Crítica aos Clássicos 1. KEYNES 1.3. PRINCÍPIO DA DEMANDA EFETIVA E INCERTEZA Crítica aos economistas “clássicos” Keynes, TG, prefácios e caps. 1, 2 e 19 (I, II) 20/04/2017 1 Crítica aos Clássicos • Keynes e sua emancipação “Foi nessa atmosfera que me formei. Eu mesmo ensinei essas doutrinas e foi só na última década que passei a ter consciência de sua insuficiência. Em meu próprio pensamento e desenvolvimento, portanto, este livro representa uma reação, uma transição no sentido de me afastar da tradição clássica (ou ortodoxa) inglesa. A ênfase que dou nas páginas seguintes a isso e aos pontos em que divirjo da doutrina tradicional tem sido considerada por alguns, na Inglaterra, como indevidamente controversa. Como pode, porém, alguém que foi educado como católico em termos de economia inglesa, um sacerdote mesmo dessa fé, evitar um pouco de ênfase controversa logo quando se torna protestante?” (Keynes, (1996[1936]), p.31) “Nessa ortodoxia, nessa transição con nua foi que eu me formei. Eu a aprendi, eu a ensinei, eu a escrevi. Para os que observam de fora, provavelmente ainda pertenço a ela. Os historiadores da doutrina irão considerar este livro como pertencente essencialmente à mesma tradição. Mas ao escrevê-lo, e em outra obra recente que levou a ele, senti-me rompendo com essa ortodoxia, numa forte reação contra ela, fugindo de alguma coisa, conquistando uma emancipação”. (Keynes, (1996[1936]), p.37) 20/04/2017 2 Crítica aos Clássicos • Os economistas “clássicos” de Keynes “Isso pode porém também resultar em que meus leitores às vezes fiquem imaginando a que me refiro quando estou falando, com aquilo que alguns de meus críticos ingleses consideram um mau uso da língua, da escola “clássica” de pensamento e dos economistas “clássicos.” (Keynes, (1996[1936]), p.38) “‘Os economistas clássicos’ é uma denominação inventada por Marx para designar Ricardo e James Mill e seus predecessores, isto é, os fundadores da teoria que culminou em Ricardo. Acostumei-me, talvez perpetrando um solecismo, a incluir na “escola clássica” os seguidores de Ricardo, ou seja, os que adotaram e aperfeiçoaram sua teoria, compreendendo (por exemplo) J. S. Mill, Marshall e o Prof. Pigou.” (Keynes, (1996[1936]), p.43) 20/04/2017 3 Crítica aos Clássicos • A crítica de Keynes à incapacidade da teoria clássica de explicar o desemprego e o ciclo econômico “Say estava supondo implicitamente que o sistema econômico está sempre operando com sua capacidade máxima, de forma que uma atividade nova apareceria sempre em subs tuição e não em suplementação a alguma outra atividade. Quase toda a teoria econômica subseqüente tem defendido, no sentido de que ela tem exigido, esse mesmo pressuposto. No entanto, uma teoria com essa base é claramente incompetente para enfrentar os problemas do desemprego e do ciclo econômico.” (Keynes, (1996[1936]), p.40) 20/04/2017 4 Crítica aos Clássicos • A teoria clássica como um caso especial e a busca por uma teoria geral “Denominei este livro A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, dando especial ênfase ao termo geral. O objetivo deste título é contrastar a natureza de meus argumentos e conclusões com os da teoria clássica, na qual me formei, que domina o pensamento econômico, tanto prático quanto teórico, dos meios acadêmicos e dirigentes desta geração, tal como vem acontecendo nos últimos cem anos. Argumentarei que os postulados da teoria clássica se aplicam apenas a um caso especial e não ao caso geral, pois a situação que ela supõe acha-se no limite das possíveis situações de equilíbrio. Ademais, as características desse caso especial não são as da sociedade econômica em que realmente vivemos, de modo que os ensinamentos daquela teoria seriam ilusórios e desastrosos se tentássemos aplicar as suas conclusões aos fatos da experiência.” (Keynes, (1996[1936]), p.43) 20/04/2017 5 Crítica aos Clássicos Mercado