TER OU NÃO TER RESPONSÁVEL TÉCNICO NOS SERVIÇOS DE ALIMENTAÇÃO: EIS A QUESTÃO A LEI DETERMINA, MAS CADÊ A FISCALIZAÇÃO? Por Profa.Dra. Cyllene de M.OC de Souza Dra em Ciência e Tecnologia de Alimentos (UFRRJ), Mestre em Vigilância Sanitária (INCQS-FIOCRUZ) Supervisora em Segurança Alimentar ABNT-NBR 15048 Especialista em Saúde Pública Especialista em Biologia Parasitária Olá prezados leitores. Aqui estamos em mais um artigo, e este é resultado de muitos emails recebidos para que pudessemos elucidar algumas dúvidas em relação a este tema. Sugerimos que os leitores complementem este tema com os nossos livros que oferecem capítulos sobre o assunto: http://alimentacaolegal.loja2.com.br/ 1- O QUE É O RT? É o profissional legalmente habilitado, responsável pela qualidade e segurança do produto perante os órgãos de vigilância em saúde. A Lei nº 6.437, de 20.08.77 e o Decreto nº 77.052, de 19.01.76, estabelecem a necessidade da responsabilidade técnica. Os Serviços de Vigilância Sanitária deverão articular-se com os Conselhos de Classe visando a implementação da responsabilidade técnica de profissionais que atuam na área de alimentos. 2- O RT DO PAT Não existe lei FEDERAL que determine que este RT tenha que ser obrigatoriamente e somente o nutricionista, exceto para o PAT (Programa de Alimentação do Trabalhador) que exige que somente o NUTRICIONISTA exerça responsabilidade técnica. No caso específico do PAT a fornecedora e a prestadora de serviço de alimentação coletiva são obrigadas a indicar um responsável técnico pela operacionalização do PAT, elas devem manter contratado um profissional legalmente habilitado em NUTRIÇÃO, a quem compete supervisionar as atividades nutricionais do Programa, com a finalidade de promover a alimentação saudável do trabalhador. As www.alimentacaolegal.com leis referentes encontram-se no livro “Aspectos Legais das Boas Práticas em Serviços de Alimentação, 2013. O responsável técnico do PAT deve ser, necessariamente, um profissional habilitado em nutrição, vez que é atividade privativa do nutricionista o planejamento, organização, direção, supervisão e avaliação de serviços de alimentação e nutrição. Compete essencialmente ao nutricionista do PAT: assegurar o cumprimento das normas referentes aos parâmetros nutricionais; zelar pela adequação da quantidade e da qualidade sanitária e nutricional da alimentação fornecida aos trabalhadores (ou pela suficiência dos valores concedidos mediante documento de legitimação, se for o caso); propiciar condições de avaliação do teor nutritivo da alimentação; supervisionar as atividades de educação alimentar e nutricional direcionadas aos trabalhadores atendidos. No caso específico do PAT, permite-se que o nutricionista seja responsável técnico por até duas empresas. 3 – O RT DE SERVIÇOS DE ALIMENTAÇÃO Temos sido questionados em nossos formulários de perguntas no site sobre os aspectos legais da obrigatoriedade de ser ter um RT em serviços de alimentação. Neste artigo vamos apenas discutir o tema sem contudo aprofundar, visto que nosso livro “Aspectos Legais das Boas Práticas em Serviços de Alimentação, 2013” explica detalhadamente os regulamentos legais sobre este assunto. Estamos a alguns meses da copa e nos chama atenção o fato de a Portaria 817/13 da categorização dos restaurantes basear-se na RDC 216/04, e ainda que a mesma DETERMINE como item classificatório a presença de um RESPONSÁVEL TÉCNICO nas atividades de manipulação de alimentos (proprietário ou funcionário designado) devidamente capacitado, texto idêntico a RDC 216/04 que é federal. FONTE: ANVISA www.alimentacaolegal.com Todas as nossas legislações federais e ainda decretos municipais e estaduais EXIGEM a presença de um RESPONSÁVEL TECNICO nos serviços de alimentação. Estimado leitor, nesta hora você deve estar questionando o fato de conhecer muitos estabelecimentos que não têm RT e muito menos Manual de Boas Práticas. A pessoa física ou jurídica que realize atividades de produção, manipulação fracionamento, embalagem, armazenamento, importação, transporte, distribuição ou venda DEVE possuir responsável técnico legalmente habilitado, de acordo com os