídrica que torne necessária a interrupção do
abastecimento público e a não adoção de medidas preventivas em caso de risco de
dano ambiental grave ou irreversível.
d) Os crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural (art. 62 a
65): ambiente é um conceito amplo, que não se limita aos elementos naturais (solo,
ar, água, flora, fauna). O meio ambiente é a interação destes, com elementos
artificiais, aqueles formados pelo espaço urbano construído e alterado pelo homem,
bem como culturais. Desta forma, a violação da ordem urbana e/ou da cultura
também configura um crime ambiental.
54
e) Os crimes contra a Administração Ambiental (art. 66 a 69): são as condutas
que dificultam ou impedem que o Poder Público exerça a sua função fiscalizadora e
protetora do meio ambiente, seja praticada por particulares que impedem ou
dificultam a fiscalização, ou ainda, por funcionários do próprio Poder Público que faz
afirmação falsa ou enganosa ao omitir a verdade, sonegar informações ou dados
técnico-científicos em procedimentos de autorização ou de licenciamento ambiental.
Ou ainda, aquele que concede licença, autorização ou permissão em desacordo
com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja realização
depende de ato autorizativo do Poder Público, aquelas obras de que trata o artigo 60
desta Lei.
Também são passíveis de infrações administrativas quaisquer ações ou
omissões que violem a proteção e recuperação do meio ambiente. A Lei de Crimes
Ambientais disciplinou as infrações administrativas em seus artigos 70 a 76, e foi
regulamentada pelo Decreto n° 6.514/08.
O Poder Público, no exercício do poder fiscalizador e através de seus
profissionais competentes para a área, ao lavrar o auto de infração e de apreensão,
indicará a multa prevista para a conduta, bem como, se for o caso, as demais
sanções estabelecidas no decreto, pela análise da gravidade dos fatos, dos
antecedentes e da situação econômica do infrator. A aplicação de sanções
administrativas não impede a penalização por crimes ambientais, se também forem
aplicáveis ao caso.
Qualquer pessoa, ao tomar conhecimento de alguma infração ambiental,
poderá apresentar representação às autoridades competentes. A autoridade
ambiental não tem escolha: uma vez ciente, deverá promover imediatamente a
apuração da infração ambiental, sob pena de corresponsabilidade.
3.4.3 A ação penal
Segundo o artigo 26 da Lei n° 9.605/98 a ação penal é pública e
incondicionada a representação.
55
Observando as sanções penais cominadas na referida Lei, percebe-se que a
maioria das condutas danosas tem pena máxima cominada não superior a dois
anos, o que faz que a maioria das ações danosas sejam submetidas ao benefício da
transação penal, prevista no artigo 61 da Lei n° 9.099/95. Através da transação
penal é possível impor ao transgressor a possibilidade da recomposição da área
degradada sem a aplicação imediata de pena, eis que pelos princípios do direito
ambiental brasileiro a reparação é a medida que se busca.
Outras infrações submetem-se à possibilidade da suspensão condicional do
processo, sendo que através desta também é possível buscar a reparação e o
retorno ao “status quo” da área degradada.
A extinção da punibilidade nos casos de crimes ambientais, somente se dará
com laudo de profissional habilitado atestando a reparação integral do bem afetado
ou a impossibilidade de fazê-lo, tendo em vista a imprescritibilidade da reparação
ambiental, conforme entendimento das cortes superiores. Caso não haja a
reparação o prazo da suspensão condicional do processo poderá ser prorrogado por
até mais quatro anos, acrescidos de mais um ano pela suspensão do prazo
prescricional, nos termos do artigo 28, incisos II e III, da Lei n° 9.605/98 no qual não
serão paliçadas as condições dos incisos II a IV do artigo 89 da Lei n° 9.099/95.
Caso não haja a reparação do dano neste período o inciso IV, do artigo 28 da
Lei n° 9.605/98 diz que poderá ser o prazo prorrogado por mais cinco anos, nos
mesmos moldes da prorrogação anterior. Esgotado este último prazo a extinção da
punibilidade somente ocorrerá após a elaboração de um laudo técnico atestando a
recuperação ou a impossibilidade de fazê-lo, desde que as razões pelo não
cumprimento sejam alheias à vontade do causador do dano.
