LEGALIZAÇÃO DA MACONHA PARA FINS MEDICINAIS Antonio

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Revista do Curso de Direito da Universidade Braz Cubas
V1 N1: Maio de 2017
LEGALIZAÇÃO DA MACONHA PARA FINS MEDICINAIS
Antonio Carlos Justo de Jesus1
Luis Rodrigues Fernandes2
Paloma Sampaio Elias3
André Ricardo Gomes de Souza4
RESUMO:A maconha é o psicoativo mais utilizado na história. Com mais de 400 substâncias, a
cannabis sativa possui 60 tipos de canabinóides, dentre os quais dois se destacam pela finalidade
terapêutica: o tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CDB). O THC, não obstante seus efeitos
medicinais, possui efeitos cognitivos e psicológicos conhecidos como “barato” da planta, o que traz um
entrave ao seu uso. No entanto, o CDB vem recebendo expressiva atenção da medicina. Isso por causa
dos seus benefícios em diversas patologias e por não causar, a princípio, dependência química – pois os
estudos acerca disto foram inconclusivos. No presente estudo, buscou-se focar nos recentes casos de
pacientes que utilizam a maconha de forma medicinal, e que buscam na justiça o direito a importar e/ou
cultivar a planta em busca de uma melhor qualidade de vida. Por fim, com bases nos inúmeros benefícios
terapêuticos da maconha, acentua-se o direito à vida e à dignidade da pessoa humana como direitos
supremos.
PALAVRAS-CHAVE: Cannabis sativa, Uso medicinal, Canabidiol, Vida, Dignidade da Pessoa Humana.
SUMÁRIO: Introdução. 1 Breve Histórico; 2 Principais Componentes Medicinais da Maconha, seus
Benefícios e Possíveis Contraindicações; 3 O Uso Terapêutico da Cannabis Sativa; 3.1 Casos no brasil;
3.1.1 Anny Fischer; 3.1.2 Gustavo Guedes; 3.1.3 Benício; 4 Principais Países que Legalizaram o Uso
Medicinal da Cannabis Sativa; 5 Canabidiol: Decisões Judiciais levam à Retirada da Substância da Lista
de Proibições da Anvisa; 6 Recentes Sinais de Avanço no Uso dos Medicamentos Formulados com
Canabidiol e Tetrahidrocannabinol (THC); 7 O Direito. 7.1 Legislação Brasileira Referente à Maconha;
7.2 O Direito à Vida e à Dignidade da Pessoa Humana x Uso Medicinal da Cannabis Sativa; 8
Conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO
Segundo Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (2012), Cannabis sativa
conhecida como maconha é a substância ilícita mais consumida no mundo. Países como
Portugal, Espanha, Canadá, Uruguai, Estados Unidos da América (19 Estados) Holanda
e Israel, dentre outros, legalizaram a maconha e fazem uso de suas propriedades
terapêuticas. Estudos têm demonstrado em larga escala que o uso dos elementos
1Graduando no Curso de Direito da Universidade Braz Cubas.
2Graduando no Curso de Direito da Universidade Braz Cubas.
3Graduando no Curso de Direito da Universidade Braz Cubas.
4 Mestrado em POLÍTICAS PÚBLICAS pela Universidade de Mogi das Cruzes, Brasil(2016). Docente
da Universidade Braz Cubas , Brasil
presentes na planta para fins medicinais é indicado para o tratamento de diversas
doenças como epilepsia, câncer e dor crônica.
A legislação brasileira classifica a maconha como droga ilícita e proíbe a sua posse, a
aquisição e transporte.
O debate sobre o uso da maconha medicinal no Brasil cresceu muito desde 2014,
quando casos de crianças com epilepsia e outras doenças tratáveis com canabidiol
surgiram na mídia.
A partir daí, muitos pacientes passaram a recorrer à Justiça para conseguir autorização e
importar medicamentos produzidos com o princípio ativo da maconha.
