CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DA TERAPIA

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CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DA TERAPIA COGNITIVOCOMPORTAMENTAL E DO TRANSTORNO DE COMPULSÃO ALIMENTAR
PERIÓDICA 1
Ana Elisa Vieira 2
Elisabeth Meyer 3
RESUMO
A transição epidemiológica das últimas décadas levou a uma maior prevalência de
indivíduos obesos. O aumento do peso corporal na população está relacionado ao
comportamento alimentar inadequado, que possui bases biológicas, demográficas,
econômicas, socioculturais, não podendo ser atribuído simplesmente ao consumo de
alimentos hipercalóricos. Existem subgrupos de indivíduos obesos que possuem
padrões disfuncionais de alimentação e, por isso, desenvolveram os transtornos
alimentares sem outra especificação, o transtorno de compulsão alimentar periódica
(TCAP). O tratamento da obesidade associada a transtornos mentais e alimentares tem
merecido atenção, particularmente, da psicologia e psiquiatria, que vem dando muita
importância à contribuição da intervenção psicoterápica baseada na terapia cognitiva comportamental. A TCC contribui para a adesão ao tratamento de pacientes com
TCAP e para o controle dos episódios de comer compulsivo. O transtorno de
compulsão alimentar periódica requer tratamento multidisciplinar, sendo importante a
terapia dietética, a terapia cognitivo comportamental, a prática da atividad e física e a
farmacoterapia. O tratamento combinado – TCC mais farmacoterapia – pode apresentar
uma melhor resposta no quadro clínico dos pacientes obesos com TCAP,
demonstrando ser um campo promissor de pesquisa.
Palavras-Chave: obesidade, transtorno de compulsão alimentar periódico, terapia
cognitivo-comportamental.
___________________
1
2
3
Artigo apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Wainer & Piccoloto como requisito parcial para
obtenção do grau de Especialista em Psicologia Clínica.
Psicóloga e Terapeuta cognitivo- comportamental, Docente do Centro Universitário Estácio FIB/BA e do
Centro de Estudos da Família e do Casal – CEFAC. E-mail: [email protected]
Mestre e doutora em Psiquiatria pela UFRGS, Terapeuta Cognitivo-Comportamental com treinamento
intensivo no Programa de Terapia Cognitiva no Beck Institute (Pensilvânia, EUA).
ABSTRACT
The epidemiological transition in recent decades has led to a higher prevalence of
obese individuals. The increase in body weight in the population is related to
inappropriate eating behavior, which has a biological, demographic, economic and
sociocultural basis, and can not simply be attributed to the consumption of highcalorie foods. There are subgroups of obese individuals who have dysfunctional
eating patterns and, therefore, have developed disorders not otherwise specified, the
Binge Eating Disorder (BED). The obesity treatment, associated with mental and
eating disorders, has received attention, particularly, by the Psychology and
Psychiatry, which has given much importance
to the contribution
of the
psychotherapeutic intervention based on Cognitive-Behavioral Therapy (CBT). CBT
contributes to adherence to treatment of patients with BED and control of episodes of
compulsive eating. This one requires multidisciplinary and important dietary therapy,
cognitive behavioral therapy, the practice of physical activity and pharmacotherapy.
The combined treatment of CBT - Pharmacotherapy may have a better clinical
response in obese patients with BED, proving to be a promising field of research.
Keywords: obesity, binge eating disorder, cognitive behavioral therapy.
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INTRODUÇÃO
Durante as últimas décadas, têm-se observado, no Brasil, processos de transição
nutricional, ou seja, uma diminuição progressiva da desnutrição e uma prevalência de
sobrepeso e obesidade na população. Para Nunes (2012), essa ocorrência é consequência
direta da mudança dos hábitos alimentares. O autor pondera que as modificações no âmbito
social, econômico e demográfico atuam direta e indiretamente no consumo e no padrão
alimentar e, consequente, no estado da saúde da população.
No Brasil, 36% da população é obesa ou está com sobrepeso. A Pesquisa de
Orçamentos Familiares (POF), referente ao período de 2008-2009, realizada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) constatou que, a partir de 1974, a população
acima de 20 anos passou a apresentar excesso de peso e obesidade (IBGE, 2011). O excesso
de peso, entre as mulheres, aumentou de 28,7% para 48%. Entre os homens quase triplicou,
de 18,5%, em 1974-75 para 50,1% em 2008-09. Já obesidade cresceu mais de duas vezes
entre as mulheres, de 8% para 16,9% e entre os homens mais de quatro vezes, de 2,8% para
12,4% (Bernardi, Cichelero & Vitolo, 2005). Esse quadro caracteriza o crescimento da
morbimortalidade por Doenças Crônicas Não-Transmissíveis (DCNT), destacando-se, dessa
forma, a obesidade (Malta, Cezário, Moura, Morais & Silva, 2006).
