Simone Pillatti Sequestro Corneal Felino: relato de casos Porto Alegre/RS 2013 Simone Pillatti Sequestro Corneal Felino: relato de casos Monografia apresentada como requisito para conclusão do Curso de Pós-Graduação, Especialização em Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais, do Centro de Estudos Superiores de Maceió, da Fundação Educaciomal Jayme de Altavila, orientada pela Profª Ms. Angela Aguiar Franzen. Porto Alegre/RS 2013 Simone Pillatti Sequestro Corneal Felino: relato de casos Monografia apresentada como requisito para conclusão do Curso de Pós-Graduação, Especialização em Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais, do Centro de Estudos Superiores de Maceió, da Fundação Educacional Jayme de Altavila, orientada pela Profª Ms. Angela Aguiar Franzen. Porto Alegre/RS, _______ de __________________ de 2013. BANCA EXAMINADORA _______________________________________ Orientador _____________________________________ Avaliador ____________________________________ Avaliador Porto Alegre/RS 2013 AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus pela luz, força e coragem para vencer todos os obstáculos e seguir em frente. Aos meus pais, Clair e Valdaci, pessoas que me ensinaram o valor da vida e me mostraram o caminho do sucesso. Agradeço à minha irmã, Cíntia, que, juntamente com meus pais, não poupou esforços para que eu chegasse até aqui. Amo muito vocês! A todos os meus amigos do coração, os quais compreenderam minha ausência nos últimos tempos e sempre torceram por mim. Aos meus amigos e colegas de trabalho, pelos conselhos e incentivo, que contribuíram para mais essa etapa. A minha orientadora, Ângela Franzen, por sua supervisão, ensinamentos e paciência, a qual estava, sempre, disposta e interessada, durante todo este período. Aos meus colegas do curso de pós-graduação e a todos os professores e funcionários da Equalis, pela amizade e pelas horas agradáveis de aprendizado e lazer, que me foram proporcionadas. “É melhor tentar e falhar, que preocupar-se e ver a vida passar; é melhor tentar, ainda que em vão, que sentar-se fazendo nada até o final. Eu prefiro na chuva caminhar, que em dias tristes em casa me esconder. Prefiro ser feliz, embora louco, que em conformidade viver ...” Martin Luther King RESUMO O sequestro corneal é uma oftalmopatia comum em felinos, acometendo, principalmente, as raças braquicefálicas. Caracteriza-se, clinicamente, pelo aparecimento de uma área pigmentada enegrecida, de intensidade variável, de posição central ou paracentral, na córnea, normalmente acompanhada de desconforto ocular, blefaroespasmo, lacrimejamento, dentre outros sinais clínicos, levando ao comprometimento ocular, a diminuição da visão e até possível perfuração ocular. No presente trabalho, descrevem-se dois casos de felinos da raça Persa, acometidos por sequestro corneal, os quais foram submetidos a tratamentos divergentes: um, com tratamento conservador e outro, cirúrgico. Os resultados sugeriram que a melhor opção de tratamento na literatura e no caso relatado foi a opção cirúrgica de ceratectomia, combinada à ceratoplastia, com uso de flap conjuntival de terceira pálpebra. Palavras-chave: oftalmopatia, felinos, córnea. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Presença de placa enegrecida na córnea central bilateral em um felino .................. 20 Figura 2 - Olho esquerdo de um felino: treze dias após desprendimento da placa com 20 dias de tratamento tópico. Mínima opacidade corneal central ......................................................... 21 Figura 3 - Olho direito de um felino: três dias após desprendimento da placa, com 20 dias de tratamento. Área corneal central com coloração esbranquiçada e vascularização. .................. 21 Figura 4 - Dois meses após alta clínica. Recidiva do sequestro corneal no olho direito, mostrando área central com opacificação da córnea central e presença de neovascularização. .................................................................................................................................................. 22 Figura 5 - Olho esquerdo de um felino apresentando edema corneal, neovascularização e pigmentação escura na área central da córnea. ......................................................................... 24 Figura 6 - Ceratectomia lamelar superficial: Remoção de toda placa necrótica. ..................... 24 Figura 7 - Flap conjuntival de terceira pálpebra com uso de mononylon 3-0 .......................... 25 Figura 8 – Olho felino 21 dias após a realização da cirurgia. Córnea com mínima opacidade central e resquício de vascularização........................................................................................ 25 Figura 9 - Pós-operatório de 30 dias. Córnea de um felino sem vascularização e mínima opacidade central. ..................................................................................................................... 26 LISTA DE ABREVIATURAS DNA: Ácido desoxirribonucléico FHV-1: Herpes vírus felino tipo 1 K+: Potássio mg: Miligramas mm: Milímetro Na+: Sódio PCR: Reação em cadeia da polimerase SUMÁRIO INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 8 1. SEQUESTRO CORNEAL FELINO ................................................................................. 9 1.1. Anatomia e fisiologia da córnea ...................................................................................... 