No final de 2014, o Conselho Federal de Medicina liberou o uso de composto. Em
janeiro de 2015, a Anvisa tirou o canabidiol de sua lista de substâncias proibidas. Com
base em inúmeros relatos dos benefícios da planta, pretende-se com esta pesquisa
verificar os avanços na legalização da maconha para fins medicinais no Brasil.
1 BREVE HISTÓRICO
A Cannabis sativa, conhecida como maconha,é uma planta que apresenta propriedades
terapêuticas e vem sendo utilizada, há séculos, pelo mundo para diversos fins; é um
arbusto pertencente à família Moraceae, denominada popularmente por cânhamo da
Índia (Honório, 2006).
Os primeiros relatos de sua presença no Brasil datam do século XVIII para a produção
de fibras, o cultivo e beneficiamento desta planta teve apoio da Coroa Portuguesa em
lugares como Santa Catarina (1747), Rio Grande de São Pedro (entre 1762 e 1766) e
Rio de Janeiro (a partir de 1772). No entanto, acredita-se que a planta já existe há mais
tempo, tendo sido utilizada pelos escravos (CEBRID).
Em 1961, a Convenção Única de Drogas Narcóticas proibiu seu porte, consumo e
comercialização, sendo a cannabis reconhecida como droga ilícita mais consumida no
mundo. Atualmente há criticas quanto à lógica utilizada na época para classificação das
substâncias psicoativas em lícitas e ilícitas, arbitrária e sem relação com o potencial
destas substâncias em causar danos ao indivíduo que as usa (Pamplona, 2014).
2 PRINCIPAIS COMPONENTES MEDICINAIS DA MACONHA, SEUS
BENEFÍCIOS E POSSÍVEIS CONTRAINDICAÇÕES
Muitos dos efeitos positivos da utilização da maconha são amplamente divulgados e
ricamente provados, mas os seus efeitos negativos ainda permeiam os diálogos sobre
sua legalização para fins terapêuticos e até mesmo em Países onde já se utiliza
medicamentos derivados de elementos isolados da planta, ainda há receios quanto o uso
da maconhain natura (MENEZES, 2014).
Após muitos estudos sobre a cannabis sativa, apurou-se os efeitos terapêuticos da
planta. A maconha possui cerca de 400 compostos químicos, contando com 60
canabinóides, que são princípios ativos específicos (MONTEIRO, 2014).
Entre estes, dois destacam-se por suas propriedades medicinais: o tetrahidrocanabinol
(THC) e o canabidiol (CDB). Conforme os estudos, esse principal constituinte da droga
(THC), os ligantes endógenos e os canabinóides, em pacientes oncológicos possuem
uma ação analgésica, antitumoral, trazem o aumento do apetite, proporcionam um
relaxamento muscular e a redução da insônia (MONTEIRO, 2014).
Da mesma forma, no caso de pacientes com dor crônica, o uso de canabinóides trata a
dor, melhora o humor e o sono. Também, os pacientes com esclerose múltipla ou dor
neurogênica não tratável relataram os benefícios dos canabinóides, incluindo redução da
ansiedade, da depressão, bem como dos espasmos musculares e da dor (MONTEIRO,
2014).
No entanto, o tetrahidrocanabinol (THC), em que pese seus efeitos terapêuticos, é,
também, a principal substância psicoativa da planta, ou seja, que "dá o barato” e que
pode causar dependência química. É, portanto, o maior entrave ao seu uso medicinal
(MONTEIRO, 2014).
Outro composto com efeito terapêutico e que vem sendo bastante conhecido no Brasil é
o canabidiol (CBD). Este vem recebendo atenção específica desde que Katiele e
Norberto Fischer, pais de Anny, com cinco anos de idade, conseguiram o direito de
importá-lo para controlar as graves convulsões causadas pela síndrome CDKL5 que
acomete a menina. Ao contrário do THC, o CBD não tem efeito entorpecente
(MONTEIRO, 2014).