de Trabalho • Clássicos: flexibilidade de preços e salários assegura pleno emprego • Keynes: o trabalhadores resistem a queda de salário nominal para proteger seus salários reais relativos, mas, em geral, não resistem a elevações de preços; e não negociam salário real uma vez que não controlam os preços; o emprego e salário real determinados pelas decisões de produção em função da demanda com possibilidade de desemprego involuntário. “Contudo, se a teoria clássica é apenas aplicável ao caso do pleno emprego, torna-se obviamente enganoso aplicá-la aos problemas de desemprego involuntário — supondo-se que tal coisa exista (e quem o negará?).” (Keynes, (1996[1936]), p.54) 20/04/2017 6 Crítica aos Clássicos Mercado de Trabalho Keynes Clássicos Y Y = F(K,N) Y1 N N1 W/P Z,D Ns=g(W/P) Z(N) D(N) N W/P DMgN W1/P1 Nd Nd=f(W/P) 20/04/2017 N1 N N 7 Crítica aos Clássicos • Teoria Clássica do Emprego i) Nd: W/P = PMgN ii) Ns: W/P = DMgN W/P Ns=g(W/P) W1/P1 Nd=f(W/P) N1 N “A teoria clássica do emprego — supostamente simples e óbvia — baseou-se, acho eu, praticamente sem discussão, nos dois postulados fundamentais que seguem: I. O salário é igual ao produto marginal do trabalho. (...) II. A utilidade do salário, quando se emprega determinado volume de trabalho, é igual à desutilidade marginal desse mesmo volume de emprego - Isto significa que o salário real de uma pessoa empregada é exatamente suficiente (na opinião das próprias pessoas empregadas) para ocasionar o volume de mãode-obra efetivamente ocupado (...)” (Keynes, (1996[1936]), p.46) 20/04/2017 8 Crítica aos Clássicos W/P • Análise do segundo postulado clássico (i) Nd: W/P = PMgN (ii) Ns: W/P = DMgN Ns=g(W/P) W1/P1 Compatível com Desemprego Friccional Nd=f(W/P) N1 N “Esse postulado é compatível com o que se pode chamar desemprego “friccional”, pois uma interpretação realista do mesmo permite, com plena justificação, conciliar certas imperfeições de ajustamento que impedem um estado contínuo de pleno emprego, como, por exemplo, o desemprego em razão de uma temporária desproporção dos recursos especializados, resultante de cálculos errados, da procura intermitente, de atrasos decorrentes de mudanças imprevistas, ou, ainda, do fato de que a transferência de um emprego para outro não se realiza sem certa demora, de modo que, numa sociedade não estática, sempre existe certa proporção de recursos não empregados “entre um e outro trabalho.” (Keynes, (1996[1936]), p.46) 20/04/2017 9 Crítica aos Clássicos • Análise do segundo postulado clássico (i) Nd: W/P = PMgN (ii) Ns: W/P = DMgN W/P Ns=g(W/P) W1/P1 Compatível com Desemprego Voluntário Nd=f(W/P) N1 N “Além do desemprego “friccional”, o postulado é ainda compatível com o desemprego “voluntário”, em razão da recusa ou incapacidade de determinada unidade de mão-de-obra em aceitar uma remuneração equivalente à sua produtividade marginal, em decorrência da legislação, dos costumes sociais, de um entendimento para contrato coletivo de trabalho, ou, ainda, da lentidão em adaptar-se às mudanças ou, simplesmente, em consequência da obstinação humana. Todavia, estas duas categorias de emprego, “friccional” e “voluntária”, são abrangentes.” (Keynes, (1996[1936]), p.46-7) 20/04/2017 10 Crítica aos Clássicos • Teoria Clássica do Emprego i) Nd: W/P = PMgN ii) Ns: W/P = DMgN • Concordância de Keynes com o primeiro postulado “Ao enfatizar os aspectos que os separam da doutrina clássica, não devemos esquecer uma concordância importante. Manteremos, pois, o primeiro postulado (...) Este é, simplesmente, o reverso da proposição, já bastante conhecida, segundo a qual a indústria trabalha normalmente sujeita a rendimentos decrescentes a curto prazo, durante o qual se supõe que permaneçam constantes o equipamento etc., dessa forma, o produto marginal das indústrias de bens de consumo dos assalariados (o qual determina os salários reais) necessariamente