Sabe-se que o aumento do peso corporal na população está relacionado ao
comportamento alimentar inadequado, que possui bases biológicas, demográficas,
econômicas, socioculturais, não podendo ser atribuído simplesmente ao consumo de
alimentos hipercalóricos (Nunes, 2012). De acordo com os resultados da POF 2008-2009, foi
observado que menos de 10% da população brasileira atingiram as recomendações de
consumo de frutas, verduras e legumes; e um excessivo consumo de açúcar e gordura
saturada, ou seja, excessiva ingestão de alimentos de baixo conteúdo nutricional e alto valor
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calórico. As novas tendências de alimentação dos últimos anos, dessa forma, vêm tornando-se
um dos principais fatores do crescimento no número de casos de obesidade no Brasil.
Sendo a obesidade uma condição médica e de etiologia multifatorial, é difícil mensurar
a força de cada um dos fatores envolvidos no processo do ganho excessivo de peso. Os
aspectos emocionais têm sido considerados decisivos para o desencadeamento da obesidade.
Pesquisas recentes mostram que, entre os pacientes que procuram tratamento, a obesidade tem
sido associada a outros transtornos mentais, especialmente à depressão e a ansiedade, o que
sugere que o tratamento da obesidade associada a comorbidades psiquiátricas, deve envolver
métodos terapêuticos de múltipla abordagem e em conjunto (Matos, 2006; Dobrow,
Kamenetz & Devlin, 2002).
No entanto, existem subgrupos de indivíduos obesos que possuem padrões
disfuncionais de alimentação e, por isso, desenvolveram os transtornos alimentares sem outra
especificação: o Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica (TCAP) e a Síndrome do
Comer Noturno (SCN) (Dobrow, Kamenetz & Devlin, 2002).
Os transtornos alimentares acometem entre 15% e 30% dos obesos, sendo comuns
episódios recorrentes de Compulsão Alimentar Periódica (CAP) ou Transtorno de Compulsão
Alimentar Periódica (TCAP) (Matos, 2006). Ambos surgem quando o indivíduo consome
uma quantidade excessiva de alimentos num curto intervalo de tempo, acompanhada de uma
sensação de perda de controle sobre o seu comportamento alimentar, entretanto, sem as
características purgativas da bulimia (Papelbaum & Appolinario, 2001).
Porém, estudos atuais sugerem a presença do TCAP apenas quando os episódios de
CAP ocorrem pelo menos 02 dias por semana, num período de 06 meses, associados a
algumas características de perda de controle, e não são acompanhados de comportamentos
compensatórios dirigidos para a perda de peso (Vitolo, Bortolini & Horta, 2006).
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O Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica é frequente entre os indivíduos
obesos. No Brasil, entre os pacientes que procuram tratamento para emagrecer, 15 a 22%
apresentam TCAP (Appolinario, 1998; Coutinho, 1999 & Borges, 1998).
Pesquisa realizada por (Petribu, et al., 2006) avaliou a frequência de TCAP em casos de
obesidade mórbida em indivíduos candidatos à cirurgia bariátrica e revelou que 56,7% dos
pacientes apresentaram o quadro, sendo 25,4% TCAP moderado e 31,3% grave. A cirurgia
bariátrica serve como uma alternativa para a perda de peso já que os aspectos emocionais
associados à compulsão alimentar terminam dificultando o processo em busca do
emagrecimento.
O tratamento da obesidade associada a transtornos mentais e alimentares tem merecido
atenção, particularmente, da psicologia e da psiquiatria, que vem dando muita importância à
contribuição da intervenção psicoterápica baseada na Terapia Cognitivo - Comportamental
(TCC) (Vasques, Martins & Azevedo, 2004). A TCC tem sido largamente utilizada no
tratamento dos transtornos alimentares e foi considerada a teoria psicológica mais investigada
no TCAP. É baseada no pressuposto de que um sistema de crenças disfuncionais está
relacionado ao desenvolvimento e à manutenção do TCAP. Dessa forma, são aplicadas várias
técnicas cognitivas com o foco na modificação dos pensamentos distorcidos e na
reestruturação de crenças supervalorizadas associadas ao peso e à imagem corporal
(Duchesne, Appolinario, Rangé, Freitas, Papelbaum & Coutinho, 2007).
