Index CALIBRAÇÃO DE MEDIDORES DE KV COM A GRANDEZA POTENCIAL DE PICO PRÁTICO (IEC 1676) Paulo H. B. Becker*, Marcos A. L. Peres*, Jaime L. Ludwig* e Carlos C. Chernicharo* *Instituto de Radioproteção e Dosimetria-IRD-CNEN Av. Salvador Allende S/N. Barra da Tijuca – Rio de Janeiro RJ – Brasil. CEP: 22780-160 RESUMO A norma IEC 1676 introduz uma nova grandeza para a medição da alta tensão nas aplicações médicas dos raios X, o “Potencial de Pico Prático” (PPP). Para possibilitar a implementação desta grandeza no Brasil, o Laboratório Nacional de Metrologia das Radiações Ionizantes desenvolveu um procedimento para calibrar instrumentos nesta nova grandeza. Foi utilizado o mesmo arranjo experimental desenvolvido para calibrar equipamentos com a grandeza kVp convencional que consiste em um divisor de tensão invasivo (Dynalyser III da Radcal Corporation) associado à uma placa de digitalização rápida e um software especifico. Visando avaliar este procedimento, um medidor de kV com capacidade de medir a grandeza PPP modelo Universal Diavolt da PTW foi calibrado e os resultados comparados. Este trabalho apresenta um resumo do procedimento de calibração e os resultados obtidos com a comparação. Keywords: kVp, practical peak voltage, IEC 1676 I. INTRODUÇÃO Existem diversas grandezas associadas às altas tensões empregadas nos aparelhos de raios X. As mais comuns são o potencial de pico máximo (kVp), o potencial médio dos picos e o potencial eficaz. Além destas grandezas existem outras e esta diversidade de definições gera inúmeras discussões e dúvidas quando se quer avaliar o funcionamento de um aparelho de raios X. A norma IEC 1676[1] introduz mais uma grandeza associada aos potenciais aplicados nos tubos de raios X; o potencial de pico prático (PPP). O PPP é definido como o potencial constante que aplicado a um tubo de raios X irá produzir o mesmo contraste que o feixe que está sendo medido. Esta grandeza associa diretamente a medição da alta tensão ao resultado obtido com a exposição (contraste). Ainda existem alguns questionamentos sobre a sua “praticidade” por exemplo: como é que um técnico vai regular um aparelho de raios X baseado em uma medição do PPP ? De qualquer forma esta nova grandeza já é uma realidade existindo, inclusive, equipamentos no mercado que possuem uma opção de medi-la. O Laboratório Nacional de Metrologia das Radiações Ionizantes (LNMRI) preocupado em disponibilizar futuramente calibrações nesta grandeza desenvolveu um procedimento para o arranjo experimental utilizado para calibrações das grandezas anteriores (kVp, kV médio, kV eficaz etc.). Para verificar este procedimento e comprovar os seus resultados seria necessário participar de uma intercomparação com outras instituições, entretanto o Sistema Metrológico Internacional ainda não está realizando intercomparações nesta grandeza mesmo porque são muito poucos os instrumentos capazes de medi-la. Através de um projeto de cooperação regional (ARCAL) com a IAEA, o LNMRI recebeu um medidor de tensões de tubos de raios X que possui uma escala em PPP. Decidiu-se então utilizar este instrumento, que veio com um certificado de calibração do fabricante que inclui a grandeza PPP, para implementar uma primeira comparação entre os fatores de calibração obtidos com o procedimento desenvolvido e aqueles declarados pelo fabricante. II. MATERIAS E MÉTODOS O processo de calibração na grandeza PPP envolve o conhecimento da curva da alta tensão aplicada ao tubo de raios X ao longo do tempo de exposição. Partindo da disponibilidade