Segundo o Seminário da Câmara dos Deputados Comissão de Seguridade Social e
Família sobre o uso medicinal do canabidiol, em consulta a base de dados da PUBMED
(US National Library of Medicine National Institutes of Health), identificou-se em
torno de 500 artigos científicos que fazem referência a efeitos terapêuticos do canabidiol
como: anticonvulsivante, alzheimer, esquizofrenia, doença de Parkinson, esclerose
múltipla, transtorno do pânico, HIV, câncer, glaucoma, asma, epilepsia, entre outros
(BUCARESKY, 2014).
Embora a planta não tenha a propriedade de curar essas doenças, seus componentes têm
se mostrado efetivos para tornar melhor a qualidade de vida dos pacientes.
Deste modo, o uso terapêutico da cannabis sativa tem causado grandes debates entre a
comunidade médica, científica e também a jurídica. Isso porque, em que pese os
inúmeros estudos, não existe uma comprovação fática de que esse uso cause ou não
dependência química.
3 O USO TERAPÊUTICO DA CANNABIS SATIVA
3.1 Casos no Brasil
3.1.1 Anny Fischer
Conforme matéria publicada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região em um site
jurídico, o juiz federal Bruno César Bandeira Apolinário, da 3ª Vara da Seção
Judiciária do DF (SJDF), antecipou os efeitos da tutela do caso da criança Anny de
Bortoli Fischer, de apenas 5 anos, acometida de uma doença rara e muito grave,
decorrente de mutações no gene CDLK5, denominada encefalopatia epiléptica infantil
precoce tipo 2.
Anny sofre com crises convulsivas devido à enfermidade, mesmo já tendo passado por
uma cirurgia para implante de marca-passo no nervo vago. A criança chegou a sofrer
80 convulsões por semana, conforme relatou nos autos o médico Wagner Afonso
Teixeira, neurologista da Universidade de São Paulo. Exauridas as terapias
convencionais para a debelação das reiteradas crises convulsivas, decidiram os pais
recorrer a um tratamento alternativo com o uso do Canabidiol, substância extraída da
planta Cannabis Sativa, popularmente conhecida como maconha, em face das notícias
veiculadas na literatura especializada sobre a eficácia dessa substância no controle dos
sintomas da doença, trecho da decisão.
No relatório, o neurologista confirma que a paciente apresentou melhora expressiva
após a administração do medicamento feito à base do Canabidiol, chegando a se ver
praticamente livre das crises convulsivas. Com o sucesso da experiência, considerada
pela genitora da paciente um milagre, o médico Wagner Teixeira recomendou a
manutenção do medicamento, advertindo que sua retirada pode implicar o retorno das
crises motoras e, consequentemente, a exposição da autora ao risco de morte, parte
extraída da decisão.
O juiz federal Bruno César, adverte que, pelos termos em que posta a questão pela
autora, não se pretende com a presente demanda fazer apologia do uso terapêutico da
Cannabis Sativa, a maconha, no tratamento da encefalopatia epiléptica infantil precoce
tipo 2, menos ainda da liberação de seu uso para qualquer fim em nosso país.
De acordo com o parecer elaborado pelo Departamento de Neurociências e Ciências
do Comportamento da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da USP, de autoria
do psiquiatra Antonio Zuardi, o Canabidiol, cuja importação se pretende, é apenas um
dos 80 canabinóides presentes na Cannabis Sativa, precisamente aquele que não
produz os efeitos típicos da planta (euforia, despersonalização, distorção sensorial,
alucinações, delírios), que são resultantes, em verdade, de outro canabinóide, o Delta9-Tetrahidrocanabinol (THC).
Na decisão, o juiz federal ressalta não haver razões para criticar a atuação da Anvisa,
pois, diante da circunstância de se tratar de importação de medicamento desconhecido
no mercado brasileiro, não se poderia exigir da agência responsável pela vigilância
sanitária conduta diversa da que adotou, num primeiro momento, com a retenção do
produto, cautelarmente, para a colheita de informações que permitissem a conclusão
sobre a possibilidade de liberação do medicamento para uso interno sem risco ao
destinatário.
