1. A DISCIPLINA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO

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1. A DISCIPLINA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO
- disciplina autônoma das demais, por desempenhar função exclusiva.
- caráter: disciplina propedêutica, de base, introdutória do estudante no curso de
Direito.
- função/objetivo principal: definir o objeto de estudo; apresentar as noções e
princípios jurídicos fundamentais da ciência, bem como as noções sociológicas,
históricas, filosóficas necessárias à compreensão do Direito (Ciência do Direito
sentido amplo) em todos os seus aspectos.
- Para Nader, são três os objetos da I.E.D.: 1) conceitos gerais do Direito (ex.:
Direito; fato jurídico; relação jurídica, justiça); 2) visão de conjunto do Direito;
3) lineamentos da técnica jurídica.
* Obs.: Ciência do Direito (num sentido amplo): é um setor do conhecimento
humano que investiga e sistematiza os conhecimentos jurídicos. Noutras
palavras, é a ciência voltada aos estudos jurídicos.
2. ETIMOLOGIA DA PALAVRA DIREITO
- Etimologia significa o estudo da origem de uma palavra, a sua genealogia.
- Etimologia da palavra Direito: Direito é oriunda do adjetivo latino directus
(qualidade do que está conforme a reta, o que não se desvia), que provém do
particípio passado do verbo dirigo, dirigere (guiar, conduzir). Essa palavra surgiu
apenas na Idade Média, século IV. Em Roma, não se usava esse termo; havia a
palavra jus para expressar o que era lícito.
- Não há uma única definição para Direito. Não há um consenso a esse respeito.
Isso decorre do fato de o Direito ser uma ciência de múltiplas faces, acepções, de
modo que uma definição pode abranger um determinado aspecto, mas ser omissa
sobre outro, ou outros aspectos, também formadores do que seja o Direito.
- Acepções da palavra Direito:
2.1) DIREITO NATURAL: são aspirações jurídicas de determinada época que
surgem da natureza social do homem e que se revelam pela conjugação da
experiência e da razão. É um conjunto de princípios universais. Não é algo
escrito, mas deverá ser consagrado pelo direito positivo, a fim de se ter um
ordenamento jurídico (conjunto de normas jurídicas; conduta exigida ou o
modelo imposto de organização social) realmente justo. Para alguns autores, o
Direito Natural não é mutável, o que muda é a forma como a sociedade o encara.
Para outros, ele muda, vai evoluindo com a sociedade e sendo acrescentado por
novos ideais, novas aspirações.
Exemplos de direitos naturais: o direito à vida, o direito à liberdade.
Numa evolução histórica do Direito Natural, temos: 1) Na Idade Média, o Direito
Natural vinha de Deus e era ditado pelos religiosos (representantes de Deus na
Terra); 2) No século XVII, Hugo Grócio (jurisconsulto holandês), considerado o
pai do Direito Natural, afirma que este surge da natureza humana e da natureza
das coisas (é uma noção de Direito Natural filosófica). 3) No século XVIII, Kant
(filósofo) dirá que o Direito Natural é um conjunto de normas superiores
apreendidas da razão, da consciência humana. 4) Direito Natural advém da
sociedade; é ela que pré-determina, de acordo com suas necessidades, com sua
realidade, o que é Direito Natural, quais são as suas aspirações.
2.2) DIREITO POSITIVO: é o Direito criado ou reconhecido pelo Estado; é a
ordem jurídica obrigatória num determinado tempo e lugar, independentemente
de ser escrito ou não, pois outras formas de expressão jurídica constituem,
também, Direito Positivo (ex.: os costumes, jurisprudência). O que é essencial
saber é que o Direito Positivo é o Direito institucionalizado pelo Estado.
* Obs.:Direito Natural e Direito Positivo são distintos, mas se interligam,
convergem-se reciprocamente, pois, como vimos nos conceitos acima, o Direito
Natural depende de uma consagração do Direito Positivo, de um respaldo pelo
Estado, para que exista um ordenamento ou ordem jurídica justa. De outro lado,
o Direito Positivo também deve atentar, observar, as aspirações, os ideais, da
sociedade, no tempo e no espaço, para que a ordem jurídica seja respeitada e não
algo arbitrário.
2.3) DIREITO OBJETIVO: é o Direito vigente (direito positivo) tomado pelo seu
aspecto objetivo, ou seja, é a norma de conduta e organização social (por muito
tempo conhecido como norma agendi). É algo teórico, uma previsão.
2.4) DIREITO SUBJETIVO: é o Direito vigente (direito positivo) tomado pelo
seu aspecto subjetivo. São as possibilidades ou poderes de agir que uma ordem
jurídica ou um contrato garante a alguém de exigir de outra pessoa uma conduta
ou uma omissão (por muito tempo, facultas agendi). É o direito personalizado, é
a norma (direito objetivo) perdendo o seu caráter teórico e se projetando numa
relação jurídica concreta, numa situação que ocorreu. Ex.: Fulano tem direito à
hora-extra porque trabalhou depois de seu horário normal. Beltrano tem direito à
indenização porque foi publicada, num jornal de grande circulação, uma notícia
falsa a seu respeito.
O Direito subjetivo pode ser: 1) patrimonial (direitos reais e obrigacionais) ou
não patrimonial.
- O direito patrimonial é alienável e transferível para outra pessoa (pode ser dado,
vendido, trocado); exemplo o direito de propriedade.
- O direito não patrimonial não é alienável, não é transferível; exemplo: direito à
vida; direito ao nome (o artigo 16 do Código Civil prevê: “toda pessoa tem
direito ao nome, nele compreendido o prenome e o sobrenome”).
2) privado ou público.
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O antigo ensinamento norma agendi/facultas agendi não é mais aceito
porque apresenta o Direito Objetivo e o Subjetivo de maneira distinta,
como se não pudesse pensar um com o outro.
TEORIAS SOBRE A NATUREZA DO DIREITO SUBJETIVO, O QUE
É AFINAL O DIREITO SUBJETIVO:
1. Teoria Subjetiva: Windscheid (jurista alemão pandectista): “direito
subjetivo é a vontade juridicamente protegida”. Problemas detectados: há
casos que o direito subjetivo existe a despeito da vontade do titular (ex. o
credor não exerce seu direito de cobrar o crédito); há casos que o direito
subjetivo existe mesmo contra a vontade do titular (ex.: o direito às férias
permanece mesmo se o trabalhador não quiser “sair” de férias); há casos
que o direito subjetivo existe mesmo sem a pessoa ter vontade (ex.: os
incapazes têm direitos, mas não conseguem exprimir sua vontade); e,
finalmente, há casos que o direito subjetivo existe, mas seu titular
desconhece (ex.: a morte do pai de Fulano num lugar desconhecido não
retira o direito do filho à herança). Diante dessas críticas, Windscheid se
manifesta, afirmando que a vontade, não é uma vontade psíquica, mas “o
poder jurídico de querer”. Não explicou o que quis dizer com isso.
2. Teoria Objetiva: Ihering (jurista alemão): “direito subjetivo é o interesse –
qualquer que seja – juridicamente protegido”. Para ele, a norma jurídica é
a capa que reveste o interesse (interesse = direito subjetivo). Problemas
detectados: a amplitude do que é interesse; muitas vezes o que interessa
não é juridicamente protegido; há situações em que a pessoa não tem
nenhum interesse em ser titular de um direito (desinteresse).
3. Teoria Eclética: Georg Jellinek: não é só o interesse, nem só a vontade que
representa o direito subjetivo, mas a conjugação desses dois elementos.
“Direito subjetivo é o interesse protegido enquanto atribui a alguém um
poder de querer”. Problemas detectados: não supera as críticas feitas às
outras teorias.
4. Hans Kelsen: direito subjetivo é a expressão do dever jurídico; reflete o
que é devido por alguém em virtude de uma regra de direito. É um modo
de ser da norma jurídica
5. Léon Duguit (publicista francês): direito subjetivo não existe. O que
existem são situações de fato de natureza subjetiva, ou seja, são situações
fáticas juridicamente garantidas.
6. Del Vecchio: vai declarar elididas as críticas feitas à teoria originária de
Windscheid, ao situar o direito subjetivo como a “possibilidade de
querer”.
DIREITO SUBJETIVO, ENTÃO, PODE SER DEFINIDO COMO A
“POSSIBILIDADE DE UMA PRETENSÃO, UNIDA À EXIGIBILIDADE DE
UMA PRESTAÇÃO OU DE UM ATO DE OUTREM” (Reale). Não é apenas
uma faculdade como, num primeiro momento, definimos em sala de aula, a título
de primeiro contato, primeiro esclarecimento sobre o que é direito subjetivo, mas
possibilidade ou poder de agir dado a alguém, pela lei ou pelo contrato, de exigir
de outra uma conduta ou uma omissão.
* Obs.: Direito Objetivo e Direito Subjetivo não são duas realidades distintas,
mas dois lados de um mesmo objeto. Representam duas formas de se “olhar” o
Direito vigente (= Direito Positivo): uma objetiva, abstrata, genérica, disposta
indistintamente; outra, subjetiva, da pessoa que, numa situação concreta, poderá
ter uma conduta ou estabelecer as conseqüências jurídicas.
DIREITO NATURAL (aspirações ou ideais sociais)
DIREITO POSITIVO (Direito vigente institucionalizado pelo Estado)
DIREITO OBJETIVO (plano teórico; abstrato)
DIREITO SUBJETIVO (caso concreto)
3. DIREITO COMO CIÊNCIA
- uma linguagem própria.
- um método (= caminho a ser percorrido para se chegar à verdade ou a um
resultado exato, rigorosamente verificado) próprio. Segundo Reale, há uma
pluralidade metodológica no Direito (método indutivo, dedutivo, uso da
analogia).
- romanos: os primeiros a descobrir que, em determinadas circunstâncias, pode
ser previsto um tipo de comportamento humano, pois tal comportamento obedece
a certas condições fáticas ou finalidades valorativas (=axiológicas). Além disso,
perceberam que a vida em sociedade, mesmo em constante mudança, apresenta
relações estáveis e regulares, permitindo uma representação antecipada do que
vai ocorrer.
- Ciência do Direito (sentido estrito, restrito): é o estudo de um conjunto de
normas de um determinado sistema jurídico. É também chamada de Dogmática
Jurídica, Jurisprudência Técnica, Ciência Dogmática do Direito.
As normas jurídicas são para o jurista dogmas, não podem ser contestadas na sua
