A AGRICULTURA URBANA COMO MANIFESTAÇÃO DA RURALIDADE NA CIDADE DE ALFENAS Deywison Tadeu Resende Gonçalves [email protected] Bolsista PIBIC/CNPq – Geografia – UNIFAL-MG Ana Rute do Vale [email protected] Docente do curso de Geografia – UNIFAL-MG RESUMO Considerando que o êxodo rural se acentuou no Brasil, sobretudo, na década de 1970, este trabalho reflete sobre a disseminação na cidade de hábitos e tradições rurais, denominados de ruralidades. Dentre as variadas modalidades de expressão das ruralidades a agricultura urbana (AU) é uma das mais frequentes. Na cidade de Alfenas/MG essa prática é bastante expressiva, pois apesar do intenso êxodo rural ocorrido no município, que culminou no atual elevado grau de urbanização (93,8%, segundo o IBGE, 2010), a ruralidade mantém-se forte no espaço citadino. Verificar a ocorrência espacial e as características da agricultura urbana como manifestação da ruralidade nos quintais das residências na área central e nos bairros Jardim São Carlos e Pinheirinho da cidade de Alfenas é o objetivo da presente pesquisa, bem como os motivos da existência de tal prática e suas contribuições. Para tanto, além do levantamento e revisão bibliográfica, serão aplicados questionários junto aos moradores desses bairros, como meio de verificar a ocorrência e a identidade que se estabelece entre praticante e prática. A coleta de dados secundários em órgãos oficiais do município proporcionará identificar a existência ou não de incentivos públicos e/ou privados para a prática da AU e ajudará a apontar suas perspectivas futuras. Palavras-chave: urbanização; ruralidade; agricultura urbana; políticas públicas. INTRODUÇÃO Falar de ruralidades requer atenção para a relação que as produzem e para série de configurações reveladas por elas, produzidas no seio das manifestações ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 642 urbanas ou rurais. O exercício de estudar as interações espaciais campo-cidade, por esta razão, torna-se de extrema relevância, pois a transposição de limites espaciais por tais manifestações se explica pela interdependência existente entre campo e cidade. A modernização da agricultura que no Brasil que se intensificou, sobretudo, a partir da década de 1970, demonstra reflexos de um histórico excludente no panorama da realidade rural brasileira. Esse movimento de desenvolvimento1 do capitalismo na agricultura, longe de representar uma homogeneização do espaço, colaborou para o volumoso movimento migratório no sentido campo-cidade e que ficou conhecido como êxodo rural. Tal fenômeno torna-se responsável pela disseminação de hábitos e valores sociais que se divergem do espaço que os migrantes se dirigiram. Sob o pressuposto apresentado objetiva-se com esta pesquisa a identificação da real situação da agricultura urbana na área central e nos bairros Jardim São Carlos e Pinheirinho do município de Alfenas, localizado no Sul/Sudoeste do Estado de Minas Gerais. O município se caracteriza pela forte presença da agricultura, principalmente a cafeicultura, cultivo típico da região. Alfenas, assim como a maioria dos municípios brasileiros, tem sua gênese relacionada ao campo. O contingente populacional que migrou intensamente a partir da modernização do campo provocou um elevado grau de urbanização no município, que vem se acentuando desde a década de 1970 quando a cifra era de 74,3%, atingindo 93,7% em 2010, chegando a ser superior a do estado de Minas Gerais (85,2%) e a do país (84,3%), segundo o Censo Demográfico de 2010. Convém ressaltar que esse trabalho é fruto de uma pesquisa de iniciação científica (PIBIC/CNPq), que por ainda encontrar-se em andamento, apresentará apenas resultados parciais. OBJETIVOS Verificar a ocorrência espacial e as características da agricultura urbana como manifestação da ruralidade nos quintais das residências na área central e nos bairros Jardim São Carlos e Pinheirinho da cidade de Alfenas, bem como os motivos da existência de tal prática e suas contribuições. Mais especificamente, buscaremos: a) identificar os pontos de ocorrência da agricultura urbana nos bairros delimitados para o “É a partir do desenvolvimento do capitalismo na agricultura concomitante à interiorização das indústrias e à modernização da sociedade urbana e rural que a teoria da urbanização passa a ser formulada, colocando a ênfase na integração dos dois espaços através das trocas cada vez mais intensas entre a sociedade urbano-industrial e as pequenas aldeias rurais” (CARNEIRO, 1998, p.57). 