Esta pesquisa bibliográfica pretendeu enfatizar a evolução do conceito do TCAP, as
bases e os processos que norteiam o comportamento alimentar, fatores psicopatológicos
envolvidos e algumas práticas de tratamento baseadas na TCC.
Para construção desta tarefa, foi realizada revisão de literatura não sistemática com base
na TCC. Inicialmente, utilizou-se as bases de dados eletrônicos MEDLINE, LILACS e
SCIELO, entre outros sites de universidades públicas, estaduais e federais. Para completar a
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busca, foram selecionados capítulos de livros, sempre dando ênfase na literatura referente à
área da psicologia, abordando o TCAP e a TCC como a terapia complementar de maior
relevância para o tratamento clínico do TCAP.
EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE TCAP
O episódio de Compulsão Alimentar Periódica (CAP) foi descrito pioneiramente por
Stunkard em 1959, caracterizado por uma ingestão de enormes quantidades de comida em um
curto espaço de tempo, acompanhada por sentimentos de desconforto físico e de
autocondenação (Borges & Jorge, 2000).
A partir de 1970, surgiram casos de indivíduos que apresentavam a compulsão
alimentar associada a comportamentos compensatórios para prevenção de ganho de peso,
fazendo com que a CAP passasse a ser considera uma síndrome. Em 1977, o conceito
descrito, inicialmente, por Stunkard, foi ampliado e critérios diagnósticos foram
desenvolvidos para a síndrome da compulsão alimentar periódica: a) Ingestão rápida,
impulsiva, episódica e sem controle de grandes quantidades de alimentos em um período de
tempo relativamente curto; b) vômitos auto-induzidos podem ocorrer, mas não são
necessários para o diagnóstico; c) sentimentos subsequentes de culpa, desprezo por si ou
remorso (Borges & Jorge, 2000).
Em 1980, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais ( DSM-III),
assume esses critérios com poucas modificações e denomina o transtorno de “bulimia”.
Russel (1979), pouco antes da publicação do DSM-III, descreveu a bulimia nervosa em um
artigo que denominou “Bulimia nervosa: an ominous variant of anorexia nervosa”, artigo que
se transformou em um marco para que a bulimia nervosa se tornasse uma nova categoria
diagnóstica. Observou que na bulimia existe um medo mórbido de engordar, que leva estes
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indivíduos a comportamentos compensatórios inadequados para prevenção de ganho de peso
e, por isso, acrescentou a palavra “nervosa” ao termo bulimia (Russel, 1979).
O DSM-III-R (1987), baseado nessas concepções, revê esta categoria diagnóstica e
passa a denominá-la “bulimia nervosa”, caracterizando-a por: “a) episódios de voracidade
recorrentes (rápido consumo de uma grande quantidade de alimento em um período limitado
de tempo); b) sentimento de falta de controle sobre o comportamento alimentar durante os
episódios de voracidade; c) empenho da pessoa ou em vômitos auto-induzidos, ou no uso de
laxativos ou diuréticos, dieta restrita ou jejum, ou exercícios vigorosos para prevenir o
aumento de peso; d) média de no mínimo dois episódios bulímicos por semana durante pelo
menos três meses; e) preocupação excessiva e persistente pela forma do corpo e o peso”.
Dessa forma, a bulimia passa a ser uma síndrome caracterizada por comportamentos
compensatórios e não mais de acordo com o DSM-III, no qual este critério não era
absolutamente necessário (Borges & Jorge, 2000).
Diversos grupos envolvidos na criação do DSM IV observaram que entre os indivíduos
obesos que buscavam tratamento em programas universitários envolvendo transtornos
alimentares, vários não preenchiam critérios diagnósticos para anorexia nervosa ou bulimia
nervosa. Muitos obesos apresentavam a compulsão alimentar, mas não os comportamentos
compensatórios para prevenção de ganho de peso, conforme critério sugerido para bulimia
nervosa. Esse fato favoreceu a criação de critérios para uma nova categoria dentre os
transtornos alimentares, o Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica sem outra
especificação (TCAP) (Borges & Jorge, 2000).
