UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE FACULDADE DE MEDICINA -DEPARTAMENTO DE MEDICINA PREVENTIVA NÚCLEO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA DISCIPLINA DE EPIDEMIOLOGIA – 1º semestre 2005 VALIDADE EM ESTUDOS EPIDEMIOLÓGICOS Validade • Validade: termo derivado do latim validus (“forte”) • Validade de um estudo: até que ponto os resultados de um estudo epidemiológico são distorcidos em decorrência de erros metodológicos na concepção (desenho) do estudo e/ou na análise dos dados. Validade Ð erro sistemático viés x Precisão Ð variação amostral erro aleatório Validade interna x Generalização • Um estudo particular é “internamente válido”, ou simplesmente “válido”, se os seus resultados não podem ser atribuídos a erros sistemáticos. • Mas será que os achados específicos de um estudo numa população específica podem ser generalizados para uma outra população? Nurse’s Health Study • Práticas conceptivas e impactos em saúde • Restrição: Enfermeiras casadas, 30-55 anos 11 estados com maior n0 de registros • Vantagens: > taxa de resposta e seguimento • Achado: relação inversa entre terapia hormonal pós-menopausa e doença coronariana • Seria este resultado generalizável para: Î enfermeiras de outros estados? Î outras mulheres americanas? Î mulheres de outros países? VALIDADE VS. PRECISÃO • VALIDADE: ausência de erro sistemático ou viés (“bias”) • PRECISÃO: ausência de erro aleatório VÁLIDO PRECISO NÃO VÁLIDO NÃO VÁLIDO IMPRECISO PRECISO VÁLIDO?! IMPRECISO Viés: 3 pilares (1) Viés de seleção: a medida de associação estimada no estudo está distorcida devido ao modo pelo qual os indivíduos são selecionados para compor a população de estudo. (2) Viés de informação: a medida de associação estimada no estudo está distorcida devido a erros de na forma como a informação sobre a exposição e/ou doença é obtida. (3) Confundimento ou situação de confusão: parte da associação observada decorre da existência de uma ou mais variáveis, denominadas variáveis de confundimento, confundidoras, ou de confusão. Viés de seleção • Viés de seleção: Distorções que resultam dos procedimentos utilizados na seleção dos participantes e/ou de fatores que influenciam a participação no estudo. • Se o processo de seleção provoca a identificação de uma associação entre exposição e doença, quando na população-alvo tal associação inexiste Î viés de seleção. • O elemento básico no viés de seleção é a existência de relações entre exposição e doença que são diferentes entre os indivíduos que participam do estudo e aqueles que são teoricamente elegíveis para participar mas que, por mecanismos de seleção viciados, não foram incluídos. Viés de seleção • Viés de seleção pode ocorrer quando a identificação de indivíduos para inclusão no estudo, seja com base na exposição (coorte) ou doença (caso-controle) depende do outro eixo de interesse. • Coorte: seleção de expostos ou não-expostos depende da probabilidade de adoecer • Caso-controle: seleção de casos ou controles depende da probabilidade de exposição Viés de detecção • Controvérsia Î estrogênio artificial vs. câncer de endométrio • Alguns estudos encontraram forte associação (OR=9) • Horowitz e Feinstein (1978): (1) Estrogênio artificial causa sangramento uterino a despeito da presença ou não de câncer de endométrio; (2) Este sintoma conduziria a mulher a um exame ginecológico; (3) Uma investigação ginecológica revelaria a presença de câncer de endométrio que de outra forma poderia passar despercebido; (4) A taxa de detecção de câncer de endométrio seria maior entre mulheres em uso de estrogênio do que entre mulheres que não o usassem (5) Ou seja, o processo de inclusão de casos no estudo seria função da exposição Î super-estimação da medida de associação. Perda seletiva de seguimento • Perdas: morte, não-cooperação, migração, dificuldades de manter o seguimento, falta de registros adequados. • Perdas podem ser relacionadas à exposição, à doença, ou a ambos. • Se a perda de seguimento é associada tanto com a exposição quanto com a doença Î perda seletiva de seguimento. • Viés pode ocorrer quando os indivíduos que são perdidos apresentam probabilidades diferentes de desenvolver a doença sob estudo, quando comparados com os que não foram perdidos. • Em particular o viés ocorrerá quando as perdas são diferenciais entre grupos de exposição. Coorte fixa sem perdas Expostos caso Não-expostos caso 36 / 144 = 2.00 RR = 18 / 144 Perdas associadas ao desfecho e exposição: Expostos caso Não-expostos caso 30/ 135 = 172 RR= . 18/ 139 Perdas associadas apenas à exposição Expostos caso Não-expostos caso 33 / 132 = 200 RR = . 