1 ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 643 estudo: Jardim São Carlos, Pinheirinho e a Área Central; b) verificar a existência de políticas públicas municipais voltadas à agricultura urbana, sobretudo, o Plano Diretor Participativo de Alfenas; c) compreender os motivos pelos quais se pratica a agricultura urbana; d) caracterizar as famílias que praticam a agricultura urbana em seus quintais, procurando encontrar possíveis indícios da influência de seu passado rural; e) analisar as técnicas utilizadas na produção, os tipos de produtos cultivados e sua destinação, bem como a relevância que a atividade como fonte de renda familiar e; f) apontar perspectivas futuras para a agricultura urbana nas áreas estudadas. 644 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Os estudos científicos que analisam a produção agrícola na cidade são relativamente recentes e com crescente abordagem por pesquisadores de diversas áreas. A agricultura urbana é, segundo Mougeot (2000, p.7), uma expressão, como qualquer outra, que necessita estar sempre sendo repensada a partir das necessidades que se cria com as experiências conectadas ao mundo real. O referido autor explica que [...] a agricultura urbana é a praticada dentro (intra-urbana) ou na periferia (periurbana) dos centros urbanos (sejam eles pequenas localidades, cidades ou até megalópoles), onde cultiva, produz, cria, processa e distribui uma variedade de produtos alimentícios e não alimentícios, (re) utiliza largamente os recursos humanos e materiais e os produtos e serviços encontrados dentro e em torno da área urbana, e, por sua vez, oferece recursos humanos e materiais, produtos e serviços para essa mesma área urbana. Para Pinto; Franz; Salamoni (2010, p.1) a agricultura urbana “que compreende as diversas atividades relacionadas à produção de alimentos e a conservação dos hábitos e práticas rurais – ruralidades - [...] representa uma estratégia de reprodução socioterritorial das famílias voltada para a produção de alimentos”. A agricultura urbana encarada como ruralidade obriga a compreensão da relação campo-cidade. No entanto, uma terminologia consciente é de suma importância. Biazzo (2007, p. 18) nos fornece a concepção de cidade e campo como sendo o recorte espacial e o urbano e rural como sendo expressões imateriais: “campo e cidade são forma concretas, materializam-se e compõem as paisagens produzidas pelo homem; “urbano” e “rural” são representações sociais, conteúdos das práticas de cada sujeito, cada instituição, cada agente na sociedade”. Aproximar dos indivíduos que praticam a agricultura urbana é enxergá-los como viventes da complexidade inerente à questão da relação campo-cidade e a ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 disseminação das “ruralidades” no espaço citadino. O estudo que se propõe nessas condições se enriquece, pois a experiência aponta como indícios de uma realidade mais concreta, sendo exatamente na consideração do local e do subjetivo que poderão ser constatadas “visões de mundo e valores distintos de acordo com o universo simbólico ao qual estão referidas, estando, portanto, sujeitas a reelaborações e a apropriações diversas” (CARNEIRO, 1998, p.60). Não há desse modo uma sobreposição de imaterialidades “urbanas” ou “rurais”. O que existe na verdade, é uma combinação de práticas que não obedece a disposições generalistas porque variam no tempo e no espaço e estão sujeitas à realidade do praticante. A disseminação da agricultura urbana como indício da ruralidade no município de Alfenas muito tem haver com o alto índice do êxodo rural e a respeito deste Santos (2011, p.8) explica que pode ser considerado