Desproporção Prótese-Paciente em Indivíduos Submetidos à Troca

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International Journal of Cardiovascular Sciences. 2016;29(2):110-117
ARTIGO ORIGINAL
Desproporção Prótese-Paciente em Indivíduos Submetidos à Troca
Valvar Aórtica
Prosthesis-Patient Mismatch in Individuals Undergoing Aortic Valve Replacement
Ramsés Miotto, Marcos Venicio Garcia Joaquim
Instituto de Cardiologia de Santa Catarina – São José, SC – Brasil
Resumo
Fundamentos: A desproporção prótese-paciente (DPP) em indivíduos submetidos à cirurgia de troca valvar
aórtica é objeto de muitas pesquisas e está associada a piora do prognóstico em longo prazo.
Objetivos: Avaliar a incidência da DPP após cirurgia de troca valvar aórtica e caracterizar o perfil clínico dos
pacientes submetidos a esta cirurgia.
Métodos: Estudo transversal, observacional, retrospectivo com 53 pacientes hospitalizados para tratamento
cirúrgico de estenose valvar aórtica grave, no período de janeiro de 2014 a junho de 2015. Foram utilizados três
modelos de biopróteses e um modelo de prótese metálica. A área de orifício efetivo indexado (AOEi) foi calculada
a partir da divisão da área de orifício efetivo fornecida pelo fabricante da prótese pela área de superfície corporal
do paciente receptor. Definiu-se a presença de DPP quando AOEi <0,90 cm²/m².
Resultados: A média de idade dos pacientes foi 65,8±9,9 anos, predominando o sexo masculino. A mortalidade
geral foi 11,3%. A DPP ocorreu em 32,0% dos pacientes, sendo a maioria de grau moderado. A prótese Biocor
apresentou 70,5% de DPP enquanto a prótese Braile não demonstrou nenhum caso. Não houve diferença na
redução dos gradientes transvalvares aórticos no período pós-operatório entre os grupos com e sem DPP.
Conclusões: O perfil dos pacientes assemelha-se ao descrito na literatura, a incidência de DPP é elevada, variando
muito entre os modelos de próteses. Não houve diferença na redução dos gradientes pós-operatórios entre os
grupos com ou sem DPP.
Palavras-chave: Estenose da valva aórtica; Implante de prótese de valva cardíaca; Ajuste de prótese; Falha de prótese
Abstract (Full texts in English - www.onlineijcs.org)
Background: Prosthesis-patient mismatch (PPM) in patients undergoing aortic valve replacement surgery is the subject of many
research studies and is associated with worse prognosis in the long term.
Objectives: To evaluate the incidence of PPM after aortic valve replacement surgery and characterize the clinical profile of patients
undergoing this surgery.
Methods: Cross-sectional observational retrospective study of 53 patients hospitalized for surgical treatment of severe aortic valve
stenosis from January 2014 to June 2015. Three models of bioprosthesis and a metal prosthesis model were used. Indexed effective
orifice area (iEOA) was calculated by dividing the effective orifice area provided by the prosthesis manufacturer by the body surface
area of the recipient patient. The presence of PPM was defined when iEOA <0.90 cm²/m².
Results: The average age of patients was 65,8±9,9. Male sex prevailed. Overall mortality rate was 11.3%. PPM occurred in 32.0%
of patients, mostly of which were moderate degree. The prosthesis Biocor showed 70.5% of PPM while the Braile prosthesis showed
no case. There was no difference in the reduction of transvalvular aortic gradients in the postoperative period between the groups
with and without PPM.
Conclusions: The patients profile is similar to that described in the literature, the incidence of PPM is high, varying greatly between
the prosthesis models. There was no difference in the reduction of postoperative gradients between the groups with or without PPM.