existência, se formalmente válidas. Além disso, ninguém pode se eximir de
cumprir a regra jurídica alegando ignorar a lei ou porque não lhe parece
adequada aos seus propósitos pessoais. Isso, contudo, não impede que a norma
seja interpretada para que sua aplicação se dê de forma a satisfazer às exigências
sociais da melhor forma possível.
- funções do Direito: imediata (a solução do conflito de interesses, ou seja, da
lide, do litígio); mediata (a paz social).
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Obs.: Estado brasileiro, Estado inglês, etc., para se referir a um país
(sempre com letra maiúscula). “Estado é a organização jurídica do poder,
em determinado território, com o objetivo de proporcionar ordem,
segurança e desenvolvimento do povo nele fixado.” (Paulo Dourado de
Gusmão). Para que esse poder consiga alcançar esse objetivo, da melhor
forma possível, é que o Estado brasileiro se dividiu em entes (os
chamados entes da federação): União (funções executadas pelo governo
federal); os Estados-membros (funções executadas pelo governo estadual Minas Gerais, por exemplo); o Distrito Federal; os Municípios (funções
executadas pelo governo municipal - Contagem, por exemplo). O artigo
18 da Constituição de 1988 é que estabeleceu essa forma de organização
político-administrativa da República Federativa do Brasil.
O poder que nós falamos acima é divido em três funções: Poder
Legislativo (criador das normas e fiscalizador do Executivo); Poder
Executivo (executa as leis e, supletivamente, pode editar normas, como as
Medidas Provisórias); Poder Judiciário (julga os conflitos sociais,
individuais, coletivos, de acordo com as normas previamente criadas). O
artigo 2º da Constituição de 1988 é que definiu essa divisão de poderes,
mas um não é superior ao outro; um “acompanha” o outro.
No âmbito federal, há um Legislativo, um Executivo, um Judiciário. No
âmbito estadual, há um Legislativo, um Executivo, um Judiciário. No
âmbito municipal, há um Legislativo e um Executivo; não existe um
Judiciário. Esses conceitos serão detalhados nos próximos períodos,
principalmente sobre a situação peculiar do Distrito Federal, o porquê de o
Município não ter um Poder Judiciário. O que deve ficar claro, nesse
momento, é que as leis são normas jurídicas advindas do Poder
Legislativo (federal, estadual, municipal).
4. ZETÉTICA E DOGMÁTICA
4.1 Disciplina Zetética (zetein)
Zetética significa problematizar, questionar. Disciplinas zetéticas são, portanto,
aquelas que acentuam a pergunta (perguntam o que é alguma coisa), de modo
que os dogmas, as evidências, sobre determinado tema são apenas pontos de
partida, permitindo uma aprendizagem mais profunda.
A função especulativa é a principal tônica. Os questionamentos são infinitos,
mutáveis; opiniões formadas são colocadas em dúvida, o que auxilia,
sobremaneira, no aprimoramento da Ciência do Direito, pois permite o
raciocínio, uma visão crítica sobre o problema que é posto à solução.
Além disso, elevam a interdisciplinariedade do Direito com outras áreas, o que,
aliás, é de todo oportuno, já que, como vimos em aula, o Direito está ligado à
sociedade, impõe limites para permitir o convívio social, mas precisa
acompanhar as mudanças sociais, as transformações dos próprios anseios, das
próprias necessidades sociais. Isso, sem dúvida, é favorecido pela ajuda de outras
Ciências.
Exemplos de disciplinas zetéticas indispensáveis na formação de bons
operadores do Direito, comprometidos com uma aplicação da lei mais
efetiva, mais próxima de efeitos duradouros, aceitáveis pelos envolvidos num
determinado caso concreto: Filosofia do Direito; Sociologia do Direito.
Notem: as disciplinas zetéticas na Ciência do Direito são, sozinhas, ciências
autônomas. Temos a Filosofia, a Sociologia. Mas quando focam como objeto de
estudo temas do Direito, o fenômeno jurídico, assumem uma adjetivação para
indicar esse compromisso. Daí Filosofia do Direito, Sociologia do Direito,
Psiquiatria Forense, etc.
4.2 Disciplina Dogmática (dokein)
Dogmática significa doutrinar, ensinar algo. Disciplinas dogmáticas acentuam,
portanto, a resposta; perguntam o que deve ser alguma coisa. Por conta disso,
parte de pressupostos, premissas inatacáveis, que não podem ser questionadas
(dogmas).
Enquanto as disciplinas zetéticas acentuam a dúvida, as dogmáticas evidenciam a
opinião, o ato de opinar sobre algo. Daí Ferraz Júnior falar que essas disciplinas
possuem uma função diretiva, ou seja, de direção, de condução. Nelas, há
questionamentos, mas são finitos.
Exemplos de disciplinas dogmáticas no Direito: direito constitucional, direito
civil, direito penal, direito do trabalho, direito processual, direito tributário, etc.
Notem: as disciplinas dogmáticas estão estritamente ligadas com o que
chamamos de direito positivo, ou seja, com as normas de conduta e de
organização social criadas pelo Estado.
Interessante a crítica feita por Juscelino Vieira Mendes aos cursos de Direito
(e mesmo aos operadores do Direito) que ainda se prendem, unicamente, à
Dogmática, às disciplinas ocupadas com a legislação:
“A zetética analítica possibilitará uma aprendizagem mais profunda e
comprometida, por tomar os dogmas como meros pontos de partida. Pressupõe o
ensino competente de Filosofia do Direito, Lógica, Metodologia Jurídica, Teoria
Geral do Direito, Hermenêutica, Teoria da Argumentação, Semiótica...
Enquanto esta postura diferenciada não é oferecida ao futuro operador do Direito,
o resultado que se tem é total desconexão dos parcos conhecimentos introjetados,
com a repetição de conceitos prontos, ditados pelos professores, isolados em cada
disciplina, e que não conseguem articulação em uma visão conjunta e coerente do
fenômeno jurídico.
Há, por outro lado, uma hipertrofia do conhecimento teórico, em detrimento da
prática, que impede ao aluno inferir, estabelecer relações e concluir de sua
aplicabilidade na vida. Ainda mais porque tais abstrações não são bem claras,
ficando ao aluno a sensação de que pode "misturar" um pouquinho de cada
teoria, formando uma posição eclética, muito ao gosto do "jeitinho" brasileiro.
Assim, sempre é frágil este saber, não aprofundado, pouco sério (do tipo diz-quediz-que: o professor diz que o doutrinador diz que Kelsen diz...). A insegurança
profissional do operador é sua decorrência natural.
Além disso, acresça-se ainda a defasagem de duzentos anos do conhecimento
teórico ministrado no país. Aqui, a "Ciência" do Direito evolui lentamente e sem
muita vontade. Conforma-se a modelos estrangeiros importados acriticamente, e,
por comodismo, mantido o repertório de dogmas, dos lugares comuns, dos
nossos mitos. No caso dos operadores do Direito que pretendem ser juízes, a
defasagem entre o ensino oferecido e o necessário se revela mais dramática. Sua
tarefa primordial será julgar, tarefa mental superior, não-inata. É necessário
aprender a pensar e a desenvolver todas as capacidades e a usar a inteligência
como poder.
Pensar é uma forma de aprender, básica para qualquer atividade futura que exija
reflexão, conclusão, julgamento, avaliação. Apesar de compreender o emprego
de um conjunto de potencialidades inatas, a tarefa de pensar não vem pronta para
ser realizada, como outras para as quais o homem já nasce biologicamente
preparado (por exemplo, respirar). Pensar é um processo mental superior, que
requer aperfeiçoamento. É preciso que o ser humano tenha consciência das
operações de pensamento, e que se empenhe para realizá-las com competência.
As principais são: comparação, resumo, observação, suposição, imaginação,
crítica, decisão, interpretação, aplicação de fatos e princípios a novas situações,
planejamento, projetos e pesquisas. Pensar é julgar, concluir, decidir; aceitar
como opinião estabelecida, acreditar. É refletir; raciocinar; intencionar; planejar.
Para Hannah Arendt pensar, querer e julgar são as três atividades mentais
básicas, cuja análise permitirá compreender a existência racional.”
Maio/2003.
Fontes de estudo: FERRAZ JR., Tércio Sampaio. "Introdução ao Estudo do
Direito" - Editora Atlas, quarta edição - 2003; FLORES CUNHA, Regina Maria
E. "Crítica ao modelo de ensino jurídico comum a todos os operadores do
Direito"; LARENZ, Karl. "Metodologia da Ciência do Direito", Fundação
Calouste Gulbenkian, 2a edição. Tradução de José Lamego.
Mendes, Juscelino V. – Zetética e Dogmática. Página de Juscelino Vieira
Mendes, seção "Pedagogia". Disponível em:
http://planeta.terra.com.br/arte/juscelinomendes/, Internet, Campinas, 2003.
Acesso em: 3 mar. 2006.
4.3 Direito Público/ Direito Privado/ Direito Misto
As disciplinas dogmáticas apresentam-se subdivididas, para facilitar o estudo, de
acordo com as três grandes áreas do Direito, a saber:
- Direito Público: é o ramo do Direito que tem por objeto o Estado e o interesse
público. Suas principais características são: a irrenunciabilidade, a irrelevância da
vontade das partes e o fato de ser um direito de subordinação (prepondera os
interesse público sobre o interesse particular). Subdivide-se, por sua vez, em
Direito Público interno e externo, como vocês terão oportunidade de ver no
próximo semestre. De modo geral, citemos como exemplos de disciplinas de
Direito Público: Direito Constitucional, Direito Tributário, Direito Penal.
- Direito Privado: é o ramo do Direito que tem como objeto os particulares. São
suas características: a possibilidade de renúncia; a relevância da vontade das
partes; é direito de coordenação (coordena os interesses das partes). Exemplos:
Direito Civil, Direito Comercial.
- Direito Misto: é o ramo do Direito que cuida dos interesses públicos e privados
ao mesmo tempo. Exemplos: Direito de Família; Direito do Trabalho; Direito
Econômico.
Observação: atentem para o fato de que essa subdivisão do Direito em três
grandes ramos, presta-se, apenas, para facilitar o estudo do Direito, pois, como já
acentuamos noutro momento, o Direito é uma única ciência.
5. O DIREITO COMO OBJETO DE CONHECIMENTO: PERFIL
HISTÓRICO

