Artigo Grelina e Controle da Energia de Homeostase Susan M. Gale1, V. Daniel Castracane1 & Cristos S. Mantzoros2 1 - Diagnostic Systems Laboratories, Inc, EUA 2 - Beth Israel Deaconess Medical Center, EUA Tradução: Sônia M.M. Fleira Genese Prods. Farm. Diag. Ltda Summary Resumo A obesidade continua a ser o maior problema médico em sociedades do mundo todo. Nas últimas décadas, houve um aumento significante na prevalência da obesidade e problemas de saúde a ela relacionada e a tensão por parte dos órgãos de saúde é claramente evidente. Este artigo foi realizado por pesquisadores da DSL e descreve o papel da grelina e outros hormônios significantes, na energia de homeostase. Introdução Obesity continues to be a major medical problem in western societies throughout the world. Over the past decade, there has been a tremendous increase in the prevalence of obesity and related health disorders, and the strain on the public health purse is clearly evident. This article describes the role of ghrelin and other significant endocrine hormones in energy homeostasis. síveis conseqüências. Tem sido co- tendimento destes mecanismos de- gitado que em algumas décadas, vem levar a tratamentos efetivos US Surgeon General estabe- a obesidade poderá substituir o ta- para o controle da obesidade. Des- leceu que problemas de saú- bagismo como número um na lis- coberta recentemente em 1999, a de resultantes de sobrepeso e obe- ta de risco de saúde em socieda- Grelina é um novo regulador de sidade foram compensados por vá- des desenvolvidas (1). grande interesse para o complexo O rios descobrimentos obtidos pela O controle de energia de home- sistema que controla a ingesta ali- medicina moderna (1). A obesida- ostase e a patogênese da obesida- mentar e peso corpóreo. Ao longo de é, hoje, o maior fator de mor- de estão sendo estudados há mui- deste artigo os autores discutem a talidade nos Estados Unidos, com tos anos; porém, em paralelo com significância clínica da Grelina e de uma estimativa de 300.000 mor- aumentos na prevalência da obesi- uma série de outros hormônios re- tes por ano, apenas nos Estados dade está acontecendo um aumen- guladores importantes, descobertos Unidos, atribuídas diretamente à to dramático no número de estudos nos últimos anos. obesidade. A lista relacionada às científicos e clínicos com o objetivo desordens de saúde é extrema- de avançar o entendimento no cam- mente alarmante: problemas car- po do balanço energético. Os endo- díacos, diabetes, câncer, asma, crinologistas reconhecem que exis- O interesse renovado no con- apnéia do sono, artrite, complica- tem muitos fatores hormonais cen- trole hormonal do balanço ener- ções reprodutivas e distúrbios psi- trais e periféricos envolvidos na gético iniciou-se em 1994 em cológicos estão incluídos nas pos- energia de homeostase e que o en- cima da descoberta da Leptina, 130 Leptina NewsLab - edição 64 - 2004 produto do gene da obesidade e em diversos processos fisiológi- ram o papel fisiológico da leptina logo em seguida, a caracteriza- cos, mas está principalmente en- foram realizados em camundon- ção do receptor de leptina e da volvida na energia de homeosta- gos e demonstraram que a lepti- proteína de ligação de leptina cir- se e saciedade. Níveis circulan- na está envolvida no controle de culante. A leptina é uma proteí- tes de leptina correlacionam-se saciedade e balanço energético/ na gligosilada com 16 kDa e 146 com índice de massa corporal e comportamento alimentar. Genes aminoácidos produzida principal- parece que a leptina transmite in- ob/ob impossibilitam os camun- mente pelo tecido adiposo, em- formações ao hipotálamo referen- dongos de produzir leptina funci- bora tenham sido detectados bai- te à quantidade de energia arma- onal e estes camundongos ficam xos níveis no hipotálamo, pitui- zenada no tecido adiposo, supri- enormemente obesos sob regimes tária, placenta, músculo esque- mindo o apetite e afetando o gas- alimentares ad-lib, atingindo um lético e epitélio gástrico e mamá- to de energia (3, 