se reduz à medida que o emprego aumenta. Portanto, na medida em que se considerar válida esta proposição, qualquer meio destinado a aumentar o emprego conduzirá, inevitavelmente, a uma diminuição paralela do produto marginal e, portanto, do nível dos salários medido em termos desse produto.” (Keynes, (1996[1936]), p.55) 20/04/2017 11 Crítica aos Clássicos • Primeira objeção ao segundo segundo postulado clássico (ii) Ns: W/P = DMgN Na visão de Keynes, não é possível afirmar que o salário real é igual à desutilidade marginal do trabalho (e, logo, que a economia opera em pleno emprego) apenas pela constatação de que há redução do emprego quando ocorre redução do salário nominal. Ns=g(W/P) W/P W1/P0 W1/P1 = W0/P0 W0/P1 Nd=f(W/P) N1 N Para essa afirmação ser válida, seria necessário que uma redução do salário real pela elevação de preços também levasse ao mesmo resultado (redução do emprego), o que não é observado. 20/04/2017 12 Crítica aos Clássicos • Primeira objeção ao segundo segundo postulado clássico (ii) Ns: W/P = DMgN “Suponhamos, por enquanto, que a mão-de-obra não esteja disposta a trabalhar por um salário nominal menor e que uma redução desse nível conduza, através de greves ou por qualquer outro meio, a uma saída do mercado de trabalho de uma parte da mão-de-obra atualmente empregada. Pode-se, a partir disso, deduzir que o nível presente dos salários reais equivale exatamente à desutilidade marginal do trabalho? Não necessariamente, pois, embora uma redução do salário nominal em vigor leve à saída de certa quantidade de mão-deobra, isso não quer dizer que uma redução do salário nominal medido em termos de bens de consumo de assalariados produza o mesmo efeito, caso resulte de uma alta de preços desses bens.” (Keynes, (1996[1936]), p.48) “Uma redução dos salários reais, devida a uma alta de preços, não acompanhada da elevação dos salários nominais, não determina, por via de regra, uma diminuição da oferta de mão-de-obra disponível à base do salário corrente, abaixo do volume de emprego anterior à alta dos preços. Supor o contrário seria admitir que as pessoas no momento desempregadas, embora desejosas de trabalhar ao salário corrente, deixariam de oferecer os seus serviços no caso de uma pequena elevação do custo de vida.” (Keynes, (1996[1936]), p.51-2) 20/04/2017 13 Crítica aos Clássicos • Primeira objeção ao segundo postulado clássico do emprego (ii) Ns: W/P = DMgN Para Keynes, portanto, os trabalhadores defendem seus salários nominais e não os salários reais. A razão da resistência à queda do salário nominal seria a tentativa de proteger os salários reais relativos, enquanto uma elevação generalizada dos preços mantém os salários reais relativos constantes. “Uma vez que a mobilidade do trabalho é imperfeita e os salários não tendem a estabelecer uma exata igualdade de vantagens líquidas para as diferentes ocupações, qualquer indivíduo ou grupo de indivíduos que consinta numa redução dos seus salários nominais em relação a outros sofre uma redução relativa do salário real, o que é suficiente para justificar a sua resistência. Por outro lado, seria impraticável opor-se a qualquer redução dos salários reais que resultasse de alteração no poder aquisitivo do dinheiro e que afetasse igualmente a todos os trabalhadores; com efeito, não há, em geral, resistência a este modo de reduzir os salários nominais, (...) a não ser que essas reduções atinjam tal proporção que o salário real corra o risco de cair abaixo da desutilidade marginal do volume de emprego existente.” (Keynes, (1996[1936]), p.52-3) 20/04/2017 14 Crítica aos Clássicos • Primeira objeção de Keynes ao segundo postulado implica indeterminação do nível de emprego no modelo clássico Se os trabalhadores não determinam a oferta de trabalho apenas em função do salário real, então o nível de emprego fica indeterminado no modelo clássico. Ns W/P (W/P)? Nd N? N “Em outras palavras, pode acontecer que, dentro de certos limites, as exigências da mão-de-obra tendam a um mínimo de salário nominal e não a um mínimo de salário real. A escola clássica presumiu, tacitamente, que este fato não traria uma mudança significativa de sua teoria. Mas isso não é exato, pois, se a oferta de trabalho não for uma função dos salários reais como sua única variável, seu argumento desmorona-se por completo, deixando totalmente indeterminada a questão do que será o nível efetivo de emprego.” (Keynes, (1996[1936]), p.48) 20/04/2017 15 Crítica aos Clássicos • Segunda objeção de Keynes ao segundo postulado clássico do emprego (ii) Ns: W/P = DMgN A segunda objeção de Keynes diz respeito ao fato de o trabalhador não ter poder para negociar o salário real, uma vez que não controla os preços, mas apenas o salário nominal. “Contudo, a outra objeção, de fundamental importância, que formularemos nos capítulos seguintes, decorre de nossa contestação da hipótese de que o nível geral dos salários reais seja diretamente determinado pelo caráter das negociações sobre salários. Ao supor que as negociações sobre salários determinam o salário real, a escola clássica descambou para uma hipótese arbitrária, pois os trabalhadores, em conjunto, não dispõem de nenhum meio de fazer coincidir o equivalente do nível geral de salários nominais expresso em bens de consumo com a desutilidade marginal do volume de emprego existente.” (Keynes, (1996[1936]), p.52) 20/04/2017 16 Crítica aos Clássicos • Segunda objeção de Keynes ao segundo postulado implica ausência de mecanismo de ajuste no mercado de trabalho Se os trabalhadores não negociam salário real com os empresários, então não existe um mecanismo de ajuste automático no mercado de trabalho que assegure o pleno emprego. “A teoria tradicional sustenta, em essência, que as negociações salariais entre trabalhadores e empresários determinam o salário real, de tal modo que, supondo que haja livre-concorrência entre os empregadores e a ausência de combinação restritiva entre os trabalhadores, os últimos poderiam, se desejassem, fazer coincidir os seus salários reais com a desutilidade marginal do volume de emprego oferecido pelos empregadores ao dito salário. Não sendo assim, desaparece qualquer razão para se esperar uma tendência à igualdade entre o salário real e a desutilidade marginal do trabalho.” (Keynes, (1996[1936]), p.50) 20/04/2017 17 Crítica aos Clássicos • Desemprego Involuntário Se uma elevação dos preços for capaz de levar a economia a um maior nível de emprego, então é possível afirmar que esta economia opera com desemprego involuntário. W/P DMgN W1/P1 W1/P2 Nd=f(W/P) N1 N2 N* N “Existem desempregados involuntários quando, no caso de uma ligeira elevação dos preços dos bens de consumo de assalariados relativamente aos salários nominais, tanto a oferta agregada de mão-de-obra disposta a trabalhar pelo salário nominal corrente quanto a procura agregada da mesma ao dito salário são maiores que o volume de emprego existente.” (Keynes, (1996[1936]), p.53) 20/04/2017 18 Crítica aos Clássicos • Teoria clássica como o caso particular de pleno emprego Para Keynes, os clássicos consideravam que a economia operava sempre em pleno emprego, e, portanto, todo desemprego seria friccional ou voluntário (recusa dos trabalhadores de aceitar remuneração compatível com a produtividade marginal). Keynes sugere que os clássicos não percebem que situações por eles consideradas de pleno emprego na verdade refletiam desemprego involuntário. “Por isso, os autores que seguem a tradição clássica, ignorando a hipótese especial em que se baseava a sua teoria, foram levados à conclusão inevitável e perfeitamente lógica, de acordo com essa hipótese, de que o desemprego aparente (salvo as exceções admitidas) era fundamentalmente devido à recusa dos fatores não empregados em aceitar uma remuneração