Finalidade do resgate histórico: identificar o papel desempenhado pela
dogmática jurídica na vida social, bem como o modo de desenvolvimento
do pensamento dogmático até a sua afirmação e justificação.
5.1 Jurisprudência Romana:
- O Direito como diretivo, guia, para a ação humana, sem distinção entre coisas
divinas e coisas humanas (“tudo se misturava”).
- O Direito era visto como norma de vida e instrumento de organização social
que teria surgido com a fundação de Roma (fundação essa explicada pelos mitos
romanos) e se transmitido, de geração em geração, pela tradição. Isso, inclusive,
permitiu a expansão romana, como império. Nesse contexto, o Direito era forma
cultural sagrada; exercício de uma atividade ética (a prudência). Daí a expressão
Jurisprudentia (Jurisprudência).

Jurisprudência romana (definição): é o exercício de uma atividade ética (a
prudência), consubstanciada no equilíbrio e na ponderação nos atos de
julgar.
- Momentos históricos de manifestação da Jurisprudência em Roma:
1º momento: a legislação era restrita à regulação de matérias muito especiais,
ficando o Direito pretoriano (dos pretores, dos juízes da época) como supletivo,
como complemento, dessa legislação. Para os julgadores, era, então, difícil suprir
as faltas da legislação, na prática, já que as leis, como dissemos, existiam apenas
para regular questões muito específicas.
Apesar de constatado esse problema, a tarefa de preencher as faltas não foi
possível, nesse 1º momento, pois a Jurisprudência era exercida por jurados, em
geral, leigos, sem capacidade para construir um conjunto teórico que conseguisse
preencher os vazios legislativos e que resolvesse, da forma mais justa, o caso
concreto.
2º momento: no período da história romana conhecido por Concilium Imperial,
os juízes assumem um papel profissional e recebem o nome de jurisconsultos.
Representavam a mais alta instância judicante, judicial, do Império Romano.
Os jurisconsultos influenciam a Jurisprudência com o responsas (informação
sobre determinadas questões jurídicas levadas aos jurisconsultos, por uma das
partes, quando do conflito de interesses. A própria solução desse conflito pode
ser entendida como responsas também).
É o início de uma teoria jurídica entre os romanos. Mas ainda havia pouca
argumentação e as decisões se pautavam no fato de as questões jurídicas, levadas
ao conhecimento dos jurisconsultos, serem afirmadas por personalidades com
reconhecimento na sociedade. Noutras palavras, não se ouvia as razões de uma
parte e as razões da outra para se chegar à solução do conflito. Simplesmente se
resolvia o problema nas justificativas apresentadas pela parte que tivesse maior
reconhecimento, destaque, na sociedade romana.

Responsas era oral, no momento que surge. Algum tempo depois assume a
forma escrita.
3º momento: com a acumulação de responsas, surge a possibilidade de
entrelaçamento das decisões; a escolha de premissas (de uma ou de outra parte);
e também se fortalecem as opiniões por meio de justificações. Para tanto, os
romanos resgatam alguns instrumentos técnicos gregos, como a retórica, a
dialética (confronto de idéias; a arte das contradições), a gramática, a filosofia,
etc.
Nesse momento, há uma condução dos romanos a um saber prático (produziram
definições duradouras e critérios distintivos para as diferentes situações
conflituosas que pudessem aparecer na prática).
Desenvolve-se o poder de argumentar e provar, que, em nossos dias, é tão
importante no processo, figurando, inclusive, como um princípio de direito
processual.
Por sua vez, o juiz é tido como aquele que decide e responde por sua decisão
enquanto juiz.
4º momento: o Direito pouco a pouco alcança um nível de abstração maior,
tornando-se uma regulação abstrata. Assume a forma de poder decisório que
formulava as condições para a decisão correta. É o surgimento do pensamento
prudencial, com suas regras, princípios, meios interpretativos, etc.
O papel de mediador é acentuado para se referir ao julgador.
5.2 O Direito na Idade Média
- O Direito é considerado um dogma.
* Dogma: algo indiscutível.
- O advento do Cristianismo levou a essa nova concepção de Direito. É o
Cristianismo que faz a diferença entre política e religião, ainda que sutil. O
grande marco foi uma resenha crítica dos digestos justinianeus (textos jurídicos
romanos), em Bolonha, no século XI.
- Permanece o caráter sagrado do Direito, mas no sentido de algo transcendente à
vida humana na Terra. Para os romanos, ao contrário, o caráter sagrado do
Direito era algo imanente, explicado com o mito da fundação de Roma.
- A grande preocupação era a adequação à ordem natural, a relação do homem
com o meio.
- Essa época representa um novo saber prudencial que não abandona totalmente o
pensamento prudencial romano, mas apresenta outra finalidade: conhecer e
interpretar a lei e a ordem, distinguindo as coisas divinas das coisas humanas.
Representa o surgimento da dogmaticidade do pensamento jurídico (textos de
Justiniano, fontes eclesiásticas, como base indiscutível do Direito – dogmas –, e
que eram submetidos a técnicas explicativas, a exemplo da gramática, da
retórica, pelos chamados glosadores) e, também, da teoria jurídica como
disciplina universitária.
Eram os glosadores (nome dado aos juristas da época) que faziam a
harmonização dos diversos textos jurídicos, sempre tomando uma interpretação
conforme o ensinamento da Igreja.
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A Igreja limitava o poder político do rei. Resgata o Direito Romano
apenas para permitir a centralização política na figura do rei, mas
deixando a figura de Deus como o grande detentor de poder. Aliás, o uso
de dogmas tinha o intuito de justificar a autoridade de Cristo como
transcendente ao mundo político.
Os canonistas (religiosos) ditam o que seria dogma (daí se falar em Direito
Canônico) e os juristas interpretavam esse dogma, sempre fazendo uma
leitura conforme o pensamento da Igreja.
Há a construção de uma teoria jurídica para servir ao domínio político do
rei, como instrumento de seu poder, o que auxilia na formação do Estado
moderno. Contudo, não se pode perder de vista que a Igreja é que limitava
o poder político do rei, como já dissemos acima.
5.3 Jusnaturalismo na Era Moderna (= Jusracionalismo)
- Direito como ordenação racional.
* Jusnaturalismo na Era Moderna ou Jusracionalismo é uma das vertentes da
Escola de Pensamento Jurídico chamada de Escola de Direito Natural. Segundo
essa vertente, o Direito vem da razão.
Outra vertente da Escola de Direito Natural é o Jusnaturalismo, para o qual o
Direito vem da natureza das coisas.
O que deve ficar claro é que tanto uma, como outra vertente, preocupa-se em
considerar o Direito como Direito Natural, apenas. Para alguns, o Direito Natural
é algo mutável; outros já o consideram mutável, variável no tempo.
- Marco: Renascimento.
- Dessacralização aos poucos. O Direito vai se afastando da Religião com a
tecnização do saber jurídico. Isso leva, também, à perda do caráter ético do
Direito.
- Surgimento da noção de sistema (conjunto coordenado de várias normas
jurídicas num todo, numa estrutura organizada).
- O grande problema é: Como dominar, tecnicamente, a natureza que tanto
ameaça a vida humana?
- Quebra do elo jurisprudência e procedimento dogmático pautado na autoridade
de textos romanos, mas tenta aperfeiçoar o caráter dogmático, como algo
construído a partir de premissas validadas (comprovadas) pela razão. O dogma
passa a ser, então, aquilo que pode ser validado pela razão, e não algo advindo de
uma autoridade, como se via na Idade Média.

Razão: é pela razão que as regras de convivência são reconstruídas. O
Direito se assume como regulador racional, acima do Estado, capaz de
atuar, apesar das divergências nacionais e religiosas, em toda
circunstância.
5.4 Positivismo (Séc. XIX)
- Direito como norma posta. O Direito se limita àquilo que é ditado e
reconhecido pelo Estado como norma jurídica. Limita-se ao Direito Positivo. Daí
se falar em Positivismo jurídico.

Positivismo jurídico é uma Escola de Pensamento Jurídico iniciada com
Comte. Os seguidores dessa Escola preocupam-se com a aplicação, a
estrutura da norma jurídica e não com o que reflete a norma. Hans Kelsen
é um desses seguidores.
- Preocupação em dar segurança jurídica à sociedade, com maior estabilidade do
ordenamento jurídico, através de normas escritas, postas pelo Estado.
- Não conseguiu explicar a mutabilidade do Direito. Perceberam que o Direito
muda no tempo, mas não conseguiram explicar o porquê disso.
Foi nesse contexto que apareceu outra Escola de Pensamento Jurídico, a Escola
do Historicismo Jurídico. Para ela, o Direito se forma, modifica-se
espontaneamente e é manifestação do espírito popular, de forma que o Direito de
cada lugar é determinado pelo seu povo. Explica, assim, a mutabilidade do
Direito, mas seus seguidores limitavam o Direito como um todo, sem avançar em
suas explicações, considerações (afinal, o que seria o Direito?).
5.5 Direito na Atualidade
- Direito como instrumento decisório dos conflitos de interesses, que surgem na
vida social.
OBSERVAÇÃO: ESTE É APENAS UM ROTEIRO DE ESTUDO E, POR
ISSO, NÃO ESGOTA O TEMA. PARA MAIORES ESCLARECIMENTOS
ACERCA DO PERFIL HISTÓRICO DO DIREITO COMO OBJETO DO
CONHECIMENTO PODEM SER CONSULTADOS OS LIVROS DE TÉRCIO
FERRAZ JÚNIOR: “INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO” E “A
CIÊNCIA DO DIREITO”.
6 INSTRUMENTOS DE CONTROLE SOCIAL: DIREITO, MORAL,
RELIGIÃO, REGRAS DE TRATO SOCIAL
- Condicionamento da vida do homem em sociedade para se atingir a harmonia
social.
- Importância: só as normas jurídicas levariam o homem a se tornar um robô, de
modo que a socialização não seria um valor em si, mas algo forçado.
6.1 Direito: como instrumento de controle social, é o Direito Positivo (normas
jurídicas de conduta e organização social criadas e/ou reconhecidas pelo Estado).
Preocupa-se com a Justiça (idéia de bem no âmbito social, de bem comum).
6.2 Moral: são normas que orientam as consciências humanas em suas atitudes.
Preocupa-se com o bem, no sentido integral (de realização) e integrado
(condicionamento ao interesse do próximo).
6.3 Religião: sistema de princípios e preceitos para a realização da vontade
divina, com o propósito de conduzir o homem à felicidade eterna. Não se limita a
descrever o além e/ou Criador. Preocupa-se com o bem, no sentido de deveres do
homem com o Criador, com a divindade.
* Obs.: não limitar a Religião apenas ao Catolicismo. Religião, aqui, é tomada
num sentido maior: “Religião: 1. Crença na existência duma força ou forças
sobrenaturais. 2. Manifestação de tal crença por meio de doutrina e ritual
próprios. 3. Devoção, piedade.” (FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda.
Minidicionário da língua portuguesa. 1.ed. 16.imp. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, [19--], p.411)
6.4 Regras de trato social: são padrões de conduta social ditados pela própria
sociedade, com o propósito de tornar mais agradável, ameno, o ambiente social.
São exemplos: a cortesia, a etiqueta, a linguagem, o decoro, o companheirismo,
etc.
6.5 Características principais dos instrumentos de controle social, segundo Paulo
Nader (1998):
DIREITO
MORAL
Bilateral
Unilateral
Autônoma, em
regra
Interior
Incoercível
Heterônomo
Exterior
Coercível
Sanção
prefixada
Sanção difusa
TRATO
SOCIAL
Unilateral
RELIGIÃO
Unilateral
Heterônomo
Autônoma
Exterior
Incoercível
Interior
Incoercível
Sanção, em geral,
prefixada
Sanção difusa