Por conseguinte, conclui-se que a responsabilidade penal do meio ambiente
será apurada e o infrator, seja pessoa física ou jurídica, responderá, mesmo que já
houver reparado o dano na esfera civil ou efetuado o pagamento de multa na esfera
administrativa, tendo em vista que as responsabilidades pelos danos causados são
independentes, tanto que os próprios tipos penais da Lei n° 9.605/98 preveem a
cumulação da pena com multa ou com a obrigação de reparar o dano.
56
CONCLUSÃO
Este estudo permitiu concluir uma série de fases do direito ambiental e
momentos do direito ambiental, sendo que partir do século XIX e XX, a corrida
humana em busca do acúmulo de bens se tornou uma constante na sociedade
liberal-individualista que se moldou na época. Alavancada pela revolução industrial a
exploração de recursos naturais chegou ao seu pico, sem qualquer política pública
de remanejamento ou compensação, apenas se tirava e esgotava, sem pensar, a luz
do “progresso”.
Apenas a partir dos anos 70 é que se começa a verificar e pensar acerca do
esgotamento dos recursos naturais, que não se renovam na mesma proporção em
que são explorados. Entretanto, apesar da ainda fraca conscientização ambiental, a
preservação do planeta começa a ser alvo de debates mundiais. O marco
internacional que alavancou o direito ambiental foi sem dúvida a Conferência de
Estocolmo, de 1972. A partir daí é que o meio ambiente passou a ser visto como um
bem coletivo de interesse difuso e essencial à qualidade de vida. Foi a partir desta
Conferência que o direito ambiental começou a fazer parte das constituições e dos
ordenamentos jurídicos do mundo globalizado.
Não obstante a isso, mesmo com o desafio de tutelar o meio ambiente
através de políticas públicas pouco eficientes que, na maioria das vezes, deixam
sem punição o agente poluidor, é necessário mais do que interesses políticos para a
busca do meio ambiente equilibrado. É necessário, também, conscientização da
sociedade. O grande debate entre a garantia da propriedade privada e a proteção do
meio ambiente vem à tona, sempre em forma de ponderações: em alguns casos
deve se respeitar o direito a propriedade, em outros a preservação de bens difusos
como o meio ambiente. O ordenamento jurídico criou a função social da propriedade
privada, elencada na Constituição Federal de 1988 nos artigos 170, incisos II, III e V
e 182 § 2º.
57
Na tentativa de resolver o conflito do direito de propriedade e da proteção do
meio ambiente um novo mecanismo de composição foi estabelecido, assim, a
propriedade que não cumprir com sua função social estará sujeita a sobreposição do
interesse coletivo sobre o interesse individual.
Em outro viés, a propriedade privada rural também foi aludida com o
dispositivo da função social, segundo o artigo 186, inciso II, da Constituição Federal.
Esta será atendida toda vez que o agricultor utilizar de forma adequada os recursos
naturais disponíveis, bem como atentar a preservação do meio ambiente. Tem-se
que não há direito de propriedade se não forem atendidos os requisitos da função
social desta. Outrossim, a verificação do cumprimento da função social no exercício
da propriedade privada se dará através do poder de polícia do Poder Público.
Como já citado no primeiro capítulo, o direito ambiental é intitulado como um
bem difuso, ou seja, de interesse de toda a coletividade, sendo indivisível quanto ao
seu objeto e indeterminado quanto a titularidade. Ademais, geralmente suas lides se
originam de circunstâncias fáticas, ou de ações que desencadeiam uma conduta
degenerativa ao meio ambiente.
Por outro lado, é preciso fazer mais do que esperar a conduta danosa
acontecer. É preciso repensar o conceito de educação ambiental, focada nos
princípios do direito ambiental, como por exemplo, nos princípios da prevenção, da
precaução, da responsabilidade social, do desenvolvimento sustentável, da
participação.
Por conseguinte, conclui-se que a responsabilidade ambiental apresenta-se
de três formas independentes entre si, sendo elas a responsabilidade civil, a
administrativa e a penal, de acordo com a infração e com o respectivo regime
jurídico aplicado. Entretanto, concomitantemente ao uso dos instrumentos de defesa
e tutela do direito ambiental, doutrinariamente nominados como a tríplice
responsabilidade, é necessário, acima de tudo, educação ambiental, com vistas a
gerar uma mudança, de fato, não só para as futuras gerações, mas para esta
geração também.
58
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