Raciocínio Lógico Matemático Cap. 3 ‐ Tautologias, Contradições e Contingências Capítulo3 Professor: Sérgio Destácio Faro Tautologias, Contradições e Contingências No capítulo anterior discutimos alguns aspectos da lógica matemática, destacando a importância dos conectivos lógicos e as suas aplicações nas operações lógicas para a elaboração de proposições compostas. Vamos dar continuidade ao estudo da lógica matemática, abordando as tautologias, as contradições e as contingências. É muito provável que você não esteja familiarizado com estes nomes! Vamos estudar cada um deles com muita atenção; e para começar com as tautologias, partiremos de seus significados retirados do dicionário Aurélio. 1. Tautologia Observe que temos como primeiro significado destacado para a palavra tautologia: 1.Vício de linguagem que consiste em dizer, por formas diversas, sempre a mesma coisa: “A gramática usual é uma série de círculos viciosos, uma tautologia infinita.” (João Ribeiro, Cartas Devolvidas, p. 45.) Quanto à tautologia (de tautos, em grego, que exprime a idéia de mesmo, de idêntico), trata-se de outra denominação que recebe o pleonasmo vicioso e se caracteriza pela seguida repetição, por meio de termos diferentes. Portanto, tautologia é dizer sempre a mesma coisa em termos diferentes. É na retórica, um termo ou texto redundante e podemos dizer que em relação à Estilística, tautologia é um vício de linguagem. Mas cuidado, pois nem sempre o pleonasmo é um vício de linguagem. Veja o trecho a seguir retirado do admirável “Soneto da Fidelidade” , de Vinícius de Morais: "De tudo, ao meu amor serei atento/ Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto/ (...) E em seu louvor hei de espalhar meu canto/ E rir meu riso e derramar meu Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 2 pranto (...)". Perceba que neste caso, o pleonasmo é utilizado não como um vício de linguagem e sim como um recurso de estilo. Tudo é uma questão de sensibilidade para perceber quando o emprego é feito de tal forma que caracteriza um vício e quando é utilizado como recurso de estilo. Falando sobre tautologias, pleonasmos e vícios de linguagem, é importante que se tenha muito cuidado com as repetições desnecessárias. Preste atenção como elas têm sido muito utilizadas em nosso cotidiano. Um dos exemplos mais comuns de pleonasmos viciosos é o “subir para cima” ou o “descer para baixo”. Mas há outros, como você pode ver na lista a seguir e que foram utilizados na apresentação (“stand up” ) sobre Tautologia ou Pleonasmo de Leandro Hassum e Marcius Melhem. Assista, você vai gostar! http://br.youtube.com/watch?v=fjzW1bNqvik&feature=related http://www.youtube.com/watch?v=Qbm2w_T4laY&feature=player_embedded#! **** Outra forma de apresentar a lista. Exemplos na linguagem elo de ligação elo de ligação certeza absoluta certeza absoluta quantia exacta quantia exacta nos dias 8, 9 e 10, inclusive nos dias 8, 9 e 10, inclusive juntamente com juntamente com expressamente proibido expressamente proibido em duas metades iguais em duas metades iguais sintomas indicativos sintomas indicativos há anos atrás há anos atrás outra alternativa outra alternativa detalhes minuciosos detalhes minuciosos anexo junto à carta anexo junto à carta todos foram unânimes todos foram unânimes encarar de frente encarar de frente criação nova criação nova retornar de novo retornar de novo Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 3 empréstimo temporário empréstimo temporário surpresa inesperada surpresa inesperada escolha opcional escolha opcional planejar antecipadamente planejar antecipadamente a última versão definitiva a última versão definitiva possivelmente poderá ocorrer possivelmente poderá ocorrer comparecer em pessoa comparecer em pessoa propriedade característica propriedade característica demasiadamente excessivo demasiadamente excessivo a seu critério pessoal a seu critério pessoal seguindo em frente seguindo em frente pessoa humana pessoa humana fato real fato real Como já foi dito, são repetições desnecessárias, perfeitamente dispensáveis! Apenas para ilustrar este fato, considere a expressão utilizada “surpresa inesperada.”