1) Bilateral: no sentido de que impõe deveres, mas também prevê direitos.
2) Unilateral: no sentido de que impõe deveres. Não há previsão de
direitos.
3) Heterônomo: no sentido de que as normas devem ser cumpridas.
4) Autônomo: no sentido de que as normas podem ser cumpridas, por um
querer espontâneo das pessoas.
5) Exterior: no sentido de que as normas são voltadas para as ações
humanas; atuam diretamente nas ações das pessoas em sociedade.
6) Interior: no sentido de que as normas são voltadas mais para a
consciência das pessoas, como um aconselhamento que pode interferir na
conduta que essa pessoa quer ou pretende ter.
7) Coercível: no sentido de que são normas ditadas pelo Estado (único
detentor do poder de exigir das pessoas o cumprimento de tais normas.).
8) Incoercível: no sentido de que as normas não partem do poder estatal,
de modo que podem ou não ser cumpridas. Notem a correlação dessa
característica com outra característica: a autonomia.
9) Sanção prefixada: são normas que já trazem, de antemão, qual será a
punição para o caso de a pessoa vir a descumprir seus preceitos.
10) Sanção difusa: são normas que não trazem uma punição prefixada; no
momento da violação da norma, é que haverá uma reprovação, uma
censura, ao infrator, por diversas formas (Lembram do olhar dos demais
passageiros para quem não cede o lugar para um idoso no ônibus? Ou o
olhar de reprovação para o advogado com trajes não adequados ao
ambiente forense?).
ATENÇÃO: A bilateralidade e a coercibilidade são características próprias do
Direito. Não estão presentes nos demais instrumentos de controle social.
7. NORMA JURÍDICA
7.1 Importância do estudo da norma jurídica: é a própria substância do direito
objetivo; é o ponto culminante do processo de elaboração do Direito; é o ponto
de partida operacional da dogmática jurídica (lembrem-se: dogmática jurídica
tem a função de sistematizar e descrever a ordem jurídica vigente).
7.2 Papel da norma jurídica: é instrumento de definição da conduta exigida
pelo Estado (como e quando agir?). Para Nader, a norma jurídica atua como uma
fórmula de justiça que satisfaz a sociedade num determinado momento histórico.
7.3 Definição de norma jurídica: norma jurídica é uma estrutura formada por
proposições enunciativas compostas da conduta exigida ou do modelo imposto
de organização da sociedade. Tanto as regras jurídicas como os princípios são
normas jurídicas. Por conta disso, não aconselhamos o uso da palavra norma
como sinônima de regra jurídica.
7.4 Norma jurídica é diferente de lei: lei é uma das formas de expressão das
normas jurídica, assim como os costumes e a jurisprudência são formas
predominantes noutros Estados.
7.5 Instituto jurídico é diferente de ordem jurídica: instituto jurídico é a
reunião de normas jurídicas afins, que rege um tipo de relação social ou de
interesse, e que se identifica pelo objetivo que procura realizar. É uma parte da
ordem jurídica. O instituto se fixa apenas num tipo de relação social ou de
interesse (ex.: adoção; casamento).
Ordem jurídica, por sua vez, é o conjunto de normas jurídicas que dispõe sobre a
generalidade das relações sociais. (ex.: o conjunto de normas de Direito Civil).
7.6 Caracteres: existem diversas categorias de normas jurídicas, mas de uma
forma geral, podemos vislumbrar as seguintes características: AI, BCG
Abstratividade: a norma jurídica regula os casos que ocorrem via de regra, a fim
de atingir o maior número de situações práticas. Daí dizermos que é um “dever
ser”.
Imperatividade: imposição de vontade (não é mero conselho).
Bilateralidade: a norma jurídica apresenta dois lados – direitos e deveres. O
direito é o que chamamos de direito subjetivo e o dever, o dever jurídico (um não
existe sem o outro, numa relação jurídica).
Coercibilidade: possibilidade de se fazer uso da coação. Coação é uma reserva de
força estatal, a serviço do Direito e é formada por dois elementos: psicológico
(intimidação através de penalidades previstas para o caso de violação da norma
jurídica); material (é a força propriamente dita, que é acionada quando o
destinatário da norma jurídica não a cumpre espontaneamente).

COAÇÃO NÃO SE CONFUNDE COM SANÇÃO: coação é reserva de
força estatal; é possibilidade de o Estado utilizar a força a serviço das
instituições jurídicas. Já a sanção é a medida punitiva propriamente dita,
que é prevista para o caso de violação da norma jurídica (é a punição, a
pena).
Generalidade: é o preceito de ordem geral, que obriga ou se refere a todos que se
encontrem na mesma situação jurídica.
7.7 Estrutura da norma jurídica: Para Kelsen, “em determinadas
circunstâncias, um determinado sujeito deve observar tal ou qual conduta; se não
a observa, outro sujeito, o Estado, deve aplicar ao infrator uma sanção.” As
normas jurídicas seriam, assim, formadas por uma norma primária (dado um fato
temporal, deve ser praticada a prestação) e por uma norma secundária (a sanção
para a violação do dever jurídico).
Com esse entendimento, Kelsen dá a entender que a norma jurídica permite ao
destinatário uma escolha entre alternativas: adotar a conduta definida como lícita
ou se sujeitar à sanção prevista para o caso de infração.
Acontece que a norma jurídica é uma estrutura una, não se subdividiria em
norma primária e norma secundária, pois a sanção a integra, faz parte, num
sentido diverso de alternativa ao destinatário. É a sanção uma parte da norma que
se implementa com a infração ao preceituado legalmente, e não porque o
destinatário quis, escolheu ser punido.
7.8 Regra jurídica é diferente de princípio: “Tanto as regras como os
princípios são normas porque ambos dizem o que deve ser. Ambos podem ser
formulados com a ajuda de expressões, como permissão ou proibição.”
(ALEXY). Mas há alguns critérios utilizados pelos estudiosos, a fim de distinguilos. Um desses critérios é o da generalidade: os princípios são normas de um grau
de generalidade alto e as regras, de nível relativamente baixo de gener
Para Alexy, os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na
maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Já
as regras jurídicas são normas jurídicas que só podem ser cumpridas ou não. São
determinações.
7.9 Classificação:
- Normas jurídicas quanto ao sistema a que pertencem: normas jurídicas
nacionais; normas jurídicas estrangeiras; normas jurídicas de Direito Uniforme.
- Normas jurídicas quanto à fonte: normas jurídicas legislativas (são aquelas
escritas e previstas pelas leis); normas jurídicas consuetudinárias (são as normas
jurídicas não escritas, advindas das práticas reiteradas da sociedade; são os
costumes); normas jurídicas jurisprudenciais (são as criadas pelos tribunais). “No
sistema de tradição romano-germânica, ao qual se filia o Direito brasileiro, a
jurisprudência não deve ser considerada como fonte formal do Direito. No
sistema do Common Law, adotado pela Inglaterra e Estados Unidos, os
precedentes judiciais têm força normativa.” (NADER, 1998, p.107).
- Normas jurídicas quanto à hierarquia: normas constitucionais (Constituição
e as Emendas Constitucionais); normas infraconstitucionais (são aquelas abaixo
da Lei Maior de um Estado). No Brasil, temos: lei complementar, lei ordinária,
lei delegada, medida provisória, decretos legislativos, resoluções, decretos e
portarias.
Dentre essas normas infraconstitucionais, também há uma hierarquia, seguindo
essa ordem que colocamos acima.
- Normas jurídicas quanto à vontade (ou à imperatividade, melhor dizendo):
normas jurídicas taxativas ou cogentes (normas de ordem pública que todos estão
adstritos. Ex.: exigências para fazer um testamento); normas jurídicas
dispositivas (normas de conduta que deixam aos destinatários uma margem de
atuação, de escolha para dispor de maneira diversa. Ex.: o testador pode escolher
o testamenteiro, mas se ele não escolhe, a lei determina que será testamenteiro o
cônjuge ou um herdeiro nomeado pelo juiz).
Nessa classificação, notamos a diferenciação entre normas taxativas e normas
dispositivas, no fato de que nestas a manifestação da imperatividade é menos
intensa que nas normas taxativas.
8 TEORIA DO ORDENAMENTO JURÍDICO
8.1 Validade, vigência, vigor, eficácia e efetividade das normas jurídicas.
Revogação. Irretroatividade. Repristinação.
Validade: dizemos que uma norma jurídica é válida quando é elaborado por
quem tem competência legislativa e também se atenta para os critérios formais e
materiais de seu procedimento.
Vigência: é a obrigatoriedade da norma jurídica desde o vigor, até a sua
revogação (expressa ou tácita). É o tempo de validade da norma jurídica, tempo
de sua permanência no ordenamento jurídico.
Vigor: é o momento em que a observância da norma jurídica passa a ser exigida.
Pode ser a partir da publicação, a partir de uma data expressamente estabelecida
pelo legislador, ou, silenciando este, em 45 dias depois de oficialmente publicada
a lei (artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro).
Quando uma norma jurídica não começa a viger da publicação, mas por outra
data (expressamente dita pelo legislador ou em 45 da publicação), há um espaço
de tempo que a doutrina chama de vacatio legis (período de vacância da lei).
Eficácia: dizemos que uma norma jurídica é eficaz quando produz os efeitos a
que se propôs.
Efetividade: dizemos que uma norma jurídica é efetiva quando é atendida por
todos os destinatários, incluindo o legislador.
TODA NORMA JURÍDICA EFICAZ É EFETIVA, PORQUE, PARA
PRODUZIR SEUS EFEITOS, FOI, EVIDENTEMENTE, ATENDIDA,
OBSERVADA, POR SEUS DESTINATÁRIOS.
ALGUNS DOUTRINADORES OPTAM POR NÃO DIFERENCIAR
EFICÁCIA DE EFETIVIDADE, EMPREGANDO UMA OU OUTRA
PALAVRA INDISTINTAMENTE.
Revogação: é a perda da vigência de uma lei. Representa a retirada de uma lei do
ordenamento jurídico de determinado Estado.
- A revogação varia de acordo com o tipo de lei:
Se a lei for de caráter permanente (aquela que não tem uma data pré-determinada
para o FIM da vigência), a revogação se dará quando for editada uma outra lei.
Se a lei for de caráter temporário (aquela na qual o legislador já prevê, de forma
expressa, o FIM da vigência, seja com a estipulação de uma condição – um
evento futuro –, seja com a estipulação de um termo – uma data de término da
lei), a revogação se dará com o implemento do evento ou com o decurso do
tempo.
Resumindo: lei de caráter permanente = revogação por outra lei.
lei de caráter temporário = revogação pelo implemento da condição ou pelo
decurso do tempo.