desta curva o PPP é calculado através da seguinte equação[2]: n U= ∑ p (U )U w(U ) i −1 n i i i i ∑ p (U )w(U ) i =1 i i (1) i Onde U é o valor do PPP, pi(Ui) é a probabilidade de ocorrência, em qualquer tempo durante a exposição, de uma tensão no intervalo [Ui-(∆U/2), Ui+(∆U/2)], sendo ∆U o menor intervalo de tensão definido pela seqüência de Index tensões de referencia Ui= i ∆U. w(Ui) é um fator de peso dado para a faixa de 20 kV ≤ Ui < 36 kV pela equação: Eq (2) e Eq (3) e n é o número de conversões A/D. Com uma planilha eletrônica pode-se calcular o valor do PPP. w(Ui)=exp{-8,646855x10-3Ui2 +0,8170361Ui-23,27793} (2) U= e para a faixa de 36 kV ≤ Ui ≤ 150 kV por: w(Ui) = 4,310644x10-10Ui4 - 1,662009x10-7Ui3 + 2,30819x10-5Ui2 + 1,03082x10-5Ui - 1,747153x10-2 Gerador de Alta tensão PC ∑U w(U ) i −1 n i i ∑ w(U ) i =1 (3) A Fig.1 apresenta um diagrama do arranjo experimental utilizado que está implementado no laboratório de ensaios do DEFISME/IRD. O aparelho de raios X é um VMI modelo Pulsar 800, o divisor de tensão é um Dynalyser III da Radcal Corporation e a placa de aquisição de dados modelo PCI-MIO-16E-4 da National Instruments (NI) (12 bits, 500 ksamples/s). Divisor de tensão n (4) i Fica evidente que o calculo do PPP é bastante simples quando se dispões da curva de alta tensão digitalizada com taxa de conversão constante. É interessante ressaltar que uma vez que PPP considera o período de tempo de aplicação da tensão os problemas referentes a tensões aplicadas por curtíssimos intervalos de tempo[4] são descartados. III. RESULTADOS OBTIDOS RX Medidor de kV Placa de aquisição de dados Figura 1. Diagrama do arranjo experimental utilizado. Utilizando o software LabView da NI, foi desenvolvido um programa que funciona como um osciloscópio digital, porém com uma resolução de 12 bits. O sinal proveniente do divisor de tensão ao ultrapassar o nível de disparo faz com que um número conversões A/D pré-definidas sejam efetuadas. Os resultados destas conversões são apresentados graficamente na tela do PC e os dados são armazenados em um arquivo pré-estabelecido pelo operador. A taxa de conversão é selecionada antes da operação do sistema de acordo com a freqüência de operação do gerador de alta tensão. O divisor de tensão (Dynalyser III) foi calibrado conforme descrito na referência [3] com uma incerteza de 0,3% (95%). A placa de conversão A/D foi calibrada conforme sugerido pelo fabricante utilizando um multicalibrador Fluke 5500 A. Este procedimento leva a uma incerteza de 0,2% (95%). Considerando cada conversão de forma independente podemos associar a cada tensão um intervalo de tempo constante, pois o tempo de conversão é fixo. Desta forma as probabilidades pi são iguais para todas as tensões (correspondem a um mesmo intervalo de tempo). Com isto a Eq (1) fica reduzida a Eq (4). Onde Ui é o valor obtido pela conversão A/D, wi são calculados conforme as O medidor de kV Diavolt Universal da PTW apresenta três faixas de medição para equipamentos de raios X convencionais: - 40-85 kV 65-110 kV 80-150 kV Foram efetuadas medições em todas estas faixas sendo que todas foram realizadas com um tempo de 250 ms e 200 mAs. O Diavolt Universal foi colocado a 50 cm do tubo de raios X e selecionada inicialmente uma filtração equivalente a 3,5 mm de alumínio pois a filtração total do aparelho de raios X da VMI utilizado é de 3,46 mm. Após algumas medições observou-se que o Diavolt apresentava erros nas medidas dos kV limites das faixas. Optou-se então em selecionar uma filtração de 3.0 mm no