9 1.2. Particularidades em felinos ............................................................................................... 11 1.3. Etiologia ........................................................................................................................... 12 1.4. Sinais clínicos e diagnóstico ............................................................................................. 13 1.5. Tratamento ........................................................................................................................ 15 2. RELATO DE CASOS ....................................................................................................... 19 2.1. Caso 1 ............................................................................................................................... 19 2.2. Caso 2 ............................................................................................................................... 22 3. DISCUSSÃO ...................................................................................................................... 27 CONCLUSÃO ........................................................................................................................ 29 REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 30 8 INTRODUÇÃO Na medicina veterinária, a oftalmologia vem ganhando destaque entre as especialidades na rotina clínica e cirúrgica de pequenos animais. Doenças oftalmológicas em felinos, muitas vezes, estão relacionadas a doenças sistêmicas e, sendo assim, são bastante frequentes. Dentre as particularidades corneanas, em felinos, o sequestro corneal é uma condição caracterizada pelo acúmulo de um estroma dessecado e degenerado na córnea, conferindo uma coloração escura, normalmente localizada na parte central da córnea (GLAZE; GELATT, 2003). A etiologia é desconhecida, embora existam suspeitas que irritação crônica da córnea, infecção por herpes vírus, conformação braquicefálica, alterações palpebrais e do filme lacrimal sejam responsáveis por esta oftalmopatia e que, se não tratados, podem levar à perfuração ocular e cegueira (HERRERA, 2008). Este trabalho teve, como objetivo, uma revisão de literatura e o relato de dois casos distintos de sequestro corneal, em felinos, com o intuito de demonstrar a eficácia da ceratectomia lamelar superficial, utilizando o flap conjuntival de terceira pálpebra como forma de tratamento do sequestro corneal felino. 9 1. SEQUESTRO CORNEAL FELINO 1.1. Anatomia e fisiologia da córnea A córnea é a porção transparente da túnica fibrosa do bulbo ocular e suas funções incluem suporte dos conteúdos intraoculares e refração e transmissão da luz à retina (PIGATTO, 2008). A córnea possui características especiais e diferenciadas, como sua transparência e avascularidade (HERRERA, 2008). A manutenção da transparência e avascularidade da córnea são essenciais para a visão. Para tanto, a transparência corneal baseia-se na ausência de vasos e células sanguíneas, ausência de pigmento, controle do conteúdo aquoso, superfície óptica lisa (fornecida pelo filme lacrimal pré-corneal) e disposição regular e altamente organizada das fibras colágenas (SLATTER, 2005). Histologicamente, a córnea é formada por quatro camadas, sendo elas: epitélio, estroma, membrana de Descemet e endotélio, sendo que alguns autores consideram o filme lacrimal pré-corneal como uma quinta camada da córnea. A espessura da córnea varia entre as espécies, mas é usualmente inferior a 1 mm, sendo a córnea de caninos mais espessa no centro e de felinos mais espessa na periferia (SLATTER, 2005). Herrera (2008) menciona ainda que a córnea de felinos é circular e de dimensões maiores que as de cão. O epitélio corneal é simples, escamoso e não queratinizado, de espessura variável, com padrão básico de membrana basal, células epiteliais basais, células aladas e células superficiais escamosas. Células basais contêm núcleo, mitocôndria e complexo de Golgi e são aderidas à membrana basal por hemi-desmossomos que permitem, ainda, a união do epitélio com o estroma. Com a divisão das células basais, células-filhas são forçadas em direção à superfície, tornando-se achatadas como células aladas e perdendo, gradualmente suas organelas. As células superficiais possuem projeções vilosas pequenas, que ancoram a camada mucóide profunda do filme lacrimal pré-corneal (SLATTER, 2005). O estroma representa 90% da espessura corneal e é formado por fibrócitos chamados ceratócitos, dispostos de maneira ordenada, formando camadas laminares superpostas. Todavia, estes possuem forma alongada, com uma largura uniforme em toda sua longitude e se encontram posicionados, paralelamente, uns contra os outros, em cada lâmina estromal. Esta disposição espacial é uma das características que mantém a transparência corneal (HERRERA, 2008). Segundo Slatter (2005), além dos ceratócitos, o estroma é 10 composto por colágeno e substância fundamental; as fibrilas colágenas paralelas formam folhas interlaçadas ou lamelas, com linfócitos entremeados, macrófagos e neutrófilos. Um espaçamento regular das fibrilas colágenas estromais, além de manter a transparência corneal, distingue o estroma do colágeno no tecido cicatricial e na esclera. As fibrilas colágenas, glicosaminoglicanos e glicoproteínas formam o suporte da estrutura corneal. O período de substituição do colágeno estromal varia com as espécies, mas pode se estender por anos. Ceratócitos são capazes de sintetizar