4). peso corporal quatro vezes maior rio (2). A leptina tem seu papel NewsLab - edição 64 - 2004 Estudos iniciais que investiga- do que seu peso corporal normal, 131 comparado com os controles. A a um alto controle de inibidores estimula a ingesta alimentar, au- administração de leptina pode re- específicos sinalizadores de lepti- menta a utilização de carboidra- verter este ganho de peso nesta na. A patogênese da resistência à tos, reduz o gasto de gordura, au- mutação genética, indicando que leptina está atualmente sob inten- menta a motilidade gástrica e se- a leptina tem função importante sa investigação. creção ácida e reduz a atividade no controle de ingesta alimentar. Uma discussão implicando lep- Em humanos, mutações gené- tina e energia de homeostase não A grelina foi originalmente ticas raras resultantes da defici- poderia estar completa sem men- descoberta por Kojima e colabo- ência de leptina ou receptores de cionarmos o papel crítico da lepti- radores durante pesquisas para leptina também contribuem para na na função reprodutiva. Tem sido um secretagogo endógeno de o fato de que a mesma tenha um sugerido que a leptina pode atuar hormônio de crescimento (8, 9). papel importante na saciedade. como um elo de ligação crítico en- A grelina é um peptídeo de 28 Em crianças identificadas como tre tecido adiposo e sistema repro- aminoácidos com uma cadeia áci- portadoras de mutações que re- dutivo, indicando se existe reser- da octanóica labil no resíduo três sultam na deficiência de leptina, va de energia adequada para uma da serina, sendo secretada em foram observados comportamen- função reprodutiva normal.Estudos células especializadas enterocro- tos alimentares de fome intensa prévios demonstraram que o mafins localizadas, principalmen- e desenvolvimento de obesidade mRNA de leptina é secretado na te, na mucosa do estomago. A extrema. Apesar do modelo ina- placenta e que camundongo ob-ob grelina não somente possui pro- dequado utilizado (roedores), fica deficiente em leptina é infértil. Es- priedades potentes de liberação claro que aumentos nos níveis de tudos mais recentes apóiam a no- de hormônio do crescimento com- leptina em humanos não evita a ção de que a leptina é crítica para paráveis com as do hormônio li- obesidade induzida por dieta. Ge- a função reprodutiva normal e é berador de hormônio do cresci- ralmente, a maioria dos casos de uma chave importante no contro- mento, mas também possui um obesidade é caracterizada por au- le da endocrinologia placentária efeito independente potente no mentos de leptina nos adipócitos (5). Neste contexto, recentemen- hormônio do crescimento. Este e altos níveis de leptina circulan- te foi demonstrado que diminui- seu efeito independente no hor- te e a administração de leptina ções nos níveis de leptina em res- mônio de crescimento é conside- exógena tem falhado em reduzir posta à privação de comida são rado hoje de grande interesse a adiposidade significativamente. responsáveis por estados de ina- para medicina clínica. Além disto, tem sido sugerido que nição induzindo supressão de LH a falta de resposta para níveis ele- no eixo gonadal (6). vados de leptina em humanos obesos representa um estado de locomotora. Durante estudos iniciais para investigar o uso potencial de grelina como um secretagogo do hormônio Grelina resistência à leptina. O mecanis- de crescimento, tornou-se claro que a administração a longo prazo de mo oculto na resistência à leptina A grelina é o mais novo hormô- grelina propiciou um aumento na talvez inclua anormalidades na se- nio descoberto envolvido na ener- adiposidade e ingesta de alimento creção de leptina, problemas de gia de homeostase. Ela tem sido em testes realizados em animais. transporte de leptina no cérebro, descrita como um hormônio que Administração de grelina periférica e/ou reduzida sinalização hipotalâ- estimula efeitos opostos aos pro- ou central nos ventrículos cerebrais mica de leptina, em parte devido duzidos pela leptina (7). A grelina tem demonstrado induzir