Obs.: No Brasil, as leis são, em geral, de caráter permanente. Apenas em
situações excepcionais (alguma calamidade, situação emergencial, por
exemplo), o legislador pode optar por editar uma lei de caráter temporário.
- A revogação da lei pode ser expressa ou tácita; total ou parcial:
1. Expressa: quando a lei nova (no caso de lei de efeito permanente)
determina claramente a revogação da lei anterior; ou, no caso de lei de
caráter temporário, pelo fato de a própria lei determinar claramente (por
condição ou por termo) quando será revogada.
Ex.: “Artigo X - Esta lei revoga as disposições em sentido contrário.”;
“Artigo X – Esta lei revoga a Lei n. 8.888, de 8 de agosto de 2001”;
“Artigo Y – Considera-se revogada esta lei a partir do término do período de
seca.”;
“Artigo Y – Considera-se revogada esta lei a partir de 31 de janeiro de 2010.”
1. Tácita: quando a lei nova, sem indicar claramente que revogou a anterior,
trata do mesmo assunto dessa lei anterior.
A revogação tácita só é possível quando estivermos falando de uma lei de efeito
permanente, já que a lei de efeito temporário depende de pré-determinação
expressa do fim da sua vigência.
1. Parcial ou Derrogação: quando a lei nova, de forma expressa ou tácita,
revoga apenas parte da lei anterior.
1. Total ou Ab-rogação: quando a lei nova, de forma expressa ou tácita,
revoga toda a lei anterior.
OBS.: Na revogação parcial e na revogação total estamos considerando uma lei
de efeito permanente. Hipoteticamente, uma lei de efeito temporário pode
revogar total ou parcialmente a legislação anterior sobre a mesma matéria, o que
é muito difícil de ocorrer dada à peculiaridade, à situação excepcional que exige
a edição de uma lei de caráter temporário.
A LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL (DECRETO-LEI N. 4.657,
DE 4 DE SETEMBRO DE 1942) DISPÔS SOBRE VIGÊNCIA, VIGOR E
REVOGAÇÃO DAS LEIS EDITADAS NO ESTADO BRASILEIRO:
“Art. 1º. Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país 45
(quarenta e cinco) dias depois de oficialmente publicada.
§ 1º. Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quando
admitida, se inicia 3 (três) meses depois de oficialmente publicada.
§ 2º. (sem aplicação desde a Constituição de 1946.).
§ 3º. Se, antes de entrar a lei em vigor, ocorrer nova publicação de seu texto,
destinada a correção, o prazo deste artigo e dos parágrafos anteriores
começará a correr da nova publicação.
§ 4º. As correções a texto de lei já em vigor consideram-se lei nova.
Art. 2º. Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que
outra a modifique ou revogue.
§ 1º. A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare,
quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria
de que tratava a lei anterior. → Princípio lex posterior derogat lex priori (lei
posterior revoga lei anterior)
§ 2º. A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já
existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
Princípio da irretroatividade da lei: no Direito brasileiro, a lei é, em geral,
irretroativa; não retroage no tempo para alcançar fatos, acontecimentos passados.
Exceções a esse princípio podem ser vistas no Direito Penal e no Direito
Tributário, quando advém uma lei que beneficiará o criminoso ou o contribuinte,
respectivamente.
Repristinação: é o nome técnico dado para o fenômeno de retorno à vigência de
uma lei já revogada. Ocorre quando uma terceira lei revoga uma segunda lei, e a
primeira, por esta (segunda lei) revogada, recupera a sua vigência.
3ª (Lei n. 6.888, de 2003)
↓ REVOGA
2ª (Lei n. 5.998, de 2001) É a possibilidade de a lei (1ª) voltar ao ordenamento
jurídico, quando a lei que a revogou (2ª) perde sua vigência, ou seja, é
posteriormente revogada (3ª).
↓ REVOGA
1ª (Lei n. 5.000, de 2000)
No Dicionário Jurídico, repristinação é o “instituto pelo qual se restabelece a
vigência de uma lei revogada pela revogação da lei que a tinha revogado. Ex: a
lei "A" é revogada pela lei "B"; advém a lei "C", que revoga a lei "B" e diz que a
lei "A" volta a viger. Deve haver dispositivo expresso, não existindo
repristinação automática (nem a CF pode repristinar automaticamente uma lei)”.
(In: http://www.direitonet.com.br/dicionario_juridico/x/52/44/524/Repristinação)
Nas palavras de Nader (1998, p.290), “esse fenômeno de retorno à vigência,
tecnicamente designado por repristinação, é condenado do ponto de vista teórico
e por nosso sistema.”
Para seguirmos esse entendimento de Nader, devemos dizer que o Direito
brasileiro condena, não admite, em regra, o efeito repristinatório da lei, ou seja, a
repristinação. É mais adequado dizermos “em regra”, porque ainda permanece a
redação do artigo 2º, § 3º, da Lei de Introdução ao Código Civil, dando indícios
de que se permite (embora não seja praticada), excepcionalmente, a repristinação
da lei no Direito brasileiro:
“..............................................................................................................................
§ 3º. Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei
revogadora perdido a vigência.” (Grifamos).
Então, em geral, segue-se o princípio da não-repristinação da lei, que pode ser
assim definido: “Quando uma lei revogadora perde a sua vigência, a lei anterior,
por ela revogada, não recupera a sua validade.” (NADER, 1998, p.290).
RESUMINDO: Princípio da Irretroatividade (regra); Retroatividade (exceção).
Princípio da Não-Repristinação (regra); Repristinação ou efeito repristinatório
(exceção).
8.2 Fontes do ordenamento jurídico
Definição: fonte (do latim, fons, fontis)significa nascente d’agua.
Metaforicamente, a Ciência do Direito se vale dessa palavra para indicar a
origem do Direito, o nascimento da norma jurídica e seu aparecimento no
ordenamento jurídico.
Classificação: Cada autor segue uma determinada classificação, com
terminologia e expressões próprias para indicar as fontes do Direito.
Paulo Nader, por exemplo, divide em três as fontes do Direito: fontes históricas,
fontes materiais e fontes formais.
Aqui, adotaremos a classificação que distingue fontes materiais e fontes
formais.
Materiais são aquelas fontes do Direito que indicam a causa produtora do Direito,
o que favorece a formação do Direito. Em outras palavras, são os fatos sociais,
que, por sua vez, são condicionados pelos mais diversos fatores, como a Moral, a
Religião, a Economia, etc.
OBS.: Alguns autores colocam tais fatores condicionantes dos fatos sociais como
sendo as fontes materiais, o que não é, de certo modo, incorreto.
Formais são as fontes do Direito que o exteriorizam; são as formas que podemos
visualizar o Direito de determinado Estado. As principais fontes formais do
Direito são as leis e os costumes.
- Lei é a fonte formal do Direito, pela qual o Estado (pelo Poder Legislativo)
estabelece as normas de conduta e organização da sociedade. “Lei é a forma
moderna de produção do Direito Positivo” (NADER, 1998, p.168). No Brasil, a
lei é a fonte do Direito por excelência.
- Costumes são práticas sociais reiteradas que se assumem como fontes formais
do Direito quando são reconhecidas, pelo Estado, para a conduta e organização
da sociedade.
OBS.: Alguns autores colocam a doutrina, a jurisprudência e o negócio jurídico
como outras fontes formais do Direito. Outros os classificam como resultados da
interpretação do Direito vigente brasileiro (ver a propósito, a manifestação de
Nader sobre a jurisprudência). Para mim, poderiam ser até consideradas fontes
formais, mas indiretas, no sentido de que exteriorizam o Direito apenas para
interpretar e/ou influenciar as fontes formais diretas (leis e costumes). Nader, por
exemplo, situa a doutrina como fonte indireta do Direito e o negócio jurídico
como fonte especial de elaboração de normas jurídicas, ao lado das leis e dos
costumes, ou seja, como fonte formal direta.
Nesse contexto, o que fica claro é que há uma divergência na doutrina sobre o
assunto (jurisprudência, doutrina, negócio jurídico são fontes ou não?). De todo
modo, deixo registrado o significado de cada um desses termos:
- Jurisprudência: são os precedentes judiciais; é o conjunto de decisões
uniformes proferidas pelos Tribunais, sobre uma determinada matéria jurídica.
- Doutrina: “[...] estudos e teorias, desenvolvidos pelos juristas, com o objetivo
de sistematizar e interpretar as normas vigentes e de conceber novos institutos
jurídicos, reclamados pelo momento histórico. É a communis opinio doctorum.
Esse acervo de conhecimentos é resultado da experiência de juristas, mestres de
Jurisprudência e dos juízes. Os estudos doutrinários localizam-se nos tratados,
monografias, sentenças prolatadas pelos mais sábios juízes.” (NADER, 1998,
p.211)
- Negócio jurídico: é o ato jurídico lícito que se aperfeiçoa com a simples
declaração da vontade, sendo os efeitos daí advindos recepcionados, tratados,
pelo direito objetivo. Significa dizer: não é qualquer declaração de vontade que
faz um determinado ato se tornar um negócio jurídico. É necessário que seja um
ato lícito expressado por um “querer espontâneo” dos envolvidos. E mais. Que
seus efeitos sejam definidos por estes envolvidos, mas tratados e permitidos pela
ordem jurídica vigente. É, em síntese, um ato jurídico lícito, voluntário e
intencional, que se destina a influir nas relações amparadas pelo Direito, por
meio da manifestação da vontada.
Exemplo citado por Nader, que não se enquadraria como um negócio jurídico,
seria uma “declaração de amizade” (NADER, 1998, p.387). Isso porque os
efeitos advindos dessa declaração de vontade não são previstos pela ordem
jurídica vigente. São efeitos irrelevantes para o Direito.
Já o testamento, a emancipação de um filho, a compra e venda, são negócios
jurídicos, pois os efeitos são relevantes para o Direito e detidamente tratados por
ele.
Obs.: Em outra disciplina, vocês verão que o negócio jurídico é gênero do qual
são espécies os contratos e os negócios jurídicos em sentido restrito/estrito.
8.3 A Interpretação do Direito
- Etimologia da palavra “interpretação”: do grego, hermeneia, e do latim,
interpretare, interpretar é explicar o sentido de alguma coisa, de alguma visão ou
oráculo.
- Definição semântica da palavra “interpretação”: interpretar é o ato de explicar o
sentido de algo; é a revelação do significado de alguma atitude ou forma de
expressão (verbal, artística).
- Definição de interpretação: é o processo de cunho prático e racional realizado
pelo trabalho de decodificação humana (o intérprete).
- Finalidade da interpretação do Direito: 1. revelar a finalidade, o próprio sentido
do Direito; 2. delimitar o alcance da norma jurídica.
- O brocardo jurídico in claris cessat interpretatio (na clareza, cessa a
interpretação) não tem mais valor científico na atualidade, pois já é unânime
entre os estudiosos do Direito que a norma jurídica (obscura, ambígua,
defeituosa, e, até, clara) está sujeita à interpretação. Aliás, a própria averiguação
da clareza já é uma interpretação. Noutras palavras, para o operador do Direito
afirmar que uma norma jurídica é clara, precisou, antes, realizar um processo
interpretativo.
Escolas
Para que o pensamento jurídico evoluísse, a ponto de se constatar a importância
da interpretação do Direito, dos métodos de interpretação, foram necessários
vários estudos sobre o tema. Surgiram, então – principalmente depois da
Revolução Francesa, com o Código Civil Napoleônico e os positivistas –,
“escolas” formadas por estudiosos que tentavam explicar o processo
interpretativo.
A primeira Escola foi a Escola da Exegese. De acordo com seus seguidores, o
Código Civil Napoleônico já traria a regulação de todos os fatos sociais, bastando
a interpretação para melhor solucionar o conflito surgido na prática, ou seja, para
melhor encaixar o caso concreto à norma jurídica. A lei é a única fonte do
Direito; é o próprio Direito.
No processo interpretativo, pregavam que devia ser seguida uma seqüência de
linhas interpretativas: 1º) gramatical; 2º ) lógica: 3º) sistemática.
Escola Histórica. Ao se constatar, na prática, que a lei não dá conta de tudo, a
Escola Histórica, principalmente, Saleilles, buscou uma outra direção para o
processo interpretativo. Segundo esse autor, era necessária, ao lado dos métodos
indicados pela Escola da Exegese, a interpretação histórico-evolutiva.
A lei depois de editada, desprende-se do legislador, de modo que é possível
interpreta-la, fazendo o resgate do cenário histórico que motivou sua “entrada”
no ordenamento jurídico, como, também, buscando a intenção do legislador, se,
ao tempo da elaboração da lei, deparasse com certas situações da vida social que
lhe foram posteriores.
Não é interpretação criadora, à margem da lei ou que ignore a lei. É uma
interpretação que estende a lei para adequá-la à realidade social. Passa, portanto,
pelo âmbito da lei.
Escola da Livre Pesquisa (séc. XIX, Gény, França). Como se concluiu, depois,
que a elasticidade da lei, a que se refere a Escola Histórica, tem um limite, uma
nova Escola (a Escola da Livre Pesquisa), e, em especial, Gény, buscou uma
outra resposta acerca da interpretação do Direito.
Para ele, a lei só tem uma intenção (a originária, ou seja, a que motivou a
“entrada” da lei no ordenamento jurídico) que deve ser respeitada. Se essa
intenção já não corresponde ao real, cabe ao juiz procurar outros meios
(Economia, por exemplo), para suprir a lacuna gerada entre a intenção originária
e a realidade.
O magistrado deve se voltar ao trabalho de pesquisa para alcançar a solução para
o caso concreto. Certo é que, mesmo assim, deve ficar atento ao positivado, ou
seja, há uma liberdade de pesquisa, desde que a leitura, a interpretação alcançada
esteja dentro do que prevê o ordenamento jurídico.
Escola do Direito Livre. Por uma compreensão sociológica do Direito – a
exigência de um Direito Justo –, a Escola do Direito Livre prega que o juiz pode
se valer da eqüidade não só diante de uma lacuna, mas toda vez que lhe parecer,
cientificamente, inexistir uma lei apropriada a um caso.
Compreensão atual do problema hermenêutico. - Preocupação compreensiva,
no sentido de situar o artigo na lei e em todo o ordenamento jurídico. –
