ESCOLA SUPERIOR ABERTA DO BRASIL – ESAB CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM PSICOPEDAGOGIA CLINICA E INSTITUCIONAL GRASIELA PROCÓPIO DUARTE A CRIANÇA ESTRANHA NA ESCOLA: PSICOPEDAGOGIA E CRIANÇAS AUTISTAS VILA VELHA – ES 2011 GRASIELA PROCÓPIO DUARTE A CRIANÇA ESTRANHA NA ESCOLA: PSICOPEDAGOGIA E CRIANÇAS AUTISTAS Monografia apresentada ao Curso de PósGraduação Lato Sensu em Psicopedagogia Clínica e Institucional da Escola Superior Aberta do Brasil – ESAB, como requisito para obtenção do titulo de Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional, sob orientação do Prof. Me. Marcony Brandão Uliana VILA VELHA - ES 2011 GRASIELA PROCÓPIO DUARTE A CRIANÇA ESTRANHA NA ESCOLA: PSICOPEDAGOGIA E CRIANÇAS AUTISTAS Monografia aprovada em ______ de ________________ de 2011. Banca Examinadora ________________________________________ ________________________________________ ________________________________________ VILA VELHA – ES 2011 DEDICATÓRIA Dedico às crianças, estranhas ou não... AGRADECIMENTO Agradeço a Deus, A meus pais, ao Yan, à Celinha, ao Marcus e à Maria Amélia, A meus amores e aos meus dissabores, Sem vocês eu não teria chegado aqui, Sem vocês eu não irei avançar mais... “A tarefa daqueles que lidam com as crianças é a de fazê-las ter vontade de viver, de despertá-las para o mundo, não as deixando ao sabor do destino, mas, responsabilizando-as pela invenção de suas próprias vidas e de sua sociedade”. Freud RESUMO Palavras-chave: Autismo. Psicanálise. Psicopedagogia. Este trabalho pretende responder como o profissional da Psicopedagogia pode contribuir para a inserção e o aprendizado de crianças autistas no ambiente escolar favorecendo-lhe a criatividade e o desenvolvimento de suas potencialidades. Para isso, será utilizada metodologia de pesquisa de caráter exploratório-descritivo, utilizando da revisão bibliográfica e análise documental. As obras escolhidas para serem analisadas são o livro autobiográfico do filme Temple Grandin de direção de Mick Jackson e do livro autobiográfico Uma menina estranha de Temple Grandin e Margareth Scariano. Pela pesquisa bibliográfica e pela história de vida de Temple Grandin pretende-se compreender o autismo sob a ótica da Psiquiatria e da Psicanálise; contextualizar o transtorno autista no ambiente escolar; verificar como o profissional da educação pode intervir/auxiliar para a inserção de crianças autistas na escola; analisar o caso de autismo "recuperado". O trabalho será dividido em quatro capítulos, no primeiro será de conceituação dos saberes: psicologia, pedagogia, psicanálise, psiquiatria e psicopedagogia; abordará a formação do sujeito e a importância da socialização; tratará da questão da relevância da escola para a inserção do sujeito na sociedade; pontuará a aprendizagem, a escola e a educação escola e conceituará e diferenciará inteligência dos problemas de aprendizagem (distúrbios e dificuldade de aprendizagem). O segundo capítulo terá conceituação do o autismo, pontuação de suas causas, o diagnóstico e o tratamento, além de apresentá-lo à luz da psicanálise, abordando a posição do psicanalista frente ao autismo. No terceiro capítulo será feito a leitura das obras a serem analisadas. O último capítulo apresentará a resposta do problema da pesquisa: como o psicopedagogo, pode atuar no ambiente escolar, com crianças autistas, visando o favorecimento da sua aprendizagem, possibilitando-a a desenvolver a criatividade e potencialidades, bem como o objetivo geral e os objetivos específicos foram alcançados. O transtorno não tem cura e suas causas são desconhecidas, mas seus sintomas podem ser amenizados, tornando as crianças mais independentes o possível. Para isso esses profissionais devem permanecer atentos às peculiaridades da criança, sendo menos invasor o possível, sem rotular, estigmatizar ou abandonar. Ele deve amar a criança, respeitando seu tempo e seu ritmo, mesmo que seus fantasmas internos apareçam. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................................8 CAPÍTULO 1 - CIENCIAS E SABERES .............................................................. 11 1.1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS ..................................................................... 11 1.2 PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO .................................................................. 12 1.2.1 Percepção social ....................................................................................... 13 1.3 APRENDIZAGEM E EDUCAÇÃO ESCOLAR ................................................ 14 1.4 INTELIGÊNCIA x “PROBLEMAS” DE APRENDIZAGEM................................16 CAPÍTULO 2 - O AUTISMO ................................................................................. 20 2.1 AUTISMO E PSIQUIATRIA ............................................................................ 21 2.2 AUTISMO E PSICANALISE ............................................................................26 2.2.1 Vertente desenvolvimentista .................................................................... 26 2.2.2 Vertente psicanalítica ................................................................................ 28 2.2.2.1 A constituição do sujeito versus autismo .................................................. 30 2.2.2.2 O Som e o silêncio .................................................................................... 37 2.3 CAUSA.............................................................................................................39 2.4 DIAGNÓSTICO ............................................................................................... 40 2.5 TRATAMENTO ............................................................................................... 42 2.5.1 Posição do analista na clínica com autistas ........................................... 44 CAPÍTULO 3 - TEMPLE GRANDIN – UMA MENINA ESTRANHA .....................46 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 57 REFERÊNCIAS .................................................................................................... 60 8 INTRODUÇÃO O Transtorno Autista foi distinto da doença mental esquizofrenia e postulado pelo psiquiatra Kanner em 1943. Trata-se, conforme a DSM IV (2002), de uma psicopatologia que afeta o desenvolvimento da interação social e da comunicação de forma acentuadamente anormal e um repertório muito restrito de atividades e interesses. Suas manifestações variam conforme o nível de desenvolvimento e da idade cronológica da criança. Repulsa ao toque, comportamento agressivo, incapacidade de falar, sensibilidade intensa a odores e ruídos repentinos, preferência ao isolamento e tendência ao isolamento são algumas características de pessoas autistas. Os autistas são taxados como pessoas que se trancam em seu mundo mental, terra onde não se pisam e se desconhece, porém, é possível certificar pela bibliografia e pelos casos apresentados por diversos autores, como Campanário, Soller e Azevedo e até mesmo pela história de Temple Grandim que as crianças acometidas por este transtorno, muitas vezes, são crianças com o coeficiente intelectual normal, ou mesmo elevado. Contudo, devido a sua dificuldade de interação social, sua inserção na escola e seu aprendizado podem ficar comprometidos. Ao mesmo tempo em que elas apresentam esta dificuldade, é também difícil tratar o estranho e o desconhecido, como nos confessa Villa (2010). Para ele, é o som que amedronta os profissionais, uma vez que o silêncio aflora seus inúmeros fantasmas interiores, afastando-os ou impelindo-os a auxiliar na recuperação dessas crianças. Considerando que existe esta dificuldade em tratar o desconhecido, no ambiente escolar, o primeiro lugar onde as crianças, normalmente, freqüentam longe do espaço familiar e onde passam grande parte de suas vidas, não seria diferente. Há a necessidade em preparar os profissionais para acolher e favorecer a inserção dessas pessoas diferentes e especiais. É necessário trabalhar a favor das crianças autistas, ajudando-as a descobrir seus talentos ocultos e a se tornarem menos estranhas. Surge, então, o problema: como o profissional da psicopedagogia pode contribuir para a inserção de crianças autistas no ambiente escolar, favorecendo-lhe o aprendizado? 9 Desta forma, o objetivo geral da pesquisa é analisar como o profissional da psicopedagogia pode contribuir no sentido da inserção e do aprendizado de crianças autistas no ambiente escolar. Os objetivos específicos são: investigar o autismo sob a ótica da Psiquiatria e da Psicanálise; contextualizar o transtorno autista no ambiente escolar; investigar como o profissional da educação pode intervir/auxiliar para a inserção de crianças autistas na escola; analisar o caso de amenização dos sintomas do autismo de Temple Grandin. Para buscar responder o problema levantado, alcançando o objetivo geral e os objetivos específicos, a metodologia escolhida para o trabalho é de caráter exploratório-descritivo, o qual utilizará de recursos da pesquisa bibliográfica e da análise documental. A análise documental consiste na investigação do livro autobiográfico de Temple Grandin, Uma menina estranha, e, de seu filme intitulado pelo seu próprio nome. Temple Grandin nasceu em 1947, nos Estados Unidos, aos três anos e meio foi diagnosticada como autista. Aos seis meses não se aninhava no colo materno, ficando rígida e rejeitando o corpo de quem a abraçava, até os três anos e meio comunicou somente por gritos, assobios e murmúrios. Brincava com suas fezes, como se fossem massa para modelar. Ora ignorava sons altíssimos, ora reagia com violência com pequenos estalidos. O cheiro de uma flor a atormentava, descontrolando-a ou fazendo com que se refugiasse em seu mundo interior. (GRANDIN, SCARIANO, 1999). O diagnóstico de autista fez a mãe de Grandin lutar por ela. Temple ingressou na escola ainda criança. Ela teve muitos problemas, principalmente com a agressividade. Suas notas eram péssimas. Ela não dançava conforme a música da escola, pois tinha seu próprio ritmo, seu próprio som, sua maneira própria de enxergar e compreender o mundo. Conseguia pensar somente fatos concretos. Conceitos abstratos não faziam parte de seu mundo. Foi expulsa da escola, estigmatizada, ridicularizada por muitos, mas também aceita e estimulada por tantos outros. Na infância tinha somente uma amiga. Temple estudou psicologia e comportamento animal. Desenvolveu uma máquina do abraço, 10 para estimulá-la e relaxá-la. Aos trinta anos de idade, conseguiu dar seu primeiro aperto de mão e olhar nos olhos de alguém. Continuou esforçando-se para se melhorar a cada dia mais. Terminou seu doutorado, viaja o mundo dando palestras e desenvolve importantes projetos em sua área de trabalho. Para isso, o trabalho será dividido em quatro capítulos. O primeiro capítulo conceituará os saberes: psicologia, pedagogia, psicanálise, psiquiatria e psicopedagogia. Abordará a formação do sujeito e a importância da socialização. Tratará da questão da relevância da escola para a inserção do sujeito na sociedade. Pontuará a aprendizagem, a escola e a educação escolar. Conceituará e diferenciará inteligência dos problemas de aprendizagem (distúrbios e dificuldade de aprendizagem). No segundo capítulo deverá ser conceituado o autismo, pontuando suas causas, o diagnóstico e o tratamento e apresentá-lo à luz da psicanálise. No terceiro capítulo será feito a leitura do filme Temple Grandin (2010) de direção de Mick Jackson e do livro autobiográfico Uma menina estranha (1999) de Temple Grandin e Margareth Scariano. No último capítulo deverá ser apresentado as contribuições do profissional da psicopedagogia para a inserção das crianças autistas no ambiente escolar, favorecendo-lhe o aprendizado. 11 CAPÍTULO 1 - CIÊNCIAS E SABERES 1.1- CONCEITOS FUNDAMENTAIS Este trabalho articula diversos saberes, como a pedagogia, a psicologia, a psicanálise, a psiquiatria e a psicopedagogia. Para melhor contextualização, iniciaremos com a conceituação de cada um. A palavra Pedagogia é de origem grega e significa paidós (criança) e agogé (condução). É a ciência do ensino. Para Paulo Freire (apud BORGES, 2008) a educação relaciona-se ao diálogo crítico, à conscientização, à humanização relacionando-se ao fazer pedagógico. Psicologia vem do grego psykhologuía, de psykhé, "psique, "alma", "mente" e λόγος, lógos, "palavra", "razão" ou "estudo"). Hiran Pinel em Fundamentos Gerais da Psicopedagogia Clínica (2002) pontua que a psicologia é uma ciência ampla, com diversas vertentes. Dentre estas abordagens tem-se a Teoria Psicanalítica, que estuda o inconsciente, a Teoria Comportamental que dá ênfase ao comportamento humano, a Teoria Fenomenólogica-existencial, com foco no fenômeno, além da Gestalt, da Teoria Centrada na Pessoa e da Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem. A psicologia, portanto, é a ciência que se preocupa com o comportamento humano em seus diversos aspectos e condutas observáveis. Ela pode utilizar de métodos e instrumentos de medições. Conforme Luciana Infantini Almeida em Intervenções Psicológicas na ótica da psicanálise (2011), a psicanálise é uma abordagem dentro da ampla psicologia e foi criada por Sigmund Freud. Seu autor acreditava que na base do comportamento humano encontram-se conteúdos inconscientes, como desejos, sentimentos, pulsões. É, portanto, uma ciência do inconsciente. Seu tratamento ocorre através do processo de Livre Associação, Interpretação de Sonhos, análise dos Atos Falhos e da Resistência. Seu propósito é descobrir, no inconsciente dos seres humanos, suas necessidades, complexos, traumas e tudo que perturbe seu equilíbrio emocional. 12 Psiquiatria é a especialização da medicina que se ocupa de desenvolver e testar modelos de conhecimento, prevenção e tratamento dos diversos transtornos psiquiátricos.