Contudo, continua o magistrado em sua decisão, uma vez esclarecido o grave estado
de saúde da paciente a quem o medicamento se destina e demonstrada a premência da
autora na sua obtenção com vistas à preservação dos ganhos obtidos até aqui com sua
administração, inclusive com a drástica redução do risco de morte, entendo que não há
justificativa para a permanência da retenção do produto pela Anvisa.
Por fim, ficou determinado que a Agência se abstenha de impedir a importação, pela
autora, da substância Canabidiol, sempre que houver requisição médica.
3.1.2 Gustavo Guedes
Em contrapartida, em matéria publicada no site do G1, no dia 01 de junho de 2014, uma
história parecida com a de Anny não teve o mesmo desfecho. Morreu em Brasília o
menino Gustavo Guedes, de 1 ano e 4 meses, vítima de complicações de uma síndrome
grave que ataca o sistema nervoso e provoca ataques epiléticos diariamente, a síndrome
de Dravet.
Meses antes, a família do garoto buscou a justiça com o intuito de obter a autorização da
Anvisa para a importação do Canabidiol (CBD), visando amenizar o número de
convulsões. A agência, por sua vez, autorizou, em caráter excepcional, a família de
Gustavo a importar o medicamento no dia 17 de abril deste ano.
No entanto, o medicamento ficou mais de 10 dias retido na Receita Federal. Em razão
dessa demora na retirada, o garoto só conseguiu usar o medicamento por nove dias,
quando foi internado no hospital e não resistiu a uma série de convulsões.
A morte do menino passará por um processo de investigação conduzido pela própria
Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
3.1.3 Benício
Outro caso semelhante aos supramencionados teve grande repercussão na mídia
nacional. O oncologista Leandro Ramires, pai de Benício, com 6 anos de idade, deu a
“cara à tapa” e publicou na internet diversos vídeos da evolução do filho com o uso do
canabidiol.
Em um dos vídeos, o pai aparece ministrando uma dose de CDB em Benício no meio de
uma crise epilética. Nos demais, ele demonstra a notória melhora do filho e a evolução
no quadro com a administração da substância. Leandro também publicou um vídeo onde
explica como elabora a mistura de canabidiol com iogurte e óleo de gergelim.
“Beni”, como o próprio pai se refere ao menino nos vídeos, foi diagnosticado em
novembro de 2011 com a síndrome de Dravet, uma das doenças que determinam um
quadro de epilepsia de difícil controle.
Segundo
o
pai,
em
recente
entrevista
a
um
veículo
de
comunicação:
“Os médicos receitaram diversos medicamentos fortes para a doença de Benício. Mas,
mesmo tomando 13 comprimidos por dia, as crises diárias continuavam. Foi então que
eu soube que os pais de Anny estavam usando o Canabidiol para medicar a filha. Entrei
em contato e eles me passaram o caminho das pedras, a estratégia para trazer ao Brasil.
[...]. O produto é fabricado na Califórnia e vem em seringa plástica, na forma de pasta”.
Leandro, que, à época, ainda não tinha a autorização da ANVISA para a importação da
substância, afirmou categoricamente que: “Não existe autoridade no Brasil que me
impeça de dar CBD ao meu filho. Sei que importando o produto posso ser condenado
por três crimes: tráfico internacional de drogas, articulação por tráfico e por dar a
substância para o meu filho. Não tenho dúvida dos benefícios do CBD. Se for impedido
de fazer isso, eu imigro para o Uruguai”.
O médico afirma que Benício apresentou uma excelente resposta ao canabidiol. O filho,
que antes tampouco olhava nos olhos do pai, passou a entender a função dos objetos,
interagir melhor com ele e com as pessoas e dormir à noite toda. O bruxismo também
diminuiu.
Para o pai, o mais importante do tratamento é que as crises, que eram diárias,
diminuíram drasticamente. Em 76 dias de tratamento, foram apenas seis crises e bem
leves.
4 PRINCIPAIS PAÍSES QUE LEGALIZARAM O USO MEDICINAL DA
CANNABIS SATIVA
Mesmo com tantos benefícios, o uso terapêutico da cannabis é ilegal na maioria dos
países do mundo. Embora em muitos deles a droga tenha sido descriminalizada, os
medicamentos com seus componentes ainda não são regularizados, o que torna o
tratamento difícil e extremamente burocrático para quem precisa dele.