colágeno, glicosaminoglicanos e mucoproteínas da substância fundamental, de transformar em fibrócitos e produzir colágeno não transparente, após a lesão. Posterior ao estroma encontra-se a membrana de Descemet, que é considerada a membrana basal do endotélio. Ela é uma estrutura elástica e, se rompida, suas terminações se enrolam para o interior da câmara anterior. A membrana de Descemet não se cora com o corante de fluoresceína e ela se apresenta como estrutura escura, transparente, salientada no centro da úlcera ou ferida corneal profunda. Tais feridas salientes estão em perigo de serem rompidas (SLATTER, 2005). O endotélio é a camada mais interna da córnea, entra em contato com a câmara anterior e está formada por uma simples linha de células de forma hexagonal que realizam um importante papel fisiológico na manutenção da transparência corneal (HERRERA, 2008; SLATTER, 2005) Uma córnea normal carece de suprimento sanguíneo, portanto, a nutrição advém do plexo arterial da junção da córnea com a esclera e diretamente do humor aquoso localizado na câmara anterior do bulbo ocular (PERIMANN; RODARTE-ALMEIDA, 2011). Segundo Herrera (2008), a nutrição também se realiza através do intercâmbio de oxigênio e substâncias, como a lágrima e capilares limbais. A córnea contém de 75 a 80% de água, no entanto, é relativamente desidratada comparada a outros tecidos do organismo. Este estado de desidratação, chamado de deturgescência, é parte da função do epitélio e do endotélio da córnea. Para tanto, ela é mantida através da remoção de água do interior do estroma corneal, pelas bombas de Na+/K+ localizados, em sua maioria, no endotélio. Portanto, os fatores que podem influenciar, diretamente, nesta taxa de hidratação, são basicamente: a integridade anatômica do epitélio e endotélio, o equilíbrio osmótico e eletrolítico, o metabolismo, a evaporação da água através da superfície anterior e a pressão intraocular (PERIMANN; RODARTE-ALMEIDA, 2011). 11 1.2. Particularidades em felinos Qualquer forma de trauma na superfície da córnea pode resultar em uma úlcera de córnea. As fontes de irritação ou trauma podem ser externas ou derivadas do próprio animal. Embora os reflexos palpebrais sejam normalmente rápidos, a córnea pode ser danificada. Entrópio, distiquíase, triquíase e cílios ectópicos são condições raras no gato, mas devem ser excluídas antes do tratamento. As condições irritativas, crônicas e não tratadas irão impedir a cicatrização da córnea. As dobras nasais e os lagoftalmos com ceratite por exposição são observados em certas raças braquicefálicas (NORSWORTHY, 2009). Segundo Herrera (2008), a abertura palpebral em felinos é pequena permitindo somente a exposição corneal e, em alguns casos, de uma área escleroconjuntival muito pequena quando comparado aos cães. O olho do gato possui mobilidade relativamente reduzida, a qual é compensada com a grande mobilidade da cabeça. A esclera felina é mais elástica que a canina mostrando maior facilidade para o desenvolvimento da buftalmia. A transparência corneal é mantida pelos mesmos mecanismos anatômicos e fisiológicos do cão, no entanto, a córnea do gato é muito mais resistente ao desenvolvimento do edema (HERRERA, 2008). Úlceras corneais superficiais em felinos são, em geral, mais dolorosas que as profundas, pois há uma densidade maior de terminações nervosas sensoriais no epitélio e no estroma superficial. Gatos com descemetocele podem se apresentar com olhos de aparência confortável (CHANDLER et al., 2006). Norsworthy (2009) descreve que não se deve subestimar uma úlcera superficial em um gato, pois ela tem sido associada a uma alta incidência de desenvolvimento de sequestro corneal. Quanto a particularidades ao exame oftálmico em felinos, existem características próprias relacionadas ao exame semiológico, que devem ser levadas em consideração. Por seu temperamento, em muitas ocasiões, o gato responde com indiferença ao teste de ameaça; para a avaliação da capacidade visual pode-se recorrer à prova da bola de algodão ou à utilização de ponteiras de laser (HERRERA, 2008). O corante rosa bengala pode ser usado para corar epitélio desvitalizado e danificado, indicado para detecção de úlceras dentríticas, induzidas por herpes vírus felino (CHANDLER et al., 2006). 12 O teste lacrimal de Schirmer apresenta valores médios, mais baixos que os observados nos caninos e costuma observar-se uma grande variedade entre os valores obtidos em animais normais. Isto pode dever-se ao fato de que o gato apresenta menor quantidade de movimentos de piscar por minuto, o que favorece a uma maior evaporação do filme lacrimal durante a etapa de abertura palpebral (HERRERA, 2008). 