critérios estabelecidos pelos Conselhos Profissionais . Os documentos que comprovem o vínculo empregatício ou o contrato de prestação de serviços entre a empresa e o responsável técnico devem permanecer no estabelecimento à disposição da autoridade sanitária. O responsável técnico OBRIGATORIAMENTE é responsável pelas seguintes atividades: Elaboração, implantação e implementação de programa de capacitação para funcionários; Elaboração, atualização, implantação e implementação do Manual de Boas Práticas; Elaboração, atualização, implantação e implementação dos Procedimentos Operacionais Padronizados – POPs; Acompanhamento das inspeções realizadas por autoridade sanitária e prestação de esclarecimentos sobre fórmulas, composição dos produtos, processos de produção, práticas e procedimentos adotados; Notificação aos órgãos de vigilância em saúde dos casos e surtos de doenças veiculadas por alimentos, dos casos de desvio no processo de fabricação com risco a saúde do consumidor, bem como no recebimento de matéria-prima ou produto contaminado, objetivando prevenir, minimizar ou reduzir riscos à saúde; Implantação e implementação de serviço de atendimento ao consumidor, para reclamações pertinentes à qualidade e segurança dos produtos; Implantação e implementação do programa de recolhimento de produtos em desacordo com as normas vigentes; www.alimentacaolegal.com Elaboração de rotulagem para informação ao consumidor e rastreabilidade do produto Capacitar os funcionários nas Boas Práticas de manipulação incluindo aspectos de segurança e saúde no trabalho; Acompanhar as inspeções realizadas pela autoridade sanitária e prestação de informações necessárias, sobre o processo de produção e procedimentos adotados; Notificar o órgão de vigilância epidemiológica os surtos de doenças transmitidas por alimentos. Nossa RDC 216/04 que é federal, exibe um texto que deixa margens para que caso queira, o próprio dono/proprietário, possa ser o RT, desde que comprove conhecimentos na área. Muitos donos não querem ser RT, pois sabem que este cargo exige um conhecimento altamente específico e qualificado que pontuam saberes que vão desde escolha de fornecedor até a entrega do alimento SEGURO ao consumidor. O exposto é verdadeiro, pois quando os mesmos percebem que as responsabilidades de ser RT são extremanente sérias, eles desistem e passam a querer contratar um profissional habilitado, ENTRETANTO não remuneram este de maneira justa. A importância do RT pode ser detalhada em nossos livros. 4 – SE É OBRIGATÓRIO: CADÊ A FISCALIZAÇÃO? As atividades que são monitoradas por um RT envolvem conhecimentos técnicos, científicos e sobretudo legais. Este profissional deve portanto ser altamente qualificado e esta competência deve ser comprovada através de seu curriculo e suas atribuições. Os Serviços de Vigilância Sanitária deverão articular-se com os Conselhos de Classe visando a implementação da responsabilidade técnica de profissionais que atuam na área de alimentos. Assim sendo, obrigatoriamente, no meu ponto de vista, os fiscais ao realizarem suas visitas de inspeções deveriam PRIMEIRAMENTE perguntar se tal estabelecimento possui um RT, até porque ao indagarem sobre o RT, e caso o www.alimentacaolegal.com estabelecimento o possua, o fiscal poderá ter outras respostas, tais como existência de Manual, POPs, treinamentos, etc… Caso os fiscais identificassem a ausência deste RT, poderiam imediatamente, notificar estes serviços de alimentação, determinando um tempo para que os mesmos contratem profissional habilitado e capacitado, e comunicar os vários conselhos de classes (área de alimentos) para que os mesmos intensifiquem a fiscalização, para que os proprietários se adequem às leis na contratação de RTs. Façamos um cálculo por alto dos estabelecimentos que foram categorizados para a copa de 2014, veremos que não foram poucos os serviços de alimentação no Brasil que foram categorizados, desta forma, para terem sido classificados, os mesmos obrigatoriamente possuiam RT e MBP, questiono: eles POSSUEM mesmo? Mas não queremos aqui nos deter no simples fato de os mesmos para se categorizar precisarem ter RTs, quero