Keywords: Aortic valve stenosis; Heart valve prosthesis implantation; Prosthesis fitting; Prosthesis failure
Correspondência: Ramsés Miotto
Rua Adolfo Donato da Silva, s/n – Praia Comprida – 88103-901 – São José, SC – Brasil
E-mail: [email protected]
DOI: 10.5935/2359-4802.20160018
Artigo recebido em 01/03/2016, aceito em 12/04/2016, revisado em 28/04/2016.
Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(2):110-117
Artigo Original
Miotto e Joaquim
Desproporção Prótese-Paciente na Troca Valvar
Introdução
Métodos
Estenose aórtica é a valvopatia adquirida mais comum,
e sua relevância, em termos de saúde pública, eleva-se
progressivamente com o envelhecimento populacional,
considerando-se que 2-4% dos indivíduos acima dos
70 anos são acometidos pela doença.1-5 A cirurgia de troca
valvar é o tratamento de escolha para a estenose aórtica,
tendo em vista a importante modificação da evolução
natural conforme foi claramente demonstrado pelos
estudos de Schawrz et al.6 e Pellikka et al.7
Estudo transversal, observacional, retrospectivo com
53 pacientes hospitalizados no Instituto de Cardiologia
de Santa Catarina (ICSC) para tratamento cirúrgico de
estenose valvar aórtica grave, no período de janeiro de
2014 a junho de 2015.
Desde a definição do conceito de desproporção prótesepaciente (DPP) — prosthesis patient mismatch — por
Rahimtoola em 1978, este tema tem sido objeto de
muitas pesquisas, dada a sua
ABREVIATURAS E
influência no prognóstico
ACRÔNIMOS
dos pacientes.8 Considera-se
desproporção prótese•AOEi – área de orifício
paciente quando a relação
efetivo indexado
entre a área de orifício efetivo
•DCE – depuração de
creatinina endógena
da prótese valvar e a área de
superfície corporal do paciente
•DPP – desproporção
for reduzida comparada
prótese-paciente
à valva nativa saudável.
• GM – gradiente transvalvar
médio
Particularmente pacientes
submetidos à troca valvar por
•GP – gradiente de pico
estenose aórtica têm maior
•ICSC – Instituto de
Cardiologia de Santa Catarina
incidência de DPP quando
comparados aos pacientes
com insuficiência aórtica, fato que pode ser explicado
pela degeneração e calcificação do anel aórtico e
consequente estreitamento presente na estenose aórtica;
já a insuficiência aórtica está geralmente associada ao
alargamento do anel aórtico.
Classifica-se a DPP em três níveis de gravidade: leve
quando a área de orifício efetivo indexado for <0,90 cm²/m²
e ≥0,85 cm²/m²; moderada quando for <0,85 cm² e
≥0,65 cm²/m²; e grave quando for <0,65 cm²/m².8-11
A desproporção prótese-paciente está associada a
menor regressão dos sintomas e da hipertrofia
ventricular esquerda, à manutenção dos gradientes
transvalvares elevados, à diminuição da durabilidade
das próteses e ao aumento da mortalidade no longo
prazo.10,12-16
O presente trabalho tem por objetivo avaliar a incidência
da DPP após cirurgia de troca valvar aórtica e
caracterizar o perfil clínico dos pacientes submetidos a
esta cirurgia.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa da instituição sob o nº CAAE
45315515.2.0000.0113. Por ser estudo retrospectivo, houve
dispensa do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Utilizou-se o banco de dados do Serviço de Estatística da
instituição para localizar todos os pacientes submetidos
à troca valvar aórtica no período citado, tendo sido
identificados 93 indivíduos.
Foram incluídos no estudo pacientes com estenose grave
de valva aórtica nativa, submetidos à troca valvar aórtica
(com ou sem revascularização miocárdica associada),
maiores de 18 anos de idade.
Foram excluídos os pacientes com outra valvopatia
moderada ou grave associada, com dupla-lesão valvar
moderada ou grave, portadores de prótese valvar e
aqueles submetidos à retroca valvar.