O TCAP foi então incluído no Apêndice B do DSM-IV, em 1994, designado para
categorias diagnósticas que ainda requerem ser melhor pesquisadas. O diagnóstico do
“Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica” segue os seguintes critérios:
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a. Episódios recorrentes de compulsão periódica. Um episódio de compulsão
periódica (“binge eating”) é caracterizado por ambos os seguintes critérios: 1 –
ingestão, em um período limitado de tempo (por exemplo, dentro de um
período de duas horas), de uma quantidade de alimento definitivamente maior
do que a maioria das pessoas consumiria em um período similar, sob
circunstâncias similares; 2 – um sentimento de falta de controle sobre o
episódio (por exemplo, um sentimento de não conseguir parar ou controlar o
que ou quanto se está comendo).
b. Os episódios de compulsão periódica (“binge eating”) estão associados a três
(ou mais) dos seguintes critérios: 1 – comer muito mais rapidamente do que o
normal; 2 – comer até sentir-se incomodamente repleto; 3 – comer grandes
quantidades de alimentos, quando não fisicamente faminto; 4 – comer sozinho,
por embaraço pela quantidade de alimentos que consome; 5 – sentir repulsa por
si mesmo, depressão ou demasiada culpa após comer excessivamente.
c. Acentuada angústia relativa à compulsão periódica.
d. A compulsão periódica ocorre, pelo menos dois dias por semana, durante seis
meses. O método de determinação da frequência difere daquele usado para a
bulimia nervosa; futuras pesquisas devem dirigir-se à decisão quanto ao
método preferencial para o estabelecimento de um limiar de frequência, isto é,
contar o número de dias nos quais ocorre a compulsão ou contar o número de
episódios de compulsão periódica.
e. A compulsão periódica não está associada ao uso regular de co mportamentos
compensatórios inadequados (por exemplo, purgação, jejuns, exercícios
excessivos), nem ocorre durante o curso de anorexia nervosa ou bulimia
nervosa.
Já no DSM-V (2013), o “Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica” é
classificado como Transtorno de Compulsão Alimentar sendo aprovado como sua
própria categoria de transtorno alimentar. Sua definição também envolve episódios
recorrentes de ingestão de alimentos significante maior em um curto período de tempo
do que a maioria das pessoas consumiria sob circunstâncias similares, com episódios
marcados por sentimentos de falta de controle.
Segundo o DSM -V (2013), uma
pessoa com TCA pode comer muito rápido, mesmo quando não está com fome. A
pessoa pode ter sentimento de culpa, vergonha ou desgosto e pode, inclusive, ingerir
estes alimentos em segredo para ocultar o comportamento. Este transtorno está
associado a acentuado sofrimento e ocorre, em média, pelo menos uma vez por
semana, durante três meses (Milczarck, Pedrotti, Tag & Bonfante, 2013). Ainda que o
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DSM-V tenha feito essas alterações, para esse estudo, serão mantidos os critérios e a
nomenclatura proposta pelo DSM-IV, ou seja, TCAP.
Quase 2% da população mundial apresentam TCAP e a maioria é obesa. No
Brasil, atualmente, aproximadamente 20% dos indivíduos com compulsão alimentar
foram diagnosticados com TCAP (Azevedo, Santos & Fonseca, 2004). A prevalência
do TCAP entre participantes de programas de emagrecimento pode chegar a 30%,
70% entre participantes de grupos de autoajuda como os comedores compulsivos
anônimos e entre pacientes que procuram tratamento cirúrgico para a obesidade 50%
(Coutinho, 2006).
Assim, a delimitação deste conceito mostrou-se de grande utilidade clínica,
diferenciando um subgrupo de pacientes obesos com características psicopatológicas
marcantes (Papelbaum & Appolinario, 2001).
ASPECTOS PSICOPATOLÓGICOS DO OBESO COM TCAP
A obesidade representa riscos para a saúde do indivíduo e está associada a
doenças como hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares, podendo aumentar
caso seja associada a episódios de compulsão alimentar (Bernardi, Cichelero &
Vitolo, 2005).
Além disso, pacientes com TCAP apresentam níveis maiores de
psicopatologia, sendo que os episódios de compulsão podem estar relacionados com o
hábito alimentar inadequado ou mesmo com sintomas psiquiátricos generalizados
(Coutinho, 1999).
O comportamento alimentar do indivíduo pode estar associado a estados
emocionais negativos como o stress e a restrição alimentar, podendo desencadear a
perda do autocontrole (Cord, Silva, Santos, Moreira & Saron, 2008). Dessa forma, o
estresse é um dos fatores que pode provocar o aumento das compulsões alimentares,
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sendo este comportamento muito frequente entre os pacientes obesos com TCAP. O
cortisol é liberado pelas adrenais durante episódios estressantes, induzindo a uma
série de respostas fisiológicas, como o excessivo consumo de alimentos e o
consequente aumento do peso (Azevedo, Santos & Fonseca, 2004).
