Curativo Hidroativo No Tratamento de Úlceras de Perna

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Curativo hidroafivo no
tratamento de úlceras de
pernas
A nossa experiência inicial consiste de 15 pacientes portadores de úlceras de membros
inferiores, no total de 18 úlceras, de etiologias diversas, tratadas de setembro de 1991 a
junho de 1992. Todas as úlceras tinham tempo de evolução minimo de 2 meses a I ano,
rebeldes aos curativos convencionais. Usamos um novo tipo de curativo hidroativo denominado" Duoderm" , constituído de 2 camadas: uma superior impermeável à água e a outros
agentes externos, e outra inferior, formada por partículas hidroativas incrustadas num
polimero inerte. Esta adere à pele seca e as partículas hidroativas protegem o leito da úlcera
formando um gel úmido que facilita a migração das células epiteliais, apressando a
cicatrização. Após a limpeza adequada da úlcera com soro fisiológico, ~ colocada a placa
de Duoderm sobre o leito, aderindo à pele circunvizinha. O curativo é trocado em média a
cada 7 dias, podendo o paciente tomar banho normalmente, sem retirar a placa. Ficamos
surpresos com o resultado: dos 15 pacientes, três tiveram suas úlceras cicatrizadas entre três
e quatro semanas; quatro casos levaram seis semanas, outros cinco demoraram oito semanas,
perfazendo 12 doentes que se beneficiaram com o tratamento; três pacientes não evoluíram
satisfatoriamente: o primeiro por infecção, o segundo por um mal perfurante diabético que
não cicatrizou e o terceiro desenvolveu eczema alérgico, tendo que suspender o tratamento.
O Duoderm é um novo conceito de curativo e, até certo ponto, contrário à nossa conduta
habitual de tratamento de úlceras. Os bons resultados obtidos nos encorajam a continuar
com a experiência, observando a cicatrização a longo prazo.
Unitermos: Curativos, úlceras, hidrocolóides, cicatrização.
, conceito generalizado que o uso de
curativo oclusivo de úlceras de
membros leva ao risco de infecção.
Entretanto, a presença de .bactérias na
úlcera ocluída não é indicativo de infecção. O diagnóstico de infecção deve
basear-se nos sinais clínicos com o SQporte da microbiologia3 . A melhora da
cicatrização nas úlceras ocluídas foi relatada por vários autores 1,2,4,7, 8,9 ,mas o
trabalho clássico de WINTER (1962)
demonstrou que as úlceras. ocluídas reepitelizavam mais rapidamente do ~ue
aquelas expostas ao meio ambiente I.
Este fato levou à introdução no mercado
de grande veriedade de curativos oclusivos; estes curativos inibem a passagem de água, mas mantêm a úlcera
úmida. Além do efeito de reepitelização,
as úlceras ocluídas exibem alterações do
metabolismo do colágeno, melhora a
formação do tecido de ~ula%ão e aumenta a neovascularizaçã05,6,1
E
CAsuíSTICA
A nossa experiência consta de 15 pacientes, 11 mulheres e quatro homens,
portadores de úlceras de membros inferiores de etiologias diversas, tratadas
de setembro de 1991 a j unho de 1992;
três pacientes eram portadores de duas
úlceras no mesmo membro. A idade variou de 10 anos - 1 menina com úlcera
traumática por extravasamento de contraste radiopaco - a 87 anos; a maioria
dos casos na faixa etária de 60 a 80 anos.
Quanto à etiologia, sete pacientes eram
portadores de úlceras de estase venosa;
três com úlceras isquêmicas hipertensivas; dois pacientes com úlceras mistas
de estase venosa e isquêmicas; dois pacientes com úlceras traumáticas e um
paciente com úlcera diabética, tipo malperfurante plantar. Todos os pacientes
eram portadores de úlceras de evolução
mínima de dois meses a um ano de duração, resistentes aos tratamentos convencionais anteriores (Tabela 1).