como consequência da “mecanização das lavouras de café, principalmente nas etapas da colheita, tem ajudado a aumentar o desemprego no campo, através da substituição cada vez maior do trabalho realizado pela mão de obra valorizada”. METODOLOGIA O trabalho proposto se desenvolverá a partir dos seguintes procedimentos: 1. Pesquisa e revisão bibliográfica (livros, artigos e teses) nas diversas bibliotecas virtuais de universidades, institutos e revistas eletrônicas, bem como nas bibliotecas da UNIFAL-MG de modo a indicar os conceitos, estudos, análises críticas e reflexivas; 2. Coleta de dados: a) secundários: Prefeitura Municipal de Alfenas (MG), instituições públicas e/ou privadas que disponham de dados documentados sobre a constatação da agricultura urbana na área estudada, além de sites especializados; b) primários: aplicação de questionários semi estruturados junto aos membros das famílias responsáveis pela prática da agricultura urbana, na área central e nos bairro Jardim São Carlos e Pinheirinho, buscando caracterizá-los nos aspectos socioeconômicos e culturais. 3. Organização e análise dos dados coletados. 4. Execução de atividades técnicas: mapear a localização das residências que praticam a agricultura urbana. 5. Elaboração do relatório final da pesquisa, indicando as conclusões obtidas e propondo medidas de desenvolvimento da prática. RESULTADOS No atual estágio de desenvolvimento da pesquisa pudemos verificar que ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 645 apesar da constatação da prática da agricultura urbana na cidade de Alfenas, praticamente não existem políticas públicas e/ou privadas para integração da agricultura urbana nos planos de desenvolvimento urbano do município. O assunto, inclusive, não é tratado em seu Plano Diretor Participativo. Segundo a Secretaria de Planejamento do município, essa ausência é reflexo do curto prazo em que o Plano Diretor foi elaborado e pela sua generalidade – não trata de questões específicas –, bem como pelas referências atribuídas ao plano que são, primordialmente, relacionadas ao ordenamento territorial. As poucas iniciativas presentes no município estão circunscritas somente às escolas. Referente à relação prática-praticante foi constatado até o presente momento que: a agricultura urbana como ruralidade é ainda muito forte no município, apesar de seu elevado grau de urbanização; a AU é atividade secundária praticada em sua maioria por migrantes do campo, seja de Alfenas ou de outro município; os praticantes adotam a horticultura como principal forma de AU; o destino da produção agrícola dessas famílias é o autoconsumo, com raras exceções essa é comercializada, sendo que, quando isso ocorre sua clientela são seus vizinhos; é na maioria das vezes praticada por idosos aposentados. Com o término da pesquisa nossas expectativas é que esse quadro seja o mesmo, no mais, com poucas variações. REFERÊNCIAS BIAZZO, P. P. Campo e rural, cidade e urbano: distinções necessárias para uma perspectiva crítica em Geografia Agrária. In: MARAFO, G. J.; PESSÔA, V. L. S. (Org.). Interações geográficas: a conexão interdisciplinar de grupos de pesquisa. Uberlândia: Roma, 2007, p. 10-22. CARNEIRO, M. J. Ruralidade: Novas identidades em construção. Estudos Sociedade e Agricultura (UFRJ). Rio de Janeiro, v.3, n.2, out./1998, p.53-75. MOUGEOT, L. J. A. Agricultura Urbana: conceito e definição. Revista de Agricultura Urbana, v.1, n.1, jul./2000. Disponível em: <http://www.ruaf.org/node/2424>. Acessado em: Março/2013 PINTO, C. V. S.; FRANZ, J. C.; SALAMONI, G. A produção de alimentos no espaço “rururbano” de Pelotas/RS: Estratégias de reprodução socioterritorial da agricultura. In: ENCONTRO NACIONAL DE GEÓGRAFOS, 16, Anais... Porto Alegre: AGB/ UFRGS, 2010. SANTOS, H. F. A outra face do agronegócio globalizado e as desigualdades socioespaciais: estudo de caso com a cafeicultura moderna no município de Alfenas-MG. Trabalho de Conclusão do Curso. Universidade Federal de Alfenas, Instituto de Ciências da Natureza. Alfenas, 2011. ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 646