A compulsão alimentar também é acompanhada por sentimentos de angústia,
vergonha, nojo e/ou culpa. Em relação aos aspectos psicológicos do transtorno,
constata-se que os pacientes obesos com TCAP possuem autoestima mais baixa e se
preocupam mais com o peso e com a forma corporal do que outros indivíduos que
também têm sobrepeso sem possuírem o transtorno (Dobrow, Kamenetz & Devlin,
2002).
Estudos sobre a comorbidade em TCAP mostraram que os indivíduos com o
transtorno aparentam índices maiores de psicopatologia, especialmente depressão e
transtornos de personalidade, além de características da fobia social, do transtorno de
ansiedade e do transtorno dismórfico corporal (Matos, 2006).
Observa-se que, nos pacientes que apresentam transtorno de personalidade, a
impulsividade pode desencadear episódios de compulsão alimentar periódica. Em
relação ao controle do peso corporal, os pacientes com transtorno do humor e
transtornos de personalidade parecem apresentar mais dificuldades. Além disso, os
sintomas da depressão podem desencadear episódios de compulsão alimentar ou uma
recidiva da compulsão alimentar após um tratamento focado na perda de peso
(Coutinho, 2006).
A ansiedade e a depressão têm sido consideradas os dois fatores psicológicos
mais comuns nos indivíduos com TCAP.
A ansiedade é considerada um estado
emocional transitório ou condição do organismo humano que é caracterizada por
emoções desagradáveis, tensão e apreensão, conscientemente identificados e por
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aumento na atividade do sistema nervoso autônomo. Já a depressão é um transtorno
que afeta o estado de humor da pessoa, deixando-a com um predomínio anormal de
tristeza. Os índices parecem estar aumentando entre jovens e idosos, embora a
depressão ocorra em todas as faixas etárias (Cataneo, Carvalho &Galindo , 2005;
Lafer, Almeida, Fráguas & Miguel, 2000).
Há evidências de que muitos indivíduos obesos comem para solucionar ou
compensar problemas e utilizam o “comer em excesso” como um meio para lidar, por
exemplo, com a ansiedade causada por crises familiares, questões afetivas, sociais,
sexuais e com a insatisfação com sua própria imagem corporal, principalmente entre
as mulheres (Azevedo & Spadotto, 2004).
Avaliando-se os aspectos nutricionais, constata-se que o comportamento
alimentar desenvolvido por pacientes obesos pode ser extremamente prejudicial à
saúde e, quando acompanhada de compulsão alimentar, estes prejuízos são a inda
maiores. Para esses pacientes, a comida serve como apoio emocional, protegendo-os,
inclusive, dos medos (Araújo, 2004).
Dessa forma, faz-se necessária a compreensão não só dos aspectos
psicopatológicos envolvidos no transtorno, mas também da forte influência de hábitos
alimentares não saudáveis na vida dos pacientes compulsivos.
O COMPORTAMENTO ALIMENTAR NA CONTEMPORANEIDADE
A população acometida pelo Transtorno da Compulsão Alimentar é, em sua
maioria, obesa. Normalmente, os ataques compulsivos desses pacientes são por
alimentos que produzem sensações, como o sabor doce que provoca liberação de
endorfinas, representando um alívio para suas tensões (Cord, Silva, Santos, Moreira &
Saron, 2008). Os chocolates, por exemplo, contêm a feniletilamina, que provoca uma
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sensação de euforia semelhante à causada pelas anfetaminas. Além disso, provoca
prazer através da liberação de noradrenalina das terminações nervosas adrenégicas
(Cozza, Souza-Soares & Ruiz, 2000).
Já as refeições ricas em lipídios reduzem níveis de leptina no plasma por 24
horas, o que pode provocar a liberação dos neuropeptídios que tem o objetivo de
aumentar a ingestão alimentar (Cord, Silva, Santos, Moreira & Saron, 2008). Estas
preferências dos indivíduos que têm episódios de compulsão alimentar trazem como
resultado o aumento da fome.
Comedores compulsivos obesos, frequentemente, apresentam variados graus de
obesidade e um histórico de alteração do peso mais acentuada do que indivíduos
obesos sem compulsão alimentar. Alguns insistem no comportamento de restrição
alimentar e, devido aos fracassos repetidos, abandonam quaisquer tentativas de fazer
dietas (Bernardi, Cichelero &Vitolo, 2005).
As mudanças do hábito alimentar ganham destaque na área científica,
principalmente quando relacionadas às patologias decorrentes dessas mudanças.