Diavolt que funcionou normalmente em todas as faixas, inclusive nas extremidades. A Tabela 1 apresenta os resultados obtidos para diferentes kVs, utilizando as três faixas acima citadas. Os resultados das leituras dos PPP correspondem a média de três medidas experimentais. A incerteza na calibração foi calculada considerando os seguintes fatores: Incertezas tipo A: - desvio padrão da média de 3 medidas experimentais tanto para o Dynalyser quanto para o Diavolt Universal Incertezas tipo B: Para o Dynalyser: - incerteza do Dynalyser – 0,3% (95%) - incerteza da placa de conversão A/D – 0,2% (95%) Index - incerteza na resposta de freqüência %(ripple)*2%(resposta de freqüência em 50 kHz) Para o Diavolt Universal: - 1% (95%) (conforme especificado no catálogo do fabricante[5]). A resposta de freqüência foi obtida na referência [3]. Considerou-se um caso extremo onde a variação do sinal seria igual à variação percentual do ripple medido relativo a cada kV e um erro de 2% devido à resposta de freqüência do Dynalyser. Pode-se observar uma concordância entre os resultados encontrados para as faixas de medições de 40 a 85 kV e de 80 a 150 kV. Para toda a faixa de 65 a 110 kV os valores não coincidem tão bem como nas outras faixas dentro das faixas das incertezas associadas às medições. Comparando a Fig.1 com a Fig 2. verifica-se que o ripple é muito mais elevado para kV menores (15% para 40 kV) do que para kV maiores (2% para 120 kV). Isto se reflete na incerteza da medição pois o valor percentual do ripple entra diretamente no calcula da incerteza 140 120 TABELA 1. Resultados Obtidos 100 Alta tensão Dynalyser kVprático 60 40 20 0 0 50 100 150 200 250 Tempo (ms) Figura 2. Curva da alta tensão na saída do Dynalyser digitalizada e o PPP calculado para 110 kV. 90 80 PPP medido (kV) Faixa kV PPP PPP Dif. Inc. Inc. selecionada Diavolt Dynal. (%) Diavolt Dynal. (kV) (kV) (%) (%) (95%) (95%) 45 45,53 45,45 0,18 1,01 0,70 50 50,43 50,53 0,19 1,01 0,51 40-85 60 59,73 60,64 1,50 1,07 0,41 70 70,20 70,82 0,86 1,00 0,39 80 80,63 80,98 0,43 1.00 0,38 85 86,43 86,04 0,45 1.01 0,38 65 66,30 65,75 0,83 1.00 0,41 65-110 70 71,63 70,81 1,16 1.00 0,38 80 82,53 80,98 1,91 1.00 0,38 90 92,87 91,15 1,88 1.00 0,37 85 86,67 86,04 0,72 1.83 0,38 90 91,80 91,15 0,71 1.91 0,37 80-150 100 101,77 101,20 0,56 1,55 0,37 110 111,70 111,31 0,35 1.22 0,37 120 121,53 121,44 0,08 1.00 0,41 125 124,53 124,37 0,13 1.04 0,48 kV 80 70 60 Diavolt Dynalyser 50 40 40 A Fig. 1 exemplifica uma curva de alta tensão digitalizada e o valor do PPP calculado utilizando o Dynalyser para 40 kV e a Fig.2 para 110 kV 60 50 60 70 80 90 Alta tensão selecionada (kV) Figura 3. Resultados experimentais com suas respectivas incertezas para a faixa de 40 a 85 kV. Alta tensão Dynalyser kVprático 95 90 PPP medido (kV) kV 40 20 85 80 75 Diavolt Dynalyser 70 0 0 50 100 150 200 250 Tempo (ms) Figura 1. Curva da alta tensão na saída do Dynalyser digitalizada e o PPP calculado para 40 kV. As Figs. 3, 4 e 5 apresentam os resultados das medições com suas respectivas incertezas. 65 65 70 75 80 85 90 Alta tensão selecionada (kV) Figura 4. Resultados experimentais com suas respectivas incertezas para a faixa de 65 a 110 kV. Index REFERENCIAS 130 125 120 PPP medido (kV) 115 110 105 100 95 Diavolt Dynalyser 90 85 80 80 90 100 110 120 130 Alta tensão selecionada (kV) Figura 5. Resultados experimentais com suas respectivas incertezas para a faixa de 80 a 150 kV. [1] International Electrical Commission “Instruments as used in the non-invasive measurement of X-ray tube potential in diagnostic radiology” IEC 1676 Draft. 