Ao final foi constituída uma amostra de 53 pacientes,
cujos dados foram coletados através do sistema de
prontuário eletrônico Micromed e do banco de dados do
Serviço de Ecocardiografia da instituição.
As próteses utilizadas e avaliadas neste estudo foram: a
bioprótese Carpentier-Edwards Perimount modelo 2900
do fabricante Edwards Lifesciences (Irvine, California,
USA); a bioprótese Biocor modelo B30 e a prótese
mecânica modelo AJ-501 ambas do fabricante St Jude
Medical (Saint Paul, Minnesota, USA) e a bioprótese
Braile do fabricante Braile Biomédica (São José do Rio
Preto, São Paulo, Brasil). Utilizaram-se os valores da área
de orifício efetivo a partir das especificações técnicas dos
fabricantes, obtidas a partir de ensaios in vitro efetuados
pelos próprios fabricantes (Quadro 1).
Para a coleta de dados, realizada por um dos autores,
utilizou-se uma ficha manuscrita que estabelecia critérios
e rotina para avaliação do prontuário. Os exames de
ecocardiografia foram realizados durante a hospitalização
por médicos cardiologistas habilitados em ecocardiografia,
utilizando o aparelho Vivid E9 equipado com o
transdutor M5S do fabricante GE (Waukesha, Wisconsin,
USA).
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Desproporção Prótese-Paciente na Troca Valvar
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Artigo Original
Quadro 1
Área de orifício efetivo em cm² das próteses valvares
Prótese
Tamanho
19
21
23
25
27
29
Carpentier (cm²)
1,3
1,5
1,8
2,0
2,1
2,2
St Jude Biocor (cm²)
nd
1,2
1,4
1,7
2,1
nd
St Jude Standard (cm²) 1,16 1,51 2,03 2,59 3,08
nd
Braile (cm²)
3,1
1,3
1,6
1,9
2,4
2,6
nd = não disponível
A fração de ejeção foi obtida pelo método biplanar; a área
valvar aórtica pelo método da equação de continuidade
e os gradientes de pico e médio pela técnica de Doppler
contínuo em janela paraesternal esquerda, apical ou
supraclavicular.
A área de superfície corporal foi calculada pela fórmula
de Du Bois17 e a área de orifício efetivo indexada obtida
através da divisão da área de orifício efetivo da prótese
pela área de superfície corporal, de maneira retrospectiva
a partir das medidas antropométricas do prontuário. Tal
medida não influenciou a escolha das próteses pelos
cirurgiões.
Para a depuração de creatinina endógena (DCE), utilizou-se
a fórmula de CKD-EPI 18 que considera o valor da
creatinina sérica, idade, sexo e etnia.
Consideraram-se hipertensos os pacientes que estavam
em uso de medicação anti-hipertensiva; diabéticos,
quando em uso de hipoglicemiantes orais e/ou insulina;
dislipidemia quando havia documentação através de
exames laboratoriais pré-operatórios e/ou uso de
hipolipemiantes.
Definiu-se a presença de doença arterial coronariana
quando existia evento coronariano prévio ou
procedimento coronariano prévio ou coronariografia,
demonstrando estenose superior a 50%. Para a definição
de doença pulmonar obstrutiva crônica utilizou-se
resultado de espirometria quando disponível e/ou uso
de broncodilatadores e corticoide inalatório. Doença
vascular obstrutiva periférica foi definida quando havia
histórico de evento vascular isquêmico prévio, cirurgia
de bypass, angioplastia prévia ou amputação.
Para a estimativa de risco operatório, utilizou-se o
método do EuroSCORE II calculado de maneira
retrospectiva a partir de dados do prontuário, por
meio da calculadora eletrônica disponível no site
www.euroscore.org/calc.html.