Entre os países que liberam o uso médico da maconha estão Estados Unidos, Itália,
Canadá, Espanha, Israel, Uruguai e Reino Unido. Os três principais países em que o uso
terapêutico da cannabis já foi aprovado:
4.1 ESTADOS UNIDOS
Os EUA é um dos países mais avançados no que diz respeito à regularização da
maconha medicinal. Hoje, 22 estados mais o distrito de Columbia tem regras efetivas
que permitem o consumo da planta em suas mais variadas formas, mediante uma
prescrição médica. Além destes, outros 10 estados já liberaram o uso da cannabis com
fins terapêuticos para um determinado número de pacientes ou oferecem um programa
de pesquisa do qual é possível fazer parte (Rasmussen, 2015).
Estima-se que só no estado da Califórnia, em 2012, 30 mil pessoas usavam a maconha
ou medicamentos nela baseados como parte de tratamentos médicos (Rasmussen, 2015).
4.2 URUGUAI
Em 23 de dezembro de 2013, o presidente uruguaio, José “Pepe” Mujica, assinou a lei
que tornou legalizado o consumo e o cultivo de maconha para fins medicinais e
recreativos em todo o Uruguai. A partir dessa data, toda pessoa residente no país teria
direito a se cadastrar em um banco de usuários e comprar a droga diretamente por
produtores regulados pelo Estado (Rasmussen, 2015).
4.3 ISRAEL
Em Israel, a maconha é proibida, mas desde 1992, pacientes que sofrem de
determinadas doenças podem fazer o uso de medicamentos que possuem substâncias da
cannabis. Estima-se que 20 mil pacientes tenham acesso à droga, que é comercializada
não só na forma de flores, para serem fumadas, mas também como óleo, presente em
bolos, chocolates e biscoitos (Rasmussen, 2015).
O país é considerado líder na ciência envolvendo a planta e é o responsável pelo maior
parte das pesquisa farmacêuticas relacionadas à maconha. É o caso da Syqe Medical,
empresa que desenvolveu um inalador que mede as doses usadas no medicamento,
permitindo que o médico tenham um maior controle sobre o tratamento. De acordo com
uma pesquisa realizada em 2013, 75% dos israelenses são a favor da maconha para fins
terapêuticos (Rasmussen, 2015).
5 CANABIDIOL: DECISÕES JUDICIAIS LEVAM À RETIRADA DA
SUBSTÂNCIA DA LISTA DE PROIBIÇÕES DA ANVISA.
Na Portaria da ANVISA, a Cannabis sativa é encontrada na lista de plantas que podem
originar substâncias entorpecentes e/ou psicotrópicas e o THC (tetraidrocanabinol) na
lista das substâncias de uso proscrito no Brasil de substâncias entorpecentes.
Em Janeiro de 2015, o Canabidiol foi retirado da lista de substâncias proibidas da
Portaria da ANVISA. Com isso, o CBD passou a ser controlado e enquadrado na lista
C1 da Portaria 344/98, que define os controles e proibições de substâncias no país.
Decisão esta levada pela grande quantidade de estudos e ações judiciais a favor da
utilização de remédios com este composto nos casos de epilepsia. Essa medida permitirá
a importação dos extratos padronizados produzidos por indústrias farmacêuticas
internacionais para tratar de casos graves da doença.
O Conselho Federal de Medicina, após inúmeros estudos e votações acerca do tema, já
tinha publicado a resolução n° 2.113/14, em dezembro de 2014, aprovando o uso
compassivo do canabidiol para o tratamento de epilepsias da criança e do adolescente
refratárias aos tratamentos convencionais.
