habeas corpus

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HABEAS CORPUS
1. INTRODUÇÃO
Habeas corpus é o remédio judicial que tem por finalidade evitar ou fazer cessar a
violência ou coação à liberdade de locomoção, decorrente de ilegalidade ou abuso de
poder. O intuito deste artigo é demonstrar as espécies, formas e natureza do habeas
corpus, sua história e sua evolução constitucional e jurisprudencial.
2. ORIGEM
O instituto do habeas corpus tem sua origem remota no Direito Romano, pelo qual todo
cidadão podia reclamar a exibição do homem livre detido ilegalmente.
A origem mais apontada por diversos autores é a Magna Carta, que por opressão dos
barões, foi outorgada pelo Rei João Sem Terra em 19 de junho de 1215, nos campos de
Runnymed, na Inglaterra.
Como aponta Pinto Ferreira: [1]
“O habeas corpus nasceu historicamente como uma necessidade de contenção do poder
e do arbítrio. Os países civilizados adotam-no como regra, pois a ordem do hábeas
corpus significa, em essência uma limitação às diversas formas de autoritarismo.”
3. INTRODUÇÃO NO BRASIL
No Brasil, foi introduzido após a partida de D. João VI para Portugal, quando expedido
o Decreto de 23 de maio de 1821, referendado pelo Conde dos Arcos.
Estabelecia aquele Decreto que, a partir de então, nenhuma pessoa livre no Brasil
poderia ser presa sem escrita do Juiz do território a não ser em caso de flagrante delito,
quando qualquer do povo poderia prender o delinqüente; e que nenhum Juiz poderia
expedir ordem de prisão sem que houvesse culpa formada, por inquirição de três
testemunhas e sem que o fato fosse declarado em lei como delito.
O decreto foi implícito na constituição de 1824, a qual proibia as prisões arbitrarias e
mais tarde, foi regulamentado pelo Código de Processo Criminal de 24 de novembro de
1832, nos artigos 340 a 355 e estabelecia que qualquer Juiz poderia passar uma ordem
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de habeas corpus de ofício, sempre que no curso do processo chegasse ao seu
conhecimento que alguém estivesse detido ou preso.
Com o advento da Republica, o Decreto de 11 de outubro de 1890 determinava que todo
cidadão nacional ou estrangeiro poderia solicitar ordem de habeas corpus, sempre que
ocorresse ou estivesse em vias de se consumar um constrangimento ilegal. Era o
aparecimento, entre nós, do habeas corpus preventivo.
4. CONCEITO E FINALIDADE
A Constituição Federal de 1988 prevê em seu art. 5º, inciso LXVIII que conceder-se-á
habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou
coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.
O sentido da palavra alguém no habeas corpus refere-se tão somente a pessoa física.
Ressalte-se que a Constituição Federal, expressamente, prevê a liberdade de locomoção
no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa nos termos da lei, nele
entrar permanecer ou dele sair com seus bens (CF, art. 5º, XV).
O habeas corpus não poderá ser utilizado para a correção inidônea que não implique
coação a liberdade de ir, permanecer e vir. [2]
Na defesa da liberdade de locomoção, cabe ao Poder Judiciário considerar ato de
constrangimento que não tenha sido apontado em petição inicial [3]. Da mesma forma,
pode atuar no tocante à extensão da ordem, deferindo-a aquém ou além do que
pleiteado.
5. NATUREZA JURÍDICA
O habeas corpus é uma ação constitucional de caráter penal e de procedimento especial,
isenta de custas [4] e que visa evitar ou cessar violência ou ameaça na liberdade de
locomoção por ilegalidade ou abuso de poder. Não se trata, portanto de uma espécie de
recurso, apesar de regulamentado no capítulo a eles destinado no Código de Processo
Penal.