( INSTITUTO DE PSIQUIATRIA, 2011 ) A psicopedagogia, segundo Hiran Pinel (2002), se ocupa da aprendizagem humana, advindo da questão problema de aprendizagem, situada além dos limites da psicologia e da pedagogia. Seu trabalho é de cunho clínico (cuidador) ou instituicional (preventivo). É possível inferir, portanto, a partir dessas conceituações que a pedagogia é a ciência do ensino; a psicologia é a ciência da mente; a psicanálise trata dos processos inconscientes; a psiquiatria busca no orgânico as causas das doenças e, normalmente, faz uso de medicações; e já a psicopedagogia, encontra-se além dos muros da psicologia e da pedagogia, ela se ocupa da aprendizagem humana, apresentando-se como forma cuidadora das dificuldades de aprendizagem ou como forma preventiva, no ambiente institucional. Considerando a complexidade do ser humano, cabe a interdisciplinaridade das ciências para entendê-lo, compreendê-lo e tratá-lo tal como ele se apresenta, abstendo os diversos profissionais de estigmas, rótulos e preconceitos. 1.2- O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO Wagner Dias Freitas em Psicologia Social (2008) enfatiza que o ser humano é um ser social. A socialização é um tipo de interação, que molda a natureza da personalidade humana, o comportamento humano, a interação e a participação na sociedade. É um processo progressivo e cumulativo, no qual a criança assimila comportamentos, valores, normas, códigos e ritos de um determinado grupo. O indivíduo torna-se membro de um conjunto social. Sem a socialização, a sociedade e o homem não seriam possíveis. Freitas (2008) define a socialização, de maneira ampla, como a internalização de idéias e de valores estabelecidos coletivamente e a assimilação de papéis e de 13 comportamentos socialmente desejáveis. É “a incorporação do homem à sociedade”. (FREITAS, 2008, p. 15) O autor aponta que o processo de socialização é fundamentalmente a educação. Educação esta que se aprende no convívio com outras pessoas correspondendo ao modo de agir em diversos momentos da vida. Ela ocorre dentro da família, com amigos, desconhecidos e mesmo no ambiente escolar. Ele completa que a socialização pode ser interpretada como condicionadora do comportamento, ou seja, ela determina a maneira de agir e comportar-se em cada situação, mediante a incorporação das normas e regras de conduta ditadas pela sociedade. Porém, por ser difusa e fragmentada por vários processos, deixa espaços de ação livres para a iniciativa individual espontânea. Para Freitas (2008) pessoas pouco socializadas não absorveram completamente os princípios que regem a sociedade, isto pode ocasionar-lhes problemas de adaptação e interação social ao longo da vida. 1.2.1 Percepção social Conforme Borges (2008) percepção é uma função cerebral que dá sentido aos estímulos recebidos a partir do histórico pessoal, é através dela que é possível interpretar e organizar os estímulos recebidos, dando-lhes significados. Portanto, é aquisição, interpretação, seleção e organização das informações obtidas pelos sentidos. Segundo Freitas (2008) a percepção social é pré-condição do processo de interação social. Ela consiste na recepção dos estímulos pelos órgãos dos sentidos atribuindolhes significados. Tem início no momento de chegada do estímulo sensorial ao percebedor e finaliza com a tomada de consciência. Embora a percepção passe pelos órgãos dos sentidos, ela é singular, visto ocorrer de forma única para cada pessoa. Um mesmo fenômeno é sentido, percebido e processado de acordo com o que a pessoa traz consigo mesma dentro de sua 14 bagagem psíquica. O que um percebe é diferente daquilo que é percebido pelo outro. 1.3- APRENDIZAGEM E EDUCAÇÃO ESCOLAR Existem vários conceitos pontuais de aprendizagem, que se entrelaçam e se complementam, apresentando, assim, um conceito global. Para Freitas (2008) aprender significa adquirir capacidades e habilidades físico-motoras e conhecimentos. O processo de aprendizagem ocorre no amadurecimento, no desenvolvimento físico ou na experiência, isto é, na medida em que o ser desenvolve-se fisicamente ou pelo contato direto com algo que lhe chame atenção. Ela é o produto da interação contínua do organismo com o mundo físico e social e aquisição de novas formas de comportamento que combinam com comportamentos inatos. Maria Doralice Veiga Alves em Psicopedagogia: Avaliação e Diagnóstico (2007) esclarece que a aprendizagem é um processo integrado que altera qualitativamente a mente de quem aprende. As pessoas absorvem as informações pelos hábitos adquiridos, ou por técnicas de ensino. Ela afirma que a vontade de aprender faz parte do psiquismo humano. Para Alves (2007) a aprendizagem pode ainda ser uma mudança relativamente durável no comportamento de forma mais ou menos sistemática, ou não, adquirida pela experiência, pela prática motivada e pela observação. A motivação é essencial ao processo de aprendizagem. Maria da Conceição Coqueiro e Ana Maria Furtado em Dificuldades de Aprendizagem (2007) ressaltam que a aprendizagem e o desenvolvimento iniciam quando o ser humano nasce e se depara com suas necessidades, sentimentos. e potencialidades. A família apresenta, portanto, papel de suma importância nesse processo. É a partir do desenvolvimento psicomotor, intelectual e afetivo-social que a criança traça o perfil de sua identidade, desta forma o principal objetivo da aprendizagem é a formação integral do indivíduo. 15 Desta forma, o ser humano desde o momento de seu nascimento está apto para aprender. São os primeiros movimentos, primeiros gestos, primeiros balbucios. Destes surgem movimentos complexos e palavras, frases e textos inteiros. Aprender inclui o simples e o complexo, seguindo a motivação interior de cada um. A aprendizagem é individual e é influenciada pelo meio em que se vive, primeiramente pela família. Kely Cristina Pereira em Estrutura e Funcionamento do Ensino Fundamental e Médio (2009) aponta que os principais canais de conservação e inovação dos valores e dos conhecimentos são as instituições sociais como a família, a igreja, o mercado profissional, a mídia e a escola. Os seres humanos dependem do processo educativo para a sua sobrevivência, a educação é imprescindível. A Educação para Pereira (2009) significa conduzir para um lugar diferente daquele em que se está. Ela pode ser compreendida de duas formas: Educação vivencial espontânea: aprende-se simplesmente pelo viver, num processo contínuo; Educação proposital ou intencional: deliberada e organizada em locais predeterminados como escola, e também pela mídia. O papel da escola, em uma visão generalizada, é dar embasamento teórico, mas segundo Pereira (2009) a escola não deve apenas ensinar, ela deve criar uma forma de estimular o aluno a descobrir por si mesmo, tanto o saber acadêmico, quanto o moral e cívico. O conhecimento não deve ser encarado como obrigação, pois se sabe que os maiores projetos da humanidade tiveram inicio na sala de aula. Como nos lembra Antônio Flávio e Barbosa Moreira e Vera Maria Candau em Educação escolar e cultura: construindo caminhos ( 2003) a escola é uma instituição cultural, pois não há educação onde a cultura não esteja entrelaçada. A escola transmite a cultura da humanidade, em particular do momento em que se vive. Seguindo seus pensamentos, a escola é uma instituição construída no contexto da modernidade com a finalidade de desenvolver a função fundamental de transmitir a cultura, oferecendo as novas gerações o que a humanidade produziu de mais significativo. 16 Para Borges e Furtado (2007) a escola não interfere apenas na transmissão do saber científico, culturalmente organizado, mas também, na socialização e individualização da criança, auxiliando no desenvolvimento da afetividade, habilidades sociais, reafirmação de sua identidade e ampliação de seu mundo de relações. Há um estreito laço entre aprendizagem, educação e escola. Ao interligarmos a visão da escola na educação, pode-se inferir que ela é muito mais do que transmissora de conceitos e saberes acadêmicos, é a responsável pela a inserção do individuo na sociedade, apresentando-lhe normas de convivência, transmitindo a cultura, desenvolvendo cidadãos críticos e conscientes, além de propiciar a prática da criatividade e a descoberta de novos saberes. 1.4- INTELIGÊNCIA VERSUS “PROBLEMAS” DE APRENDIZAGEM Borges (2008) aponta que a inteligência relaciona-se a capacidade de compreender e conhecer o mundo em que vive, de raciocinar sobre seres animados e inanimados que o cercam e estabelecer relações entre eles. Para Piaget (1982, apud ALVES, 2007) inteligência é uma adaptação, um caso particular de adaptação biológica, ela é essencialmente uma organização com função de estruturar o universo como o organismo estrutura o meio imediato. Leandro S. Almeida e Ricardo Primi no BPR5: Manual Técnico (2000) apresenta os conceitos de inteligência fluida e inteligência cristalizada de Cattel. A inteligência fluída é a capacidade de raciocinar, estabelecer relações e generalizações sobre os problemas que não tem soluções previamente aprendidas. Representa a capacidade biológica do sujeito ou seu potencial intelectual pouco influenciável pela cultura. Já a inteligência cristalizada traduz a capacidade intelectual do sujeito evoluindo ao longo do seu processo de aculturação, refletindo as experiências educativas e culturais. Relaciona-se com a extensão e profundidade dos conhecimentos que a pessoa tem armazenado. 17 A teoria da inteligência múltipla é apresentada por Howard Gardner apud Alves (2007), nela inteligências são potenciais, ativados ou não, pelos valores culturais, familiares e pessoais, não é algo que é apenas mensurável. Elas são inerentes ao homem, cabendo a ele ativá-las, desenvolvendo-as e levando-as a sua maior potencialidade. As inteligências são: Lógico-matemática: relacionada à capacidade de resolver problemas, operações matemáticas e questões científicas; Linguística: relacionada à língua falada ou escrita; Espacial: capacidade de visualização minuciosa do mundo visual; Musical: relaciona-se a capacidade de compor, tocar e apreciar padrões musicais; Físico-cinestésica: capacidade de utilizar o corpo para dança e esporte; Intrapessoal: capacidade de auto-conhecimento; Interpessoal: capacidade de compreender, entender as motivações e desejos dos outros; Naturalista: sensibilidade de compreender e assimilar fenômenos da natureza. Percebe-se, então, que a inteligência faz parte da natureza humana. A inteligência pode ser dividida em sete tipos, podendo ser fluída, ou seja, traduzida pela capacidade de raciocinar e generalizar problemas previamente desconhecidos, ou cristalizada, influenciada pela cultura. Cabe ao homem desenvolvê-la e potencializála, de acordo com seus interesses e aptidões. Ser inteligente é interagir com o mundo em que cerca, relacionando os seres, é adaptar-se biologicamente ao meio. A aprendizagem relaciona-se com a inteligência, ou com a capacidade de potencializá-la. Ser inteligente não implica em necessariamente ter facilidade em aprender. Há pessoas que apresentam algumas dificuldades para aprender. Alves (2007) aponta que as dificuldades de aprendizagem são provenientes de aspectos naturais ou secundários e são passíveis de mudanças por meio de recursos de adequação ambiental. Borges e Furtado (2008) ressaltam que fatores: físicos, emocionais, sensoriais, neurológicos, intelectuais ou cognitivos, educacionais ou sócio-econômicos podem 18 causar distúrbios que originam nas dificuldades de aprendizagem, na medida em que o homem é um ser integral, e que a deficiência de algum fator pode implicar na deficiência de algum aspecto de sua vida. Dentre as dificuldades de aprendizagem destaca-se a disgrafia, a dislexia, a disortografia e discalculia, que podem estar presentes, também em crianças autistas. Para Fonseca (1975, apud ALVES, p.49, 2007) a dificuldade de aprendizagem é um termo global com causas relacionadas ao sujeito que aprende, ao professor, aos conteúdos pedagógicos, ao método de ensino, ao ambiente físico e social da escola visto que cada um aprende de sua maneira, e nem sempre é possível adaptar às generalizações oferecidas por tais fatores. Cada sujeito é único. Enquanto os distúrbios de aprendizagem relacionam-se a um grupo de dificuldades específicas e pontuais, caracterizados pela presença de uma disfunção neurológica. Alves (2007) designa distúrbio de aprendizagem, as crianças com dificuldades de aquisição teórica, embora apresente inteligência normal e não apresente algum desfavorecimento físico, emocional ou social. Diferentemente de deficiência mental, os distúrbios de aprendizagem são reversíveis, as crianças podem aprender pela adequação de métodos e atenção. Os distúrbios de aprendizagem são manifestados, segundo Alves (2007) pelos distúrbios de atenção e concentração; dificuldades de leitura, dificuldades na matemática. Ela considera uma criança com distúrbio de aprendizagem se ela tiver um desempenho inferior a de outras crianças na mesma faixa etária e com experiências de aprendizagem apropriadas e apresenta discrepância entre seu desempenho e sua habilidade intelectual. As dificuldades e os distúrbios de aprendizagem diferem das deficiências mentais na medida em que são reversíveis se diagnosticados e “tratados” de forma adequada e apropriada para o desenvolvimento da criança. Compara-se uma criança a outra. Estabelecem-se padrões de normalidade de intelecto. Pela observação é possível perceber quando o desenvolvimento intelectual da criança difere da normalidade. Esta diferença encontra-se além ou aquém do esperado? Trata-se de uma deficiência mental ou de algum distúrbio que pode estar 19 gerando uma dificuldade? Mesmo que seu intelecto esteja dentro dos padrões da normalidade, seja ele médio ou médio superior, algum distúrbio de aprendizagem pode se manifestar. A detecção dos problemas de aprendizagem e tratamento adequado pode reverter o quadro, favorecendo o desenvolvimento intelectual da criança. 