Neste sentido, Cristovam Buarque, relator do Parecer da Comissão de Direitos
Humanos sobre a sugestão 8/2014, acrescenta:
O canabidiol tem um papel terapêutico no tratamento de algumas doenças,
especialmente epilepsia e suas consequentes convulsões. Os profissionais
ouvidos também manifestaram, apesar da dúvida de alguns deles, que o
remédio tem efeitos positivos. Prova disto é que o Conselho Regional de
Medicina do Estado de São Paulo – CREMESP autorizou, no dia 10/10/2014,
os médicos filiados a receitarem esse medicamento.
Referida resolução restringe a prescrição do canabidiol de forma compassiva, vale dizer,
apenas às situações em que os tratamentos convencionais conhecidos não apresentam
resultados satisfatórios. O uso compassivo ocorre quando um medicamento novo, ainda
sem registro na Agência Nacional de Vigilância em Saúde (Anvisa), pode ser prescrito
para pacientes com doenças graves e sem alternativa terapêutica satisfatória com
produtos registrados no país.
Por fim, essa resolução também determina que apenas médicos com especialidade em
neurologia e em suas áreas de atuação (neurocirurgia e psiquiatria) podem prescrever o
canabidiol, e o registro obrigatório de prescritores e pacientes junto ao CFM para o
monitoramento da segurança e efeitos colaterais. Da mesma forma, proíbe
expressamente que o médico prescreva a cannabis in natura para uso medicinal, bem
como quaisquer outros de seus derivados, que não o canabidiol.
6 RECENTES SINAIS DE AVANÇO NO USO DOS MEDICAMENTOS
FORMULADOS COM CANABIDIOL E TETRAHIDROCANNABINOL (THC)
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) estabeleceu em Março deste ano
(2016) regras para a prescrição médica e a importação de medicamentos formulados
com canabidiol e tetrahidrocannabinol (THC), princípios ativos extraídos da maconha.
Segundo as novas diretrizes, a importação pode ser feita por pessoa física, para uso
próprio e para tratamento de saúde (DIAS, 2016).
A principal mudança é que a importação de medicamentos com THC, a substância
psicoativa da maconha, está liberada para tratamentos médicos em casos específicos - a
substância, no entanto, permanece na lista de proibições da agência. A decisão é um
avanço na direção de descriminalizar e regulamentar o uso da planta para fins
medicinais - mas ainda parece cedo para falar da liberação da maconha medicinal
(DIAS, 2016).
Na prática: Está autorizada a prescrição médica e a importação de produtos com THC
ou canabidiol como princípios ativos, sem as restrições que até agora eram impostas
(como a concentração de canabidiol e THC). Para isso, o paciente deve apresentar uma
prescrição médica, laudo e declaração de responsabilidade assinada pelo médico e pelo
paciente (DIAS, 2016).
A liberação vai além do óleo de canabidiol, normalmente utilizado em tratamentos de
dores crônicas e convulsões. Por permitir que produtos sejam importados
independentemente da concentração, é possível prescrever e importar até mesmo flores
da cannabis in natura e outros medicamentos feitos à base de THC. Os produtos, porém,
devem estar regularizados em seus países de origem (DIAS, 2016).
O canabidiol é liberado pela Anvisa desde 2015, quando se tornou uma substância
controlada por receita. O THC agora também pode ser importado por receita, porém,
permanece na lista de substâncias proibidas. Produtos com esse princípio ativo só
podem ser receitados e prescritos para casos específicos e com fins medicinais,
seguindo as regras da Anvisa. A liberação também só vale para substâncias produzidas
fora do país: o cultivo da planta também permanece proibido (DIAS, 2016).
Segundo Cristovam Buarque, relator do Parecer da Comissão de Direitos Humanos
sobre a sugestão 8/2014:
Para que o canabidiol fique ao alcance de todos os que dele necessitam, me
parece necessário que lei ordinária autorize aos médicos a prescrição de
medicamentos que contenham canabidiol e associados e de outros produtos
derivados da Cannabis; que regulamente a importação desses medicamentos
e sua distribuição pelo Sistema Único de Saúde aos pacientes de que deles
necessitarem, determinando que o Conselho Federal de Medicina e a Agência
Nacional de Vigilância Sanitária, estabeleçam regulamentos claros e precisos
que garantam o acesso da população a medicamentos que sigam os preceitos
legais para sua comercialização em solo brasileiro. Ao mesmo tempo, essa
legislação deve incentivar a pesquisa científica básica e farmacológica
aplicada, para que instituições brasileiras se capacitem a encontrar
medicamentos e dosagens a partir da Cannabis, a ser produzidos no Brasil.
