Percepção e atenção * Falar em percepção significa falar de respostas operantes controladas por estímulos antecedentes. Como outra relação operante, a relação envolvida no que chamamos de percepção sofre a influência da história vivida pelo indivíduo que se comporta e de circunstâncias presentes no momento em que o indivíduo se comporta. Poling, Schlinger, Starin e Blakely (1990) resumem muito bem esse ponto de vista: Entre as variáveis que controlam a percepção, no sentido de respostas controladas por um estímulo, estão: 1. as características físicas do estímulo, 2. a presença concomitante de outros estímulos, e 3. a história (experiência) do indivíduo com relação ao estímulo. (p.109) A descrição da percepção como resposta operante sob controle de estímulos acarreta uma mudança em relação à concepção tradicional: uma vez que se assuma que percepção é comportamento operante, assume-se que percepção como comportamento envolve ação em relação ao ambiente. Assim, do ponto de vista comportamental, o estudo da percepção não deve ser reduzido ao estudo das estruturas dos órgãos dos sentidos ou ao estudo da forma ou estrutura dos estímulos; nenhum desses aspectos abrange o fenômeno psicológico-comportamental – que chamamos percepção. Alguns trechos de Skinner, retirados do capítulo sobre percepção, do livro About behaviorism (1976), representam o ponto de vista comportamental. Uma pessoa não é um espectador indiferente a absorver o mundo como uma esponja. (...) Não estamos simplesmente “cientes” do mundo ao nosso redor; respondemos a ele de maneiras idiossincráticas por causa daquilo que aconteceu quando estivemos em contato com ele. (...) Tem sido salientado, com freqüência, que uma pessoa que percorreu um caminho quando passageiro não consegue encontrá-lo tão bem quanto uma que tenha dirigido por ele um igual número de vezes. (...) Ambos foram expostos aos mesmos estímulos visuais, mas as contingências foram diferentes. Perguntar porque o passageiro (...) não “adquiriu conhecimento do caminho” é perder de vista a questão importante. (...) As grandes diferenças naquilo que é visto em diferentes momentos em uma dada situação sugere que um estímulo não pode ser descrito em termos puramente físicos. Tem sido dito que o behaviorismo falhou por não reconhecer que o que é importante é “como a situação aparece para uma pessoa” ou “como uma pessoa interpreta uma situação” ou “que significado uma situação tem para uma pessoa”. Entretanto, para investigar como uma situação aparece para uma pessoa, ou como ela a interpreta, ou que significado ela tem para a pessoa, devemos examinar o seu comportamento com relação a tal situação, incluindo suas descrições dessa situação, e este exame só pode ser feito em termos de sua história genética e ambiental. (...) pessoas vêem coisas diferentes quando foram expostas a contingências de reforçamento diferentes (pp.82, 83, 85, 86, 88) * Trecho selecionado por Hélio José Guilhardi. Do ponto de vista da análise do comportamento, o que chamamos de atenção não difere do que chamamos de percepção; estamos, no caso da atenção, mais uma vez falando de controle de estímulos, portanto, de uma relação entre condições antecedentes e respostas operantes. Vamos mais uma vez recorrer a Skinner (1965) para apresentar essa posição: O controle exercido por um estímulo discriminativo é tradicionalmente tratado sob o rótulo de atenção. Este conceito inverte a direção da ação sugerindo, não que um estímulo controla o comportamento de um observador, mas que o observador atenta para o estímulo e, assim, o controla. No entanto, algumas vezes reconhecemos que o objeto “ chama ou mantém a atenção” do observador. O que usualmente queremos dizer, neste caso, é que o observador continua a olhar para o objeto. (...) Mas, atenção é mais do que olhar para algo ou olhar para um conjunto de coisas, uma após a outra. Como todo mundo sabe, podemos olhar para o centro de uma página enquanto “atentamos” para detalhes nas bordas. (...) Mas, se atenção não é uma forma de comportamento, não se segue daí que esteja fora do campo do comportamento. Atenção é uma relação de controle – a relação entre uma resposta e um estímulo discriminativo. Quando alguém está prestando atenção está sob controle especial de um estímulo. Detectamos a relação mais prontamente quando os receptores estão claramente orientados, mas isto não é essencial. Um organismo está atentando para um detalhe de um estímulo se o seu comportamento estiver predominantemente sob controle daquele detalhe, quer seus receptores estejam ou não orientados para produzir uma recepção mais clara. (pp. 122-124) Se o analista do comportamento, nos dois casos – da percepção e da atenção -, estuda e descreve os fenômenos de uma mesma maneira, isto é, como controle de estímulos sobre respostas operantes, quase que inevitavelmente surge a pergunta sobre se não está ocorrendo uma grande simplificação ou, em outras palavras, por que existem dois termos, se o fenômeno é um só? É possível que a dificuldade que temos em lidar com relações sujeito-ambiente, no lugar de lidar com eventos estanques, delimitados e com existência independente, seja a responsável pela existência de dois termos que supõem e, ao mesmo tempo, sugerem a existência de dois fenômenos distintos. Diante dessa dificuldade, ou enfatizamos o sujeito e supomos que ele é o iniciador autônomo de suas atividades, ou enfatizamos o ambiente e supomos que ele se impõe sobre o sujeito, visto, então, como receptáculo das estimulações ambientais. No primeiro caso recorremos ao termo atenção; no segundo caso, ao termo percepção.