20 CAPÍTULO 2 - O AUTISMO É possível encontrar vários significados e conceitos para o termo autismo. Para este trabalho recorremos à Sociedade Americana de Autismo (ASA), ao Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais, 4ª edição, DSM IV (2002), à Classificação Internacional de Doenças, CID-10. A Autism Society of American, ASA, define autismo como: uma inadequacidade no desenvolvimento que se manifesta de maneira grave por toda a vida. É incapacitante e aparece tipicamente nos três primeiros anos de vida. Acomete cerca de 20 entre cada 10 mil nascidos e é quatro vezes mais comum no sexo masculino do que no feminino. É encontrado em todo o mundo e em famílias de qualquer configuração racial, étnica e social. (AUTISM-SOCIETY, 2011) Os sintomas são causados por disfunções físicas do cérebro, incluindo: 1. Distúrbios no ritmo de aparecimentos de habilidades físicas, sociais e lingüísticas. 2. Reações anormais às sensações. As funções ou áreas mais afetadas são: visão, audição, tato, dor, equilíbrio, olfato, gustação e maneira de manter o corpo. 3. Fala e linguagem ausentes ou atrasadas. Certas áreas específicas do pensar, presentes ou não. Ritmo imaturo da fala, restrita compreensão de idéias. Uso de palavras sem associação com o significado. 4. Relacionamento anormal com os objetivos, eventos e pessoas. Respostas não apropriadas a adultos e crianças. Objetos e brinquedos não usados de maneira devida. (AUTISM-SOCIETY, 2011) O Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais, 4ª edição, DSM IV (2002), é publicado pela Sociedade Americana de Psiquiatria e fornece os critérios de classificação dos Transtornos Mentais. Neste, o Transtorno Autista, sob código, F84.0, é também denominado autismo infantil precoce, autismo da infância e autismo de Kanner. Consta os quadros Transtorno Autista, Transtorno de Rett, Transtorno Desintegrativo da Infância, Transtorno de Asperger. Suas manifestações variam de acordo com o desenvolvimento e idade cronológica. Caracteriza-se pelo desenvolvimento acentuado anormal ou prejudicado na interação social e comunicação, de atividades e interesses. Pode haver prejuízos múltiplos com comportamentos não-verbais (contato visual, expressão facial, posturas e gestos corporais) que regulam a interação social e a comunicação. (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2002) 21 Para a Classificação Internacional de Doenças, CID-10 (2000) o autismo infantil (F84.0) é um transtorno global do desenvolvimento caracterizado por: desenvolvimento anormal ou alterado, manifestado antes da idade de três anos. Atribui-se o diagnóstico a crianças que apresentam comprometimento qualitativo à integração social recíproca e à comunicação, além de comportamento restrito, estereotipado e repetitivo. O transtorno acompanha comumente de numerosas outras manifestações inespecíficas, como: fobias, perturbações de sono ou da alimentação, crises de birra ou agressividade (auto-agressividade).(DATASUS, 2008) É possível inferir que dentro as várias conceituações sobre o autismo, seja denominado por Autismo Infantil ou Transtorno Autista, dentre outras, eles se entrecruzam. Desta forma, pode-se considerar que o transtorno autista acomete crianças até três anos de idade, afetando suas relações interpessoais e apresentando manifestações comportamentais típicas e estereotipadas. No autismo, como Tânia Ferreira nos traz em A criança e a loucura – apontamentos sobre a clínica do autismo e da psicose (2000), o sujeito encontra-se em dois mundos, seu mundo autista e o mundo das relações, tão amedrontador que é preferível evitá-lo, utilizando-se de recursos estereotipados e repetitivos, afastando o mau que tentar se aproximar. 2.1- AUTISMO E PSIQUIATRIA Flora Fernandes em seu artigo Psicopatologia – Introdução e definição (2008) define Psicopatologia como estudo descritivo dos fenômenos psíquicos de cunho anormal, exatamente como se apresentam à experiência imediata, de forma independente dos problemas clínicos. Estuda os gestos, o comportamento e as expressões dos enfermos além de relatos e autodescrições realizadas pelos mesmos. Oscar Cirino em Psicanálise e Psiquiatria com crianças: desenvolvimento ou estrutura (2001) enfatiza os dizeres de Jaspers que em psicopatologia, todo o procedimento do clínico é guiado pelo que ele chama de “relações de 22 compreensão”, ou seja, pelo esforço de representar o vivido do doente no fenômeno em si, ou na compreensão genética. Levando-o a distinguir a patologia constitucional compreensível e a patologia não compreensível, que corresponde aos casos de etiologia orgânica (com causa corporal conhecida) e às grandes psicoses ditas “endógenas” (sem causa corporal conhecida). Cirino (2001) relata que no fim do século XVIII a criança toma o estatuto de pessoa, merecendo cuidados específicos, dentre eles, saúde e educação. Para Paul Bercherie em A clínica psiquiátrica da criança (1992) o saber psiquiátrico sobre a criança ocorreu em três tempos. O primeiro tempo ocorreu no fim século XIX e dedicou-se exclusivamente a discussão sobre o retardamento mental. O segundo momento, no início do século XX, a nosologia do adulto começou a ser aplicado à criança, há, então, a introdução do termo Dementia precocíssima descrevendo casos de início precoce da Dementia praecox de Kraepelin. O terceiro momento iniciou na década de 1930 e estende a atualidade, estabelece a clínica psiquiátrica específica da criança. Os recursos para a clínica da criança foram importadas da clínica do adulto, diferindo-se desta, pois sua abordagem atual e conceitualização estão bem separados dos paradigmas médicos – que continuam marcando à clínica do adulto – e fortemente impregnados dos métodos psicanalíticos, que consiste na interpretação do inconsciente por meio da associação livre, sonhos, atos falhos e chistes. Não há nada surpreendente no fato de que ela desempenhe, desde então um papel de guia e que exerça uma função de abertura para o conjunto da clínica. (CIRINO, 2001). Isabela Santorio Campanário em Espelho, Espelho meu: A psicanálise e o tratamento precoce do autismo e outras psicopatologias graves (2008) apresenta o breve histórico das patologias infantis desde o início da clínica com crianças. Dentre elas há a Dementia infantilis descrita por Heller, com o quadro designado pelo termo Psicoses desintegrativas. Neste, o desenvolvimento da criança é normal até dois anos, seguida por perda definitiva de habilidades adquiridas, acompanhado de um funcionamento social anormal, regressão da linguagem, podendo ocorrer perda do controle intestinal e vesical. Há, também, diminuição do interesse pelo ambiente, maneirismos e comprometimento do tipo autista da interação social e da 23 comunicação. Raramente ocorrem alucinações visuais e auditivas. (CAMPANÁRIO, 2008) Ainda, ao lado do autismo, há a psicose simbiótica onde há predomínio da ligação excessiva e patológica com a mãe. Nesta, a mãe permanece indiferenciada do self, consequentemente, as realidades internas e externas são fundidas, persistindo além da idade simbiótica normal, pois ao nascer o bebê não se distingue da mãe, sendo os dois, um ser único, para ele. Qualquer possibilidade de separação ameaça a ilusão de simbiose entre a mãe e a criança, provocando reações de pânico, restituindo o delírio parasito-simbiótico de unidade com a mãe. (MALHER apud AZEVEDO 2009). Também ao lado do autismo, há a esquizofrenia infantil, que surgiu em 1926 com Homburger. Seus critérios diagnósticos foram sistematizados por Potter em 1933, reforçando a existência da psicose em crianças, entre eles: retração generalizada dos interesses, distúrbios do pensamento e afetividade diminuída, rígidos ou distorcidos. Em 1978, Ajuriaguerra classifica esta patologia entre as psicoses da idade escolar, ou seja, que aparecem entre 5 e 12 anos de idade, por isso é, também, conhecida como Psicoses da fase de Latência. Com início insidioso e progressivo, caracteriza-se por distúrbios de conduta, retraimento autista e alterações de humor. Estereotipias são comuns, incoerência, neologismos, linguagem cifrada ou mesmo língua estrangeira podem aparecer na fala. Porém, diferente do autismo há pouca ecolalia e inversão pronominal. (CAMPANÁRIO, 2008) O termo esquizofrenia infantil desapareceu na CID 10, e essas crianças são classificadas como portadoras de transtorno esquizofrênico, de conteúdo fantástico (criações mentais absurdas) ou persecutório (sensação de perseguição). (CAMPANÁRIO, 2008) Segundo Campanário (2008), em 1801, houve a descrição de um caso de autismo, nos bosques de Aveyron, na França, de um menino com cerca de doze anos de idade. Os sintomas eram típicos, como tendência a pisar nas pontas dos pés, cheirar os objetos e ausência de linguagem. Entretanto, o termo autismo só foi introduzido na literatura médica por Bleuler em 1911, como neologismo do termo “auto- 24 erotismo”, (retirando o Eros, o sexual) utilizado por Freud para referir-se às neuroses narcísicas (psicoses), quando o sujeito começa por tomar a si mesmo, ao seu próprio corpo, como objeto de amor. Desta forma, para Bleuler as três características fundamentais da esquizofrenia eram o autismo, como já descrito anteriormente, a ambivalência, isto é, pensamentos antagônicos ou sentimentos contraditórios, e a dissociação psíquica, ou desprendimento da realidade. O autismo, portanto, significava perda de contato com a realidade. O termo foi criado a fim de ser utilizado como sinal fenomenológico da esquizofrenia, não definido como entidade nosológica própria, ou uma doença ou transtorno específico. Assim, o autismo não era uma doença, mas característica de outra. (CAMPANÁRIO, 2008) Em 1943, Kanner distinguiu o autismo da esquizofrenia, visto o retraimento ocorrer desde o início do desenvolvimento. Uma síndrome única, em que a desordem fundamental era a incapacidade de relacionamento com outras pessoas desde o início da vida. O psiquiatra definiu a patologia como própria da criança, com primeiros sintomas nos dois primeiros anos de vida e com características como: linguagem alterada ou inexistente, preferências por atividades repetitivas, mesmice e isolamento extremo, mas com inteligência normal. A princípio, Kanner salientava que os pais dessas crianças eram intelectualizados, porém distantes afetivamente. Posteriormente, ele mesmo, postulou a organicidade para a patologia. (CAMPANARIO, 2008) Flávia Chiapetta Azevedo em Autismo e Psicanálise (2009, p.28), pontua que o autismo trata-se de “uma síndrome que descreve os distúrbios, decorrentes da entrada do bebê no mundo”. Campanário (2008) apresenta a Síndrome de Asperger, ou Psicopatia Autística, descrita por Asperger em 1944, com variedades leves de autismo, maioria com inteligência global normal ou superior, e ocasionalmente, episódios psicóticos na fase adulta. São os autistas que conseguem maiores laços afetivos, escolarização e inserção no mercado de trabalho. E, também, a Síndrome de Rhett, a qual acomete somente meninas, descrita por Rhett, em 1966. Esta foi distinta do autismo em 1983, mas atualmente incluída pela CID 10, ao lado do autismo, entre os transtornos 25 globais do desenvolvimento. Nesta síndrome, as meninas desenvolvem-se normalmente até dois anos de idade, havendo em seguida perda total ou parcial das habilidades manuais e da fala, desaceleração do crescimento do crânio, surgem movimentos de lavar as mãos, prejuízo mental grave, marcha de base alargada, hipotonia, atrofias espinhais com incapacidade motora que se desenvolvem na adolescência. Elas podem ter convulsões de difícil controle. A partir de 1970, o autismo começa a mudar de visão. Em 1987, passa a ser chamado de “distúrbio autístico”. Na CID 10 deixa de ser considerado psicose e passa a ser “distúrbio global de desenvolvimento”, ampliando os critérios diagnósticos, visualizando-a somente enquanto sinal fenomenológico. A partir da década de 90, surgem outros termos como “transtorno do espectro autista” em crítica a denominação anterior. Passa a ser cada vez mais uma síndrome comportamental, com prejuízo neurológico e etiologias variadas. (CAMPANÁRIO, 2008). Donald Winnicott em Da dependência à independência no desenvolvimento do indivíduo (1982) critica o conceito de Kanner, dizendo que o autismo infanti precoce não existe. Para ele destacar o autismo de outra psicose serviria apenas para destacar fenômenos de ensimesmamento e o afastamento da realidade. O autor apresenta a idéia do buraco negro, postulando que o isolamento fazia parte da constituição de um eu separado do psiquismo materno, apontando o ódio inconsciente da mãe em relação a seu bebê. Marie-Chistine Laznik em A Voz da Sereia: o autismo e os impasses da constituição do sujeito (2004) relata que as crianças que não são detectadas pelo instrumento de rastreamento precoce de autismo, que identifica indícios desse transtorno em crianças entre 18 e 24 meses - M- CHAT (Modified Checklist for Autism in Toddlers) - e comprovam serem autistas posteriormente apresentam uma precoce capacidade de fazer o que se espera delas em um teste, como o mimetizar o brincar simbólico. Segundo observação clínica de Campanário (2008), a maioria dos autistas gosta de música, podem cantar bem, apresentam facilidade com quebra-cabeças, jogos de encaixe, material elétrico ou mecânico. Podem ser superdotadas em áreas específicas, porém apresentam dificuldades em atividades básicas da vida. Na 26 medida em que eles se aproximam da idade adulta as características autísticas se perdem. Alguns passam a se assemelhar com indivíduos débeis. Outros podem apresentar características de surto esquizofrênico. Não é possível “enquadrar” o transtorno dentro da psicose infantil, nem “desenquadrá-la”, também não se sabe se é um déficit cognitivo ou déficit social primário. Sabe-se que comportamento e o déficit perpassam seu conceito. 