Osvaldo Munhoz
Procópio de Freitas
Antonio M.P. Jemma
Renato R. C. Neves
Angiologistas e Cirurgiões Vasculares
da Angiomed e Hospital São
Francisco de Ribeirão Preto.
Sergio T. Plza
EdyrSanches
Marcelo E. Ribeiro
Fábio Galletti
Residentes do Serviço
Trabalho realizado na Angiomed .
Clínica de Moléstias Vasculares de
Ribeirão Preto - SP.
Pacientes
11 mulher..
04 homens
Faixa Etária
01 pec.-
10 <J1OS
05 pec. -
40a6O anos
06pec. 03 pec.-
6Oa80 anos
acima 80 anos
DIClgnôsHco
07 pec.úlcera tV.C.
03 pec. -
úlcera Isq. hlpertenslva
02 pec.-
úlcera mista
02 pec. -
úlcera trallTláHca
01 pac.-
mal pert. plantar-dlab.
Observacões
01 pec. 2 úlceras no metmo membro
02 pec.Total
úlceras ambos os membros
=18 úlceras
Tabela 1: CasuísHca
MÉTODOS
A úlcera é cuidadosamente limpa,
com solução salina; a pele ao redor deve
ser bem lavada, depilada se necessário;
não devem ser usadas soluções antissépticas irritantes. A placa de Duoderm é
colocada sobre a úlcera de maneira a
ultrapassar as bordas da mesma e aderir
à pele circunvizinha; é feita a compressão elástica; o paciente pode fazer o
asseio habitual, tomar banho, sem remover a placa de Duoderm, que deve ser
trocada a cada sete dias, ou antes, quando há sinal de secreção extravasando
pelas bordas do curativo.
CIR. VASCo ANG. 9(1), 12, 15, 1993
Osvaldo Munhoz e cals.
Tratamento de úlceras de perna
Número
1 pacientes
1 pacientes
1 pacientes
Compll~gç6es
alergia
úlcera hlperlenslva ap6s granUlaçOO
mal-ª-furante
Conse<ãlênclas
suspenso Duoderm
enxerto pele
. mau resultado
Tabela 3: Complicações
t4JiW;;3i~M;tiJi·I.jQit.j.lijí.l
Figura 1: úlcera de estase venOfa crOnlca com
evoluçOO de um ano.
Duoderm é wna placa flexível constituída de duas camadas: wna superior,
impermeável à água e a outros agentes
externos; a outra, inferior, formada por
partículas hidroativas num polímero
inerte. Este adere à pele e as partículas
hidroativas protegem o leito da úlcera; a
secreção da úlcera interage com as partículas hidroativas formando wn gel úmido e macio. Este promove um meio que
facilita a migração das células epiteliais,
apressando a cicatrização. O Duoderm
forma uma barreira contra a contaminação bacteriana e a ausência de oxigênio atmosférico estimula o crescimento
de capilares na derme; estes novos capilares são responsáveis pelo fornecimento de oxigênio e nutrientes essenciais
para o processo de cicatrização da úlcera. O gel formado pelo Duoderm tem
também o efeito de liquefazer as escaras,
facilitando sua remoção e evitando o
debridamento mecânico ou químico 8 •
Figura 3: úlcera ka.mãllca por contusOo.
RESULTADOS
Dos 15 pacientes tratados, no total de
18 úlceras, a cicatrização ocorreu entre
três e quatro semanas para três pacientes; seis semanas para quatro pacientes;
oito semanas pára cinco pacientes; um
paciente com úlcera apresentou reação
alérgica intensa, sendo suspenso o curativo; wn paciente com mal perfurante
plantar não se beneficiou com o tratamento; wn paciente com úlcera hipertensiva após granulação foi realizado
enxerto de pele. Um dos pacientes apresentou infecção, sendo suspenso do
Duoderm por três semanas, voltando a
usá-lo após, completando a cicatrização
da úlcera (Tabelas 2 e 3). Nas úlceras
hipertensivas a dor desapareceu em méNúmero
TempO de ClcalrlzaçOo
Resultado
3 pacientes
3a4semanas
Bom
4 pacientes
6 semanas
Bom
8 pacientes
8semalÍaS
Bom
Obs. Total 15 - 12 pec. bons resultados
=80%
CIR. VASCo ANG. 9(1), 12, 15, 1993
FIgura 4: úlcera ela Flg. 3, cicatrizada após quatro semanas de uso de Duoderm .