Valorização do elemento teleológico ou finalístico, na busca da finalidade social
da lei no seu todo (interpretação teleológica). – Entendimento de que nenhuma
interpretação, sozinha, diz o que o Direito significa. – Tendência atual de
valorização da interpretação histórico-evolutiva.
Interpretação gramatical ou filológica: revelação do sentido das palavras
empregadas no texto, bem como da sintaxe e pontuação. É o significado
verbal que se deve extrair, através do emprego de regras gramaticais, de
uma expressão jurídica ou de um dispositivo de lei.
Interpretação lógico-sistemática: depois da análise da estrutura interna de
uma lei ou de um dispositivo de lei, a interpretação lógico-sistemática é
empregada. Significa a contextualização dessa lei ou dispositivo no contexto
normativo. Vale dizer, o intérprete deve ficar atento ao contexto mais amplo
em que está inserida a lei/dispositivo.
Interpretação histórico-evolutiva: resgate do cenário histórico que motivou
a “entrada” da lei na ordem jurídica, e, ainda, da intenção do legislador,
caso estivesse frente às situações da vida social posteriores à edição daquela
lei.
Interpretação teleológica: busca-se a finalidade social da lei no seu todo, ou
seja, qual é o fim a que ela se destina no ordenamento jurídico.
8.4 As Lacunas do Direito e sua Integração. As Antinomias Jurídicas
O sistema jurídico ou ordenamento jurídico é complexo, unitário, dinâmico,
e, em tese, deve ser, também, coerente e completo. Ocorre que essas duas
últimas características acabam por serem objetivos, metas, a serem
alcançados, já que, na prática, os estudiosos do Direito perceberam ser
impossível um Direito totalmente coerente e completo.
Há situações concretas que podem fugir de um regramento jurídico (lacuna
do Direito), ou, então, existirem duas normas jurídicas que podem ser
aplicadas num caso concreto e que dependem de uma solução (antinomia do
Direito).
Aplicação: “imposição de uma diretriz como decorrência de competência legal”
de um órgão ou autoridade.
Antes de aplicar uma lei, é necessário interpretar o Direito, de modo que aplicar é
um exercício condicionado a uma prévia escolha valorativa entre várias
interpretações possíveis.
Integração: é o preenchimento dos vazios de uma lei, com o propósito de se dar
uma resposta jurídica a quem esteja desamparado por uma lei expressa.
- Os métodos de integração:
*Analogia é processo de integração do Direito, por meio do qual se estende a um
caso semelhante, uma resposta dada a outro caso. Difere da interpretação
extensiva, pois esta é o momento de reconhecimento de que existe norma que
pode ser estendida ao caso, enquanto a analogia é o momento de lacuna, ou seja,
de reconhecimento, pelo juiz, de que inexiste norma para o caso.
*Costumes. Definição já vista quando falamos das fontes do Direito.
*Princípios gerais do Direito são enunciações normativas de valor genérico que
condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, quer para a sua
aplicação, quer para a elaboração de novas normas jurídicas. Os princípios são a
sustentação do Direito: guiam, fundamentam e até limitam as normas jurídicas
advindas com as leis.
Finalidade: 1. influenciam a elaboração das leis. 2. auxiliam no processo de
integração do Direito.
Deve-se entender “gerais”, no sentido de princípios direcionadores do Direito
como um todo, mas, também, aqueles princípios específicos de um ramo jurídico.
Tomando uma classificação geral sobre princípios, temos que os princípios gerais
do direito são princípios monovalentes (aplicados a apenas uma área do
conhecimento). Há ainda duas outras categorias nessa classificação geral: os
princípios onivalentes (válidos em todas as áreas científicas. Ex.: princípio da
razão suficiente) e os princípios plurivalentes (aplicados em vários campos do
conhecimento. Ex.: princípio da causalidade).
Definição semântica dos princípios gerais do direito: - princípios (no sentido de
origem); - gerais (no sentido de comum, de genérico; algo que não se volta
apenas para um determinado ponto ou parte); - direito (no sentido de que estão
atrelados à juridicidade).
Natureza jurídica dos princípios gerais do direito: Para os positivistas, os
princípios gerais do direito são os consagrados pelo ordenamento jurídico e, para
aplicá-los, o juiz deve ater-se, objetivamente, ao Direito vigente, sem qualquer
subjetivismo. Já os jusnaturalistas dizem que os princípios gerais do direito estão
acima do Direito Positivo; são eternos, imutáveis; universais. São os princípios
do Direito Natural.
*Eqüidade é o processo, por meio do qual as conclusões de uma regra
genericamente prevista no ordenamento jurídico são amenizadas com o propósito
de ajustá-la às particularidades do caso concreto. No caso de uma lacuna, a
eqüidade assume o papel de processo de integração do Direito, através do qual o
Juiz busca, por critérios de justiça, alcançar uma solução adequada à situação
fática que, positivamente, não tem uma solução prevista.
Antinomias jurídicas: é o conflito entre duas normas jurídicas, válidas e
emanadas de autoridades competentes num mesmo âmbito normativo,
necessitando de solução.
* Elementos: 1. a incompatibilidade entre as normas jurídicas (proibição X
permissão; ação X omissão); 2. as normas jurídicas são válidas e emanadas de
autoridades competentes num mesmo âmbito normativo; 3. a necessidade de
solução.
* Classificação:
a) Aparente/ Real
Aparente é a antinomia que pode ser solucionada via interpretação, com o auxílio
de critérios elaborados para tanto.
Real é a antinomia que não pode ser solucionada com o auxílio de algum critério
previamente definido; é uma situação na qual inexiste critério já definido para
solucionar o conflito de normas jurídicas. Dois são os caminhos para buscar a
solução de uma antinomia real: 1. Pelo Legislativo, com a edição de uma terceira
norma jurídica que diga qual das duas conflitantes deverá ser aplicada. 2. Pelo
Judiciário, com a aplicação dos artigos 4º e 5º da Lei de Introdução ao Código
Civil; o juiz pode adotar, para decidir um caso concreto, uma das duas normas
jurídicas conflitantes sempre em atenção ao princípio da justiça.
b) Própria/ Imprópria
Própria é a antinomia que ocorre por motivos formais (uma norma permite, a
outra proíbe, por exemplo).
Imprópria é a antinomia ocorrida pelo conteúdo material das normas jurídicas.
Podem ser, segundo Ferraz Júnior: antinomia de princípios (as normas protegem
valores opostos); antinomia de valoração (pune um delito grave com uma pena
leve, por exemplo); antinomia teleológica (os fins de uma norma jurídica
conflitam com os meios propostos por outra norma).
É importante deixar claro que o conflito impróprio é mais entre o comando
estabelecido pelas normas e a consciência do aplicador. Não há necessidade de
aplicar qualquer critério para resolver esse tipo de antinomia, pois é certo que tal
aplicador tem de agir conforme as normas, interpretando-as, obviamente, mas
chegando à uma conclusão do caso concreto, aplicando alguma norma, ainda que
não concorde com ela por motivo, juízo particular de valor.
c) De Direito Interno/De Direito Internacional/De Direito Interno-Internacional
d) Total-Total/Total-Parcial/Parcial-Parcial
e) De 1º Grau/De 2º Grau
De 1º Grau é o conflito de normas jurídicas que envolve apenas um dos critérios
de solução já definidos previamente para a solução de conflitos.
De 2º Grau é o conflito de normas jurídicas que envolve dois dos critérios de
solução, ou seja, à primeira vista parece existir a possibilidade de aplicar tanto
um, como outro critério. Vale dizer, há um conflito entre os próprios critérios
postos para a solução do conflito de normas jurídicas.
* Critérios de solução de antinomias jurídicas:
- Hierárquico: lex superior derogat lex inferiori (lei superior prevalece sobre
inferior). É aplicável no caso de uma antinomia própria, de 1º grau, e aparente,
que envolva a hierarquia de duas normas jurídicas sobre um caso concreto.
- Especialidade: lex specialis derogat lex generalis (lei especial prevalece sobre
geral). É aplicável no caso de uma antinomia própria, de 1º grau, e aparente, que
envolva a especialidade, especificidade, de duas normas jurídicas sobre um caso
concreto.
- Cronológico: lex posterior derogat lex priori (lei posterior prevalece sobre
anterior). É aplicável no caso de uma antinomia própria, de 1º grau, e aparente,
que envolva a questão temporal de duas normas jurídicas sobre um caso
concreto.
- Hierárquico X Cronológico: lei superior anterior conflitando com lei inferior
posterior, prevalece o critério hierárquico. É a solução aplicável quando for caso
de uma antinomia própria, de 2º grau, e aparente, que possibilita, num primeiro
momento, a aplicação de duas soluções ao conflito entre normas jurídicas.
- Especialidade X Cronológico: lei especial anterior conflitando com lei geral
posterior, prevalece o critério da especialidade. É a solução aplicável quando for
o caso de uma antinomia própria, de 2º grau, e aparente, que possibilita, num
primeiro momento, a aplicação de duas soluções ao conflito entre normas
jurídicas.
- Especialidade X Hierárquico: lei geral superior conflitando com lei especial
inferior, não há um critério previamente definido pela doutrina, ou mesmo, pela
legislação. É o único caso de antinomia própria, de 2º grau, e real. Teoricamente,
prevalece o hierárquico. Mas na prática, pode ser justificada a opção pelo critério
da especialidade se embasado no princípio da justiça. O juiz, frente ao caso
concreto, é quem define qual critério adotará, seguindo apenas o que estabelecem
os artigos 4º e 5º da Lei de Introdução ao Código Civil.
8.5 Relações entre ordenamentos estatais
Há, na ciência jurídica, um ramo direcionado ao estudo comparativo de
ordenamentos jurídicos de diferentes Estados, com o propósito de revelar as
novas conquistas em determinados institutos jurídicos e que podem servir de
orientação ao legislador de outro Estado. Esse ramo é o Direito Comparado.
Seu objeto é, então, a comparação de ordenamentos jurídicos estatais, e seu
objetivo, revelar as conquistas alcançadas em determinadas instituições jurídicas.
Para tanto, é necessário que o pesquisador atente para as leis/códigos do Estado
para o qual se direciona a pesquisa, os fatos culturais e políticos que serviram de
suporte ao ordenamento jurídico daquele Estado; buscando, também, selecionar
as legislações mais avançadas no ramo de interesse para, assim, obter resultados
positivos no estudo realizado.
Importante é o alerta de Nader sobre o estudo comparado de ordenamentos
estatais: o aproveitamento, por um Estado, da experiência jurídica de outro é
possível, desde que o novo conjunto normativo adapte à realidade social a que se
destina.
Apesar de cada Estado possuir uma ordem jurídica própria, pode
apresentar elementos afins que permite seu agrupamento com outros,
formando as chamadas famílias ou sistemas jurídicos.
São famílias ou sistemas jurídicos:
1. Família romano-germânica: é a família formada por todos os
ordenamentos estatais que sofrem forte influência do Direito romano e do
seu estudo. A grande característica dessa família, é que a regra jurídica é
genérica, preceituada pelo legislador, na maior parte, por lei escrita, e
deve ser aplicada ao caso concreto pelo juiz. Por isso se diz que é um
sistema que funciona de “cima para baixo”. São exemplos o Direito de
vários Estados europeus, de toda a América Latina, e, de modo especial, o
Direito brasileiro.
2. Família da common law: é a família formada por uma base
jurisprudencial, por uma base de decisões judiciais de casos anteriores (os
precedentes). Nessa família, os costumes têm uma forte influência. É o
sistema originado do Direito britânico e funciona de “baixo para cima”, ou
seja, as decisões judiciais anteriores formam uma espécie de regra geral
que, futuramente, pode ser aplicada pelo juiz a um caso concreto
semelhante.
3. Família dos direitos socialistas: é a família influenciada pela noção de
Estado socialista (maior intervenção social do Estado, se comparado com
o Estado de vertente liberal). Desde a fragmentação da URSS, são restritos
os ordenamentos jurídicos pertencentes a essa família, na atualidade. Do
ponto de vista formal, assemelha-se ao direito adotado na família romanogermânica.
4. Outras famílias: o Direito muçulmano; os Direitos do Extremo Oriente.
Para maiores estudos a respeito desse tópico, sugiro o livro “Os Grandes
Sistemas do Direito Contemporâneo”, de René David, e o texto encontrado no
endereço eletrônico <http://www.wikipedia.org/wiki/Direito_comparado>
8.6 – Dos fatos e atos jurídicos
8.6.1 – Noção de relação jurídica
Toda ciência implica relações. Com a Ciência do Direito não seria diferente. Era
preciso, também, delimitar o campo de suas relações. A propósito, foi Savigny,
no século XIX, quem primeiro conceituou o que se entenderia por relação
jurídica.
Certo é que fatos e atos humanos podem se apresentar como relações sociais e,
mais especificamente, como relações jurídicas. Há uma série de laços que
prendem os serem humanos entre si, mas nem todos são de natureza jurídica.
Podem ter fins morais, religiosos, econômicos, estéticos, artísticos, etc.
Assim, uma primeira conclusão que podemos tirar é que a relação jurídica é uma
espécie de relação social.
Contudo, saber que uma relação jurídica é uma espécie de relação social, por si,
não é suficiente para nos auxiliar no seu reconhecimento. Para tanto, existem
dois enfoques: 1. TRADICIONAL (baseado numa concepção individualista do
Direito, as relações jurídicas são relações sociais postas por si mesmas, sendo
apenas reconhecidas pelo Estado para o fim de protegê-las); 2. ATUAL (baseado
numa concepção operacional do Direito, não atribuindo ao Estado a mera função
de reconhecer e amparar algo já estabelecido no jogo dos interesses individuais.
O Estado vai além. Estabelece, também, modelos jurídicos que condicionam e
orientam o constituir-se das relações jurídicas).
Seja qual foi o enfoque a ser seguido, o que fica claro para nós é que inexiste
relação jurídica se inexiste um fato correspondente às normas jurídicas.