2.2- AUTISMO E PSICANÁLISE O autismo surge do campo da psiquiatria, encontrando, também, duas vertentes na psicanálise, sendo a primeira desenvolvimentista, pela forma como se concebe o sujeito e a segunda a lacaniana, com rigor teórico. (AZEVEDO, 2009) 2.2.1 Vertente desenvolvimentista Azevedo (2009) e Campanário (2008) afirmam que a psicologia do desenvolvimento é limitada e restrita para esclarecer as manifestações constatadas em cada faixa etária, mas são de grande auxílio na detecção de quadros psicopatológicos graves, sendo que na primeira infância as manifestações são mais sutis, tornando mais evidentes a partir dos dois anos. Nesta vertente a constituição do sujeito ocorre como um acesso progressivo dos estágios do desenvolvimento. O que é um “risco supor que a subjetivação do bebê é conseqüência de um processo maturacional” (CAMPANÁRIO, 2008, p. 42). O primeiro estágio é marcado por relação dual, pressupondo a dualidade mãe-bebê. Psicanalistas, pós-freudianos, com embasamento na vertente desenvolvimentista como Margaret Malher, Bruno Bettelehim e Frances Tustin consideram o autismo como um desvio do curso habitual do desenvolvimento, devido ao fracasso da relação do bebê com o objeto (mãe). Cada um desses autores denominam essa 27 relação diferentemente, para Mahler, simbiose social; paraísos perdido ou idade dourada para Bettelheim e para Tustin útero pós-natal. (AZEVEDO, 2009) Margaret Mahler em Sobre a psicose infantil e esquizofrenia: psicoses autisticas e simbiótica da infância. (1983) considera que a criança gradualmente passa de uma fase quase vegetativa e simbioticamente dependente da mãe para a separação individual. Assim, na simbiose autística infantil, uma deficiência no ego impede o bebê de perceber a mãe como figura representativa do mundo externo. Ela não é catexizada, fixa como objeto parcial indiferenciado dos objetos inanimados. Bruno Bettelheim em A fortaleza vazia (1987) tem uma visão psicológica, onde autismo é uma patologia para proteção do sujeito das agressões externas. Na fase de dualidade mãe-bebê a alteridade não comparece, há a idéia de plenitude primordial, onde nada se pede e tudo se ganha. É uma fase de adaptação entre mãe e bebê tendo a reciprocidade como ponto de partida. A sensação, a percepção e a experimentação dominam essa relação. A expectativa da mãe sobre o desenvolvimento do bebê deve “ser justa, de boa medida, nem mais, nem menos” (p.39) e a atividade do bebê desempenha papel fundamental para o desenvolvimento normal, ou seja, a experiência interior da criança de que suas ações influenciam o mundo externo. Nesse sentido, o desenvolvimento da criança ocorre na medida em que ela conscientiza que seus esforços são percebidos e valorizados pelo meio. Quando ela não percebe essa valorização o autismo é desencadeado. O termo autismo para Frances Tustin em Estados autísticos em crianças (1984) designa um estado de sensação, centrada e dominada no corpo, constituindo a essência do eu (self). Seu trabalho é marcado por dois momentos. No primeiro segue o trabalho de Mahler e estabelece uma fase inicial do desenvolvimento, o autismo primário normal. O autismo patológico é uma fixação ou regressão ao primeiro estágio, caracterizado pela indiferenciação entre o eu e o não eu, ou seja, a experiência não é diferenciada ou objetivada em qualquer extensão apreciável. Assim, ao combinar esta indiferenciação à preocupação da mãe, uma relação denominada pelo autor como útero pós natal é constituída. Como se a relação intra uterina permanecesse após o parto. O autismo patológico é, portanto, concebido como experiência prematura à separação. 28 Frances Tustin em A perpetuação de um erro (1995) revê seus conceitos, a partir de um caso clínico. Neste segundo momento o autismo passa a ser uma aberração do desenvolvimento, uma reação protetora contra estresse ligado a ruptura da mãe. Ao nascer, o bebê sente que ele e sua mãe são um ser único, há uma relação dual. Uma cisão da relação com a mãe deve ocorrer, de forma natural, porém nem sempre isso é vivido desta forma pelo bebê, que ao estar despreparado para a ruptura, pode reagir de forma estranha da habitual, como uma forma de autoproteção. O autismo passa a ser uma doença de dois estágios, primeiro, há uma perpetuação da unidade dual e depois a ruptura traumática disso e o estresse que ela desperta. Portanto, o autismo é uma reação à separação prematura, quando o sujeito ainda não se preparou para tal. Para Azevedo (2009) estes três autores, pós-freudianos, desconsideraram a teoria psicanalítica da descoberta do inconsciente, visto equivalerem eu e consciência. Eles entendem o ego ou self de forma diferente de Freud. Lacan, por sua vez, resgata o estatuto do inconsciente, elaborando a categoria do grande Outro. 2.2.2 Vertente da psicanálise Tânia Ferreira (2000) a criança autista vive no vazio, numa solidão entrincheirada, num vazio de história. Para a autora, não há déficit na estrutura no autismo, trata-se de uma montagem lógica onde há sujeito, alguém que demanda e deseja, que está inserida no discurso e dentro da linguagem, sendo, portanto, o sujeito do inconsciente, o sujeito do significante, como afirma Lacan apud Cirino (2001). Colete Soller em Fora do discurso: autismo e paranóia (1994) denomina o autismo como doença da libido. Consideramos libido como referente à manifestação da pulsão sexual no psiquismo, sendo que enquanto dimensão fundamental da pulsão, esta se liga aos objetos e pode se deslocar em seus investimentos mudando de objeto (auto-erótico, narcísico, homossexual, heterossexual) e de objetivo (sexual ou não sexual). Além de diversificar-se quanto à sua fonte de excitação, encontrada, também, todo processo funcional do corpo, mesmo que seja mais intensa nas zonas erógenas: oral, anal, uretro-genital. (FREUD apud CIRINO 2001). 29 Desta forma, para Soller (1994) no autismo há uma perturbação ou alteração das relações objetais, provocada pelo distúrbio da libido, encontrando-se dentro do estatuto de sujeito, pois apesar de estar fora do discurso, estão dentro da linguagem. Eles não podem assumir o lugar de sujeito da enunciação, há no Outro significantes que os representam. Do ponto de vista da psicanálise lacaniana, a relação entre autismo e esquizofrenia apresenta divergência. Rosine e Robert Lefort (apud AZEVEDO, 2009) consideram o autismo uma falência de estrutura, ou uma quarta estrutura diferente das existentes: neurose, psicose e perversão. Já Pierre Bruno considera o autismo dentro da estrutura psicótica, próximo a esquizofrenia, o que as diferencia é o momento de desencadeamento. Jacques Lacan quase não fez menção ao autismo, mas aproximou-o da esquizofrenia, visto ser o autor que estabeleceu e sistematizou o conceito de estrutura em psicanálise. Distinguiu a neurose, a psicose a perversão, considerando os modos de interdição no sujeito. Na neurose, o recalque; na psicose a foraclusão; na perversão a recusa ou desmentido da lei interditora do pai. (CAMPANÁRIO, 2008) Campanário (2008) concorda com autores como Robert e Rosine Lefort que consideram o autismo como uma quarta estrutura, ou seja, fora das três estabelecidas pela psicanálise. Para eles, não haveria Outro que se reduz a uma ausência, não existindo objeto a para elas. Ela está por inteiro no lugar desse objeto, não especularizável, sem imagem especular. Segundo Azevedo (2009) ao estudar o autismo pelo olhar fenomenológico. Um olhar pelo que se mostra, pelas coisas em si mesmo. Pois, é possível perceber várias características marcadas pela falta, como: ausência de fala, ausência de demanda, ausência de imagem especular. Ao considerar essa presença-ausência ela interroga se no autismo o sujeito é inconstituído pela ausência de elementos essenciais à sua constituição ou é uma resposta às vicissitudes, ocorridas por tais elementos. Assim, para ela, “não existe perda total da realidade: o sujeito encontra-se em dois mundos o mundo autista e o mundo de relação com os outros seres humanos” (AZEVEDO, 30 2009, p. 18), o qual uma destaca sobre a outra. Desta forma, para localizar o lugar do sujeito é necessário passar pela alteridade1 de si mesmo. 2.2.2.1 A constituição do sujeito versus autismo Para Sigmund Freud em Projeto para uma Psicologia Cientifica (1895), a relação dual é inconcebível. É a partir do semelhante que o sujeito aprende a conhecer. Esse complexo do próximo divide-se em dois: no primeiro corresponde ao que é qualidade de objeto, formulado como atributo, isto é, representado, inscrito no sistema de memória. Sua outra parte é inassimilável, permanecendo excluído de todas as associações possíveis, denominado por Coisa, Das Ding. Nesta, o Outro apresenta-se como algo familiar e ao mesmo tempo estranho. Ele é semelhante, é pura alteridade. Isto limita a relação sujeito/Outro, impedindo a reciprocidade. Não é objeto que se perdeu, é a presença do vazio, porque o objeto é perdido por sua natureza. Assim, a constituição do sujeito ocorre pela ausência do objeto, que estabelece a falta, jamais suturada. A falta designa a impossibilidade de haver relação recíproca entre o bebê e a mãe. Sigmund Freud em Além do Princípio do Prazer (1920) relata sua observação do brincar de seu neto de 18 meses. A criança jogava e puxava um carretel e dizia fort (fora) e da (aqui). Ele fazia o movimento de aparecer e desaparecer o carretel, diante a ausência de sua mãe. Esse movimento repetitivo era a tentativa de elaborar algo impressionante, a ausência materna. É possível inferir, a partir dessas observações que o brincar é uma linguagem a qual a criança é tomada por ela. O jogo é iniciação ao simbólico. Os jogos de ocultação são, assim dizendo, antecipadores da ausência/presença. A oscilação entre presença e ausência materna produz um revezamento psíquico, não marcando a função materna como sempre presença ou sempre ausência. Essa alternância simbólica permitirá a inscrição pulsional, passando do nível da necessidade para o nível desejante. A alterização consistirá na manifestação 1 Alteridade (ou outridade) é a concepção que parte do pressuposto básico de que todo o homem social interage e interdepende sozinho. O outro não é um objeto para um sujeito. (GODIM, 2005) 31 simbólica, não no próprio corpo. Assim, a mãe não deve fazer a criança apenas um objeto de sua satisfação, situando a lei como referência entre seu laço e a criança. (CAMPANÁRIO, 2008). Campanário (2008) pontua que os cuidados maternos mapeiam o organismo ao percorrê-lo, distingui-lo, organizá-lo e historicizá-lo. O corpo torna-se libidinizado, assim o gozo do fluxo vital é submetido à linguagem, a qual faz deste ser vivo, um sujeito. A pulsão opera circularmente, fazendo um movimento circular. Sai da borda erógena, orifício, furo, algo não especularizável, que não passa pelo registro da imagem, onde não há um real de corpo específico e retornando pela resposta do Outro, pelo objeto a, objeto perdido da satisfação, substituto do fluxo vital pelos significantes oferecidos pelo Outro. Assim, o sujeito começa no lugar do Outro, onde surge o primeiro significante. Pela circularidade da pulsão, o sujeito atinge a dimensão da falta, no Outro. Os significantes se substituem, mas não se igualam. O intervalo de ida e volta destaca a hiância, onde reside o sujeito. Segundo Colete Soller em O sujeito e o outro (1997) as pulsões não falam, satisfazem-se na ação. Silenciosamente sem se escreverem no tempo. O sujeito não evita, não detém, não escolhe e não assume a pulsão. Ele é dividido, tanto pelo significante quanto pela pulsão. O tempo para Campanário (2008) é significante da assunção subjetiva, ele é deslocamento, é recalcamento. Sem ele, tudo é contínuo. Repetição sem diferença. Neste sentido, a separação é intervalo, o que permite a função da fala e o aparecimento do sujeito dividido. Jacques Lacan (1985) em O seminário, livro 11, Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise esclarece que o sujeito aparece no intervalo dos significantes (S1 $ S2). Na ausência desse intervalo, a primeira dupla de significantes se solidifica, se holofraseia, não permitindo o aparecimento do sujeito dividido pelo significante. O significante S2 que permite a representação por S1 comparece singularmente. Holófrase para Lacan (1985) é a ausência da dimensão metafórica. É outro nome dado à Foraclusão do Nome-do-Pai, onde o sujeito dividido não aparece. Quando 32 não há dimensão metafórica, há solidificação dos significantes. Seu efeito é a não dialetização do significante. Assim, não permite o aparecimento de outros significantes, do traço unário, pois S1 e S2 ocupam o mesmo lugar. Seguindo Lacan (1985) o primeiro significante, do traço unário, representa o sujeito ao ser introduzido no campo do Outro por outro significante (S2), e permite o sujeito entrar como falta, mas na afânise, quando há desaparecimento do sujeito enquanto dividido, ele desaparece. Na holófrase o sujeito aparece como um monólito onde a significação se iguala à mensagem enunciada, não aparecendo como falta. Não há, também, objeto a, como causa de desejo. Para Lacan, ocorre a holófrase na psicose, na debilidade e no fenômeno psicossomático, bem como no autismo, por este se aproximar da esquizofrenia. Campanário (2008) recorda que na ausência do intervalo entre significantes eles se solidificam, não se separam. Mas, é a separação que permite a função da fala e o aparecimento do sujeito dividido. Impossível para o autista. Se não há o intervalo que permite o aparecimento do Outro como falta, não há interrogação de seu saber. Há a alienação do saber do Outro. A criança encontra-se no limiar da estrutura da linguagem, algo que não se sabe ler. Nessa holófrase há um sujeito, não o sujeito dividido pela separação, mas um sujeito fixo ao terceiro tempo pulsional, mantido como objeto da subjetividade materna. Para Jacques Lacan em Duas notas sobre a criança (2003) a criança nesta posição é correlata do objeto a no fantasma materno. Jacques Lacan (1955) em Variantes do tratamento padrão retoma Freud, afirmando que o sujeito se constitui por intermédio da falta, marcando a alteridade na relação sujeito e Outro. Azevedo (2009) lembra a alteridade abordando-a pelos três “a” – o pequeno autre , o grande autre, e o objeto e articulando os três registros: Real, Simbólico e Imaginário. No texto Jacques Lacan: o simbólico, o imaginário e o real, Maria Bernadette Soares de Sant´Ana Pitteri (2010) apresenta os conceitos destes três registros. Imaginário difere da imaginação, relaciona-se com as imagens e não se confunde com o campo do analisável, embora o analisável sempre encontre o Imaginário em sua fixidez. O 