1.3. Etiologia O sequestro corneal foi descrito, pela primeira vez, em felinos no ano de 1964, por Roberts (PIGATTO, 2008) e, desde então, continuamente relatado na espécie, sendo considerada uma doença exclusiva em gatos, por alguns autores como Glaze; Gelatt (2003), embora já tenha sido descrito um caso em um cão da raça Shih Tzu (BOUHANNA et al., 2008) e outro caso em um equino (McLELLAN; ARCHER, 2000). A etiologia ainda é desconhecida; várias hipóteses têm sido discutidas e relatadas: trauma corneal, ceratite ulcerativa crônica, predisposição racial, conformação braquicefálica com lagoftalmia, ceratopatia de exposição, irritação crônica da córnea, uso de corticoides tópicos, distrofia corneal primária, alteração do metabolismo estromal, distúrbio neurológico, deficiência qualitativa do filme lacrimal e infecção por herpes vírus tipo 1 (FHV-1) (CULLEN et al., 2005; FEATHERSTONE; SANSOM, 2004; STIVAL; WOUK, 2010). Featherstone e Sansom (2004) e Lacroix (2001) descrevem, ainda, que ceratotomia em grade e cauterização química utilizada como forma de tratamento em úlceras indolentes também podem predispor a doença em gatos. Herrera (2008) cita o uso nitrato de prata e a tintura de iodo como cáusticos químicos que podem produzir o sequestro corneal. Assim como gatos com úlceras corneais que recebem tratamento com corticoides tópicos são mais propensos a desenvolver o sequestro corneal (ANDREW et al., 2001). A conformação braquicefálica de algumas raças como Persa, Himalaia, Exótica, que possuem cabeça redonda, focinho curto, órbita rasa e olhos proeminentes favorecem a lagoftalmia e o entrópio de canto medial, ficando a córnea sujeita à rápida evaporação do filme lacrimal, à irritação e às lesões secundárias, sobretudo na região central (ABREU et al., 2011; ANDREW et al., 2001). As características anatômicas ainda podem levar à irritação crônica da córnea, favorecendo traumatismos e produção de úlceras corneais, sobre as quais o sequestro corneal poderia se estabelecer posteriormente relata Herrera (2008). O porquê de o sequestro corneal afetar apenas felinos e ter predisposição racial, não é sabido, mas pode estar 13 relacionada à característica braquicefálica, mencionada anteriormente, sugerindo que uma ceratite por exposição possa estar envolvida (NEWTON; OLVEIRA, 2000). Para Woerdt (2001) essas raças possuem menor grau de sensibilidade da área central da córnea, comparados a outros gatos domésticos, o que os torna mais predispostos às lesões oculares. Featherstone et al. (2004), em seu trabalho, observaram que o conteúdo lipídico da lágrima era menor em felinos com sequestro corneal, comparados aos animais não afetados. Mas, para Grahn et al. (2005), que avaliaram o filme lacrimal e, qualitativamente, o número de células caliciformes na conjuntiva de gatos com a doença, concluíram que a diminuição do número de células caliciformes, observada no estudo, foi relacionada com a inflamação da córnea e da conjuntiva associada com o sequestro nestes gatos, e não como um evento inicial na patogênese do sequestro de córnea. As células caliciformes em gatos estão sujeitas a diminuir em número quando a conjuntivite se desenvolve. Ceratoconjuntivite seca é rara em gatos, devendo ser considerada a infecção por herpes vírus, quando esse estiver presente, já que a etiologia mais comum em gatos é a destruição da glândula lacrimal por FHV-1 (WOERDT, 2001). O teste de escolha para diagnóstico do FHV-1 é o PCR (HARTLEY, 2010). Contudo, estudos para diagnosticar o envolvimento de FHV-1 na patogenia do sequestro corneal felino, obtiveram resultados insatisfatórios, mostrando animais com a doença sem envolvimento pelo vírus e animais saudáveis, com reação positiva para FHV-1, segundo Herrera (2008). Grahn et al. (2005), também observaram a presença de herpes vírus em córneas de animais que não apresentavam sequestro corneal felino, e consideram improvável que este esteja relacionado com a patogênese da afecção. Para Cullen et al. (2005), a apoptose pode ter um papel importante no sequestro corneal felino, independentemente da presença de DNA de agentes infecciosos como Herpes vírus, Toxoplasma gondii, Chlamydophila felis e Mycoplasma spp. 1.4. Sinais clínicos e diagnóstico O sequestro corneal também é chamado de córnea negra, ceratite necrosante, degeneração focal do epitélio corneal e mumificação corneal (PONTES et al., 2010). A doença afeta mais comumente apenas um olho, mas pode ocorrer bilateralmente, simultaneamente ou em momentos diferentes (ANDREW et al., 2001; 14 HERRERA, 2008). Clinicamente, observa-se uma placa pigmentada, com a coloração oscilando entre uma mancha âmbar difusa a uma lesão preta bem definida (CULLEN et al., 2005; FEATHERSTONE; SANSOM, 2004). Pentlarge (1989) concorda, mas lembra que um sequestro precoce pode aparecer como uma opacidade na córnea de cor âmbar sem nenhuma inflamação simultânea ou sinais de dor ocular. Segundo Herrera (2008), a placa pode apresentar-se com dois aspectos diferentes, uma placa preta, seca, de limites bem definidos, com sua superfície rugosa e que sobrepassa o nível da córnea ou uma placa marrom-escura de limites menos definidos que quase sobrepassa a superfície corneal. Segundo Oriá et al. (2001) a lesão é geralmente na córnea central ou paracentral, circular ou oval e os gatos afetados podem apresentar enoftalmia, protrusão da membrana nictitante e diminuição da atividade e do apetite, devido à dor. Featherstone; Sansom (2004) e Cullen et al. (2005) mencionaram que sinais oculares como: secreção ocular, ulceração de córnea e diferentes graus de neovascularização e edema de córnea, também podem acompanhar o sequestro corneal. Para Slatter (2005) os sinais clínicos mais comuns, além da lesão corneal focal e preto-amarronzada, são epífora e blefaroespasmo. O sequestro de córnea pode permanecer sem evolução por vários anos ou pode se desenvolver rapidamente em dias ou semanas (FEATHERSTONE et al., 2004). Com a cronicidade, se torna mais denso e as bordas podem começar a separar-se do estroma corneano adjacente (ORIÁ et al., 2001). Para Featherstone; Sansom (2004), a lesão pode desprender naturalmente da superfície da córnea, estender a membrana de Descemet ou ocasionar a perfuração