Deve também incentivar o estudo da Cannabis nas faculdades de medicina,
para que os profissionais da área de saúde tenham acesso ao conhecimento
gerado por pesquisas científicas e se guiem por preceitos científicos
atualizados quando estiverem no exercício da profissão.
7 O DIREITO
7.1 LEGISLAÇÃO BRASILEIRA REFERENTE À MACONHA
No Brasil, a Lei nº 11.343/2006, conhecida como Lei Antidrogas, instituiu o Sistema
Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – SISNAD, estabelecendo normas para
repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas. O artigo nº 66 da Lei
nº 11.343/06, que incrimina a compra, guarda e o porte de substâncias ilícitas é uma
norma penal em branco. Cabe à Secretaria de Vigilância Sanitária (ANVISA), do
Ministério da Saúde especificar quais substâncias são ilícitas (BRASIL, 2006).
Com efeito, o art. 66 da Lei de Drogas ampliou o universo de incidência dos comandos
proibitivos penais, visando proteger o bem jurídico tutelado - saúde pública – não
apenas no pertinente aos entorpecentes, mas também no que se refere a substâncias
outras que se entender igualmente prejudiciais ao mencionado bem.
O artigo nº 66 da referida Lei, dispõe que se denominam drogas substâncias
entorpecentes, psicotrópicas, precursoras e outras sob controle especial, da Portaria
SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998 (BRASIL, 2006).
7.2 O DIREITO À VIDA E À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA X USO
MEDICINAL DA CANNABIS SATIVA
Conforme versa a nossa Constituição Federal de 1988 em seu primeiro artigo, a
República Federativa do Brasil tem como um de seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana(art. 1º, inciso III, da CF/88).
Para Alexandre de Moraes:
Esse
fundamento
afasta
a
ideia
de
predomínio
das
concepções
transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual.
A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta
singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida
e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas,
constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve
assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas
limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem
menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto
seres humanos. (MORAES, 2010)
No mesmo sentido, ressalta Flávia Piovesan que:
Infere-se desses dispositivos quão acentuada é a preocupação da Constituição
em assegurar os valores da dignidade e do bem-estar da pessoa humana,
como imperativo de justiça social.(PIOVESAN, 2012)
Assim, observar tal fundamento é, justamente, atuar de acordo com a justiça. Como
evidentemente se comprova nos casos apresentados, não restam dúvidas que a utilização
da cannabis sativa devolve àquelas pessoas o mínimo de qualidade de vida e de bem-
estar, com a obtenção de uma efetiva dignidade enquanto ser humano (MAGALHÃES,
2015).
Neste sentido, Cristovam Buarque, relator do Parecer da Comissão de Direitos
Humanos sobre a sugestão 8/2014, acrescenta:
Do ponto de vista humanista, é um absurdo negar a milhares de crianças e
adultos o acesso a um remédio de que necessitam para um mínimo de
conforto e redução de sofrimento.
Isso porque, em cada caso, comprovou-se que a cannabis trouxe de volta pequenos
detalhes, mas que para seus familiares eram avanços gigantescos, como, por exemplo,
nos casos de síndromes de epilepsia, voltar a se vestirem sozinhos, a compreender os
objetos e tudo ao seu redor, ou mesmo voltar a ter aquele “olho no olho” com seus
próximos, como afirma a mãe da menina Anny Fisher (MAGALHÃES, 2015).
Desta feita, foi necessário sopesar o que estava em jogo: interesses do Estado em não
liberar o uso de uma planta por esta ser considerada ilícita, mas com comprovados
benefícios medicinais; os interesses de indústrias farmacêuticas com grande influência
nesse cenário; ou, por fim, a qualidade de vida e prolongamento desta com o uso
terapêutico da maconha (MAGALHÃES, 2015).