Convém lembrar que, não obstante o esforço teórico desprendido por esses autores e o
fato de o habeas corpus servir às vezes, como sucedâneo de recurso, para atacar
pronunciamento judicial, está hoje fora de qualquer dúvida a sua natureza jurídica de
ação, ou seja, “atuação do interessado, ou alguém por ele, consistente no pedido de
determinada providência, a órgão jurisdicional, contra ou em face de quem viola ou
ameaça violar a sua liberdade de locomoção”. [5]
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6. HIPÓTESES E ESPÉCIES
6.1 Habeas corpus preventivo (salvo-conduto)
Quando alguém se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de
locomoção por ilegalidade ou abuso de poder. Assim, bastará, pois a ameaça de coação
à liberdade de locomoção, para a obtenção de um salvo conduto ao paciente,
concedendo-lhe livre trânsito, de forma a impedir sua prisão ou detenção pelo mesmo
motivo que ensejou o habeas corpus.
6.2. Habeas corpus liberatório ou repressivo
Quando alguém estiver sofrendo violência ou coação em sua liberdade de locomoção
por ilegalidade ou abuso de poder. Pretende fazer cessar o desrespeito à liberdade de
locomoção.
6.3. Liminar em habeas corpus
Em ambas as espécies haverá possibilidade de concessão de medida de liminar, para se
evitar possível constrangimento à liberdade de locomoção irreparável.
Júlio Fabbrini Mirabete lembra que:
“Embora desconhecida na legislação referente ao habeas corpus, foi introduzida nesse
remédio jurídico, pela Jurisprudência, a figura da ‘liminar’, que visa atender casos em
que a cassação da coação ilegal exige pronta intervenção do judiciário”
Concluindo que:
“Como medida cautelar excepcional, a liminar em habeas corpus, exige requisitos: o
periculum in mora ou perigo na demora, quando há probabilidade de dano irreparável e
o fumus boni iuris ou fumaça do bom direito, quando os elementos da impetração,
indiquem a existência de ilegalidade” [6]
7. CABIMENTO DE HABEAS CORPUS
Dado o intuito pragmático do presente artigo, serão elencadas as ocorrências que
autorizam a concessão da ordem:
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1. Ameaça, sem justa causa, à liberdade de locomoção;
2. Prisão por tempo superior estabelecido em lei ou sentença;
3. Cárcere privado;
4. Prisão em flagrante sem a apresentação da nota de culpa;
5. Prisão sem ordem escrita de autoridade competente;
6. Prisão preventiva sem suporte legal;
7. Coação determinada por autoridade incompetente;
8. Negativa de fiança em crime afiançável;
9. Cessação do motivo determinante da coação;
10. Nulidade absoluta do processo;
11. Falta de comunicação da prisão em flagrante do Juiz competente para relaxá-la.
8. PESSOAS DO PROCESSO
Do processo de habeas corpus participam as seguintes pessoas:
1. O Impetrante – é aquele que requer ou impetra a ordem de habeas corpus a
favor do paciente;
2. O Paciente – é o individuo que sofre a coação, a ameaça, ou a violência
consumada;
3. O Coator – é quem pratica ou ordena a prática do ato coativo ou da violência;
4. O Detentor – é quem mantém o paciente sobre o seu poder, ou o aprisiona.
8.1. Impetrante
Primeiramente, é de se considerar a figura do impetrante, que é a pessoa legitimada a
impetrar a ordem, uma vez que apropria natureza do habeas corpus indica que qualquer
pessoa seja nacional ou estrangeiro, não importando sua profissão ou situação social,
pode impetrá-lo a seu favor ou de outrem.
8.2. Coator
O coator, como já foi dito, é a pessoa que de qualquer modo, causa ou ameaça causar ao
paciente um constrangimento ilegal.
Apesar de existir ainda certa divergência, é prevalente em doutrina e jurisprudência o
entendimento de que a coação pode provir de ato de autoridade pública ou de particular.
Normalmente é a autoridade, policial ou judiciária, a responsável pela coação, mas isto
não exclui a possibilidade de o particular também exercê-la, cabendo habeas corpus
para remediá-la. [7]
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8.3. Paciente
Chama-se paciente a pessoa que está sofrendo a coação ilegal, ou está iminência de
sofrê-la. Pode ela mesma impetrar a ordem, ou pode outra pessoa impetrá-la em seu
favor. No primeiro caso o paciente e o impetrante se confundem na mesma pessoa.
Para uma fácil compreensão, enumeramos algumas situações especiais, na qual se pode
encontrar o paciente.