Para o diagnóstico eletrocardiográfico de sobrecarga
ventricular esquerda considerou-se o preenchimento de
pelo menos um dos critérios a seguir: Sokolow-Lyon,
Sokolow-Lyon-Rappaport; Lewis; Cornell, GubnerUngerleider e Romhilt-Estes.19,20
Os dados referentes às variáveis categóricas foram
descritos pela contagem absoluta e percentual e
analisados através do teste exato de Fisher ou quiquadrado.
Os dados relacionados às variáveis contínuas foram
expressos em médias e desvios-padrão. A comparação
intra e intergrupos das variáveis contínuas foi realizada
por meio do teste t pareado e/ou não pareado, sendo
considerados significativos os valores de p<0,05. Os
dados foram analisados através do programa Microsoft
Excel®.
Resultados
As características gerais do grupo estão dispostas na
Tabela 1. A amostra foi predominantemente masculina
e com média de idade de 65,8±9,9 anos. A maioria
apresentava manifestação clínica de dispneia (classe
funcional II e III da NYHA) e angina pectoris. O subtipo
predominante da estenose aórtica nestes pacientes foi o
acometimento degenerativo com calcificação.
Em média, os pacientes apresentavam hipertrofia
ventricular esquerda, fração de ejeção preservada e
elevados gradientes transvalvares, conforme pode ser
visto nos dados ecocardiográficos do pré-operatório na
Tabela 2.
O Quadro 1 especifica as áreas de orifício efetivo das
próteses de acordo com o fabricante e com o tamanho
nominal, obtidas a partir de material divulgado pela
indústria (valores obtidos por ensaios in vitro).
A Tabela 3 apresenta os dados referentes ao tempo de
hospitalização e mortalidade hospitalar. Os pacientes
estudados, hospitalizados, aguardaram em média
28,4±12,6 dias para serem submetidos à cirurgia,
totalizando um tempo médio de internação de 45,1±20,2
dias. A mortalidade intra-hospitalar foi 20,0% para os
submetidos à cirurgia combinada e 7,9% para os
submetidos à troca valvar isolada.
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Tabela 1
Características gerais da amostra estudada (n=53)
Variáveis
Idade em anos (média±DP)
Sexo masculino (%)
Valores
65,8 ± 9,9
62,3
Comorbidades (%)
Tabela 2
Características ecocardiográficas pré-operatórias da
amostra estudada
Área valvar aórtica (cm²)
0,7 ± 0,2
Fração de ejeção (%)
57,0 ± 18,9
Espessura do SIV (mm)
14,3 ± 2,7
Hipertensão
56,6
Espessura da PPVE (mm)
13,5 ± 2,4
Diabetes
30,2
Gradiente transvalvar de pico (mmHg)
86,7 ± 26,0
Dislipidemia
39,6
Gradiente transvalvar médio (mmHg)
56,1 ± 19,2
DAC
41,5
DVOP
5,7
DPOC
11,3
DCE < 60 mL/min
26,4
Manifestações clínicas (%)
Dispneia
83,0
Angina
60,4
Síncope
14,0
SVE ao ECG
82,0
Classe funcional (NYHA) (%)
Valores expressos em média±desvio-padrão.