33 simbólico aparece na análise, através dos sintomas e dos atos falhos e leva a perceber o funcionamento dos símbolos na linguagem, a partir da articulação significante e significado, o equivalente da estrutura de linguagem. Enquanto o real, é ou a totalidade ou o instante esvanecido, aparece jungido ao Simbólico e ao Imaginário. O Real é aquilo que sobra, o resto do Imaginário a que o Simbólico é incapaz de capturar – é o impossível. Assim, “o pequeno a é o outro, a partir do qual o eu poderá se constituir. O grande A é a referência significante, é o S2 para o qual S1 representa o sujeito. O objeto a é uma alteridade referida a um estranho mais íntimo de Freud.” (AZEVEDO, 2009, p. 61) Sigmund Freud em seu texto Sobre o narcisismo: uma introdução (1914) conclui que o narcisismo secundário surge na medida em que a libido é desinvestida do objeto e se reporta ao ego. Ou seja, o ego é desenvolvido, num movimento do interior para o exterior. Jacques Lacan (1953-54) em O seminário, livro 1: Os escritos técnicos de Freud, seguindo os conceitos de Freud, elabora o estádio do espelho. Este estádio marca o momento em que a criança percebe a noção unidificada do seu corpo, num domínio imaginário. Azevedo (2009) ressalta a partir da visão da imagem do outro a criança antecipa a representação do seu corpo. O eu se constitui em relação ao outro. A experiência inicial da semelhança entre o eu e o outro implica também na descoberta da alteridade. Em O estádio do espelho como formador da função do eu (1949), Jacques Lacan, ressalta que tal relação é constituída a partir da matriz simbólica em que o eu precipita-se em uma forma primordial, para objetivar-se na dialética da identificação com o outro. Porém, essa matriz desencadeia uma experiência de inadaptação do sujeito em relação a sua imagem. O simbólico prevalece sobre o imaginário tal como o Ideal do eu prevalece sobre o eu-ideal. Assim o ideal do eu corresponde à dimensão simbólica, e, portanto, com a identificação com o pai, sendo uma introjeção simbólica. Enquanto o eu-ideal é uma projeção imaginária. Azevedo (2009) argumenta que no autismo o Ideal do eu não se constitui, a palavra não 34 chega a ele, não há dimensão simbólica que regula e estrutura a dimensão imaginária. Há a falta da função de reconhecimento pela instauração do Ideal do eu. Lacan em Seminário, livro 10, A Angústia (1962-1963) fala do fenômeno da despersonalização, ou seja, o que é visto é angustiante pelo não reconhecimento da imagem especular, determinado pela ausência do reconhecimento do outro. Para o autor, a identificação ocorre apenas com um aspecto, com um traço unário, o que permite a constituição do sujeito, fazendo-o sentir-se desejado e incluído no simbólico. A dimensão simbólica tem função mediadora, capaz de identificações pacificantes na violência imaginária. O eu não se iguala ao outro. Algo escapa. Daí o outro é também objeto de rivalidade e concorrência do eu pelo mesmo lugar. Torna-se fonte de sustentação da agressividade constitutiva da formação do eu e do laço social. Na impossibilidade de coincidir com a imagem especular mediante a decepção da não alienação total, surge a psicose. (AZEVEDO, 2009). O grande Outro, A, para Lacan O seminário, livro 3, As psicoses ( 1955-1956), é o lugar do inconsciente, “presente para todos e vedado para cada um” (LACAN, [19551956] 1998, p. 554). O Outro é definido como o campo do código, da palavra, da linguagem. Ele estabelece uma verdadeira alteridade para o sujeito, mediando o desdobramento de si para consigo mesmo e também com o semelhante. O Outro é aquilo diante do qual se faz conhecer, devido ao reconhecimento dado a ele. Azevedo (2009) salienta que a relação entre os dois outros ( A e a) apresenta-se sob a forma de duas falas: a fala fundadora e a fala mentirosa. É fundamental em ambas o apontamento que fazem para um mais além do outro, exibindo que a presença do Outro é alteridade na relação imaginária do sujeito com seu semelhante, o outro. A fala fundadora, funda as posições do sujeito e do outro. É nela que é revelado que é do Outro que se reconhece. Ela funda o inconsciente. Azevedo (2009) questiona a fala ecolálica do autismo, a qual é caracterizada por repetições de palavras ou frases, como são ouvidas pelo Outro, sem inversão de pronomes. E articula a função Bejahung, uma afirmação que implica em expulsão, Ausstossung, marcada pela negação. Assim, a operação Bejahung- Ausstossung articula a formação do sujeito, 35 pois ao trabalhar o dentro e o fora marca a diferenciação eu e não-eu. No autismo, não faz a Bejahung dos vocábulos, daí a ecolalia, a repetição de palavras tal como se ouve pelo Outro. Azevedo (2009) ressalta que o nome próprio, também, tem função articulada à constituição do sujeito. Ele é um traço unário, uma marca distintiva, sem significação, sem representação. O sujeito se constitui a partir do assujeitamento ao significante primeiro, que sobredetermina a cadeia significante. Assim, sua história é marcada pelo valor primordial já presente. E, completando a alteridade pelos três as, temos ainda o objeto a. Este é o resto que se perde à significantização, ou seja, ele surge no intervalo onde um significante representa um sujeito para outro significante, que na esfera de significantes, está perdido. A linguagem não pode cobrir tudo, ela não representa o sujeito em sua totalidade. Desta forma, o objeto a cai, é um resto na relação sujeito e o Outro, assim, ela instaura a falta em ambas as partes, tornando-se causadora de Desejo. Um desejo enigmático, visto o desejo do homem ser desejo do Outro, na medida que se deseja o que lhe falta, o objeto a. (AZEVEDO, 2009) Seguindo o raciocínio de Azevedo (2009) sobre o objeto a, temos que para que o sujeito ocupe o lugar de objeto causa de desejo é necessário que o Outro seja barrado, pois a possibilidade da ausência é fundamental para que uma presença se afirme. É na ausência do Outro que a Bejahung, enquanto primeira afirmação, pode se constituir. Assim, no autismo não ocorre a primeira simbolização, consequentemente não há queda do objeto a, e o Outro não é barrado. E por não ser barrado, o Outro se torna invasor, com poder de vigiar, de penetrar, de aniquilar. É a mãe quem “dá um verdadeiro banho de língua” no seu bebê, fundamental para sua constituição enquanto sujeito. Conforme Campanário (2008) ela cria manifestações de subjetividade no bebê através do manhês, pela maneira particular que cada mãe possui para falar com seu filho. Esta subjetividade antecipada faz do bebê um interlocutor. Seu início se dá nas protoconversações, passa pela fala infantilizada, quando se faz de conta que o bebê fala, indo até as pausas longas, onde o lugar locutório do bebê se faz presente. São nessas pausas longas que o lugar do falante do bebê é garantido. O deslocamento para o lugar de mãe ocorre, 36 por volta dos nove meses, quando a fala materna passa a pontuar as produções do bebê pela fala ritmada, inserindo a criança no compasso da língua. A partir dos quinze meses a criança assume seu lugar de sujeito, como outros lugares, como sua mãe. Esse momento é da fala enfática. A mãe o introduz na linguagem. Laznik (2004) compara os manhês com a voz da sereia, que tem picos prosódicos acentuados que pode atrair e provocar alienação. Para ela, a voz antecipa ao olhar do bebê. Conforme estudo apresentado por Campanário (2008) os picos prosódicos dos pais de crianças autistas parecem ser diminuídos, com menos entonações de alegria e surpresas, o contrário ocorre em casos de crianças com risco de evolução psicótica. Enquanto no autismo não há atração, na psicose há excesso de atração. Azevedo (2009) recorda Lacan ao dizer que a sustentação de uma família advém do desejo, não anônimo. A função da mãe, seus cuidados, deve ser marcada por um interesse, mesmo que sejam suas próprias carências. O desejo da mãe é fonte de transmissão do Nome-do-Pai. O pai é instaurado como Nome pela mãe. Porém, é uma transmissão um a um. Esta metáfora paterna tem função dupla: instauração da lei, submetendo inclusive a mãe, e produção do sentido ao enigma do desejo da mãe. Em outros dizeres, a mãe instaura para a criança um lugar fora dela, uma posição terceira, entre ela-mãe e a criança. Porém, é importante que a mãe esteja submetida a uma lei não sua, de um Outro, e seu objeto de desejo deve ser remetido a esse mesmo Outro, permitindo a criança a reconhecer-se sem o falo, como sua mãe. Bem como ser desejado por ela, onde é suposto estar e onde se torna possível tê-lo. Ocorre, assim, a intervenção do pai pela inscrição da dialética do ter da mãe e da criança; mãe não tem falo, pode desejá-lo onde o detém, a criança igualmente desprovida, pode desejá-lo junto a quem tem, o pai. A operação Bejahung/Ausstossung é efetivada pelo Nome-do-Pai, que ordena a cadeia significante e produz significação ao enigmático Desejo da mãe. (AZEVEDO, 2009) Cláudio Munayer David em A linguagem sonora (2004) considera a voz o primeiro instrumento melódico, as mãos e os pés os primeiros instrumentos de percussão. O bebê já pode ser afetado pela voz no último trimestre de gestação, ele é, portanto, 37 precoce em relação ao contato com o estímulo sonoro. A fala e a música remetem a própria significação humana. Dos conceitos tratados até o momento, pode-se interrogar se no autismo é evidente a ausência do Outro? Azevedo (2009) reflete que a relação do autismo com o Outro parece apontar para o lugar da linguagem. As crianças autistas não são máquinas falantes, elas parecem fazer algo com os significantes advindos do outro. As palavras têm peso muito grande. Elas são tomadas como coisa. Não há metáfora. Ela, ainda, ressalta que crianças autistas não utilizam do pronome eu, tratando a si próprias em terceira pessoa, visto não haver “certificado de recepção” da mensagem vinda do Outro. Assim, no autismo, pode haver certa apreensão dos vocábulos, mas deles não é feito a Bejahung,ou seja, um sim ao simbólico. Dessa forma, não há admissão do traço unário no simbólico. Na psicose não há Bejahung do Nome-do-Pai, no autismo, antes da foraclusão do Nome-do-Pai, não há inscrição no simbólico de uma simples cadeia de significantes. Não há Bejahung do S1 o que lança o S2 para fora do simbólico. Neste sentido, a não Bejahung dos significantes advindos do Outro, estes se tornam tão potentes que invadem o sujeito, as palavras são verdadeiramente coisas, há presença excessiva do Outro, que os invadem, causando-lhes horror. 2.2.2.2 O som e o silêncio François Daniel Villa em seu texto O mutismo da criança autista: uma promessa de silêncio? (2010) questiona se a criança autista encontra-se no limiar do nosso mundo e diz que basta pronunciar “criança autista” para que ocorra um cortejo de imagens, para que se delineie a empresa da fascinação. Fala-se dela como um mágico onipotente, universo como impenetrável, incompreensível. Compara-a a um anjo, evoca-se sua beleza. Parecerá estar na superfície de nosso mundo em “contato direto” com alguma coisa que nos escapa e que a mantém indiferente ao nosso mundo e aos humanos. (VILLA, 2010, p. 181) Villa (2010) se impressiona com o mutismo das crianças autistas, porém para ele, mesmo quando não se fala, não se deixa de falar algo. O mutismo não se encontra fora da linguagem. O mutismo no autismo mostra ao analista seu próprio 38 funcionamento. “Seja na fascinação, hipnotizados, engolfados numa espécie de depauperamento, seja na defesa da fascinação e da ansiedade, projetando seu sistema imaginário de compreensão e de expressão”. (VILLA, 2010, p. 182) Porém, o material produzido com o encontro não advém da criança. Assim, a transferência evocada no encontro é do terapeuta, manifestada pelo material posto para fora de si e que retorna do lugar que para ele ocupa a criança autista. Ela “é única, embora bipolar, assimétrica, é tensão, intercepção, inseminação e disseminação. (...) um bocado de impurezas.” (VILLA, 2010, p. 183). O autor trata dos processos inconscientes, únicos a serem trabalhados na relação, esses que agem em silêncio e assim se fazem ouvir. Diante do silêncio, para Villa (2010) pode ocorrer o “ativismo terapêutico” com objetivo de proteção, mascarando e arrancando o analista do trabalho que se opera diante da criança autista e que tende a constituí-la sob o pretexto da observação clínica, reduzindo-a a uma soma de sinais não-creditados. Isto poderá torná-la objeto colocado no lugar de ideal do ego. Villa (2010) trata da Coisa que coloca significado ao desejo. O encontro com ela possibilita uma libido de objeto. “O encontro com o desdém do acaso nos faz filho da Ausência e do Silêncio” (VILLA, 2010, p.186). Para ele, o luto é cumprido pela identificação parcial com o que se perdeu, enriquecendo o ego e salvando o objeto. Na criança autista a libido de objeto toma o ego por objeto desde o início, pois o movimento para criação de um objeto não foi levado a termo, não se estabeleceu na primeira transferência. Como se nenhum objeto fosse digno de ser erigido como substituto da coisa, funcionando como tentativa do ego de se identificar com a Coisa e a de fazer desaparecer a outra parte do ego. Se o melancólico sabe quem perdeu, mas não sabe o que perdeu, a criança autista não perdeu ninguém, pois nunca encontrou alguém, mas sabe o que não quer perder. No autismo não se produz relação nem transferência, a não inaptidão para a transferência. O que é o motor da intervenção. 