ganho de 132 NewsLab - edição 64 - 2004 peso em roedores, indicando um grelina em anorexia nervosa re- lina seguido de procedimento cirúr- papel claro para grelina como o pri- fletem o estado patofisiológico de gico e de subseqüente perda de meiro hormônio orexígeno, sistema- resistência à grelina, analogamen- apetite. O desenvolvimento de um ticamente ativo (10). te a resistência de leptina na obe- antagonista de grelina, ou o desen- sidade ainda não é do conheci- volvimento de um mecanismo ini- mento dos pesquisadores. bidor da liberação de grelina para Em humanos, os níveis de pico de grelina têm sido encontrados antes de cada refeição, caindo en- Níveis elevados de grelina são controle de apetite, pode criar con- tão a níveis baixos, imediatamen- encontrados também em condi- dições para o desenvolvimento de te após alimentação (11). O forte ções clínicas de obesidade pediá- fármaco, importante para o moni- impulso de alimentação induzido trica, chamada de Síndrome de toramento da obesidade. pela grelina é em parte mediado Prader-Willi. Esta síndrome é mui- Estudos recentes sugerem que pelos núcleos arcuato amplamen- to rara, caracterizada por hipoto- a grelina também tem implicações te implicados no controle do neu- nia congênita, e desencadeando em outras funções fisiológicas im- ropeptídeo Y (NPY) e peptídeo re- na adolescência hiperfagia, obe- portantes e não somente na ener- lacionado ao agouti (AGRP). Cu- sidade, hipogonadismo, retarda- gia de homeostase. Estudos indi- riosamente, a leptina possui efei- mento mental e baixa estatura. caram a existência de sítios recep- to oposto ao da grelina referente Esta síndrome está associada com tores para grelina no ovário, testí- a estes neurotransmissores. Em deleção no cromossomo 15 e pode culos, base molar, o efeito orexígeno da representar um defeito no desen- pituitárias.O relato recente da ex- grelina é próximo do efeito do volvimento hipotalâmico. Em um pressão do mRNA de grelina na NPY, um potente orexígeno (11). estudo com crianças portadoras placenta (13) também envolve a A grelina está elevada em vá- desta síndrome, concentrações de grelina no controle reprodutivo, um rios estados de baixa ingesta ali- grelina de jejum não estavam sig- cenário que é análogo à elucida- mentar, como a anorexia nervo- nificativamente diferentes das ção do papel da leptina no contro- sa, restrição calórica e caquexia concentrações do grupo controle le da função reprodutiva. provocada por câncer. com peso normal. tireóide, adrenais e Em estudo envolvendo pacien- De qualquer forma, estes paci- Outros hormônios com poten- tes femininos com anorexia ner- entes não demonstraram concen- ciais implicações na energia de vosa, foi demonstrado que a gre- trações de três a quatro vezes homeostase lina liberada estava correlaciona- mais altas como demonstrou o da fortemente e negativamente grupo de obesos (12). A grelina e a leptina foram des- com o índice de massa corporal. Fica evidente que a grelina é um critas como hormônios regulado- Surpreendentemente, as pacien- importante regulador de ingesta ali- res importantes na energia de ho- tes anoréxicas tinham altos níveis mentar e saciedade em humanos. meostase, sendo que estes hor- de grelina quando comparadas ao A grelina circulante está reduzida mônios parecem ter efeitos opos- grupo controle. Estes dados con- em indivíduos obesos e em respos- tos. O texto a seguir é uma intro- firmaram a hipótese de que a gre- ta a altas ingestões alimentares. dução breve para outros três hor- lina não possui somente efeito Isto é demonstrado por estudos de mônios descobertos recentemen- oposto ao da leptina, mas é tam- grampeamento gástrico em pacien- te e que podem ter implicações bém controlada por estes efeitos tes que possuem mudanças indica- no complexo mecanismo de ba- opostos. Se níveis elevados de tivas nos níveis circulantes de gre- lanço energético: adiponectina, 134 NewsLab - edição 64 - 2004 resistina e peptídeo YY3-36. sos e seu efeito resulta do aumen- sença de alimento e diminui