sim me aprofundar na seguinte exclamação: não é pelo fato do Brasil estar às vésperas da Copa do Mundo que todos os restaurantes, bares, hotéis, etc precisam ter RTs e sim a premissa que independente de copa, olimpíadas, seja lá o evento que for, todos sempre foram OBRIGADOS a ter RT. Ficamos realmente angustiados ao perceber que LEI sem FISCALIZAÇÃO não tem nenhum poder, não tem nenhuma utilidade. O fato de se determinar, ou seja, de ser requisito obrigatório a presença de um RT é devido a este profissional seja ele nutricionista, médico veterinário, engenheiro de alimentos, economista doméstico, tecnólogo de alimentos, etc ser habilitado para prevenir os serviços de alimentação de multas, e auxiliá-los na conquista constante da excelência em qualidade. Quais os resultados desastrosos de não ter um RT em seu serviço de alimentação? Posso tentar enumerá-los aqui, entretanto a lista seria GIGANTESCA. Já tiveram a curiosidade de acompanhar as inúmeras intervenções, multas e autuações dos fiscais ÉTICOS do Procon, e da Visa em todo o País? Procon multa sete restaurantes por irregularidades: fiscais encontraram panelas e vasilhas com comida armazenadas de forma inadequada, diretamente no chão, e constataram a veracidade da denúncia de que o estabelecimento possui poço artesiano em suas dependências (http://oglobo.globo.com/rio/procon-multa-sete-restaurantes-porirregularidades-10826954#ixzz2s1XB3nWt) www.alimentacaolegal.com Fiscais encontraram carne moída escondida dentro de embalagens de outras carnes no frigorífico. Além da carne moída, os fiscais recolheram 43kg de carne vencida. Os fiscais interditaram a máquina de moer carne por estarem localizadas num local em que os consumidores não podem vê-las. (http://www.procon.rj.gov.br/index.php/publicacao/detalhar/834) Fiscais interditaram restaurante, por apresentar precárias condições de higiene, alimentos sem identificação e acondicionados de forma irregular, equipamentos sujos, presença de vetores, falta de sanitários e vestiários para os funcionários e ausência do Manual de Boas Práticas para o serviço de alimentação exigido pela VISA (http://www.bocaonews.com.br/noticias/principal/servicos/56402,vigilancia- sanitaria-interdita-restaurante-na-pituba.html) O Procon e a Vigilância Sanitária interditaram padaria por cinco dias. Foram encontradas diversas irregularidades no local, como produtos fora de validade e mal acondicionados. O que motivou a interdição, no entanto, foi a constatação de que a data de validade dos bolos de rolo vendidos na padaria era adulterada, segundo o Procon, intencionalmente. (http://barreirosdagente.com.br/procon-interdita-padaria-do- bompreco-fiscais-encontraram-produtos-fora-da-validade/) Uma fábrica de doces foi interditada pela Vigilância Sanitária por problemas de estrutura e higiene. Segundo o órgão, “falta de documentação e de boas práticas de fabricação e manipulação de alimentos, conforme lei vigente e código sanitário” levaram à interdição. De acordo com o agente da VISA, falhas na estrutura “levaram a crer” que o ambiente, onde trabalham cerca de 40 funcionários, tem problemas de higiene. Infiltrações, ferrugem e ninhos de pombo foram detectados no local. Acredito que ao ler estas irregularidades, alguns leitores podem pensar que a solução não está em uma contratação de um RT, ou, que mesmo tendo um respondendo pelo serviço de alimentação, este não está livre de multas e interdições. Então deixe-me tecer alguns comentários bem RELEVANTES. Um profissional no sentido literal da palavra é alguém que estudou, se especializou, se qualificou, uns mais que outros, mas todos habilitados em requisitos tais como: www.alimentacaolegal.com Qualidade Elementos de microbiologia Perigos biológicos, químicos e físicos Elementos de conservação de alimentos Boas Práticas APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle) Verificação e auditoria de BP/ APPCC Legislação Sanitária de Alimentos Entre outros Um serviço de alimentação que queira reduzir custos e controlar desperdícios, certamente ao contratar um RT terá resultados SATISFATÓRIOS na implementação das boas práticas. Fica extremamente difícil