1997. [2] BAORONG Y., KRAMER, H. M., SELBACH, H. J., LANGE B. Experimental determination of practical peak voltage, The British Journal of Radiology 73 641-649 (2000). [3] Becker, P. H. B., e Peres, M. A. L. Implantação de um laboratório para calibrar divisores de tensão utilizados em radiologia, Anais da International Conference on Advanced Opticall, Electrical and Legal Metrology São Paulo, Nov. 2000. [4] Becker, P. H. B., e Peres, M. A. L. Calibração de divisores de tensão para medidas de kVp em radiologia, uma comparação da calibração elétrica com a espectrométrica IRPA, Recife, 2001 [5] PTW, manual do medidor de kV Diavolt Universal. IV. CONCLUSÕES Os resultados demonstram haver uma concordância entre os valores medidos com o Diavolt Universal da PTW e aqueles obtidos utilizando o procedimento e o arranjo experimental do IRD para as faixas de medidas de 40 a 85 kV e de 80 a 150 kV. Para a faixa de 65 a 110 kV as diferenças encontradas foram maiores. Isto ocorreu inclusive quando variou-se a filtração selecionada para o tubo de raios X no Diavolt. Aparentemente este instrumento apresenta problemas na medição do PPP quando se utiliza esta faixa. Outro ponto observado é que o Diavolt tem uma grande sensibilidade com a filtração do tubo selecionada o que foi comprovado quando selecionou-se uma filtração de 3,5 mm de alumínio e o instrumento não foi capaz de medir um kV de 44 kV dentro da faixa de 40 a 85 kV. Não dispondo de nenhum outro instrumento com capacidade de medir o PPP, não é possível fazer uma melhor avaliação do que ocorreu neste ponto específico. Aparentemente o problema é realmente do instrumento, pois, variando a seleção da filtração a resposta passou a ser coerente. De qualquer forma os resultados indicam que o procedimento desenvolvido e o arranjo experimental utilizado levaram a valores coerentes com a maioria das leituras do instrumento fabricado pela PTW. Em seqüência a este trabalho serão efetuadas comparações em aparelhos de raios X com geradores de altas tensões que utilizam média freqüência ou uma rede trifásica de forma a se avaliar a resposta do sistema com outros tipos de geradores. Dentro do projeto ARCAL LIII Cuba, México e Peru estão implementando, baseados na experiência brasileira, ainda este ano, arranjos experimentais semelhantes ao do IRD e receberão também medidores Diavolt Universal. Solicitaremos a estes países que efetuem medições semelhantes a cujos resultados foram apresentados neste trabalho de forma a possibilitar uma comparação dos resultados e confirmar a resposta do Diavolt Universal. ABSTRACT The IEC 1676 standard introduces a new quantity for the measurements of the high voltages applied to the X ray tubes used for diagnosis, the ‘Practical Peak Voltage” (PPV). In order to start the introduction of this new quantity in Brazil the National Laboratory for Metrology of Ionizing Radiation has developed a procedure for calibrating measuring instruments in this quantity. This procedure is based in the same set up used for the calibration of the conventional kVp, which consists in a high voltage divider (Dynalyser III from Radcal Corporation), a fast analogue to digital conversion board and a data acquisition software. In order to evaluate this procedure a commercial kVp measure instrument that is able to measure PPV (Universal Diavolt from PTW) was calibrated and the results compared. This work presents a summary of the procedure developed and the results obtained with the comparison.