39 2.3- CAUSA Campanário (2008) nos traz que o autismo é ainda, na atualidade, uma incógnita. Seja para a psiquiatria, seja para a Teoria Psicanalítica. Há postulados sobre esse transtorno. A psiquiatria encontra-se dividida na organogênese da psicose e na psicogênese do autismo infantil, ou seja, ela é proveniente de alguma anormalidade organoneurobiológicas e bioquímicas, ou de uma disfunção de origem psíquica. Por Kanner, ela foi descrita inicialmente como tendo etiologia psicológica e, posteriormente, como orgânica. Ainda não é possível explicar o autismo na busca da relação causa efeito direta. Essa dificuldade de interlocução dos saberes dificulta tanto o tratamento farmacológico quanto o psicoterápico dessas crianças. (CAMPANÁRIO, 2008) A idade precoce faz tender a organicidade da questão, porém sabe-se, por vários estudos, da grande capacidade mental dos bebês, o que possibilita alguma relação com a mãe (ou função), além deles preferirem a voz materna ao nascer, o que transpõe a esta hipótese. Segundo Alfredo Jerusalinsky (apud Campanário 2008, p. 39)2 o autismo é “um quadro que coloca radicalmente em xeque o suposto positivista de que cada fenomenologia nosográfica corresponde a uma determinada etiologia”. No pensamento de Jerusalinsky o autismo desenquadra a suposição de que um fenômeno refere-se à determinada doença. É perigoso, portanto, excluir uma das vertentes. Na atualidade, é comum sustentar a multideterminação: orgânica, dinâmica e social. Campanário (2011) pontua que tanto para Freud quanto para Lacan não existe organogênese ou psicogênese dos quadros psicopatológicos. Para Lacan, (apud Campanário, 2008, p. 40) todo sujeito apresenta-se ao mundo submetido a uma história, uma árvore genealógica, numa cadeia de gerações que influenciarão seu desejo inconsciente como o somatório de desejos de todos que desejaram por ele e para ele e que lhe é passada através dos significantes vindos do Outro. (LACAN apud CAMPANÁRIO, 2008, p. 40) Ela lembra, também, que “a criança vem ao mundo com um real orgânico que se apresenta em seu corpo, perfeito em alguns casos, sindrômico em outros, que pode 2 Aula proferida em São Paulo, no Instituto de Psicologia da USP, em 7 de novembro de 2005. 40 facilitar ou não seu caminho em direção a subjetivação”. (CAMPANARIO, 2008, p. 40) 2.4- DIAGNÓSTICO O autismo acomete um número grande de crianças, cerca de 0,2%, ou 2 a cada 1000 crianças nascidas, sendo que várias características descrevem o transtorno autista. (AUTISM-SOCIETY, 2011) Rodrigo Marot em Autismo: Transtornos relacionados por semelhança ou classificação (2004), relata que o diagnóstico do autismo é feito por especialista, na clínica, baseado na entrevista e história do paciente. Não existem testes laboratoriais ou de imagem para isso. Deve-se descartar a surdez, problemas neurológicos e retardo mental, bem como outras doenças que se assemelham ao autismo e podem ser diagnosticada por exames clínicos – laboratoriais, imagem e testes. O DSM IV (2002) apresenta os critérios diagnósticos para o transtorno autista, sendo um total de seis itens no mínimo de 1, 2 e 3. Ou seja, deve haver pelo menos duas características de prejuízo qualitativo na interação social, uma de prejuízo qualitativo na comunicação e uma de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades. Os itens são apresentados na tabela abaixo: 41 Tabela 1 - Critérios diagnósticos para Transtorno Autista - DSM IV (2002) A. Um total de seis (ou mais) itens de (1), (2), e (3), com pelo menos dois de (1), e um de cada de (2) e (3). 1- a. destacada diminuição no uso de comportamentos não-verbais múltiplos, tais como contato ocular, expressão facial, postura corporal e gestos para lidar com a interação social. b. dificuldade em desenvolver relações de companheirismo apropriadas para o nível de comportamento. c. falta de procura espontânea em dividir satisfações, interesses ou realizações com outras pessoas, por exemplo: dificuldades em mostrar, trazer ou apontar objetos de interesse. d. ausência de reciprocidade social ou emocional. 2- a. atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem oral, sem ocorrência de tentativas de compensação através de modos alternativos de comunicação, tais como gestos ou mímicas. b. em indivíduos com fala normal, destacada diminuição da habilidade de iniciar ou manter uma conversa com outras pessoas. c. ausência de ações variadas, espontâneas e imaginárias ou ações de imitação social apropriadas para o nível de desenvolvimento. Marcante lesão na interação social, manifestada por pelo menos dois dos seguintes itens Marcante lesão na comunicação, manifestada por pelo menos um dos seguintes itens: 3- Padrões restritos, repetitivos e estereotipados de comportamento, interesses e atividades, manifestados por pelo menos um dos seguintes itens: a. obsessão por um ou mais padrões estereotipados e restritos de interesse que seja anormal tanto em intensidade quanto em foco. b. fidelidade aparentemente inflexível a rotinas ou rituais não funcionais específicos. c. hábitos motores estereotipados e repetitivos, por exemplo: agitação ou torção das mãos ou dedos, ou movimentos corporais complexos. d. obsessão por partes de objetos. B . Atraso ou funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas, com início antes dos 3 anos de idade: 1. interação social. 2. linguagem usada na comunicação social. 3. ação simbólica ou imaginária. Fonte: American Psychiatric Association, 2002. 42 2.5- TRATAMENTO Como tratar aquilo que se desconhece? Tratar, tanto no sentido de curar, como no sentido de proceder diante a. Alguns autores, como Marot, Pimenta, Malher, Betterheim, Ferreira, Soller, Azevedo e Campanário, visualizam e experenciam tratamentos diferentes ao autismo, segundo sua perspectiva de estudo e prática. Marot (2004) relata que, a reação dos familiares mediante essa diagnóstica vária, podendo, muitos pais recusarem o diagnóstico do autismo, encaminhando a criança a outro profissional. Enquanto, outros cultivam a esperança da recuperação total da criança. Ele, ainda, afirma que, até os dias atuais, não há cura para o autismo, porém há muitos recursos para tornar essas crianças as mais independentes possíveis, como: intervenção precoce, educação especial, suporte familiar e em alguns casos medicações ajudam cada vez mais no aprimoramento da educação de crianças autistas. O psiquiatra, Rodrigo Marot (2004), informa que não existem medicações que tratem o autismo. Há medicações que combatem os seus efeitos, como agressividade ou comportamentos repetitivos. Há algum tempo, usava-se neurolépticos, medicamentos inibidores das funções psicomotoras, para combater a impulsividade e a agitação. Hoje, os antidepressivos apresentam bons resultados. As medicações com bons resultados são a fluoxetina, a fluvoxamina, a sertralina e a clomipramina. Dentre os neurolépticos a clorpromazina, o haloperidol e a tioridazina. Segundo Marot (2004) não há propriamente um tratamento para o autismo, o que existe é um treinamento para o desenvolvimento de uma vida tão independente quanto possível. Basicamente a técnica mais usada é a comportamental, além dela, programas de orientação aos pais. Quanto aos procedimentos são igualmente indispensáveis, pois os pais são os primeiros professores. A educação especial pode expandir as capacidades de aprendizado, comunicação e relacionamento com os outros enquanto diminui a freqüência das crises de agitação. Alguns autores como Paula Ramos Pimenta em Autismo: déficit cognitivo ou posição do sujeito? Um estudo psicanalítico sobre o tratamento do autismo (2003) e Laznik (2004) afirmam que segundo experiências clínicas, quanto mais cedo for 43 diagnosticado o transtorno melhor são as evoluções dos casos, embora não se consiga uma explicação plausível para o fato, visto a constituição do sujeito não seja ligada ao referencial cronológico, e sim ao lógico. Margaret Mahler em Sobre os precursores infantis do aparelho de influência (1983) cria impasses na direção do tratamento. Ela considera que a direção do tratamento é a terapia de substituição, a mãe seria substituída pelo terapeuta. E para a insuportabilidade da presença do Outro, a música poderia ser utilizada como recurso, privilegiando a dimensão psicológica da percepção. A autora ao tentar dirigir o tratamento sob a via pedagógica não obteve êxito. Bettelheim (1987) propõe o objetivo tratamento como separação da criança dos pais, seguindo a terapia da substituição, ao substituir o mundo insensível (pais) a outro estimulante, proporcionando-a uma segunda oportunidade para desenvolver-se. Segundo Ferreira (2010) a indicação clínica para as crianças autistas deve ser uma espécie de “maternagem” para colmatar o fracasso das primeiras relações mãebebê, alojando-se no lugar onipotente de reparar a falha da mãe. Porém, a falha encontra-se na falta do simbólico, não na relação mãe-bebê. Para Collete Soler em O desejo do psicanalista – onde está a diferença? (1997) o analista deve mediante a criança-objeto produzir onde não aconteceu, ligar a operação do significante, articulando o que se falta, operando a “psicanálise invertida”, do Real ao Simbólico, subtraindo de onde engendra o sujeito. Para ela, trata-se de interrogar o enigma que o sujeito tece frente ao Outro. Campanário (2008) diz que muitas vezes não se produz um movimento efetivo de separação, mas ao dirigir às crianças autistas, antecipando um sujeito, cria-se a possibilidade de contenção do gozo, circundando seu corpo pela fala. Ela, ainda, pontua a grande importância da música, do ritmo e da entonação da voz no tratamento das crianças autistas, além de permitir a criança se expressar de sua forma: brincando, por exemplo. Para Azevedo (2009) uma das possibilidades de tratamento é o surgimento de uma alteridade, oferecendo a criança um lugar dentro do discurso como sujeito, mas permitindo-a, escolher se aceita-o ou não. Para isso, deve-se manejar a particular 44 transferência do autista ao Outro não barrado, utilizando de estratagemas, ou estratégia de engano, para não abordar a criança diretamente, sendo o analista quase invisível. Essa estratégia implica no analista não se colocar no lugar do Outro, além de permitir a esvaziação do Outro não barrado pelo sujeito. Isto pode se dar pela tentativa de introduzir um terceiro para barrar o gozo do Outro onipotente. O analista deve ocupar o lugar de objeto, considerando que este não se constitui como tal na psicose. “O analista não deve preocupar-se em normatizar, pedagogizar, pelo contrário, quer fazer surgir a singularidade.” (AZEVEDO, 2009, p.146). Em seu desejo, portanto, o analista, deve colocar a criança autista ao trabalho, acreditando que é possível constituir uma alteridade (relação com o outro), onde tudo é indiferenciado. 2.5.1 Posição do analista na clínica com autistas Vimos que a criança autista apresenta-se com poucos recursos psíquicos. Não há egoização e, não há acesso ao simbólico. Surge a questão, como manter distância, evitando o horror e a angústia da transferência com um Outro não barrado, invasor? Azevedo (2009) apresenta um possível lugar para o analista no tratamento de crianças autistas. Segundo ela, o único lugar para o sentimento do analista é do morto. Não se dirige o paciente, mas o tratamento. Nessa relação, analista/autista, ambos pagam. O analista paga com a sua própria palavra, com a sua própria pessoa e com o seu próprio ser. Ele situa-se em sua falta-a-ser. O lugar do analista, portanto, deve seguir o tripé de Lacan: tática, estratégia e política - lugar da interpretação, o ponto da transferência e como agir com seu ser. Para Lacan em A direção do tratamento e os princípios de seu poder (1958) a interpretação não aparece. Ela se fundamenta no fato do inconsciente ser estruturado em linguagem, funcionando de acordo com as leis das línguas faladas. Existem intervenções imaginárias. O que aparece na interpretação é o elemento faltante do Outro, articulado com o intervalo dos significantes. Pelo fato de um significante não significar-se a si mesmo, surge a dimensão metafórica, ou seja, um aparece no lugar de outro produzindo significação. 45 No autismo, vimos que a falta vem a faltar, não há intervalo entre significantes. As palavras têm um peso muito sério. Assim, elas não podem ser usadas. Azevedo reflete sobre a possibilidade de uma tática para tornar as palavras mais leves no autismo. Para isso, ao invés de interpretar, deve-se notificar a mensagem do sujeito. Azevedo (2009) enfatiza Lacan ao afirmar que é a partir de sua análise que um analista pode autorizar-se a si mesmo. Não há identificação no autismo. Há excesso do Outro que lhe invade, fazendo a criança autista tampar os ouvidos. A voz e o olhar do analista são insuportáveis para elas. Mahler (1952) sugere que o analista aborde indiretamente a criança, de costas, cantarolando. Deve-se tornar invisível, visto algo poder acontecer ao desviar a atenção da criança. O Outro não tem lugar no tratamento do autismo. A política de Lacan (1958) relaciona-se ao desejo do analista, presente no movimento psicanalítico desde muito cedo. Cabe, a ele, então, ouvir, não auscultar. Seu desejo é antinômico à noção de compreensão. Sua formação articula-se a douta ignorância, e essa ignorância deve ser entendida como o amor e o ódio, uma paixão do ser, iluminando a falta-a-ser. Assim, para Azevedo (2009) o analista não pode querer ensinar, compreender ou querer a fala da criança. Não deve pedagogizar. Ele deve ignorar o que se sabe. Ele não ocupa o lugar de sujeito, mas de objeto, tornando possível a singularidade. . 