... E, por acaso, existe alguma surpresa que seja esperada? É óbvio que não! Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 4 Resumidamente, podemos dizer que tautologia é o termo usado para definir um dos vícios de linguagem. Consiste na repetição de uma idéia de maneira viciada, com palavras diferentes, mas com o mesmo sentido. Feitas estas considerações iniciais, agora vamos entrar de fato no estudo das tautologias na lógica matemática, que é nosso foco principal. Tautologias na Lógica Matemática Vamos partir de um significado dado no dicionário Aurélio, e “entrar” no conceito da tautologia na Lógica Matemática. 4.Lóg. Função lógica que sempre se converte em uma proposição verdadeira sejam quais forem os valores assumidos por suas variáveis. Quando uma proposição composta é sempre verdadeira, então teremos uma tautologia. De outra forma, podemos afirmar que numa tautologia, o valor lógico da proposição composta será sempre verdade (V). Ex.: A proposição composta “p→p” ( Se p, então p) é tautológica. Como assim? Vamos exemplificar: Considere p: O ônibus está lotado. p→p : Se o ônibus está lotado, então o ônibus está lotado.(V). Observou que a proposição composta “p→p” é verdadeira? Você está lembrado que fizemos uso de tabelas-verdade para o estudo das operações lógicas, tais como: conjunção, disjunção, condicional e bicondicional. Deste modo, nosso estudo abrangeu os valores lógicos das proposições simples e das compostas formadas a partir das simples. Vamos, neste capítulo, retomar o estudo das tabelas-verdade. Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 5 Utilizando o conceito de tabela-verdade, temos a seguinte definição para tautologia Definição: Chama-se tautologia, ou proposição tautológica, toda a proposição composta cuja última coluna da sua tabela-verdade encerra somente a letra V (verdade); isto é, tautologia é toda proposição composta cujo valor lógico será sempre V (Verdade) independentemente dos valores lógicos das proposições simples que a compõem. Por esta definição fica fácil entender a razão pela qual a tautologia é denominada, também, de proposição logicamente verdadeira. Vamos partir de alguns exemplos mais triviais; isto é vamos retomar o princípio da Identidade e mostrar que as proposições “p→p” e “p↔p” são tautológicas. É importante também relembrarmos a Tabela de Conectivos lógicos que serão utilizados para compreensão desse capítulo. Tabela dos Conectivos Lógicos Conectivos Significados ^ e v ou , → se...então..., ↔ se e somente se Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 6 Ex.: Vamos partir, por hipótese, que o valor lógico da proposição simples p a seguir é a verdade(V). p: O sonho acabou.(V) p→p: Se o sonho acabou, então o sonho acabou.(V) Podemos representar o exemplo dado por meio da seguinte tabela-verdade: p p p→p V V V Perceba que o valor lógico da proposição condicional p→p é a verdade, e portanto é uma proposição tautológica. Da mesma forma, temos para a bicondicional: p↔p: O sonho acabou, se e somente se o sonho acabou.(V) p p p↔p V V V Observe que, se considerarmos o valor lógico da proposição simples p a falsidade(F). Veja como fica cada etapa. p: O sonho acabou.(F) p→p: Se o sonho acabou, então o sonho acabou.(V) Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 7 Podemos representar o exemplo dado por meio da seguinte tabela-verdade: p p p→p F F V Perceba que o valor lógico da proposição condicional p→p é a verdade, e portanto é uma proposição tautológica. Representando na tabela verdade, temos o seguinte: p p p→p O sonho acabou O sonho acabou Se o sonho acabou, então o sonho acabou V V V Da mesma forma, temos para a bicondicional: p↔p: O sonho acabou, se e somente se o sonho acabou.