de compreender o por quê donos de serviços de alimentação não investem em qualidade em suas empresas, pois para mim fica claro que o fato de não contratarem um RT, estes estão simplesmente deixando de priorizar a QUALIDADE, deixando desta forma, margem para não conformidades e desrepeito ao consumidor. Entretanto, ainda nos deparamos com algumas disparidades, uma delas o fato de continuarmos a encontrar FISCAIS sem conhecimento algum a respeito de leis, microbiologia, APPCC, parâmetros de temperatura, noções de controle integrado de pragas, e ainda sim insistirem em autuar, inventar leis, e o pior de tudo, afirmarem que tais disparidades estão registradas em lei. Descrevemos muitas destas situações em nosso livro“Aspectos Legais das Boas Práticas em Serviços de Alimentação, 2013” http://alimentacaolegal.loja2.com.br/. O RT assume uma grande responsabilidade, e é regulamentado por lei que este deve responder civil e penalmente pelo serviço de alimentação, desta forma, se realmente houvesse uma FISCALIZAÇÃO acirrada não só por conta dos fiscais da VISA, PROCON, DECON, mas também dos Conselhos de Classe das diversas categorias profissionais destinados aos serviços de alimentação, certamente o cenário de inúmeros restaurantes, padarias, hoteis no Brasil estaria bem diferente. www.alimentacaolegal.com Todavia uma andorinha só não faz verão. Se todos os atores envolvidos nesta tríade (o profissional, o gestor e a fiscalização) não unirem esforços na conquista da qualidade, o quadro TRÁGICO para não dizer fatal, irá se perpetuar por longas gerações, continuando desta forma: as propinas, as ineficiências técnicas, as multas desnecessárias, os retrocessos, os descasos com o consumidor, os desacatos a nós profissionais da qualidade em serviços de alimentação, sim desacato, pois é isto que estamos sofrendo por não sermos respeitados por nosso cabedal de conhecimento e experiência técnica. O grito deve partir de nós profissionais e se fazer ouvir pelos que devem cuidar de nossa defesa, os conselhos devem interceder por nós. Os fiscais devem se capacitar de igual forma como nós nos capacitamos, pois o simples fato de ser um fiscal não significa que o estudo e a qualificação se esgota, ao contrário, o estudo deve ser diário, pois bem sabemos que não é apenas o RT que deve ser o profissional HABILITADO, o fiscal deve também preencher os mesmos requisitos de capacidade técnica, científica e sobretudo legal. Estamos caminhando para a copa do mundo, e muito se fez para que vários serviços de alimentação fossem categorizados em A-B-C, entretanto temos que parar de viver de projetos momentâneos que geram expectativas e resultados também momentâneos. Precisamos sim, viver uma REALIDADE em que TODOS os serviços de alimentação do BRASIL sejam QUALIFICADOS para atender o povo BRASILEIRO com QUALIDADE e RESPEITO em primeiro lugar e claro aos nossos visitantes estrangeiros e amigos de outras nações ou só poderemos ter uma comida saborosa e com qualidade higiênico sanitária durante grandes eventos nacionais? Ter um RT em seu restaurante, bar, padaria, hotel, não irá te onerar, ao contrário, a presença deste, desde que capacitado, será de grande valia, pois o mesmo é um instrumento de qualidade para que seu estabelecimento siga dentro dos padrões técnicos e legais no mercado, o que o tornará mais competitivo e qualificado frente aos que insistem em desacatar as leis e aos consumidores. www.alimentacaolegal.com Pensemos nisso, mudemos este quadro, comece por você profissional: denuncie os estabelecimentos que não possuem RT, denuncie fiscais inescrupulosos que ao invés de educar ou até mesmo punir, ainda insitem em negociar valores mensais para não aplicarem multas e interdições, que muitas das vezes são necessárias. Levem seus clamores aos conselhos respectivos de sua categoria profissional, pois muitos deles nem sabem o que de fato está ocorrendo, e sobretudo, se queremos ser RTs precisamos nos capacitar dia a dia, pois não é brincadeira, pelo contrário, respondemos para que o consumidor tenha a garantia de um serviço e um alimento SEGURO E INÓCUO. Com respeito e admiração www.alimentacaolegal.com