da córnea. Herrera (2008) concorda relatando que, quando não realizado o tratamento, a placa pode cair espontaneamente, mas geralmente ocorre recidiva. O sequestro não é corado por fluoresceína, mas as áreas circunjacentes à lesão podem aparecer fracamente coradas (GALERA et al., 2008; GLAZE; GELATT, 1999). O teste com rosa de bengala pode ser positivo, ocorrendo impregnação pelo epitélio degenerado (ANDREW et al., 2001; ORIÁ et al., 2001). O diagnóstico baseia-se na aparência clínica característica do sequestro corneal (ANDREW et al., 2001; GLAZE; GELATT, 1999). Andrew et al. (2001) mencionaram em seu trabalho que as principais queixas, dos proprietários, foram secreção ocular, estrabismo, lacrimejamento, mudança de cor na córnea, vermelhidão e diminuição do apetite e da atividade devido a dor. Muitos gatos têm uma história de sinais oculares crônicos que são notados pela primeira vez pelo proprietário meses ou até anos anteriores à apresentação clínica. Dor ocular pode ser bastante grave e é atribuível à exposição de terminações nervosas 15 do estroma em torno da periferia da placa. Durante o exame oftalmológico os principais achados foram vascularização da córnea, edema de córnea, conjuntivite, entrópio, blefaroespasmo, fotofobia e todos os casos apresentaram sequestro de córnea central. No trabalho em que Featherstone; Sansom (2004) avaliaram 64 gatos, as queixas foram as mesmas relatadas pelos proprietários no trabalho anterior, mas o exame oftalmológico diferenciou-se por 39 dos casos apresentarem úlcera de córnea. Destes, 32 casos eram indolente/superficial e sete estromal; e dois casos de perfuração ocular. Observaram também que o sequestro corneal foi mais frequente unilateralmente (58 casos) e os outros seis, bilateralmente, sendo o último mais comum na raça Persa. A posição do sequestro corneal variou nos 64 casos, provavelmente devido a um dos fatores predisponentes, o entrópio, que pode influenciar o local de formação, mas na maioria dos casos assim como no relato de Andrew et al. (2001), apresentaram sequestro corneal central. Dor e blefaroconjutivite podem resultar em entrópio por espasticidade, sendo importante avaliar a real necessidade de blefaroplastia (ABREU et al., 2011). 1.5. Tratamento O grau de desconforto ocular e a profundidade da lesão, geralmente, indicam se o tratamento deverá ser clínico ou cirúrgico (STIVAL; WOUK 2010). Alguns autores como Featherstone; Sansom (2004) mencionam que quando não há sinais óbvios de dor ocular e as lesões forem superficiais, um tratamento clínico, com o uso de lubrificantes oculares e antimicrobianos pode levar ao desprendimento espontâneo da placa. Entretanto, a extrusão da placa pode levar anos e a terapia ocular e a dor poderão ser prolongadas. Andrew et al. (2001) concordam que o tratamento clínico com uso de medicações tópicas pode ser utilizado, mas, lembra que muitas vezes mostra resultados pobres e uma elevada taxa de recorrência. Segundo Pigatto (2008), mesmo que exista a possibilidade de desprendimento espontâneo do sequestro de córnea em alguns casos, o tratamento clínico deve ser evitado. Além do tratamento conservador não apresentar bons resultados, a demora na realização do tratamento cirúrgico poderá levar à perda da visão devido à conjuntivalização da córnea ou perfuração ocular. Herrera (2008) concorda e afirma que tratamentos tópicos não dão resultados e, dependendo da profundidade, a ceratectomia superficial associada a diferentes técnicas de ceratoplastia para proporcionar suporte, é a forma mais apropriada de tratamento. 16 Primeiramente, deve-se identificar e corrigir quaisquer causas subjacentes (GLAZE; GELATT, 1999), tais como: entrópio, triquíase, distiquíase, ceratoconjuntive seca, lagoftalmia, exoftalmia, conjuntivite crônica. O estado sistêmico também deve ser acompanhado, pois muitos gatos com sequestro apresentam baixa imunidade (PIGATTO, 2008). Particular atenção deve ser focada na conformação das pálpebras e função, sensibilidade da córnea, membrana conjuntiva e crescimento de pelos aberrantes (PENTLARGE, 1996). Após, a ceratectomia lamelar é indicada para a retirada da placa necrótica, bem como de todo o tecido pigmentado. Quando realizada precocemente, promove rápido alívio do desconforto ocular e remissão dos sinais clínicos (BOUHANNA et al., 2008; FEATHERSTONE; SANSOM, 2004). A ceratectomia lamelar é a remoção do epitélio corneal ou estromal, que pode ser completa ou parcial. A incisão inicial é feita sob magnificação com uma lâmina de bisturi de Beaver nº 64 ou de Bard-Parker nº15 e a dissecção é continuada com um elevador corneal de Martinez. O estroma é removido em uma única porção em direção ao limbo, no qual ele é incisado com uma tesoura corneal ou um bisturi. Todo procedimento é realizado com uso de microscópico cirúrgico adequado. No pós-operatório, a córnea é coberta por um recobrimento de terceira pálpebra ou corada diariamente com fluoresceína, para avaliar a epitelização, e antibióticos e atropina tópicos são aplicados (SLATTER, 2005). O recobrimento da córnea, pela terceira pálpebra, após a cirurgia, tem o intuito de facilitar a cicatrização, a redução de dor e a prevenção de lesões posteriores. A técnica é simples e quando corretamente realizada não causa desconforto para o animal. A membrana pode ser suturada à conjuntiva bulbar ou à palpebra superior. A sutura conjuntival tem a vantagem de possibilitar a movimentação da terceira