46 CAPÍTULO 3 - TEMPLE GRANDIN – UMA MENINA ESTRANHA "Você não sabe que a maneira que você pensa é diferente até que você começa a questionar as pessoas sobre como você pensa." Temple Grandin Neste capítulo será apresentada a autobiografia intitulada por Uma menina estranha – autobiografia de uma autista de Temple Grandin e Margaret M. Scariano (1999) e do filme: Temple Grandin, dirigido por Mick Jacson (2010). A história de Temple Grandin é apresentada de maneira clara, singela e com um toque de humor. Temple Grandin nasceu em Boston (EUA) no dia 29 de agosto de 1947. Primogênita de quatro filhos. Foi diagnosticada como Autista aos três anos, sete anos após a descrição dos sintomas por Leo Kanner (1943). Como em poucos casos do diagnóstico do transtono, Grandin graduou-se, mas diferentemente de outras pessoas com o mesmo diagnóstico, estudou psicologia, na tentativa de autoconhecer-se. Ela conseguiu “passar para o outro lado, além das trevas, tateando no escuro”. (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 20). Publicou várias obras, e em sua autobiografia, ela pontua questões sobre o autismo, relacionando teoria e sua vivência. É uma obra enriquecedora. Temple Grandin, em seu livro autobiográfico, Uma menina estranha – autobiografia de uma autista (1999) se considerava uma “menina estranha”. Quando nasceu, sua mãe contava com 19 anos de idade, e se lembra que a recém-nascida era normal e saudável, quieta e bem-comportada. Aos seis meses, sua mãe percebeu que ela não se aninhava e ficava rígida, passando a arranhá-la quando tentava carregá-la. Embora lhe fosse assustador, não entendia o porquê da diferença do comportamento de sua filha em relação aos outros bebês. Até seus três anos e meio de idade a criança só gritava, assobiava e murmurava de boca fechada, embora entendesse o que as pessoas lhe diziam. A ausência da fala, a voz inexpressiva, 47 com pouca inflexão e nenhum ritmo preocupavam sua mãe. Tinha dificuldade de olhar alguém nos olhos, o que conseguiu somente depois de adulta. Segundo Campanário (2008) no autismo, para Kanner, o retraimento ocorre no início do desenvolvimento com dificuldades de relacionar com os outros. E quanto mais cedo o diagnóstico, maior a probabilidade de sucesso no tratamento. Apresentava outros sintomas do transtorno autista, conforme descrito pelo DSM IV (2002), como girar como um pião, o qual lhe dava a sensação de poder, de controle sobre as coisas, pois ela era capaz de fazer a sala girar. Era extremamente sensível a ruídos, o que lhe causava desconforto extremo. Brincava de modelar fezes ou servia-se delas para agredir as pessoas em seus acessos de raiva. Urinava em locais impróprios, como no tapete da sala ou na cortina, mesmo com a proibição de sua mãe. Sua mãe, na tentativa de recuperar a filha, retirando-a de seu mundo fechado, a matriculou aos os cinco anos no jardim da infância, fato que lhe provocou emoções contraditórias. Novos lugares a deixavam perturbada e ela era alheia à vida social. Ora ela se refugiava em seu mundo interior, ora era impulsiva que ela mesma se assustava. A socialização faz parte do ser humano, e a educação é uma forma de incorporação do homem à sociedade, como nos diz Freitas (2008). Daí a importância da atitude da mãe de Grandin em inserí-la no meio social, na escola, mesmo que isso causasse à criança certo desconforto. Visto, conforme Pereira (2009), a escola, paralelamente, à família e à religião serem canais de conservação de valores e conceitos. Na escola Temple “percebeu” que seu raciocínio não se enquadrava no tipo de ensino, em que as “coisas ou são brancas ou são pretas, ou estão certa ou erradas” (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 35). Tinha (e ainda tem) dificuldade de ritmo, não consegue realizar duas atividades motoras simultaneamente. Não conseguia entender matemática, usar a caneta tinteiro, muito menos entregar seus trabalhos limpos. Sua capacidade de leitura era mediana. Muito criativa, tinha grande habilidade para fazer trabalhos com madeira e costura. 48 Estudos de Campanário (2008) crianças autistas podem ser superdotadas em áreas específicas e possuir dificuldades em atividades básicas da vida. A percepção de Grandin, ou seja, a forma de dar sentido aos estímulos de acordo com seu histórico pessoal (FREITAS, 2008) era diferente do padrão de normalidade esperado dentro do contexto escolar. Não lhe faltava inteligência, como Piaget (1982) conceituou, a organização com função de estruturar o universo como o organismo estrutura o meio, ou como Borges (2008) capacidade de compreender e conhecer o mundo. Temple compreendia e organizava o mundo a sua maneira, e sua inteligência mais acentuada é a inteligência fluída, a qual é pouco influenciada pela cultura, sendo a extensão e a profundidade dos conhecimentos que a pessoa tem, promovendo-lhe raciocínios além do que lhe é apresentado (PRIMI, ALMEIDA, 2000). Desde a segunda série sonhava e devaneava em um aparelho mágico que estimulasse seu corpo, pressionando prazerosamente seu corpo, na tentativa de suprir o quanto seu sistema nervoso danificado ansiava por estímulos tácteis. Ao mesmo tempo em que desejava ser abraçada, fugia dos abraços, pois tinha a sensação de estar sendo engolida. Temple sentia “como se uma porta de vidro me separasse do mundo do amor e da compreensão humana.” (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 38). Os estímulos tácteis são ansiados pelos autistas, mas eles se retraem diante deles, pois lhes causam dor e confusão. Somente aos trinta anos, Temple conseguiu trocar aperto de mão e olhar diretamente nos olhos. Quando criança, ela se consolava enrolando em cobertores e almofadas. As atitudes de Grandin coadunam com os dizeres de Azevedo (2009) no qual os autistas encontram-se em dois mundos, o da relação com o outro, e o mundo autista. Desta forma, como Ferreira (2000) nos apresenta no autismo há montagem lógica onde existe sujeito, alguém que demanda e deseja inserida no discurso e dentro da linguagem. Na época da escola, Temple teve uma amiga. Ela a aceitava com seu jeito estranho, achava-a divertida e que nunca Grandin era chata. Porém, vários outros colegas criticavam-na, levando-a a acessos de raiva. E em outros momentos, “vingava-se”. Era estigmatizada pelo comportamento extravagante e impulsivo, pelos seus 49 ataques de raiva, pelo péssimo desempenho acadêmico, mas era reconhecida pelos seus talentos criativos. De acordo com Borges e Furtado (2008) as dificuldades ou os distúrbios de aprendizagem podem ser causados por fatores emocionais, sensoriais, físicos e neurológicos, o que eventualmente, reflete no péssimo desempenho acadêmico da jovem autista. Enquanto menina apresentava acessos de risos incontroláveis, fixava-se em movimentos ou palavras, repetindo-os incansavelmente. Repetia assuntos relacionados a sexo, o que causava transtorno no meio escolar. Na adolescência, sua mãe relata ao medico que a filha em ambiente seguro, onde se sente amada e apreciada, tem o comportamento compulsivo atenuado. No contrário, até sentir e perceber os limites, costumava apresentar comportamentos bizarros. A mudança de escola causou insegurança em seus pais, que pediram nova orientação ao médico da filha. Sua mãe pensava que precisava prepará-la para se virar sozinha, servindo-lhe de bengala por tempo longo. Nesta época, Grandin foi muito infeliz, lembrando-se pouco desse período. Foram muitas mudanças, mais colegas na sala e um professor para cada matéria. Não conseguia assimilar abstrações e conceitos. Aborrecia-se quando não entendia algo, e consequentemente comportava-se mal. Preparava brincadeiras para agitar a turma, aliviando o tédio das aulas. A coordenação do colégio conversou com sua mãe sobre suas notas baixas e seu mau comportamento. Esse fato a fez pedir auxilio ao psiquiatra, o qual interviu, oferecendo préstimo à equipe escolar e escrevendo uma carta á escola descrevendo sua paciente: Temple é uma criança de inteligência muito alta, com problemas tais que não consegue liberar seu afeto e fazer criativo de sua inteligência (...) não é psicótica, nem de longe. Pode ser chamada de criança neurótica – tem uma organização da personalidade bem formada e os instrumentos de controle para conservar essa organização, exceto em casos de extrema tensão. Ainda está em processo de desenvolvimento dos aspectos mais saudáveis de sua personalidade, e as flutuações que podem ser observadas parecem ser parte desse processo de amadurecimento. Ela percorreu um longo caminho (...) é uma jovem de potencial enorme, uma imaginação fora do comum (...) suas esquisitices tendam a torná-la um tanto saliente. (...) ela vai entrar na adolescência, e acabou de deixar uma escola onde seus piores aspectos eram bem conhecidos, uma escola que lhe dava apoio incondicional e também acompanhava com sincero prazer o progresso que ela fazia. (GRANDIN, SCARIANO, 1999, P. 66) 50 Segundo Villa (2010) a estranheza do autismo amedronta muitas pessoas e profissionais. Isto aconteceu com esta escola, levando-a a não acolher a jovem Temple da forma que ela precisava, de acordo com suas peculiaridades. Para Moreira e Candau (2003) a escola é transmissora de cultura e ela deve ensinar e estimular o aluno a aprender por si, visto que aprender faz parte do psiquismo e a motivação ser essencial ao processo de aprendizagem (ALVES, 2007). Seu progresso era notado, tentava se enturmar, assistia TV, lia livros de ficção científica e era fascinada por aeromodelos. Mesmo assim, Grandin, foi expulsa da escola após 2 anos e meio devido seus ataques de raiva. Sua mãe, mais uma vez, ficou do seu lado. Ela foi matriculada em uma escola menor, recebendo atenção e sendo considerada como um indivíduo. Em 1960, Temple foi para a nova escola Mountain Country School, fundada para acolher crianças bem-dotadas, intencionando a desenvolver o potencial da criança ao máximo. Na escola havia animais, aulas trabalhos manuais, acampamentos e canoagem, além de música, teatro, agricultura, balé, boliche, pesca, natação, esqui, patinação. Ela ficou eufórica. Alojou-se em um quarto, no folheto da escola era prometido a oportunidade de aprender as matérias escolares e o desenvolver emocionalmente. Em seu primeiro dia nessa escola, uma colega furou a fila no refeitório. Temple reagiu socando o rosto da moça. Uma senhorita a recolheu, segurando-lhe pelos braços (Temple não se incomodou), pediu explicações. Olhando nos olhos da menina, a Senhorita lhe falou que “bater não é a maneira de lidar com desentendimentos”. (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 75) e que a escola não toleraria nenhum tipo de violência. Embora alertada, a jovem continuou resolvendo suas questões com acessos de raiva e socos. Nesses momentos, ela era castigada sem poder montar a cavalo, que tanto amava, por uma semana, o que a curou do seu espírito brigão. Melhorou alguns aspectos e acentuou outros, como a fixação e a necessidade de manter o ambiente da mesma forma, usava a mesma roupa. A menstruação causoulhe crises de pânico, “sentia-se como um moinho de vento em meio a um vendaval”. 51 (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 76) Em sua mente, fantasias borbulhavam, seu comportamento impulsivo e a dificuldade de relacionar acentuaram. Só não era a última em biologia. Apresentava sintomas do “medo do palco”, em momentos como ouvir toque do telefone ou receber carta, bem como em excursões, por hipersensibilidade. Medicações não atenuavam seus tremores. Ficava ansiosa em períodos específicos do dia. Coceiras davam-lhe a sensação de ser perseguida por um assaltante. Ela estava “presa num labirinto de sintomas fisiológicos que perturbavam, destruíam e desfaziam quaisquer conquistas. (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 78) Aos dezesseis anos, Temple procurava uma forma para aliviar seus nervos, quando houve um passeio a um parque, brincou no Rotor (brinquedo que gira e exerce pressão sobre o corpo devido à força centrípeta), no início teve medo e sensação ruim, mas aos poucos era tomada por grande sensação de prazer. Fixou no brinquedo, insistiu na escola para colocassem um aparelho igual. Chegou a escrever cartas ameaçadoras, como se fosse outra pessoa, Alfred Costello, o Sombra. Temple diz que em seu estado delirante, sabia que o Sombra era fruto de sua imaginação. Nesta época, em um culto, Grandin ouviu a falar na porta da salvação. Como ela precisava de símbolos concretos para conceitos abstratos, buscou pela sua porta concreta por vários dias, até que a achou, uma portinhola que dava para o telhado. Entrou e permaneceu longo tempo observando o céu, a lua, as estrelas. Era a sua porta. A moça passou a ir ao telhado e observar o céu todas as noites. Era seu local sagrado. Tinha passado para uma nova vida. Após um ano foi proibida de ir lá. Passou a ir, não por necessidade, mas pelo prazer da intransigência. Esta passagem ilustra Azevedo (2009) ao dizer que a palavra no autismo tem peso, são tomadas como coisa, sem metáfora, sem traço unário do simbólico. O professor de psicologia, Sr. Brooks, modificou a vida da jovem autista. Ele falava de comportamento animal. Apresentou o enigma do quadro distorcido, que Temple fixou nele, por seis meses, até compreendê-lo. 52 Para Grandin, atrás de sua porta, havia várias pessoas compreensivas e dedicadas que sem elas seu destino seria uma escola para retardados, como disse seu pai. Sua mãe sempre a defendeu e fez tudo para ajudá-la, o contrário de seu pai. Embora autores como Malher (1983), Bettelehim (1987) e Tustin (1984), ao desconsiderarem a teoria do inconsciente, tratar o autismo como resultado de um fracasso da relação do bebê do objeto (mãe), e vermos com Laznik (2004) a importância dos manhês para a constituição do sujeito e com Azevedo (2009) que o Nome-do-Pai ser instaurado pela mãe. Um segundo professor, Sr Carlock, não rotulou Temple e canalizava as suas fixações para projetos construtivos. Disse a ela: “as coisas nem sempre são o que parecem” (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 89), o que a enfureceu, sua lógica não admitia ambigüidades e ela era inflexível. O professor deu-lhe livros de filosofia, condizente com seus pensamentos à base de símbolos. Um dia, ele lhe disse que o tom de sua voz estava menos inexpressiva. Temple percebeu, então, que na medida em que aumentava sua percepção da esfera social o tom de sua voz melhorava. Grandin diz que graças ao Sr. Carlock, a outros professores dedicados e a fé de sua mãe, ela começou a estudar. Este professsor ofereceu à Temple um lugar no discurso como sujeito, fazendo surgir a alteridade, como pontua Azevedo (2009), para o lugar do psicanalista frente ao autismo. Na viagem de férias, no verão, na fazenda de sua tia Ann, fez vários trabalhos para ela. Sua tia era paciente e soube aproveitar a tendência à fixação da sobrinha para algo construtivo. Lá, Temple viu o brete (equipamento utilizado para prender o gado a fim de marcá-lo). Quis experimentá-lo, sua tia relutou, mas acabou cedendo. A jovem autista teve a principio a sensação de ser engolida, como com a tia gorda de sua infância, mas aos poucos teve uma sensação estimulante e relaxadora. Em carta de Ann à mãe de Temple, ela dizia: Temple funciona