Nobre (2010) considera que embora o diagnóstico da obesidade, em geral, seja obtido
através das medidas de peso e altura, que permitem o cálculo do Índ ice de Massa
Corpórea (IMC), é preciso mensurar o aparecimento de outras patologias que são
comumente associadas à obesidade. Entre as principais doenças, aliadas a esta doença,
destacam-se: a hipertensão, diabetes, estresse, depressão, transtornos de ansi edade e
personalidade.
Os níveis de psicopatologia exibidos pelos pacientes com TCAP estão
associados ao número de episódios de compulsão alimentar que vivenciam e não ao
seu grau de obesidade (Dobrow, Kamenetz & Devlin, 2002). A partir desse contexto, o
tratamento mais adequado seria centrar-se, inicialmente, na diminuição da frequência
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de compulsão alimentar e, posteriormente, no emagrecimento (Bernardi, Cichelero
&Vitolo, 2005).
O
tratamento
para
o TCAP deve
ser
pautado
em
uma
abordagem
multidisciplinar que contemple não só a farmacoterapia, mas também, a dietoterapia
associada à psicoterapia, opções consideradas não invasivas (Vasques, Martins &
Azevedo, 2004).
TRATAMENTO PARA TCAP E TCC
O TCAP é um transtorno psiquiátrico grave que tem solução e deve ser tratado
diferenciadamente. Além da dificuldade natural na tentativa de mudanças cognitivas
em pacientes com TCAP, pesquisas sugerem que os obesos que apresentam TCAP
respondem de forma pior aos tratamentos com foco no emagrecimento, a um maior
número de tentativas fracassadas de adesão a dietas, a uma maior dificuldade na perda
de peso, uma pior manutenção do peso perdido e uma maior taxa de desistência dos
tratamentos (Duchesne, Appolinario, Rangé, Freitas, Papelbaum & Coutinho, 2007).
O tratamento deve propor inicialmente a diminuição da frequência dos
episódios de compulsão alimentar, sendo importante a psicoterapia, o combate à
obesidade por meio de medidas dietéticas específicas, a inclusão de exercícios físicos
na rotina dos pacientes e a prescrição de fármacos (Appolinario, 2004).
Atualmente, o TCAP é avaliado por alguns instrumentos sendo, um deles, a
Escala de Compulsão Alimentar Periódica (ECAP) que foi traduzid o e adaptado para a
língua portuguesa da Binge Eating Scale (BES). O ECAP constitui-se em um
questionário de autorrelato, contendo 16 questões (Vitolo, Bortolini & Horta, 2006),
elaborado com o objetivo de quantificar a gravidade das tendências para a CAP em
uma população de obesos. Esse instrumento mostrou-se eficaz na identificação de
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indivíduos com sintomas de CAP graves, moderados ou ausentes, conforme avaliado
por meio de entrevistas com o pesquisador (Coutinho, 1999).
A TCC contribui para a adesão ao tratamento de pacientes com TCAP e no
controle dos episódios de comer compulsivo (Duchesne, 1995). É uma psicoterapia de
curto prazo, que se baseia em técnicas cognitivas e comportamentais como estratégias
de intervenção para melhorar os quadros clínicos dos pacientes (Duchesne & Almeida,
2002).
Dessa forma, os objetivos terapêuticos no TCAP envolvem o desenvolvimento
de Estratégias para Controle de Compulsão Alimentar (ECA), a modificação de
hábitos alimentares inadequados, o desenvolvimento de estratégias para adesão à
prática do exercício físico, à redução do peso corporal de forma gradual, quando a
obesidade está associada e a modificação do sistema de crenças disfuncionais
(Duchesne, 1995).
A TCC pressupõe que o sistema de crenças de um indivíduo exerce influência
no desenvolvimento de seus pensamentos, sentimentos e comportamentos. Uma das
crenças distorcidas centrais para a manutenção dos Transtornos Alimentares (TA) é a
que relaciona valor pessoal ao peso e formato corporal, ignorando ou não valorizando
outros critérios (Nunes, Appolinario, Galvão & Coutinho, 2006).