pálpebra, juntamente com o globo ocular, resultando em menor movimento relativo entre a superfície da córnea e a superfície bulbar da membrana. No entanto, esta técnica tem a desvantagem de se desprender da conjuntiva mais cedo do que quando fixada na pálpebra superior (SLATTER, 2005). Na realização do recobrimento de terceira pálpebra, com fixação à conjuntiva bulbar superior, a sutura central está posicionada a 2 mm da margem palpebral. O ponto na conjuntiva é posicionado a 7 mm do limbo e uma sutura em padrão colchoeiro horizontal é utilizada. A agulha passa de volta através da pálpebra, a 2 mm do primeiro braço do fio de sutura, e cerrada em padrão colchoeiro horizontal simples com a extremidade sendo cortada a 5 a 10 mm do nó. Outras duas suturas são ainda posicionadas. As suturas não tocam a córnea (SLATTER, 2005). 17 O recobrimento pela terceira pálpebra proporciona, por vezes, resultados satisfatórios, sobretudo na indisponibilidade de instrumental exigido na execução de técnicas mais elaboradas, caso contrário, quando realizadas ceratectomias profundas são necessários enxertos de conjuntiva, para dar mais apoio à córnea, melhorar o conforto pós-cirúrgico do gato e ajudar na cicatrização da córnea (ORIÁ et al., 2001). Além do recobrimento com uso da terceira pálpebra, existem outras opções disponíveis para proteção da córnea, como o flap conjuntival e as lentes de contato terapêuticas específicas para felinos (GLAZE; GELATT, 1999; PENTAGE, 1996). A utilização de lentes de contato terapêuticas, embora pouco utilizadas, são lentes hidrofílicas, que permitem o emprego de medicações, bem como, nutrição corneal, pelo filme lacrimal précorneal, além de ser permeável ao oxigênio e ter textura macia. Tem função de proteger a córnea dos movimentos palpebrais, favorecendo a adesão do epitélio recém-formado ao estroma adjacente, e permitir ótima visualização da superfície corneal, durante a fase de cicatrização (ALMEIDA et al., 2008). Ainda entre as possibilidades de ceratoplastia Herrera (2008) relata o emprego da transposição corneoconjuntival, que consiste na realização de um pedículo corneoconjuntival, o qual é deslizado até a zona onde foi realizada a ceratectomia. Para Featherstone; Sansom (2004), os enxertos pediculados conjuntivais e corneoconjuntivais são preferíveis, mas, em seu estudo, não observaram diferença significativa na taxa de recidiva entre os olhos que receberam enxerto dos que não receberam. Acredita-se que a presença de pigmento residual após a ceratectomia aumenta o risco de recorrência de sequestro corneal felino. Pontes et al. (2010), concluíram que a membrana amniótica bovina, preservada em glicerina a 99%, a temperatura ambiente, é eficaz no tratamento de sequestro corneal felino e de úlceras não responsivas à terapia clínica. Sua utilização permitiu a reparação da córnea e o restabelecimento de, aproximadamente, 90% da sua transparência, nos dois casos de sequestro corneal felino, abordados pelo autor. Tem sido descrita ainda a utilização de córneas canina ou felina, congelada, e submucosa de intestino delgado, como forma de recobrimento corneal (HERRERA, 2008). O tratamento pós-operatório visa prevenir infecções, diminuir dor e inflamação. Stades et al. (1999) citam o uso de antibióticos tópicos de amplo espectro, em forma de pomada ou colírios e relata que eventual formação cicatricial depende, principalmente, da profundidade do sequestro, sendo que o defeito normalmente requer de uma a quatro semanas 18 de tratamento. Pontes et al. (2010), também descrevem o uso de antibiótico e antiinflamatório não esteroidal pré e pós-cirúrgicos, em todos os casos relatados. Nos casos em que há suspeita de infecção pelo FHV-1 pode-se indicar a utilização de L-lisina, por via oral, e antivirais tópicos, como idoxuridina 0,5%, no periodo pré e pósoperatório, em função da presença de agentes virais, que dificultam a cicatrização (ABREU et al., 2011). A terapia tópica com o extrato de Triticum vulgare, em conjunto à realização do procedimento cirúrgico foi descrito como benéfica, relativamente à evolução da cicatrização corneal (GALERA et al., 2008). 19 2. RELATO DE CASOS 2.1. Caso 1 Um felino da raça Persa de quatro anos de idade, macho, castrado, foi atendido na clínica veterinária com queixa principal de blefaroespasmo, pigmentação escura nos dois olhos, há cerca de oito meses. Durante a anamense, a proprietária mencionou o uso de produto tópico, à base de dexametasona e cloranfenicol por conta própria logo no início do aparecimento de lesões como olho vermelho, coceira e lesão de aspecto puntiforme no olho. Essas alterações se manifestaram, inicialmente, apenas no olho esquerdo e, após o uso das medicações citadas, notou que o animal conseguia abrir os olhos, coçava menos, sentia menos dor, mas observou aparecimento da lesão no olho contralateral. Consultou outro médico veterinário, o qual indicou tratamento tópico à base de dexametasona com neomicina e lubrificante ocular, duas vezes ao dia, por um período de 30 dias e não observou melhora; sendo assim, procurou um médico veterinário oftalmologista. Ao exame clínico, foi notada uma placa enegrecida central bilateral e neovascularização (Figura 1). Ao exame com fluoresceína, notou-se mínima pigmentação ao redor da placa enegrecida. O animal não apresentava entrópio ou outras alterações palpebrais. Suspeitou-se que o animal estivesse infectado por herpes vírus, devido à falta de vacinação