com símbolos, e quando ela encontra um símbolo que tem o poder de (...) agüentar o peso de alguns de seus medos e frustrações, ela realmente não o larga mais. Ouvi falar à exaustão da “porta” que simboliza o ingresso em novos territórios e experiências, tanto que poderia repetir a historia palavra por palavra. Várias vezes eu a interrompi no meio desse assunto. Ela me deixava acabar minha interrupção e então retomava a história dela, exatamente do ponto em que tinha parado. É verdade que era um pouco irritante, mas Temple é tão fundamentalmente sensata, tão obviamente inteligente e disposta a ajudar com qualquer problema que pudéssemos ter, que ouvi-la era um preço baixo a pagar. (...) o brete do 53 gado (...) era um símbolo que reconciliava dois impulsos opostos – o impulso de submeter-se a uma imobilização táctil prazerosa e a relutância oposta em permitir uma pessoa (...) a exerça. (...) um símbolo muito útil para ela na busca de soluções para seus problemas. (...) estou certa de que vai chegar o dia em que vou poder dizer com grande satisfação: “Eu a conheci naquele tempo...” (GRANDIN, SCARIANO, 1999, p. 94) Ao voltar para a escola, Grandin queria seu brete. O psicólogo a indagou se ela tinha problema de identidade, perguntando se ela se achava uma vaca. Ela lhe respondeu com a mesma pergunta, se ele se achava um boi. O uso de sua máquina de pressão provocava polêmicas entre terapeutas, amigos e parentes. Isso a levou ao sentimento de culpa, como se seu uso fosse pervertido ou doentio. Ela tinha que provar o efeito relaxante do brete nas pessoas. Mesmo com muitas dificuldades, Grandin foi escolhida uma das oradoras na formatura. Marot (2004) informa que o autismo não tem cura, mas há recursos que podem ajudar a criança a se tornarem mais independentes o possível. As medicações usadas são para os sintomas, embora nem sempre sejam eficazes. Cada pessoa encontra uma forma para compensar suas angústias e ansiedades. Tal como Grandin, em vários momentos de sua vida, como o rotor, com seus projetos acadêmicos, com o cavalgar ou com o uso do brete, por exemplo. Após a formatura recebeu uma carta de sua mãe, que refletia sobre a conversa sobre o amor. Para ela, o amor é querer fazer as coisas crescerem e participar de seu crescimento, sem necessidade de sensação interior especial. Bastava o compromisso, a atenção e a disposição para com o outro. Disse que a amava porque tinha muito investimento dela na filha e pergunta a filha sobre seu sentimento com a mãe. Foi para uma faculdade pequena, próxima a escola anterior, que a auxiliou. O professor Carlock nos finais de semana continuou a estimulá-la. Construíram um brete maior e fizeram testes nos alunos, obtendo resultados positivos. Passou a acreditar que seu brete ajudaria outras crianças autistas. Temple cursava psicologia. Trabalhou num hospital com crianças perturbadas. Um menino de sete anos tinha algumas características autistas, embora não tivesse o rótulo. Ele intrigava-a, pois Grandin se via nele. Ela se sentiu o Senhor Carlock abrindo o mundo secreto de Jake. Ela atuou tal como seu professor, e como sugere Azevedo (2009) como 54 objeto, propiciando o aparecimento da alteridade na relação com a criança. Formouse bacharel em psicologia e novamente foi oradora da classe. Foi, então, para uma universidade, no Arizona. Após 2 anos trocou o curso de psicologia para o ciência animal., pois trabalhava com animais e acreditou ser mais coerente. Percebeu que sentia o sentimento do animal ao encostar suas mãos em seu dorso. Grandin matava o gado com respeito e consideração. Desenvolveu currais baseando no movimento do gado, o que os acalmava e não estragava a carne na hora do abate. Escreveu vários artigos. Começou a fazer viagens pelo mundo desenvolvendo projetos e apresentando palestras. Fez doutorado em Ciência Animal. Quando adulta, Temple, conseguiu dominar seus “nervos”. Não se deixa transtornar. Não discute com as pessoas e quando a situação perturba, vira-se e sai. Sua mente é visual, então para recordar um conceito abstrato, ou imagens mentais, lê as informações em sua mente. Confunde algumas palavras com ortografias diferentes. Utiliza uma medicação que a acalma. Ela acredita que até os dias atuais, muitos pais e profissionais acreditam que “uma vez autista, sempre autista”, mas ela se considera uma prova do contrário. Pois, “é preciso descobrir seus talentos ocultos e desenvolve-los. (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 140) e qualquer criança precisa de estímulos tácteis, mas as autistas precisam de mais. Segundo Grandin e Scariano (1999) autismo é: Um distúrbio do desenvolvimento. Uma deficiência nos sistemas que processam a informação sensorial recebida faz a criança reagir a alguns estímulos de maneira excessiva, enquanto a outros reage debilmente. Muitas vezes a criança “ausenta” do ambiente que a cerca e das pessoas circundantes a fim de bloquear os estímulos externos que lhe parecem avassaladores. O autismo é uma anomalia da infância que isola a criança de relações interpessoais. Ela deixa de explorar o mundo a sua volta, permanecendo em vez disso em seu universo interior. (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 18) As autoras apontam que as causas da “doença” é um mistério, não se sabe ao certo se a origem é neurológica, fisiológica, trauma-uterino, dano cerebral, rejeição pela mãe, escassez de certas substâncias. As opiniões dos profissionais se divergem. Pesquisas indicam que certas partes do sistema nervoso central podem não se 55 desenvolver de maneira adequada, alguns neurônios estabelecem conexões erradas e algumas áreas do cérebro apresentam atividade acima do normal, mas seja qual for a forma de autismo desenvolvida, os sintomas permanecem. Elas, ainda, descrevem os sintomas que aparecem nos primeiros meses de vida, como esquivar-se do toque alheio, ausência de fala com significado, comportamentos repetitivos, acesso de raiva, sensibilidade a barulhos altos ou incomuns e falta de contato emocional com outras pessoas, porém em estudo na Universidade da Califórnia, comprovou que as crianças autistas apresentam um relacionamento social muito intenso, e é um equívoco dizer que essas crianças não apresentam reação nenhuma às outras pessoas. As autoras destacam a questão da inteligência. Há a inteligência cristalizada que requer treinamento e educação prévia, estimulada no sistema educacional, que valoriza o excesso de “regurgitamento” de conhecimento. Alguns jovens possuem a inteligência fluida, processam grande número de informações, encontram padrões que os outros desconhecem, resultando na marginalização deles, são taxados de malcomportados ou diferentes, pois “dançam conforme outra música”. (GRANDIN; SCARIANO, 1999, p. 45) Segundo Grandin e Scariano (1999) a criança autista se auto-estimula para acalmarse. Não há duas crianças autistas iguais, portanto não será o mesmo tratamento que funcionará com todas elas. É preciso descobrir o que a interessa, não exagerar nas medicações, amá-las e respeitá-las. Quanto às fixações, deve-se canalizá-las para algo positivo. Certa dose de obsessão, para Grandin, é útil, pois foi o que a conduziu ao sucesso. Grandin sempre muito curiosa, uma verdadeira cientista, desenvolveu a máquina do abraço, esta que alivia a tensão da necessidade de afeto pelos autistas e sem agredi-la com o toque de outra pessoa. Para ela, o tratamento é a “escolha do freguês”, podendo ser com estimulação sensorial, educação, tratamento com medicação, dietas, suplementos alimentares. A combinação dos diversos tipos de tratamento favorece o sucesso. Para sua mãe, em qualquer terapia, o ponto mais importante era o amor, como forma de compensar que o amor que não pode receber 56 ou dar em seus primeiros anos de vida. O amor faz Temple “funcionar bem”. (GRANDIN; SCARIANO, 1999) 57 CONSIDERAÇÕES FINAIS A pesquisa partiu do seguinte problema: como o profissional da psicopedagogia, pode atuar no ambiente escolar, com crianças autistas, visando o favorecimento da sua aprendizagem, possibilitando-a a desenvolver a criatividade e potencialidades? O objetivo geral foi alcançado, pois foi possível analisar como profissional da psicopedagogia pode contribuir no sentido da inserção e do aprendizado de crianças autistas no ambiente escolar, pois o ambiente escolar é responsável, também, pela socialização e promoção das habilidades e criatividades de seus alunos, como vimos com Pereira (2009). Assim o psicopedagogo deve permanecer atento as peculiaridades da criança autista, adequando o processo educacional, na medida do possível, de forma a favorecer a integração da criança ao meio, fazendo-a sentir aceita e acolhida. Ele deve ser o menos invasor o possível e dar leveza as suas palavras. As obsessões da criança devem ser deslocadas de modo a favorecer o desenvolvimento de sua capacidade intelectual latente. Não se deve rotular, estigmatizar, expulsar, nem abandonar. Deve-se acolhê-la, promovê-la. Tratá-la como criança, impor limites e apresentar as regras. Não deve desistir delas, deve-se investir nelas. O amor é uma boa estratégia a ser utilizada no processo. Um amor que aceita, que respeita o tempo, o ritmo e as singularidades da criança. O objetivo específico de analisar o caso de amenização dos sintomas do autismo foi atingido após a leitura da obra de Grandin e Scariano – Uma menina estranha (1999). Temple Grandin foi diagnosticada com autismo aos três anos de idade, e embora os embates de sua vida, a dificuldade de relacionar-se e seu modo peculiar de visualizar e raciocinar o mundo, conseguiu desenvolver-se socialmente, mesmo que de forma “arcaica”, intelectualmente, ao doutorar-se, escrever livros e ministrar palestras pelo mundo e profissionalmente. Ela passou para o outro lado, tateando no escuro, como a própria autora se retrata (GRANDIN, SCARIANO, 1999). O objetivo específico de compreender o autismo, tanto na ótica da Psiquiatria e da Psicanálise, foi atingido ao estudá-lo sob o viés de ambas vertentes. Desta forma, para a psiquiatria o diagnóstico segue os critérios pré-estabelecidos pela DSM IV (2002). Pela psicanálise o autismo perpassa pelo Outro, seja na relação “ineficiente” entre mãe e bebê em seu desenvolvimento, seja pela alteridade, como vimos com 58 Campanário (2008) e Azevedo (2009). Indiferente de suas causas, não há ainda, um tratamento medicamentoso específico para o transtorno. Não há cura. O que se pode é tentar desenvolver as crianças, tornando-as mais independente o possível. Os medicamentos minimizam alguns sintomas. Sugere-se, então, a interdisciplinaridade. Já o objetivo específico de contextualizar o transtorno autista no ambiente escolar foi possível pela análise da história de Grandin, a qual muito contribuiu, entrelaçando com o ambiente escolar dito normal. Temple, mesmo ao ser diagnosticada como portadora do transtorno autista, foi matriculada em uma escola. Ela se sentia e era considerada pela comunidade acadêmica uma “estranha no ninho”. Foi estigmatizada, ignorada, menosprezada por alguns. O Estranho que assusta e amedronta que nos faz deparar com nossos próprios fantasmas, como nos disse Villa (2010). Neste momento foi possível perceber a interligação de fatores sociais, emocionais e intelectuais. Desta forma, quando algo não está bem, algum problema na aprendizagem pode ocorrer. Ela pode ser inteligente e apresentar uma dificuldade ou algum distúrbio. O primeiro aspecto que não está bem na criança autista é sua capacidade de socializar-se, de se interagir com o meio. Isto, muitas vezes, dificulta a interação dos outros com o seu mundo autista. Essa recíproca dificuldade pode acarretar no distanciamento e na exclusão da criança do ambiente escolar, o que consequentemente, implicará nos problemas de aprendizagem, podendo ser revertido mediante uma atenção e um método adequado. Enquanto que o objetivo específico de verificar como os profissionais da educação podem intervir/auxiliar na inserção de crianças autistas na escola, como foi retratado pelos professores Brooks e Carlock, ambos apresentados na obra de Temple Grandin. Podemos psicopedagogia. inferir Além do que tais aprendizado “personagens” com Malher são profissionais (1983) que trata da a pedagogização com crianças autistas como inadequada. Não se devem exigir respostas prontas, aprendizado e conhecimento seguindo o padrão de normalidade conhecido de uma criança “normal”. Pontuar, sem interpretar. Chamá-la sempre pelo seu nome, dando-lhe um lugar, significado e status de sujeito. Seguindo o raciocínio, não se pode desconsiderar que na relação com a criança autista, fantasmas internos do psicopedagogo podem florescer, indicando-lhe seu próprio funcionamento 59 psíquico, o que pode interferir no manejo do processo. São dois sujeitos. Porém, não há entre eles relação transferencial, é a transferência do psicopedagogo que estará em jogo. Este profissional não pode colocar a criança em posição de objeto, é ele que deve ocupar um lugar de morto, tal como um analista, fazendo surgir a alteridade. As autoras Malher (1983) e Azevedo (2009) sugerem a utilização do recurso da música e não direcionar à criança olhando diretamente para ela. As causas do autismo não são conhecidas, tampouco sua cura, ou mesmo sua estrutura psíquica. Sabe-se que o autismo não se encontra nem no campo do simbólico, nem do imaginário. Ele está no real. Resta-nos, então, o manejo, o cuidado. Um cuidado, muitas vezes, difícil, pois não há uma receita pronta, considerando não existirem duas crianças autistas iguais no mundo, da mesma forma que não existem duas pessoas iguais. Cada experiência, uma nova aprendizagem, um novo processo. Um processo considerado, por muitos, como fadado ao fracasso, mas que deve ser investido com tentativas de acerto e êxito. Mesmo assim, o profissional da psicopedagogia pode contribuir no sentido da inserção e do aprendizado de crianças autistas no ambiente escolar 60 REFERÊNCIAS AUTISM SOCIETY. Disponível em: <http://www.autism-society.org/>. Acesso em: 12 de agosto de 2011. 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