O sistema distorcido de crenças pode perpetuar-se em decorrência de várias
tendências disfuncionais de pensamento, entre elas, a abstração seletiva, que consiste
em atentar exclusivamente para os fatos que confirmam suas crenças, ignorando ou
distorcendo os dados que poderiam questioná-las. A TCC utiliza diversas técnicas
para modificar as crenças disfuncionais. Uma delas seria ensinar o paciente a
identificar pensamentos que possam conter alguma distorção. Em seguida ele é
orientado a analisar todas as evidências disponíveis que possam confirmar ou não o
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pensamento distorcido, tornando-o mais funcional. Outra possibilidade seria
apresentar novas possibilidades de explicações para as experiências vividas,
verificando a veracidade das conclusões sugeridas pelo paciente (Nunes, Appolinario,
Galvão & Coutinho, 2006).
Nos pacientes com TCAP, observa-se uma excessiva atenção ao formato
corporal, acompanhada de sentimentos de vergonha e inferioridade, o que
compromete a sua autoestima (Duchesne & Almeida, 2002). Em função do peso
excessivo são consideradas pessoas descontroladas, preguiçosos ou indisciplinadas,
tornando-os suscetíveis aos estereótipos sociais negativos associados à obesidade.
Dessa forma, o desenho da imagem corporal e a exposição gradual do corpo permitem
que o paciente modifique as suas crenças de que está gorda e de que seria rejeitado
em função disto (Nunes, Appolinario, Galvão & Coutinho, 2006).
Segundo Duchesne e Almeida (2002), o paciente deve manter expectativa s
realistas com relação à meta de peso e focar em seus sucessos e qualidades.
Autoaceitação, disciplina, espiritualidade e rede social são itens importantes que
devem ser incluídos no tratamento já que podem se constituir em agentes promotores
de mudanças cognitivas do indivíduo em relação à imagem corporal (Espíndola &
Blay, 2006).
Em relação à redução de peso no TCAP, o tratamento envolve modificações
graduais de hábitos alimentares. São fornecidas informações nutricionais para ajudar
a paciente a fazer escolhas mais adequadas de alimentos, evitando o pensamento
“tudo ou nada”. São também inseridas estratégias, que consistem na diminuição da
exposição da paciente às situações que favorecem a alimentação exagerada como,
diminuir a exposição a alimentos que só deveriam ser ingeridos em baixa frequência
na fase inicial do tratamento (Duchesne & Almeida, 2002).
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A técnica do diário alimentar é outro recurso muito utilizado, na qual o paciente
anota, em um gráfico, tudo relacionado à sua alimentação diária, como o que come; a
hora que come; além dos sentimentos presentes antes, durante e depois de alimentar se (Olivera & Fonseca, 2006).
O aumento da atividade física também tem se mostrado muito eficaz no
tratamento para a perda de peso. Os pacientes com TCAP tendem a exercitar-se
pouco, logo a importância da atividade física deve ser abordada logo no início da
terapia, por ser útil no emagrecimento, na melhoria da saúde e no controle dos
episódios de compulsão alimentar (Nunes, Appolinario, Galvão & Coutinho, 2006).
O programa de atividade física deve ser flexível, podendo-se inserir exercícios
diferentes e, para alguns pacientes, a associação de outras pessoas no programa para
facilitar a adesão. É importante também avaliar situações e pensamentos que
poderiam dificultar a prática do exercício e planejar antecipadamente possíveis
soluções (Nunes, Appolinario, Galvão & Coutinho, 2006).
Em relação à eficácia da TCC no tratamento de pacientes com TCAP,
(Duchesne & Almeida, 2002) sugerem que fora encontrada uma redução da frequência
dos Episódios de Compulsão Alimentar (ECA), sem que venha acompanhada de uma
redução significativa do peso corporal em alguns pacientes. Também foram
encontradas melhoras nas atitudes associadas ao peso, formato corporal, autoestima,
sintomas depressivos associados ao TCAP e ajustamento social. A necessidade de
associação de estratégias que sejam dirigidas diretamente à redução do peso corporal
já foi ressaltada, considerando que a orientação nutricional especializada não tem sido
comtemplada nos tratamentos psicoterapêuticos. Além disso, o número de sessões
precisa ser estendido com o objetivo de incluir uma maior quantidade de técnicas
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focalizadas no emagrecimento, favorecendo a perda de peso em um número maior de
pacientes (Nunes, Appolinario, Galvão & Coutinho, 2006).
Observa-se que a adição de medicamentos pode reduzir o número de episódios
dos ECA e, em alguns casos, facilitar a perda de peso a curto prazo, além de
favorecerem as funções mentais necessárias para a participação efetiva na
psicoterapia (Nunes, 2012; Piccoloto, Wainer, Pergher & Piccoloto, 2003). O uso de
fármacos
adequadamente
prescritos,
também,
proporciona
ao
paciente
uma
diminuição do incomodo gerado pelas manifestações físicas dos transtornos mentais,
proporcionando uma maior capacidade de comunicação paciente-terapeuta e um maior
benefício da psicoterapia (Piccoloto, Wainer, Pergher & Piccoloto, 2003).