dia após o terceiro curativo. Nas úlceras
flebopáticas houve mais secreção nos
primeiros curativos, obrigando a troca
mais freqüente (quatro dias).
O Duoderm apresenta odor caracte-
Osvaldo Munhoz e cols.
Tratamento de úlceras de perna
rístico, mais forte nos primeiros curativos, diminuindo à medida que a úlcera
cicatriza.
Em todos os pacientes mantivemos o
tratamento da doença inicial, com o uso
de linfocinéticos, hipertensivos, vasodilatadores, compressão elástica, repouso
e antibióticos quando necessários (Figs.
1,2,3 e 4).
COMENTÁRIOS
Ficamos entusiasmados e mesmo
surpresos com os resultados iniciais do
Duoderm na cicatrização de úlceras de
membros inferiores. Realmente é um
novo conceito e até certo ponto contrário
a nossa conduta habitual no tratamento
de úlceras de pernas: na maioria dos
casos ela é cirúrgica. Tratamos a causa
inicial, operando as varizes primárias do
complexo varicoso ou secundárias da
síndrome pós-flebítica, fazendo a ressecção das úlceras; nas síndromes
isquêmicas, a simpatectomia ou revascularização, também ressecando as úlceras; num segundo tempo, após
granulação, fazemos o enxerto de pele
total.
Nos casos em que a cirurgia não tem
indicação ou condição, o tratamento local das úlceras é feito com limpeza e uso
de antissépticos, evitando-se as pomadas ou cicatrizantes; às vezes açúcar nas
úlceras mais profundas para apressar a
granulação.
Achamos que o Duoderm está bem
indicado para estes casos, evitando o seu
uso nas úlceras infectadas ou específicas. Vamos continuar com a experiência, estendendo o uso do duoderm após
a ressecção da úlcera, apressando a granulação ou cicatrização, evitando o segundo tempo da cirurgia: O enxerto de
pele. Queremos tembém observar os resultados a longo prazo, sobre recidivas
precoces ou tardias.
HYDROCOLLOID DRESSING
FOR LEG ULCERS
Fifteen patients who had leg ulcers, in a total of eighteen uleers of
various causes were treated for ten
months. Ali ulcera had been presant
for at least two months to one year
and had been refractive to other conventional dressings.
A new type of dressing ealled
"Duoderm" was used to treat the ulcers. It consisted of two layers: one
superior, non-permeable to water
and to other externai agents, and
one inferior, eonsisting of polyrethane-backed hydro colloids. lhe
latter adheres to dry skin and the
hydrocolloids proteet the wou.nd
bed, produeing a hydrated gel whlch
helps the migration of epithelial
cells, resulting in a more rapid h~al­
ing. After proper wound cleansmg
with saline, the dressing is placed
over the wound bed, adhering to the
surrounding skin. lhe hydrocolloid
dressing is changed every seven
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. CHERRY GW, RYAN TJ - Enhanced wound angiogenesis with a
new hydrocolloid dressing. In Ryan
TJ (ed). An Environment for Healing: The Role of Occlusion. Royal
Society of Medicine, London: 6168,1985.
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Los Angeles, California. Editor:
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3. HUTCHINSON JJ, LAURENCE
JC. - Wound infection under occlusive dressings. Journal of Hospital
Infection P:83-94, 1991.