Fundamento básico, segundo Reale: os fatos e as relações sociais só têm
significado jurídico se forem inseridos numa relação normativa. Significa
dizer: a norma jurídica nasce do fato social e ao fato social se destina. Só
enquanto as relações sociais passam sob a luz irradiada das normas
jurídicas é que são relações jurídicas.

Definição: relação jurídica é a realidade concreta (fruto de uma relação
entre seres humanos) que se adapta ao modelo normativo instaurado pelo
legislador.

Requisitos: 1. intersubjetividade (vínculo entre duas ou mais pessoas); 2.
correspondência normativa (que o vínculo entre pessoas corresponda a
uma hipótese normativa, de tal modo que daí derivem conseqüências
obrigatórias). Não há relação jurídica sem norma jurídica, implícita ou
explícita, que como tal a qualifique (REALE).
8.6.2 – Elementos da relação jurídica
1. Sujeito ativo: titular ou beneficiário principal da relação jurídica.
2. Sujeito passivo: devedor da prestação principal (no sentido de que nada
impede de o devedor ter o direito de exigir do sujeito ativo algo como
prestação complementar).
3. Vínculo de atributividade: vínculo que une uma pessoa a outra, de modo
recíproco ou complementar, mas sempre de maneira objetiva.
4. Objeto: razão de ser do vínculo constituído entre sujeito ativo e sujeito
passivo. Pode ser uma pessoa (direito pessoal), coisa (direito real),
prestação (direito obrigacional).
Obs.: alguns autores não aceitam que uma pessoa possa ser um objeto numa
relação jurídica.
8.6.3 – Espécies de relação jurídica
De acordo com a norma aplicável ao caso e a natureza do fato social em si,
juntamente com o fim que se tem em vista com a prática do ato, podemos ter
várias espécies de relação jurídicas. Vejamos:

Quanto ao tipo do fato social e do fim almejado: - relações jurídicas de
direito público (subordinação); - relações jurídicas de direito privado
(coordenação).