SIV – septo interventricular; PPVE – parede posterior do
ventrículo esquerdo
Tabela 3
Dados referentes à hospitalização da amostra estudada
Dias de internação pré-op (média±DP)
28,4 ± 12,6
Dias de internação na UTI pós-op (média±DP)
8,1 ± 15,6
Dias de pós-op na enfermaria (média±DP)
16,7 ± 17,1
Tempo total de internação (média±DP)
45,1 ± 20,2
Mortalidade hospitalar geral (n, %)
6/53 – 11,3
Classe I
9,6
Classe II
30,8
Classe III
44,2
Classe ignorada
15,4
Mortalidade hospitalar em cirurgia combinada
(n, %)
3/15 – 20,0
1,8 ± 0,2
Mortalidade hospitalar em troca valvar
isolada (n, %)
3/38 – 7,9
Antropometria (média±DP)
Área de superfície corporal (m²)
Peso (kg)
71,0 ± 14,0
Altura (cm)
154,0 ± 32,1
Etiologia da valvopatia (%)
Trivalvular calcificada
75,4
Valva bicúspide
20,8
Doença reumática
3,8
Classificação do EuroSCORE II (média±DP)
2,1 ± 1,6
Troca valvar isolada (n,%)
38/53 – 71,7
Troca valvar combinada com RM (n, %)
15/53 – 28,3
Minutos em CEC (média±DP)
Minutos em clampeamento aórtico
(média±DP)
98,8 ± 40,9
75 ± 28,9
DAC – doença arterial coronariana; DVOP – doença vascular
obstrutiva periférica; DPOC – doença pulmonar obstrutiva crônica;
DCE – depuração de creatinina endógena; SVE – sobrecarga
ventricular esquerda; ECG – eletrocardiograma; NYHA – New York
Heart Association; RM – revascularização do miocárdio;
CEC – circulação extracorpórea; DP – desvio-padrão
Pré-op – pré-operatório; Pós-op – pós-operatório; DP – desvio-padrão
A Tabela 4 expõe os dados ecocardiográficos do período
pós-operatório dos pacientes avaliados: nenhum
apresentou disfunção da prótese ou insuficiência
paravalvar grave; houve insuficiência paravalvar leve
em 15,6% e de grau moderado em 2,2% dos pacientes.
Os gradientes trasvalvares aórticos de pico e
médio foram 31,5±11,3 mmHg e 17,2±7,5 mmHg,
respectivamente.
Não houve diferença estatisticamente significativa da
redução do gradiente transvalvar no pós-operatório
entre os pacientes que apresentaram ou não DPP
(Tabela 5).
Um total de 17 (32,0%) pacientes apresentaram DPP,
sendo que 3 (5,6%) de grau leve, 13 (24,5%) de grau
moderado e 1 (1,8%) paciente de grau grave.
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Tabela 4
Características ecocardiográficas pós-operatórias da
amostra estudada
Disfunção da prótese (%)
0,0
Insuficiência paravalvar leve (%)
15,6
Insuficiência paravalvar moderada (%)
2,2
Insuficiência paravalvar grave (%)
0,0
Gradiente transvalvar de pico (mmHg)
(média±DP)
31,5 ± 11,3
Gradiente transvalvar médio (mmHg)
(média±DP)
17,2 ± 7,5
Analisando por prótese, 10 (18,8%) pacientes foram
submetidos ao implante de prótese biológica Braile; 17
(32,0%) receberam prótese St Jude Biocor, 8 (15,0%)
receberam prótese Carpentier e 18 (34,0%) pacientes
receberam prótese metálica St. Jude Standard. Todos os
53 pacientes tiveram redução estatisticamente significativa
do gradiente transvalvar de pico (GP) e médio (GM) em
relação ao valor pré-operatório (Figura 1).
Nenhum paciente que recebeu a prótese Braile apresentou
DPP. Apresentaram DPP: para a prótese Biocor, 12 (70,5%)
dos 17 pacientes; para a prótese Carpentier, 3 (37,5%) dos
8 pacientes; e 2 (11,1%) dos 18 pacientes que receberam a
prótese metálica St. Jude Standard.
Entre a prótese Biocor e a Carpentier não houve diferença
estatisticamente significativa em relação à incidência de
DPP. Houve diferença significativa entre a prótese Biocor
e a St. Jude metálica (p=0,005), e entre a prótese Biocor e
Braile (p=0,0001).
Tabela 5
Comparativo de redução dos gradientes entre os grupos estudados
Pacientes com DPP (n=17)
Pacientes sem DPP (n=36)
Valor de p
Grad de pico pré-op
89,4 ± 24,9
85,4 ± 26,7
ns
Grad med pré-op
57,6 ± 18,9
55,4 ± 19,5
ns
Grad de pico pós-op
34,3 ± 10,2
30,3 ± 11,7
ns
Grad med pós-op
17,1 ± 5,6
17,2 ± 8,1
ns
Gradientes de pico e médio pré e pós-operatórios expressos em mmHg
Grad – gradiente; pré-op – pré-operatório; Grad med – gradiente médio; pós-op – pós-operatório; ns – não significativo; DPP – desproporção
prótese-paciente
Figura 1
Distribuição dos casos de DPP e dos gradientes pré e pós-operatórios por prótese.