(V) p p p↔p F F V Novamente temos que a última coluna da tabela-verdade é constituída do valor lógico V (VERDADE). É importante destacar que o que importa é o valor lógico da última coluna da tabela-verdade, não importando os valores lógicos das proposições simples que constituem as proposições compostas. Representando na tabela verdade, temos o seguinte: Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 8 p p p↔p O sonho acabou O sonho acabou O sonho acabou, se e somente se o sonho acabou V V V Ficou claro que as proposições compostas “p→p” ( se p, então p) e “p↔p” ( p, se e somente se p) são tautológicas, isto é sempre serão logicamente verdadeiras? Vamos ver outros exemplos. p: 5 x 12 = 60 (V) ~p: 5 x 12 ≠ 60 (F) p ^ ~p : 5 x 12 = 60 e 5 x 12 ≠ 60 (F) Se tomarmos a negação desta proposição, obteremos a proposição ~ (p ^ ~p) , cujo valor lógico é a verdade, e portanto esta última é tautológica. Vamos representar na tabela-verdade e compreender melhor como ficam os valores lógicos das proposições. p ~p p ^ ~p ~ (p ^ ~p) 5 x 12 = 60 5 x 12 ≠ 60 5 x 12 = 60 e 5x12 ≠ 60 V V F F V Esta proposição ~(p ^ ~p) que é verdadeira pode ser interpretada da seguinte maneira: Dizer que uma proposição não pode ser simultaneamente verdadeira e falsa é sempre verdadeiro. Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 9 Isto não te faz lembrar algum princípio da lógica? Esta é a essência do Princípio da não contradição. Achou confuso, podemos ver um outro exemplo: p: 4 x 10 = 60 (F) ~p: 4 x 10 ≠ 60 (V) p ^ ~p : 4 x 10 = 60 e 4 x 10 ≠ 60 (F) Se tomarmos a negação desta proposição, obteremos a proposição ~(p ^ ~p) , cujo valor lógico é a verdade, e portanto esta última é tautológica. Vamos representar na tabela-verdade e compreender melhor como ficam os valores lógicos das proposições. p ~p p ^ ~p ~ (p ^ ~p) 4 x 10 = 60 4 x 10 ≠ 60 4 x 10 = 60 e 4 x 10 ≠ 60 V F V F V Esta proposição ~(p ^ ~p) que é verdadeira pode ser interpretada da seguinte maneira: Dizer que uma proposição não pode ser simultaneamente falsa e verdadeira é sempre verdadeiro. Já retomamos dois dos três princípios da lógica; falta apenas o Princípio do terceiro excluído. A proposição “p v ~p” ( Princípio do terceiro excluído) é tautológica; isto é sempre será logicamente verdadeira. Vamos verificar isto por meio de um exemplo. Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 10 p: O abacate está podre.(V, por hipótese) ~p: O abacate não está podre.(F) p v ~p: O abacate está podre ou o abacate não está podre (V) Colocando os valores lógicos das proposições na tabela-verdade, obtemos: p ~p p v ~p V F V Aqui ficou mais fácil de perceber, pois se declaro que o abacate está podre ou o abacate não está podre, será sempre uma verdade, pois sendo uma coisa, obviamente, não poderá ser outra. Veja mais um exemplo, agora na Matemática: p: 5 = 6 (F) ~p: 5 ≠ 6 (V) p v ~p: 5 = 6 ou 5 ≠ 6 (V) p ~p p v ~p F V V Vamos representar na tabela-verdade e compreender melhor como ficam os valores lógicos das proposições. p ~p p v ~p 5=6 5≠6 5 = 6 ou 5 ≠ 6 F V V Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 11 Ficou claro que, aqui também, na Matemática, a proposição composta obtida é logicamente verdadeira? 5 = 6 ou 5 ≠ 6 é logicamente verdadeira, pois caso não seja igual, obviamente, será diferente. Conclusão: A proposição composta “p v ~p”, também, é tautológica. Falando ainda sobre tautologia, vamos verificar sua aplicação para a validade de um argumento. E como ponto de partida, considere que: “Um argumento em que a conclusão é uma tautologia é sempre válido, independentemente do que sejam suas premissas.” Vamos ver um exemplo sobre esta afirmação com o seguinte argumento: A Universidade está lotada nesta véspera de feriado. Logo, Zenaide é professora ou Zenaide não é professora. Há uma tendência de considerar argumentos deste tipo como inválido, pois nos parece ilógico uma Universidade estar lotada numa véspera de feriado, mas temos que ter um certo cuidado com estas avaliações precipitadas. Vamos construir a tabela-verdade e perceber melhor como ficam todos os possíveis valores lógicos. Para tanto, vamos considerar: q: A Universidade está lotada nesta véspera de feriado (premissa). p: Zenaide é professora. ~p: Zenaide não é professora. p v ~p: Zenaide é professora ou Zenaide não é professora. (conclusão). Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 12 q p ~p p v ~p Zenaide é professora ou A Universidade está lotada nesta véspera de Zenaide é professora. Zenaide não é professora Zenaide não é professora. (conclusão) feriado (premissa). V V F V V F V V F V F V F F V V Notou que a última coluna é uma proposição composta (a conclusão) que será sempre verdadeira independente do que sejam suas premissas. Assim sendo, esse argumento seria válido mesmo que substituíssemos a premissa dada “A Universidade está lotada nesta véspera de feriado” por qualquer outra. Veja que um argumento que traz uma conclusão que não se relaciona com as premissas pode ser válido, mesmo que pareça estranho. A validade de um argumento depende, somente, do relacionamento lógico entre as premissas e a conclusão. Isto quer dizer que não é papel da Lógica ocupar-se de saber se as premissas são verdadeiras. Seu objetivo é verificar a estruturação do argumento de forma que, independente dos valores lógicos das proposições envolvidas, a veracidade das premissas implica na veracidade da conclusão. Em termos lógicos, isso significa dizer que se um argumento é válido, então a condicional que o representa é sempre verdadeira, independentemente dos valores lógicos das proposições componentes. Em outras palavras, se um argumento é válido, a condicional que o representa é uma tautologia (baseado em Introdução à Lógica Matemática, Prof. Antonio de Almeida Pinho - disponível em: http://br.oocities.com/EJAABR/logica/Apostila_de_Logica.pdf). Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 13 2. Contradições Vimos que a tautologia ou proposição logicamente verdadeira é uma proposição composta sempre verdadeira, independente dos valores lógicos das proposições que a compõe. Já a contradição ou proposição logicamente falsa é uma proposição composta, sempre falsa, independente dos valores lógicos das proposições que a compõe. Note que a negação de uma tautologia é sempre falsa (F), ou seja uma contradição, e vice-versa. Veja o exemplo: p: Verduras são saudáveis. (V) ~p: Verduras não são saudáveis(F) p ^ ~p: Verduras são saudáveis e verduras não são saudáveis (F) Observe que a proposição “p ^ ~p” é uma contradição. Notou que ela é sempre falsa? Não tem sentido dizer que as verduras são saudáveis e não saudáveis, ao mesmo tempo! Como pode? Uma possibilidade exclui a outra! Representado por uma tabela, temos: p ~p p ^ ~p V F F Resumindo, temos: Dizer que uma proposição pode ser simultaneamente verdadeira e falsa é sempre falso. Pense em situações do nosso cotidiano em que utilizamos contradições deste tipo. Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 14 Vamos para um exemplo na matemática. p: 2 é um número ímpar (F) ~p: 2 não é um número ímpar(V) p ^ ~p: 2 é um número ímpar e 2 não é um número ímpar (F) Percebeu melhor que a proposição “p ^ ~p” é uma contradição. Representando na tabela-verdade, temos: p ~p p ^ ~p F V F Vamos representar na tabela-verdade e compreender como ficam os valores lógicos das proposições. p ~p p ^ ~p 2 é um número 2 não é um 2 é um número ímpar e 2 não é um ímpar número ímpar número ímpar F V F Veja que, neste caso, 2 não pode, ser e não ser, número ímpar. Ou é ou não é! Novamente, dizemos que uma possibilidade exclui a outra. Logo, a proposição composta é logicamente falsa e caracterizada por uma contradição! Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 15 3. Contingências Contingência é toda proposição composta que não é tautologia nem contradição. São, também, denominadas proposições contingentes ou proposições indeterminadas. Veja os seguintes exemplos: 1º. p: 5 = 5 (V) ~p: 5 ≠ 5 (F) p→ ~p: se 5=5, então 5≠ 5 (F) 2º. p: 5 = 0 (F) ~p: 5 ≠ 0 (V) p→ ~p: se 5=0, então 5≠ 0 (V) A proposição “p→ ~p” é uma contingência, conforme pode ser visto pela sua tabela verdade: p ~p p→ ~p V F F F V V Perceba que para ser tautologia, a última coluna da tabela-verdade é sempre constituída do valor lógico V e para ser contradição a última coluna da tabela-verdade é sempre constituída do valor lógico F. Perceba que neste caso não ocorre uma coisa nem outra, por isso a proposição “p→ ~p” é considerada contingência ou indeterminada. Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 16 Vamos representar na tabela-verdade e compreender como ficam os valores lógicos das proposições. 1º 2º p ~p p→ ~p 5=5 5≠5 se 5=5, então 5≠ 5 V F F 5=0 5≠0 se 5=0, então 5≠ 0 F V V No próximo capítulo trataremos de ver os conceitos de implicação e equivalência lógicas. Capítulo 3 Professor: Sérgio Destácio Faro 17