Nesse mesmo viés, a Carta Magna nos traz no caput do seu artigo 5º, acerca dos direitos
e garantias fundamentais, a garantia “aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade” (BRASIL, 1988).
Assim, os pacientes acometidos por graves doenças e que procuram por diferentes
tratamentos para as suas enfermidades, estão no exercício dessa garantia constitucional,
buscando salvaguardar a sua vida. Se, como já frisado, o uso medicinal da cannabis
prolonga a vida dessas pessoas, afastando o risco de morte natural àquelas patologias,
nada mais justo senão a liberação incondicional do seu uso (MAGALHÃES, 2015).
Em que pese a própria constituição relativizar o direito à vida quando permite a pena de
morte em caso de guerra (art. 5º, XLVII, “a”) (Brasil, 1988), e no Código Penal onde
admite o homicídio em estado de necessidade (art. 24) e em legítima defesa (art. 25), e
também em alguns casos de aborto (art. 128, incisos I e II), este é um direito pleno e
incontestável do cidadão (BRASIL, 1940).
Assim, muito além de se debater a questão da dependência química ou não que por
ventura pode acarretar o uso da cannabis, deve-se refletir à luz das normas
constitucionais e das garantias individuais que a Carta Magna garante aos seus cidadãos.
Até mesmo porque, estão no mercado diversos medicamentos de uso restrito,
popularmente conhecidos como de “tarja preta”, que também causam séria dependência
e não por isso são considerados ilícitos (MAGALHÃES, 2015).
8 CONCLUSÃO
Em que pese as recentes mudanças das regras pela Anvisa, a maconha medicinal ainda
não está longe de ser liberada no Brasil. Isso porque, a autorização da Anvisa saiu em
resposta a uma decisão judicial - e a agência informou, através de nota, que está
adotando medidas judiciais cabíveis para derrubar a ação. “Tanto o canabidiol quanto o
THC não possuem registros no Brasil e, portanto, não têm sua segurança e eficácia
comprovadas”, disse a Anvisa.
A agência argumenta que muitos produtos à base de canabidiol e THC não são
registrados em seus países de origem e, por isso, não foram avaliados por nenhuma
autoridade de saúde competente. “Não é possível garantir a dosagem adequada e a
ausência de contaminantes e tampouco prever os possíveis efeitos adversos, o que
implica em riscos imprevisíveis para a saúde dos pacientes que os utilizarão, inclusive
com reações adversas inesperadas”, justifica a agência.
A regulamentação é fruto da pressão de inúmeros pacientes e da sociedade. Hoje é mais
fácil para os pacientes terem acesso a produtos à base de maconha do que em 2014, mas
o processo ainda é caro e burocrático. E a mudança nas regras avança conforme mudam
as regras da Anvisa, movidas lentamente à base de ações na Justiça.
No Brasil, enquanto não há uma política pública clara para a área, prevalecem as
decisões da Justiça e autorizações da Anvisa. Hoje, considerando as milhares de
autorizações expedidas, já se pode falar que no Brasil existem pessoas fazendo uso
descriminalizado da cannabis.
Acredita-se que a regulamentação do uso medicinal é um passo importante na reforma
da política de drogas quanto à cannabis e que sua descriminalização não significa, salvo
melhor juízo, legalizar o seu uso, mas sim, retirar o caráter criminal de algumas
condutas em relação às drogas.
Assim, entende-se que diante de inúmeras pesquisas sobre os benefícios terapêuticos da
maconha é salutar a discussão sobre sua legalização ou descriminalização para fins
terapêuticos. Portanto, o direito à vida e ao seu pleno gozo com saúde, bem como o
direito à dignidade da pessoa humana, refletem a importância de se revisar as leis e
alterar a política de drogas adotadas pelo Brasil com celeridade.
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Sei
que
posso
ser
condenado
por
três
crimes,
mas
não
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