Quanto ao objeto: - pessoais; - reais; - obrigacionais.
Dentre as formas de relações obrigacionais, destaco as de tipo negocial, ou,
simplesmente, os negócios jurídicos (- declaração de vontade que instaura uma
situação jurídica capaz de produzir efeitos externos ao seu autor; subordinação
dos efeitos dessa situação às cláusulas e condições estabelecidas na declaração
por ele feita).
Definição de negócio jurídico: é o ato jurídico pelo qual se estabelece uma
relação jurídica cujos efeitos se subordinam à vontade declarada, por uma ou
mais pessoas, nos limites consentidos legalmente.
Produzem efeitos porque o agente (sujeito ativo) assim deseja.
* Tipos de negócio jurídico:
- Unilaterais: pressupõem vontade de uma pessoa (ex.: doação).
- Bilaterais ou sinalagmáticos: é o encontro de duas ou mais vontades
exteriorizadas.
- Solenes: a lei exige, para a validade do negócio jurídico, uma determinada
formalidade. (ex.: testamento).
- Não solenes: desprovido de formalidade legal para a sua validade.
- Mortis causa: seus efeitos só ocorrerão após a morte do agente (ex.:
testamento).
- Inter vivos: seus efeitos se operam em vida dos manifestantes.
- A título gratuito: não é exigida uma contraprestação (ex.: doação).
- A título oneroso: é exigida uma contraprestação (ex.: locação).
Obs.: Nos direitos obrigacionais, o objeto da relação é sempre uma prestação, ou
seja, um ato a que se obriga o sujeito passivo, e não a coisa necessária à execução
do pactuado entre as partes. Ex.: no contrato de mútuo, o objeto imediato da
relação jurídica é o empréstimo e o respectivo pagamento a que se compromete o
sujeito passivo. Já a moeda é o objeto mediato (é só a coisa necessária para a
execução do contrato).
Nos direitos reais, a relação tem como objeto imediato uma coisa. Ex.: no
exercício do direito de propriedade, quando o proprietário age na defesa e
manutenção de tal direito contra todo aquele que tentar ou quiser violá-lo.
8.7 Sujeitos de Direito
As pessoas, às quais as normas jurídicas se destinam, chamam-se sujeitos de
direito, e podem ser pessoas naturais/físicas, ou pessoas jurídicas.
TODO SUJEITO DE DIREITO É UMA PESSOA.
Sujeito de direito é, então, o titular de direitos e deveres na relação jurídica.
Pessoa é palavra que assume diversas conotações. Do ponto de vista religioso, é
pessoa aquele ser dotado de alma. Do ponto de vista biológico, é todo ser
humano. Do ponto de vista jurídico, pessoa é a qualificação do indivíduo (ser
humano) como ser social, entendendo-se, algum tempo depois, também os entes
coletivos formados para atingir determinada finalidade. Significa dizer: é o ser,
individual ou coletivo, dotado de direitos e deveres na ordem jurídica.
Personalidade jurídica é o atributo essencial do ser humano que a ordem jurídica
também conferiu às pessoas jurídicas. Significa a aptidão para possuir direitos e
deveres que são reconhecidos pela ordem jurídica.
A personalidade jurídica não é uma realidade ou fato, mas uma criação jurídica.
Tanto é assim que no passado animais poderiam ser parte em ações judiciais ou
receber honrarias. Já os escravos não possuíam personalidade jurídica.
Obs.: Quando se protege um animal ou uma árvore, não significa que esses têm
direitos. É apenas um indicativo de que são respeitados valores de “bons
sentimentos” próprios dos homens mais civilizados (REALE).
PESSOA NATURAL



Pessoa natural ou física: ser individualmente considerado como sujeito de
direito. Entenda-se por ser, nesse caso, como o ser humano.
Início da personalidade jurídica da pessoa natural ou física: duas correntes
– uma, que entende o início como sendo a concepção; outra, entendendo
que o início se dá com o nascimento com vida (vida é, para o Direito, o
momento da respiração).
Pelo artigo 2º do CC/2002, o Direito brasileiro segue a segunda corrente,
mas resguarda os interesses do nascituro (o feto, para a Biologia).




Capacidade de direito é o mesmo que personalidade jurídica. É a
possibilidade de ter direitos e deveres na ordem jurídica. Basta ser pessoa,
segundo o artigo 1º do CC/2002, para ter personalidade jurídica e
capacidade de direito.
Capacidade de fato: é a aptidão legal para o exercício de direitos e
deveres, por ato próprio. Se a pessoa não detém essa capacidade de fato, é
chamada de incapaz (absoluto ou relativamente). A incapacidade jurídica
é um reflexo de uma incapacidade natural ou fática.
A pessoa que reúne a capacidade de direito e a capacidade de fato é
chamada de pessoa plenamente capaz, que, em regra, dá-se com a
maioridade civil, ou seja, quando a pessoa atinge os dezoito anos de idade
(artigo 5º do CC/2002).
Absolutamente incapaz é a total falta de aptidão, pela idade ou por motivo
de doença, para exercer, pessoalmente, os atos da vida civil. Quando
precisa participar de algum ato ou negócio jurídico, depende da
representação por seus pais, tutores ou curadores (representantes legais),
que substituirão a sua vontade, levando em consideração, obviamente, a
conveniência da realização de tal ato ou negócio jurídico. Há, ainda,
direitos que nem por representação podem ser exercidos pelo
absolutamente incapaz, pois são direitos personalíssimos (só exercidos
pela própria pessoa. Ex.: casamento). Dispõe o artigo 3º do CC/2002:
Artigo 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida
civil:
I – os menores de 16 (dezesseis) anos;
II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário
discernimento para a prática desses atos;
III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.

Relativamente incapaz é aquela pessoa que, de acordo com o legislador,
não se encontra privada de toda a vontade. Necessita, apenas, de ser
acompanhada, assistida, na prática de certos (e não todos) atos da vida
civil, ou ao modo de exercê-los. Quem exterioriza a vontade é o
relativamente incapaz, mas sob a fiscalização daquele que o assiste. De
acordo com o artigo 4º do CC/2002, são relativamente incapazes a certos
atos, ou à maneira de os exercer:
Artigo 4º ..............................................................................
I – os maiores de 16 (dezesseis) e menores de 18 (dezoito) anos;
II – os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental,
tenham o discernimento reduzido;
III – os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
IV – os pródigos.
Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.
OS ATOS JURÍDICOS PRATICADOS PESSOALMENTE POR
ABSOLUTAMENTE INCAPAZ SÃO ATOS NULOS (ARTIGO 166, I, DO
CC/2002), NÃO PODENDO SER CONFIRMADOS, NEM CONVALIDADOS
PELO DECURSO DO TEMPO (ARTIGO 169 DO CC/2002). JÁ OS
PRATICADOS POR RELATIVAMENTE INCAPAZ, SEM A EXIGIDA
ASSISTÊNCIA, SÃO ANULÁVEIS (ARTIGO 171, I, DO CC/2002), OU SEJA,
PODEM SER CONFIRMADOS PELAS PARTES, SALVO DIREITO DE
TERCEIRO (ARTIGO 172 DO CC/2002).
OBS.: Para que o menor relativamente incapaz se torne capaz antes da
maioridade civil, exige-se a emancipação. Para que o maior (já alcançou os 18
anos de idade) seja considerado incapaz (absoluta ou relativamente), é necessária
a interdição.
PESSOA JURÍDICA
Com o tempo, sociedade exigiu a criação de associações de pessoas que
pudessem atender, de modo adequado e suficiente, às necessidades humanas que,
cada vez, tornavam-se mais diversificadas e complexas. Assim, surgiram as
chamadas pessoas jurídicas como sendo o ente coletivamente considerado que é
organizado pela união de pessoas naturais, para atingir um objetivo comum.
Apresentam autonomia patrimonial, ou seja, patrimônio é diverso do patrimônio
daqueles que as instituíram.
Há várias teorias que tentam explicar a pessoa jurídica, a exemplo da teoria da
instituição, que ressalta a distinção do ente coletivo da figura de seus
instituidores.
Classificação: pelo artigo 40 do CC/2002, as pessoas jurídicas se dividem em
pessoas jurídicas de direito público, interno e externo, e as de direito privado.
São pessoas jurídicas de direito público interno (artigo 41, CC/2002): - a União; os Estados-membros; - o Distrito Federal; - os Territórios; - os Municípios; - as
autarquias; - as demais entidades de caráter público criadas por lei.
São pessoas jurídicas de direito público externo (artigo 42, CC/2002): - os
Estados estrangeiros; - todas as pessoas que forem regidas pelo direito
internacional público (ex.: Santa Sé; os organismos internacionais, como a ONU,
etc.).
São pessoas jurídicas de direito privado (artigo 44, CC/2002): - as associações; as sociedades (empresárias – em regra, as sociedades que tem por objeto o
exercício de atividade própria do empresário sujeito a registro, conforme artigo
967 e artigo 982 do CC/2002 – e simples, as demais sociedades que não se
dedicam à atividade própria do empresário, ou seja, ao exercício profissional de
atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de
serviços que constituem elemento da empresa); - as fundações.

Início da personalidade jurídica: a pessoa jurídica “nasce” com o registro
de seus atos constitutivos junto ao órgão competente (Junta Comercial;
Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas, etc.). No caso de pessoas
jurídicas de direito público interno que dependam de criação legal (artigo
41, V, CC/2002), antes do registro, é necessária aquela formalidade.
OBS: no Estado brasileiro, adota-se a chamada descentralização política, ou seja,
há pessoas jurídicas de direito público interno que concorrem com competências
políticas, de forma soberana (União) ou autônoma (Estados-membros, Distrito
Federal e Municípios), para ditar leis e governar. Essas pessoas são os chamados
entes federativos e possuem personalidade jurídica própria, sem subordinação
entre eles. Há, apenas, algumas competências reservadas constitucionalmente à
União.
Na organização administrativa brasileira, formam a chamada Administração
direta, enquanto as autarquias, as fundações e as empresas estatais (sociedades de
economia mista e empresas públicas) formam a chamada Administração indireta.
Autarquia é uma pessoa jurídica de direito público interno, com natureza
administrativa e criação por lei específica do Chefe do Poder Executivo,
direcionando-se para a execução das atividades antes desempenhadas pelo ente
estatal que as criou. Ex.: o Banco Central do Brasil e o Instituto Nacional do
Seguro Social – INSS são exemplos de autarquias federais; a Universidade do
Estado de Minas Gerais – UEMG e a Loteria do Estado de Minas Gerais são
exemplos de autarquias estaduais;
LEI DELEGADA Nº 88, DE 29 DE JANEIRO DE 2003
Dispõe sobre a estrutura orgânica básica da Loteria do Estado de Minas Gerais e
dá outras providências..
O Governador do Estado, no uso da atribuição que lhe foi conferida pela
Resolução nº 5.210, de 12 de dezembro de 2002, da Assembléia Legislativa do
Estado de Minas Gerais, decreta a seguinte Lei:
CAPÍTULO I
Disposições Preliminares
Art. 1º - A autarquia Loteria do Estado de Minas Gerais, de que trata a alínea “b”
do inciso IX do artigo 10 da Lei Delegada nº 49, de 2 de janeiro de 2003, tem
autonomia administrativa e financeira, personalidade jurídica de direito público,
prazo de duração indeterminado, sede e foro na Capital do Estado, vincula- se à
Secretaria de Estado de Governo e tem sua estrutura básica definida nesta Lei.
Parágrafo único - Para os efeitos desta Lei a expressão “Loteria do Estado de
Minas Gerais”, e as palavras “Loteria” e “Autarquia” se equivalem.
CAPÍTULO II
Da Finalidade
Art. 2º - A autarquia Loteria do Estado de Minas Gerais tem por finalidade,
mediante exploração de jogos lotéricos e similares no Estado de Minas Gerais,
gerar recursos e destiná-los à promoção do bem-estar social, a programas das
áreas de assistência, desportos, educação, saúde e desenvolvimento social.
..................................................................................................................................
.....
In: http://www.loteriademinas.com.br/lei_delegada_88.htm Acesso: 1 jun. 2006.
Fundação, apesar de poder integrar a Administração indireta, é pessoa jurídica de
direito privado, como consta no artigo 44, CC/2002. Mas registro que também há
a possibilidade de o Estado instituir fundação sob o regime de direito público.
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