DPP – desproporção prótese-paciente; GP – gradiente de pico; GM – gradiente médio; pré-op – período pré-operatório; pós-op – período
pós-operatório.
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Discussão
O perfil dos pacientes deste estudo é muito semelhante
ao encontrado por outros autores,11,14,21-26 porém a amostra
estudada apresentou percentual maior de pacientes
portadores de diabetes e doença renal crônica. O maior
número de pacientes com insuficiência renal pode estar
relacionado a diferentes critérios de definição adotados:
enquanto na maior parte dos estudos utilizou-se o valor
de creatinina, no presente estudo utilizou-se o cálculo da
depuração de creatinina endógena.
Todos os pacientes obtiveram redução significativa dos
gradientes transvalvares em relação ao período préoperatório, no entanto, não houve diferença entre os
pacientes com ou sem DPP. Foram encontrados neste estudo
valores médios para o GP em torno de 31,5±11,3 mmHg no
pós-operatório. Flameng et al.14 encontraram diferença
significativa no GP pós-operatório entre os pacientes com
ou sem DPP, com valores médios de 29,0±11,2 mmHg e
22,9±9,3 mmHg, respectivamente.
O estudo de Hanayama et al.25 encontrou média do GP
de 23,9±9,8 mmHg e de 13,6±6,5 mmHg do GM no pósoperatório, e demonstrou diferença significativa, com
menor valor do GM no pós-operatório entre os pacientes
sem DPP.25 Tal contradição dos resultados do presente
estudo provavelmente se deve ao tamanho pequeno da
amostra estudada e ao fato de ter ocorrido ausência de
dados no prontuário referentes ao ecocardiograma do
período pós-operatório.
A mortalidade geral hospitalar encontrada no presente
trabalho foi 11,3%; entretanto para pacientes submetidos
à troca valvar aórtica isolada foi 7,9%, menor que a de
outro estudo realizado no Brasil, em 2011, com pacientes
submetidos à troca valvar aórtica isolada21 e semelhante
à mortalidade geral de 7,2% obtida por Dayan et al.22
Howell et al.23 publicaram trabalho em que obtiveram
mortalidade de 3,8% em amostra de 944 pacientes
submetidos à troca valvar aórtica isolada,23 podendo ser
ainda menor segundo outros autores.24,25,27
Diversos trabalhos demonstram que a cirurgia de troca
valvar aórtica associada à revascularização do miocárdio
aumenta a mortalidade. No presente trabalho encontrou-se
20% de mortalidade hospitalar para a cirurgia combinada,
o que pode ser considerado elevado quando comparado
aos achados na literatura que variam de 5,0 a 8,2%.23,27,28
Existem informações conflitantes a respeito da melhor
metodologia para o cálculo da AOEi. Pibarot et al.9
afirmaram que as medidas a partir de ensaios in vitro são
Miotto e Joaquim
Desproporção Prótese-Paciente na Troca Valvar
semelhantes aos achados in vivo, sugerindo ainda que
para a avaliação de próteses metálicas deva-se utilizar
medidas in vitro, enquanto outros sugerem que os valores
in vitro são superestimados e que se deve basear em
ensaios in vivo realizados a partir da ecocardiografia.29,30
Para a prótese Braile não foi encontrada nenhuma referência
sobre desempenho hemodinâmico in vivo, e foram utilizados
dados in vitro para todas as próteses. Curiosamente, nenhum
paciente submetido ao implante da prótese Braile apresentou
DPP e os gradientes pós-operatórios apresentaram tendência
a serem menores, porém sem significância estatística.