18/ 144 P(D) entre as perdas (3/12) = P(D) nos remanescentes (33/132) Viés de informação • Viéses de informação: distorções nas estimativas de efeito que decorrem de erros na mensuração/aferição da exposição e/ou desfecho de interesse. • Fontes: utilização de procedimentos diagnósticos de baixa sensibilidade e/ou especificidade (informação sobre o desfecho); uso de instrumentos de coleta de dados (p.ex., questionários) de má-qualidade; procedimentos de entrevista não padronizados; registros de dados incompletos, entre outras. • Resultado: classificação errônea dos participantes do estudo em termos de seus status de doença e/ou exposição. • Por isto: também denominado erro de classificação ou viés de máclassificação (misclassification bias). Viés de informação: diferenciais e não-diferenciais •Erro de classificação não-diferencial: o sistema de classificação, seja ele adequado ou não, é o mesmo para os grupos de comparação, ou seja, a sensibilidade e especificidade não variam segundo status de exposição ou doença. •O resultado usual, porém não universal, dos erros não-diferenciais é diminuir as diferenças entre os grupos de comparação e enviesar as medidas de associação em direção ao valor nulo Î as estimativas de risco relativo tendem a se aproximar de 1,0. • Erro diferencial: a taxa de má-classificação difere entre os grupos de estudo Î distorção na estimativa de efeito cuja direção é muito difícil de ser avaliada. Impacto do erro de classificação 7 OR verdadeiro=6.0 6 OR 5 SE=1.0 SE=0.9 SE=0.75 SE=0.5 4 3 2 1 0.5 0.6 0.7 0.8 Especificidade 0.9 1 Confundimento: Princípios básicos • Confundimento ou situação de confusão ocorre quando parte do efeito observado de um fator de exposição resulta da presença de uma ou mais variáveis, que estão relacionadas tanto com a doença sob estudo quanto com a exposição de interesse na base populacional. • Esta(s) variável(is) é(são) denominada(s) variável(is) de confundimento, confundidora(s), ou de confusão. • A situação de confusão ocorre devido a uma inerente falta de comparabilidade entre populações expostas e não-expostas no que diz respeito aos riscos de adoecer. Propriedades básicas 1. Deve ser um fator de risco independente para a doença sob estudo (entre os não-expostos); 2. Deve estar associada com a exposição na base populacional (na coorte, em estudos de coorte, e nos controles, em estudos caso-controle); 3. Não ser intermediária na relação causal entre a exposição e doença, ou consequência do desfecho sob estudo. Condições mínimas E = Exposição D = Desfecho C = Fator de confusão D E C Fator intermediário E = Exposição D = Desfecho C = Fator de confusão E C D Não há confundimento: não existe asssociação entre C e D independente de E Fator intermediário E = Exposição D = Desfecho C = Fator de confusão D E C Não há confundimento: não existe asssociação entre C e D independente de E Estratégias para lidar com confundimento 1. Estratégias preventivas • Randomização • Restrição • Pareamento 2. Estratégias analíticas • Estratificação • Análise multivariada Randomização • O que é? Alocação aleatória dos participantes às categorias de exposição • Meta: criar grupos de comparação que tenham propensão equivalente ao desfecho, isto é, incidências iguais do desfecho na ausência da exposição de interesse. • Como: balanceando a distribuição dos determinantes do desfecho (conhecidos ou não!) nos grupos de comparação • Limites: – Não torna a distribuição dos determinantes igual nos grupos – Mais efetivo em estudos com amostra grande – E o que acontece após a randomização? Restrição • O que é? Restrição da admissão no estudo a participantes que têm características comuns (p.ex. mesmo sexo, idade) • Lógica: Confundimento não pode ocorrer se a variável potencialmente confundidora é impedida de variar • Limites: – Diminui o total de indivíduos elegíveis – Generalizabilidade Pareamento • O que é? Estratégia de seleção de participantes de forma a garantir que a distribuição da potencial variável de confundimento tenha distribuição similar nos grupos de comparação • Lógica: Elimina a associação do confundidor com a exposição (em estudos de coorte!!!) • Limites: – Problemas operacionais para encontrar pares – Estratégia de análise pareada em caso-controle – Super-pareamento (overmatching) Estratificação • Compara-se o valor da medida de efeito de interesse (p.ex., o odds ratio) levando-se em consideração o potencial fator de confundimento (odds ratio ajustado) ou ignorando-o (odds ratio não-ajustado, bruto ou crú). • Se diferentes então há confundimento • Quão diferentes?! E = contraceptivo D = infarto C = idade D+ D- E+ 25 73 98 E- 203 1383 1586 228 1456 1684 25 × 1383 = 2.33 OR = 73 × 203 E = contraceptivo D = infarto C = idade idade (30-39) idade (40-49) D+ D- E+ 13 59 72 E- 45 720 765 58 779 837 13× 720 = 353 OR= . 59× 45 D+ D- E+ 12 14 26 E- 158 663 821 170 677 847 12× 663 = 360 OR= . 14× 158 Modificação de efeito O efeito (associação) da variável de exposição no desfecho em questão varia “substancialmente” de acordo com os níveis de uma outra variável. D+ D- E+ 550 400 950 E- 450 600 1050 1000 1000 2000 OR = 1.83 Modificação de efeito C+ C- D+ D- E+ 520 180 700 E- 300 100 400 820 280 1100 OR = 0.96 D+ D- E+ 30 220 250 E- 150 500 650 180 720 900 OR = 0.45 O que fazer? Î mostrar os OR por estrato da variável de interação