correspondente à sua produtividade marginal.” (Keynes, (1996[1936]), p.54) 20/04/2017 19 Crítica aos Clássicos • Teoria clássica como o caso particular de pleno emprego Para Keynes, a teoria clássica só seria adequada ao caso particular de pleno emprego, não sendo capaz de explicar o funcionamento da economia quando esta opera abaixo do pleno emprego, que seria o caso mais geral . “Contudo, se a teoria clássica é apenas aplicável ao caso do pleno emprego, torna-se obviamente enganoso aplicá-la aos problemas de desemprego involuntário — supondo-se que tal coisa exista (e quem o negará?). Os teóricos da escola clássica são comparáveis aos geômetras euclidianos em um mundo não euclidiano, os quais, descobrindo que, na realidade, as linhas aparentemente paralelas se encontram com muita frequência, as criticam por não se conservarem retas, como único recurso contra as desastrosas interseções que se produzem.” (Keynes, (1996[1936]), p.54) 20/04/2017 20 Crítica aos Clássicos Oferta e Demanda • Clássicos o a moeda é demandada apenas pelo motivo transação e toda poupança é direcionada à aquisição de títulos (oferta de fundos emprestáveis) para viabilizar maior consumo futuro o a taxa de juros promove o ajuste entre a poupança e o investimento (demanda por fundos), assegurando que a demanda seja sempre igual à oferta. “Certamente, o homem prático — banqueiro, funcionário público ou político —, educado na teoria tradicional e, também, o economista profissional vivem na idéia de que sempre que um indivíduo realiza um ato de poupança faz algo que, automaticamente, reduz a taxa de juros e que essa baixa estimula, automaticamente, a criação de capital e de que a baixa na taxa de juros tem lugar, precisamente, na proporção que se necessita para estimular a produção de capital numa amplitude igual ao aumento da poupança; e de que isto é, além do mais, um fenômeno de ajustamento auto-regulador que opera sem necessidade de nenhuma intervenção especial ou de cuidados maternais por parte da autoridade monetária.” (Keynes, (1996[1936]), p.182-3) 20/04/2017 21 Crítica aos Clássicos Oferta e Demanda Y P Y = F(K,N) MV = PY M = Md = k.PY Y1 P1 N N1 W/P Ns=g(W/P) Yd (M1) Y1 r W1/P1 S D = C(r) + I(r) = Y S(r) = Y – C(r) = I(r) r1 I Nd=f(W/P) N1 20/04/2017 Y N S=I I,S 22 Crítica aos Clássicos Oferta e Demanda • Keynes o Em um mundo com incerteza, a poupança é acrescida ao estoque de riqueza, que inclui moeda como ativo o A alocação do portfólio é periodicamente reavaliada em função da preferência pela liquidez e das expectativas de longo prazo dos agentes, em conjunto com os fatores dados e a oferta de moeda o O investimento é determinado pela comparação entre a eficiência marginal dos ativos e a taxa de juros da economia o Nada assegura que a demanda, derivada do investimento e do multiplicador, determinado pela propensão marginal a consumir, será compatível com o pleno emprego o A oferta, determinada em função das expectativas de curto prazo (aproximadamente corretas), ajusta-se à demanda o E a demanda não necessariamente assegura o pleno emprego. 20/04/2017 23 Crítica aos Clássicos Oferta e Demanda • Keynes “Diante disso, o sistema econômico pode encontrar um equilíbrio estável com N em um nível inferior ao pleno emprego, isto é, no nível dado pela interseção da função da procura agregada e da função da oferta agregada — excluídas as hipóteses especiais da teoria clássica, segundo as quais, quando o emprego aumenta, certa força intervém sempre, obrigando D2 a subir o necessário para preencher a lacuna crescente entre Z e D1.” (Keynes, (1996[1936]), p.64) “Já devem ser bastante evidentes para o leitor as dificuldades que se antepõem ao propósito de manter uma demanda efetiva de nível suficientemente alto para garantir o pleno emprego, resultantes da associação de uma taxa de juros a longo prazo convencional e bastante estável com uma eficiência