a in- Adiponectina é um hormônio to da expressão de moléculas en- gesta alimentar. Tem sido demons- derivado dos adipócitos e sua se- volvidas, tanto na combustão de trado que este peptídeo atravessa creção e expressão está diminuída ácidos graxos como na dissipação a barreira cérebro-sangue e vai de na obesidade e/ou diabetes tipo 2. de energia no músculo (14). Em um encontro ao núcleo arcuato do hi- Tem sido observado que a adpo- estudo isolado, uma única injeção potálamo, estimulando os neurôni- nectina diminui a resistência a in- de adponectina diminuiu os níveis os a criar a sensação de saciedade sulina, principalmente, pela dimi- de glicose sanguínea em camun- e inibindo neurônios que estimulam nuição dos triglicérides nos múscu- dongos obesos e diabéticos e seu o comportamento alimentar (19). los e fígado em camundongos obe- efeito não foi alcançado por aumen- Este peptídeo está nos estágios ini- sos e seu efeito resulta do aumen- tos nos níveis de insulina (15). Ana- ciais de investigação e certamente to da expressão de moléculas en- lisados conjuntamente, estes resul- merece mais pesquisas. volvidas, tanto na combustão de tados indicam que a reposição de ácidos graxos como na dissipação adponectina talvez traga uma nova de energia no músculo (14). Em um modalidade de tratamento para re- estudo isolado, uma única injeção sistência a insulina e diabetes tipo de adponectina diminuiu os níveis 2. Relatos recentes também de- A descoberta de leptina e mais de glicose sanguínea em camun- monstraram a relação de baixos recentemente, grelina, tem estimu- dongos obesos e diabéticos e seu níveis de adponectina para HIV as- lado o descobrimento de vários efeito não foi alcançado por aumen- sociado a síndrome metabólica e re- novos hormônios relacionados à tos nos níveis de insulina (15). Ana- sistência a insulina relacionada com saciedade, obesidade e gasto ener- lisados conjuntamente, estes resul- malignidades (16, 17). gético. Devido à complexidade do Conclusões tados indicam que a reposição de A resistina é também outro hor- controle de balanço energético, é adponectina talvez traga uma nova mônio peptídeo fabricado pelo teci- esperado que mais hormônios se- modalidade de tratamento para re- do adiposo e contrastando com adi- jam descobertos em processos de sistência à insulina e diabetes tipo ponectina, tem sido implicada no pesquisa. Como a maioria dos es- 2. Relatos recentes também de- desenvolvimento da resistência à in- tudos fisiológicos e testes farma- monstraram a relação de baixos sulina. Estudos laboratoriais em roe- cêuticos é realizada utilizando roe- níveis de adponectina para HIV as- dores indicam que a resistina faz com dores e indivíduos humanos, uma sociado a síndrome metabólica e re- que o tecido fique menos sensível à série de ensaios quantitativos para sistência a insulina relacionada com ação da insulina, o que é a caracte- roedores e humanos serão neces- malignidades (16, 17). rística da diabetes tipo-2 (18). Estu- sários para todos os hormônios cha- Adiponectina é um hormônio dos sobre a resistina circulante em ves mencionados neste texto.O en- derivado dos adipócitos e sua se- humanos não foram ainda realizados tendimento do controle endócrino creção e expressão está diminuída e, conseqüentemente, o seu papel de energia de homeostase e da pa- na obesidade e/ou diabetes tipo 2. na energia de homeostase perma- togênese da obesidade pode auxi- Tem sido observado que a adpo- nece indeterminado. liar imensamente o desenvolvimen- nectina diminui a resistência à in- Finalmente, outro fator foi recen- to de novos tratamentos preventi- sulina, principalmente, pela dimi- temente identificado: Peptídeo YY3- vos e regimes para combater o au- nuição dos triglicérides nos múscu- 36. Este hormônio é produzido pe- mento epidêmico de obesidade e los e fígado em camundongos obe- los intestinos em resposta à pre- desordens a ela relacionada. 136 NewsLab - edição 64 - 2004 Referências Bibliográficas 1. 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