Mesmo considerando que as AOE fornecidas pelos
fabricantes sejam superestimadas, ainda assim, para as
próteses Biocor, St. Jude metálica e Carpentier-Edwards
Perimount 2900 percebe-se grande prevalência de DPP, com
pior desempenho encontrado na prótese Biocor. Da mesma
forma essa proporção de DPP pode estar subestimada pelo
mesmo motivo.
Foram identificados 32,0% de pacientes com DPP no
presente estudo, sendo que somente um (1,88%) paciente
apresentou DPP grave. Kaminishi et al.24 obtiveram, no
total, 8,5% de pacientes com DPP, entretanto em seu
estudo utilizaram somente próteses mecânicas, modelos
stentless e Carpentier que sabidamente têm melhor perfil
hemodinâmico.24 Howell et al.23 concluíram que 8,6% dos
pacientes apresentaram DPP grave, dado muito maior
que o aqui encontrado. Ambos os autores utilizaram
dados in vitro para os cálculos.
Outros autores utilizaram medidas in vivo para o cálculo
da AOEi, entre eles, Blais et al.11 que encontraram 36,0%
de DPP moderada e 2,0% de DPP grave. Bleiziffer et al.30
encontraram 33,4% de DPP moderada e 6,3% de DPP
grave. Flameng et al.14 identificaram 46,0% de DPP
moderada e 4,0% de DPP grave. Yap et al.31 descreveram
6,6% de DPP grave e Dayan et al.22 relataram 62,8% de
DPP moderada e 1,8% de DPP grave.
É possível perceber que existe diferença na incidência de
DPP nos estudos realizados com dados in vivo em
comparação aos realizados com dados in vitro para a
definição de DPP, o que reforça o argumento de que os
valores de ensaios in vitro são superestimados.
A amostra estudada, apesar de ser baseada em dados in
vitro, aproximou-se muito dos estudos que utilizaram dados
in vivo, nos quais se demonstrou que o problema da DPP é
muito frequente, embora os casos graves sejam a minoria.
O problema da DPP é muito frequente na literatura
mundial, assim como no ICSC, onde ocorre prevalência
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Miotto e Joaquim
Desproporção Prótese-Paciente na Troca Valvar
semelhante à de grandes trabalhos. Essa situação clínica
gera implicações prognósticas importantes e deve haver
empenho para minimizá-la, utilizando técnica cirúrgica
para aumento do anel aórtico e implante de próteses com
melhor perfil hemodinâmico.
Em alguns dos prontuários consultados havia ausência
de dados do ecocardiograma de controle antes da alta
hospitalar ou durante o seguimento, o que pode ter
prejudicado o cálculo dos gradientes pós-operatórios,
entretanto, este fato não inviabilizou a pesquisa.
As AOEi foram calculadas com base nas especificações
técnicas do fabricante de cada prótese, e nenhum paciente
foi submetido ao ecocardiograma de controle com intuito
de calcular a AOEi pela equação da continuidade. De
qualquer forma, deve-se tentar evitar a DPP fazendo-se
o cálculo do tamanho da prótese no pré-operatório com
base nas especificações divulgadas pelos fornecedores,
embora estas possam ser obtidas por metodologias não
padronizadas e sofrerem viés comercial da indústria.32
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Artigo Original
Conclusões
As características gerais dos pacientes submetidos à
cirurgia são semelhantes às dos demais estudos
publicados. A incidência de DPP é elevada, entretanto
existem diferenças marcantes entre os modelos de
próteses. Com relação aos gradientes, não houve
diferença significativa entre os pacientes portadores ou
não de DPP.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
Vinculação acadêmica
Este artigo representa parte do Trabalho de Conclusão de
Curso (TCC) de Ramsés Miotto para o Programa de Residência
Médica em Cardiologia do Instituto de Cardiologia de Santa
Catarina.
Referências
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