marginal do capital inconstante e altamente instável.” (Keynes, (1996[1936]), p.204) OBS: Z = oferta, D1= demanda por consumo e D2 = demanda por investimento 20/04/2017 24 Crítica aos Clássicos Oferta e Demanda D Z=D D = D1 + D2 D1 = Co + bY PMgC (Fat.Subj) 45o Z,D Z(N) D(N) Z rm Exp. LP, PS I (EMgK, r) N W/P I r DMgN Ms r (Pref.Liq., M) Md 20/04/2017 M Nd N 25 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • Resultado da Teoria Geral de Keynes (desemprego e flutuações) não depende da rigidez de salários nominais. • Mas a análise do efeito de uma redução do salário nominal depende da compreensão de todo arcabouço proposto na TG. “Teria sido preferível examinar os efeitos das variações nos salários nominais em capítulo anterior, pois a teoria clássica tem o costume de basear numa pretensa fluidez dos salários nominais a suposta ap dão do sistema econômico para se ajustar por si mesmo; e, quando há rigidez, de atribuir a essa rigidez a responsabilidade pelos desajustamentos. (...) Uma redução dos salários é capaz, em determinadas circunstâncias, de estimular a produção, tal como o supõe a teoria clássica. A diferença entre esta teoria e a minha reside principalmente na matéria de análise, de modo que não poderia expô-la claramente antes que o leitor estivesse familiarizado com meu método.” (Keynes, (1996[1936]), p.247) 20/04/2017 26 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • A explicação tradicional supõe que desemprego leva à queda de salário real causada por queda de salário nominal acompanhada de queda de preços e consequente estímulo à demanda e produção ao nível de pleno emprego. “A explicação geralmente admitida é, no meu entender, muito simples. Ela não depende das repercussões indiretas, como as que examinaremos em seguida. O argumento consiste simplesmente em que uma redução nos salários nominais es mulará, coeteris paribus, a demanda ao fazer baixar o preço dos produtos acabados, aumentando, portanto, a produção e o emprego até o ponto em que a redução que os operários concordaram aceitar em seus salários nominais fique compensada justamente pela eficiência marginal decrescente do trabalho à medida que aumenta a produção (de determinado equipamento).” (Keynes, (1996[1936]), p.247) 20/04/2017 27 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • Este argumento, contudo, não leva em conta os efeitos da queda de salários nominais sobre a demanda, determinada por MV (=PY). “Em sua forma mais rudimentar, isto equivale a supor que a redução dos salários nominais não afetará a demanda. Há, talvez, alguns economistas que sustentam não haver razão para que a demanda seja afetada, argüindo que a demanda agregada depende da quantidade de moeda multiplicada pela velocidade-renda da mesma, e que não há razão evidente para que uma redução dos salários nominais diminua a quantidade de moeda ou a sua velocidade-renda.” (Keynes, (1996[1936]), p.247-8) 20/04/2017 28 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • A hipótese de que a queda de salários nominais não afeta a demanda, para Keynes, seria falaciosa. “Ninguém pensaria, pois, em negar a proposição de que uma redução dos salários nominais, acompanhada de demanda efetiva agregada idêntica a níveis anteriores, é seguida por um aumento de emprego; mas a questão que se propõe é justamente saber se os salários nominais reduzidos serão ou não acompanhados por uma demanda agregada efetiva que, medida em dinheiro, seja igual à demanda anterior, ou pelo menos não tenha sofrido uma redução plenamente proporcional à dos salários nominais (isto é, que seja um tanto maior, quando medida em unidades de salários).” (Keynes, (1996[1936]), p.249) 20/04/2017 29 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • A análise do efeito da queda de salário nominal sobre a demanda depende do impacto sobre os determinantes da demanda: propensão a consumir, eficiência