e à vida ao ar livre, em contato com outros felinos de procedência desconhecida. Devido às caraterísticas da lesão, sinais clínicos, raça e espécie do animal, diagnosticou ser sequestro corneal felino bilateral. O tratamento sugerido foi cirúrgico, ressaltando a gravidade do quadro e risco de perfuração ocular. Iniciou-se tratamento tópico com colírio antiviral (Idoxuridina 0,5%, a cada 4horas) e tobramicina colírio, cinco vezes ao dia, e uso de colar elizabetano. Junto, iniciou-se tratamento oral com L-lisina (250mg/gato, 2 vezes ao dia por 30 dias) précirúrgico. Devido às restrições financeiras da proprietária, a mesma não marcou a data do procedimento cirúrgico, mas iniciou o tratamento indicado. Após uma semana de tratamento, ela observou o desprendimento da placa enegrecida, no primeiro olho afetado (olho esquerdo) (Figura 2); 10 dias depois, o pigmento do olho direito desprendeu-se (Figura 3). 20 Após o desprendimento das placas, foi indicado o uso de colírio tópico, à base de tobramicina e dexametasona pomada, duas vezes ao dia, por um período de 20 dias, não sendo realizado nenhum tipo de recobrimento da córnea. O animal teve alta clínica 30 dias após, apresentando mínima opacidade corneal, mas sem sinais de vascularização, em ambos os olhos. Dois meses após alta clínica, o animal apresenta novamente pigmentação de coloração esbranquiçada e presença de neovascularição no olho direito, recidivando o quadro de sequestro corneal felino (Figura 4). Fonte: Fotografado pela autora. Figura 1 - Presença de placa enegrecida na córnea central bilateral em um felino. 21 Fonte: Fotografado pela autora. Figura 2 - Olho esquerdo de um felino: treze dias após desprendimento da placa com 20 dias de tratamento tópico. Mínima opacidade corneal central. Fonte: Fotografado pela autora. Figura 3 - Olho direito de um felino: três dias após desprendimento da placa, com 20 dias de tratamento. Aréa da córnea central com coloração esbranquiçada e vascularização. 22 Fonte: Fotografado pela autora. Figura 4 - Dois meses após alta clínica. Recidiva do sequestro corneal no olho direito, mostrando área central com opacificação da córnea central e presença de neovascularização. 2.2. Caso 2 Foi atendido na clínica veterinária um felino, macho, raça Persa, adulto, com queixa principal de bleraespasmo e mudança de coloração no olho esquerdo. Durante a anamnese, a proprietária relatou que o animal foi encontrado na rua havia cerca de seis meses. Levou-o para avaliação geral em uma clínica veterinária onde o médico veterinário não examinou os olhos. Durante o primeiro mês de adaptação em casa, notou que o animal piscava bastante, mas não havia observado outra alteração, até então. Após, notou que o olho esquerdo estava mudando de cor e permanecia fechado, demonstrando desconforto. Exame oftálmico: Teste de fluoresceína positivo, edema de córnea, neovascularização e presença de pigmento de coloração escura, na área central da córnea no olho esquerdo (Figura 5). Sem demais alterações. 23 Através dos sinais clínicos, anamnese, espécie e raça diagnosticou-se como sequestro corneal central unilateral. O tratamento indicado foi o cirúrgico, mas o uso de medicações pré-cirúrgicas, como o uso de antiviral (idoxuridina 0,5% a cada 4 horas), antibiótico tópico à base de tobramicina 5 vezes ao dia, L-Lisina na dose de 250mg/gato, duas vezes ao dia e uso de colar elizabetano também foram solicitados. Exames laboratoriais como: pesquisa de hematozoários e bioquímicos apresentaram resultados dentro da normalidade. Já o hemograma apresentou discreta linfopenia. O procedimento cirúrgico realizado foi ceratectomia lamelar superficial, associado à ceratoplastia, com flap conjuntival de terceira pálpebra. O animal foi submetido à anestesia geral inalatória, posicionado em decúbito lateral direito, ficando o olho afetado (esquerdo) para cima. O campo operatório, assim como a antissepssia foram preparados de maneira rotineira. Utilizou-se microscópio cirúrgico e material cirúrgico oftalmológico. Retirou-se uma camada de epitélio e estroma superficial, com bisturi nº 24. Foi removida a placa necrótica, até obter-se ausência de pigmento (Figura 6). Um flap de terceira pálpebra conjuntival foi empregado para proporcionar conforto e proteção, e para completa cicatrização da córnea, utilizando fio de mononylon 3-0 (Figura 7). No pós-operatório, o animal foi mantido com colar elizabetano e continuou com as medicacões indicadas anteriormente. Após 21 dias, ele retornou para retirada dos pontos do flap de terceira pálpebra. No exame oftálmico, notou-se mínima opacidade corneal e resquício de vascularização no local onde foi removido o sequestro corneal (Figura 8). Após 30 dias de tratamento, o paciente recebeu alta já que não apresentava vascularização e a córnea apresentava-se quase totalmente transparente (Figura 9). 24 Fonte: Fotografado pela autora. Figura 5 - Olho esquerdo de um felino apresentando edema corneal, neovascularização e pigmentação escura na área central da córnea. Fonte: Fotografado pela autora. Figura 6 - Ceratectomia lamelar superficial: Remoção de toda placa necrótica. 25 Fonte: Fotografado pela autora. Figura 7 - Flap conjuntival de terceira pálpebra com uso de mononylon 3-0. Fonte: Fotografado pela autora. Figura 8 –Olho felino 21 dias após a realização da cirurgia. Córnea com mínima opacidade central e resquício de vascularização. 