4. HUTCHINSON JJ - Prevalence of
wound infection under occlusive
days, while patients are allowe~ to
bathe or take showers as usual wlthout removing the dressing. lhe results were surprising: of the 15
patients treated; three had the ulcers
healed within three to four weeks;
four healed in six weeks and in other
five patientscomplete healing lasted
eight weeks, amounting to 12 patients who showed marked improvement. Only three patients failed to
show marked improvement: the first
one due to infection, the second for
being a diabetic who did not achieve
healing and the third one developed
an allergic eczema and had to interrupt the treatment.
Duoderm is a new trend in wound
healing and to some extent different
from ali we are acquainted with in
leg ulcers treatment. lhe good ~e­
sults achieved eneourage us to intensify our clinica i research w ith
Duoderm dressings.
Uniterms: Dressings, ulcers, hydrocolloids, healing.
dressings: A collective survey ofreported research. Wounds, a compendium of clinicai research and
practice, volume 1, nO 2, August,
1989. Health Management Publications, Inc.
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dressings: A microbiologic and
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Infection Control, 18:257-268, August, 1990.
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Wounds: A compendium of c lini cal
research and practice, VoI. I, ~ 2,
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Tratamento de úlceras de perna
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CHERRY GW - Dissolution of
wound coagulum and promotion of
granulation tis sue under Duoderm.
Wounds: A compendium of clinicai
research and practice, VoI I, N" 2,
1989. HeaIth Management Publications, Inc.
9. RIJSWIJK L VAN, BROWN D,
FRIEDMAN S, DEGREEF H, PETERSON JR, BORGLUND E,
EBERT HM, SAY AG J, BEYLOT
C, DANIEL Su WP - Multicenter
clinicaI evaIuation of a hydrocolloid
dressing for Ieg ulcers. Frorn the Division of ClinicaI Research, Convatec, Squibb Corpo Princeton, New
Jersey.
Sempre é oportuno rever os cuidados
higiênicos dispensados a úlceras de perna.
Por mais variadas que sejam as etiologias
destas, o exercício da medicina, o trabalho
manual do médico, faz-se sentir imediatamente sobre a evolução da doença,
principalmente se a úlcera tiver a sua origem
na hipertensão venosa. Úlceras de origem
outras podem não apresentar uma evolução
tão espetacular e podem exigir uma intervenção médica mais agressiva, tal como as
úlceras por isquernia. Na análise do trabalho
de Dr. Oswaldo Munhoz chama a atenção o
fato de o tratamento ser idêntico, por não
estar explícito, dispensado a úlceras de etiologias diversas: por estase venosa, hipertensiva isquêmica, estase venosa e
isquêmica, mal perfurante plantar em
paciente diabético e traumática. À tabela 3
deve ser acrescentado como complicação
aquele paciente que apresentou infecção durante o tratamento ocl\lsivo, apesar de posteriormente ter conseguido cicatrizar a
úlcera. Três perguntas' ainda precisam de
resposta: 1. Qual foi a úlcera que apresentou
infecção? 2. Após quanto tempo apareceu a
~. V~.~.9(1),
12, 15, 1993
10. V ARGHESE MC, BALIN AK,
CARTER DM - Local environrnent of chronic wounds under synthetic dressings. Arch DermatoI
122:52-57,1986.
11. WINTER GD - Formation of the
scab and rate of epitheliaIization of
superficial wounds in the skin ofthe
young domestic pig . Nature
193:293-294,1962.
alergia no paciente úlcera mista? 3. Qual foi
o tempo durante o qual foram aplicados
esses curativos oclusivos, comparando-o
com tratamentos habituais. Houve redução
do tempo de tratamento prolongado por oito
semanas? Certamente a úlcera traumática na
criança de 10 anos deve estar entre as três
que cicatrizaram nas primeiras três semanas.
Um futuro estudo poderá esclarecer
estas dúvidas.
Wolfgang G.W. Zorn
São Paulo
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