marginal do capital e taxa de juros. • Se os determinantes permanecerem inalterados, a elevação do emprego e produção como resultado da queda de salários irá gerar perdas ao empresário, que não conseguirá vender toda a oferta adicional de bens e serviços. “Demonstramos que o nível de emprego depende unicamente do da demanda efetiva medida em unidades de salários, e que sendo esta a soma do consumo provável e do investimento provável, não pode variar se a propensão a consumir, a curva da eficiência marginal do capital e a taxa de juros permanecem constantes. Se, na ausência de qualquer modificação nestes elementos, os empresários aumentassem o volume de emprego, seus rendimentos seriam necessariamente inferiores ao preço da oferta.” (Keynes, (1996[1936]), p.249-50) 20/04/2017 30 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • A perda decorre do fato de a elevação de produção gerar elevação da demanda apenas pela elevação do consumo induzido, que não é capaz de realizar toda a oferta adicional, uma vez que a propensão marginal a consumir é menor do que a unidade. • Para que se justifique uma elevação da produção, seria necessário que o investimento aumentasse, cobrindo a diferença entre o novo nível de oferta e o consumo. • Portanto, para que a elevação da produção, frente à queda dos salários nominais, seja sustentável, é preciso haver elevação do investimento, que depende da relação entre a eficiência marginal do capital e a taxa de juros. “Somente se a propensão marginal a consumir da comunidade for igual à unidade, de modo que não haja lacuna entre o incremento dos rendimentos e o incremento do consumo; ou então se houver um aumento no investimento que corresponda à lacuna existente entre o incremento da renda e o incremento do consumo, o que só acontecerá no caso de a curva das eficiências marginais do capital ter aumentado relativamente à taxa de juros.” (Keynes, (1996[1936]), p.250) 20/04/2017 31 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • Caminho possível para redução de salário influenciar positivamente a demanda: “Efeito Keynes” • Elevação dos encaixes reais, via redução de salários e preços, e consequente redução da taxa de juros, favorável ao investimento. “A redução da folha de salário, acompanhada por certa baixa nos preços e nos rendimentos monetários em geral, diminuirá a necessidade de recursos líquidos para o pagamento de rendimentos e para as transaçoões; e, por conseqüência, fará baixar pro tanto a curva da preferência pela liquidez da comunidade em conjunto. Coeteris paribus, isto reduzirá a taxa de juros e será favorável ao investimento.” (Keynes, (1996[1936]), p.251-2) 20/04/2017 32 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • Contudo, na visão de Keynes, é preciso considerar outros impactos da redução de salários sobre a demanda, por meio de variações na propensão a consumir, eficiência marginal do capital e taxa de juros (considerando economia fechada). “Desse modo, a redução dos salários nominais não tenderá a aumentar o emprego durante muito tempo, a não ser pelas suas repercussões sobre a propensão da comunidade em conjunto a consumir, sobre a curva da eficiência marginal do capital ou sobre a taxa de juros. Não há outro método, para analisar as conseqüências de tal redução, que o de acompanhar os seus possíveis efeitos sobre esses três fatores.” (Keynes, (1996[1936]), p.250-1) 20/04/2017 33 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • Em primeiro lugar, o Efeito Keynes seria potencialmente reduzido pela elevação da incerteza e da preferência pela liquidez que acompanha o “descontentamento popular” frente às reduções dos salários nominais, limitando a queda da taxa de juros. “Além disso, se a redução dos salários diminui a confiança no plano político por causa do descontentamento popular, o aumento na preferência pela liquidez decorrente desta