O tratamento do TCAP, a curto prazo, tem sido eficaz quando associado ao uso
do Inibidores Seletivos da Recaptação da Serotonina (ISRS). A presença de
anormalidades na neurotransmissão serotoninérgica central que ocorreriam nos
episódios de transtornos alimentares, reforçam esse argumento, de que fárm acos
inibidores de recaptura de serotonina, podem favorecer o tratamento do TCAP
(Nunes, 2012).
Foram testadas a fluoxetina, a fluvoxamina, a sertralina e o citalopram.
Somente em uma das pesquisas a droga ativa (fluoxetina) mostrou -se superior ao
placebo em diminuir os sintomas depressivos, muito prevalentes entre pacientes com
TCAP (Coutinho, 2006).
Entretanto, estudos farmacológicos mostraram que outras drogas como a
dexfenfluramina e a desipramina, produzem um resultado eficaz no tr atamento do
TCAP. Além disso, alguns agentes antiobesidade, como a sibutramina, têm se
revelado promissores no tratamento do TCAP (Papelbaum & Appolinario, 2001). O
18
uso desse fármaco favoreceu a redução na frequência de compulsão alimentar e a
redução significativa do peso corporal e dos sintomas depressivos (Coutinho, 2006).
Os agentes anticonvulsivantes também já tiveram sua eficácia avaliada no
tratamento do TCAP, sendo que o topiramato foi considerado o mais eficaz. Embora o
seu mecanismo de ação não tenha sido totalmente elucidado, sabe-se que aumenta a
atividade gabaérgica, bloqueia canais de sódio, antagoniza receptores do glutamato e
inibe a anidrase carbônica. O topiramato mostrou-se eficaz na frequência de episódios
compulsivos, frequência de dias com compulsão alimentar, gravidade total da doença,
IMC e redução do peso corporal (Coutinho, 2006).
Portanto, o tratamento combinado - TCC mais farmacoterapia - pode apresentar
uma melhor resposta no quadro clínico dos pacientes obeso s com TCAP,
demonstrando ser um campo promissor de pesquisa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A obesidade vem sendo considerada um problema grave de saúde pública, de etiologia
multifatorial, em que fatores psicológicos presentes em grande parte dos pacientes,
desencadeiam ou reforçam o comportamento alimentar inadequado e o consequente episódio
de compulsão alimentar.
Entre os pacientes obesos, existe uma grande incidência de TCAP, associadas também a
quadros de ansiedade, depressão e transtornos de personalidade. Este transtorno alimentar
requer tratamento multidisciplinar, sendo importante a terapia dietética, a terapia cognitivo
comportamental, a pratica da atividade física e a farmacoterapia.
Conforme o exposto até aqui, a terapia cognitivo-comportamental (TCC) tem sido
amplamente utilizada no tratamento dos transtornos alimentares e é a teoria psicológica mais
19
investigada em TCAP, pois tem contribuído consideravelmente para a melhora dos quadros
clínicos, na adesão às dietas e no controle de psicopatologias mais comuns.
A TCC busca identificar e modificar as crenças e os pensamentos disfuncionais, as
emoções e comportamentos, através de técnicas cognitivas e comportamentais que possam
ajudar os pacientes a estabelecerem metas razoáveis e a trabalharem para realizar escolhas
mais saudáveis de alimentação que favoreçam uma melhora na qualidade de vida, envolvendo
o bem-estar físico e psicológico.
O tratamento combinado, psicoterapia mais farmacoterapia tem se tornado um
importante aliado no controle do TCAP e vem despertando bastante atenção dos
profissionais de saúde.
Apesar de estar ainda em fase inicial, a investigação de agentes farmacológicos
no tratamento do TCAP, alguns medicamentos têm se mostrado eficazes em ensaios
clínicos randomizados. São três as principais classes de medicamentos qu e foram
avaliados
em
estudos
duplo-cegos
randomizados:
antidepressivos,
agentes
antiobesidade e anticonvulsivantes.
Faz-se importante, portanto, o desenvolvimento de novas reflexões e pesquisas
acerca do tratamento mais adequado para os pacientes, que contemple não só dois
tipos de abordagens simultâneas, mais vários profissionais trabalhando de forma
integrada e respeitosa em prol da melhoria dos quadros clínicos.
20
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