26 Fonte: Fotografado pela autora. Figura 9 - Pós-operatório de 30 dias. Córnea sem vascularização, mínima opacidade central. 27 3. DISCUSSÃO O sequestro corneal felino é uma doença oftalmológica com grande repercussão na clínica de pequenos animais, pela grande incidência de felinos de raças braquicefálicas, principalmente Persas (HERRERA, 2008; PONTES et al., 2010), que foi a raça dos gatos relatados neste trabalho. Foram relatados dois casos que apresentaram lesões semelhantes, em relação à localização e coloração do sequestro. Segundo Featherstone; Sansom (2004) e Cullen et al., (2005) observa-se uma placa pigmentada, com coloração, oscilando entre uma mancha âmbar difusa a uma lesão preta bem definida. Para Glaze; Gellat (1999), essa aparência clínica é bastante característica. Andrew et al. (2001), concorda e designa as lesões como patognomônicas. Apesar das semelhanças das lesões, foram utilizados tratamentos diferentes. No caso 1, utilizou-se tratamento conservador, com uso de corticosteroides tópicos, lubrificantes e antibiótico tópico, observando-se desprendimento do sequestro corneal bilateral. Entretanto, os resultados não foram satisfatórios, já que ouve recidiva do caso. Pigatto (2008) concorda e ressalva que o tratamento conservador pode levar à perda da visão, devido à conjuntivalização da córnea ou perfuração ocular, além de levar meses a anos para o desaparecimento do sequestro, fazendo com que os animais convivam com a dor cronicamente, estando sujeitos à recorrência. No caso 2, optou-se pelo tratamento cirúrgico, utilizando a técnica de ceratectomia lamelar superficial, associada à ceratoplastia, a qual está de acordo com Bouhanna, et al. (2008) e Featherstone; Sansom (2004), que promove rápido alívio do desconforto ocular e remissão dos sinais clínicos. A técnica de ceratoplastia, utilizando flap de terceira pálpebra, também é descrita por Oriá et al. (2001), sendo uma prática que proporciona resultados satisfatórios. Utilizou-se o flap conjuntival de terceira pálpebra e percebeu-se ótima cicatrização corneal, sem resquícios de vascularização. Com 30 dias de pós-operatório, observou-se a recuperação da transparência da córnea quase totalmente, além de ser uma técnica simples e de fácil aplicação. Foi utilizada esta técnica por causar pouca leão cicatricial comparando com as demais técnicas, como o uso de lentes de contato (ALMEIDA et al., 2008), utilização de membrana aminiótica bovina (PONTES et al., 2010), enxertos pediculados conjuntivais e corneoconjutivais (FEATHERSTONE; SANSOM, 2004). 28 O uso de medicações, como antibióticos e antivirais (tópicos e por via oral), no período pré e pós-operatório, nos dois casos relatados, também é uma prática descrita por vários autores, como Stades et al. (1999), Abreu et al. (2011), principalmente nos casos em que se suspeite de animais que possam ter tido contato com o herpes vírus. Foi possível comparar as duas terapias descritas na literatura, porém a resposta individual do paciente sempre deve ser considerada. O tratamento cirúrgico obteve sucesso em 30 dias e, em contrapartida, o tratamento conservador apresentou melhora momentânea e recidiva da patologia. Tendo em vista, o tratamento cirúrgico é a indicação e opção para os casos de sequestro corneal em felinos. 29 CONCLUSÃO Observou-se que o sequestro corneal felino é uma doença bastante comum na rotina de clínica de pequenos animais e concordamos com os autores quanto à incidência nas raças braquicefálicas. Neste trabalho, observou-se dois animais com o mesmo diagnóstico e com lesões bastante semelhantes, tendo sido realizados tratamentos divergentes. No primeiro caso, utilizou-se o tratamento conservador por opção da proprietária na qual o resultado não foi satisfatório, prolongando o sofrimento do animal e fazendo com que o seu proprietário tivesse custos aumentados. No segundo caso, realizou-se o tratamento cirúrgico. A opção por tratamento clínico é uma prática utilizada por alguns autores, mas não é um tratamento eficaz, por apresentar risco de perfuração ocular, dor crônica, além dos índices de recidivas. Assim, a técnica de ceratectomia lamelar superficial, com subsequente utilização de flap conjuntival de terceira pálpebra, demonstrou ser uma técnica cirúrgica eficaz para o tratamento do sequestro corneal felino no caso dois. Este procedimento mostrou um excelente resultado estético e devolveu a acuidade visual em um curto espaço de tempo. Estas técnicas, em adição ao tratamento pós-operatório adequado, resultaram em ausência de recidiva do sequestro corneal felino, concluindo que, realmente, é a melhor conduta a ser assumida perante esta patologia. 30 REFERÊNCIAS ABREU, R.C.; HONSHO, S.C.; BOLZAN, A.A.; ORIÁ, P.A. Sequestro corneal felinorevisão. Clínica Veterinária, n. 94, p. 36-42, 2011. ALMEIDA, A. C. V. R. et. al. Uso de lente de contato terapêutica após ceratectomia lamelar em sequestro corneano em um felino-relato de caso. In: 35º Congresso Brasileiro de Medicina Veterinária, 2008; Gramado. Anais. Disponível em: http://www.sovergs.com.br/conbravet2008/anais/cd/resumos/R1043-1.pdf. Acesso em: 20 out. 2012. ANDREW, S.E.; TOU, S.; BROOKS, D.E. Corneoconjunctival transposition for the treatment of feline corneal sequestra: a retrospective study of 17 cases (1990-1998). Veterinary Ophthalmology. v. 4, n. 2, p. 107-111, jun. 2001. BOUHANNA, L.; LISCOËT, L.B.; LETRON, I.R. Corneal stromal sequestration in a dog. 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