causa poderá compensar a liberação de recursos líquidos da circulação ativa. (...) De fato, um movimento dos empregadores com vista a uma redução dos salários nominais pela revisão dos contratos encontrará resistência muito maior que a baixa gradual e automática dos salários reais como resultado da alta dos preços.” (Keynes, (1996[1936]), p.252) 20/04/2017 34 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • Em segundo lugar, mesmo com a queda da taxa de juros, pode não haver elevação do investimento se houver piora na EMgK, resultado de expectativas de reduções subsequentes nos salários; “Se se espera que a baixa dos salários nominais seja uma redução relativamente aos salários nominais no futuro, a mudança será favorável ao investimento, porque, como vimos antes, aumentará a eficiência marginal do capital, ao mesmo tempo que, pela mesma razão, poderá ser favorável ao consumo. Se, por outro lado, a redução leva à expectativa ou, pelo menos, à séria possibilidade de uma baixa posterior, terá justamente o efeito contrário, pois diminuirá a eficiência marginal do capital e provocará o adiamento do investimento e do consumo.” (Keynes, (1996[1936]), p.251) 20/04/2017 35 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • Em terceiro lugar, mesmo que o investimento aumente, pode haver redistribuição de renda, com provável impacto negativo na PMgC; “Uma redução dos salários nominais diminuirá, em certa medida, os preços. Acarretará, portanto, certa redistribuição da renda real (a) dos assalariados para outros fatores que entrem no custo primário marginal e cuja remuneração não tenha sido reduzida, e (b) dos empresários para os rendeiros aos quais se garantiu certo rendimento fixo em termos monetários. (...) Só podemos conjecturar sobre qual será o resultado líquido da soma destas considerações. Provavelmente será mais adverso que favorável.” (Keynes, (1996[1936]), p.2501) 20/04/2017 36 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários o Por fim, a situação pode ser agravada pela elevação do peso do das dívidas em relação ao novo fluxo de renda associado a menores preços. “Por outro lado, a influência deprimente que exerce sobre os empresários a responsabilidade crescente das dívidas pode neutralizar, em parte, qualquer reação otimista proveniente da redução dos salários.” (Keynes, (1996[1936]), p.252) 20/04/2017 37 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • A flexibilidade de preços e salários, cujo principal efeito positivo sobre a demanda depende do impacto sobre a taxa de juros, funciona de maneira análoga à variação da oferta de moeda e está sujeita às mesmas limitações. “As mesmas razões antes mencionadas, que limitam a eficácia dos aumentos na quantidade de dinheiro como meio de elevar o investimento à cifra ótima, aplicam-se, mutatis mutandis, às reduções de salários. Assim como um acréscimo moderado na quantidade de moeda pode exercer uma influência inadequada sobre a taxa de juros a longo prazo, um aumento excessivo pode neutralizar, pelos seus efeitos perturbadores sobre a confiança, as outras vantagens que apresenta; do mesmo modo, uma redução moderada nos salários nominais pode revelar-se pouco eficaz, enquanto a redução exagerada, supondo que fosse exeqüível, poderia destruir a confiança.” (Keynes, (1996[1936]), p.252) 20/04/2017 38 Crítica aos Clássicos Flexibilidade de Salários • Nem a flexibilidade de salários nem a política monetária seriam capazes de assegurar o funcionamento da economia a pleno emprego. “Não há, portanto, motivo para crer que uma política flexível de salários possa manter um estado permanente de pleno emprego, nem como pensar que uma política monetária de mercado aberto possa atingir, sozinha, este resultado. Tais meios não são suficientes para conferir ao sistema econômico a propriedade de se ajustar por si mesmo.” (Keynes, (1996[1936]), p.254) 20/04/2017 39