8.3.1. Paciente incapaz
Se o paciente for incapaz, ser-lhe-á nomeado curador que poderá, ser inclusive, o
próprio impetrante.
8.3.2. Vários pacientes
Se houver mais de um paciente, as condições para concessão da medida, deverão ser
atendidas por todos, sendo que pode um paciente impetrar habeas corpus pelos demais.
8.3.3. Paciente de nome desconhecido
Mesmo que o nome do paciente seja desconhecido, no todo ou em parte, poderá o
interessado impetrar o habeas corpus, indicando na petição, dados suficientes para
individualizá-lo.
8.3.4. Paciente em local desconhecido
Não é necessário que se saiba onde se encontra o paciente que sofre o constrangimento
ilegal, bastando que se indique qual é a autoridade coatora.
8.3.5. Paciente foragido
A circunstância de se encontrar o paciente foragido, não impede o conhecimento e
julgamento de habeas corpus.
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9. COMPETÊNCIA
Em regra, competirá conhecer o pedido de habeas corpus a autoridade judiciária
imediatamente superior à que pratica ou está em vias de praticar o ato ilegal.
9.1. Juiz de Direito
Compete aos Juizes de Direito estaduais sempre que a coação for exercida por
particulares ou pelas autoridades policiais estaduais.
9.2. Tribunais de Justiça ou de Alçada
Já os Tribunais de Justiça ou de Alçada serão competentes originariamente, sempre que
a autoridade coatora for Juiz de Direito estadual ou secretário de estado (Código de
Porcesso penal, art. 650, II).
9.3. Juiz Federal
Compete ao Juiz Federal, quando o crime atribuído ao paciente tiver sido praticado pela
Polícia Federal. Caso seja o próprio Juiz Federal a autoridade coatora, competirá ao
Tribunal Regional Federal a que estiver ele subordinado.
9.4. Superior Tribunal de Justiça
Competirá ao Superior Tribunal de Justiça, quando o coator ou o paciente for
Governador de estado ou do Destrito federal; órgão monocrático dos Tribunais
Estaduais ou dos Tribunais Regionais Federais, membros dos Tribunais de Contas dos
Estados ou do Destrito Federal; dos Tribunais Regionais Eleitorais, dos Tribunais
Regionais dos Trabalho; dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e do
Ministério Público da União que oficiem perante Tribunais ou quando o Coator for
Ministro de Estado.
9.5. Supremo Tribunal Federal
Será competente se o paciente for o Presidente da República, o Vice-Presidente, os
membros do Congresso Nacional, os seus próprios Ministros, o Procurador-Geral da
República, os Ministros de Estado, os Membros dos Tribunais Superiores, os dos
Tribunais de Contas da União e os Chefes de Missão Diplomáticas.
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10. CONCESSÃO DE OFÍCIO
Segundo preceitua o artigo 654, parágrafo 2º do Código de Processo Penal, “os Juizes e
os Tribunais tem competência para expedir de oficio ordem de habeas corpus, quando
no curso do processo verificarem que alguém sofre ou esta na iminência de sofrer
coação ilegal”.
Na lição de Espínola Filho
“Para a concessão da ordem, na hipótese, não há necessidade de processo especial, a
autoridade judiciária serve-se dos próprios elementos do processo, que corre sob sua
jurisdição, eis que a prova nele colhida, a convença da efetividade, ou da ameaça real e
iminente, de constrangimento ilegal de que seja paciente, o réu, o ofendido, o
querelante, testemunha, advogado”.
11. EXECUÇÃO DA SENTENÇA
Provada a ilegalidade do constrangimento e concedida a ordem de habeas corpus,
expedir-se-á alvará de soltura, lavrado pelo escrivão da Vara e assinado pelo juiz, a fim
de que o paciente seja posto em liberdade.
Não poderá a autoridade coatora, deixar de acatar, imediatamente, a ordem concedida a
não ser que a mesma emane de Juiz Incompetente para a sua concessão. O não
cumprimento implica em desobediência, podendo o Juiz determinar a prisão do
detentor, ou requisitar a força necessária para que a mesma seja cumprida.
12. CONCLUSÃO
O habeas corpus nada mais é do que um remédio constitucional, da qual nos ampara
contra as ameaças arbitrárias de certos profissionais, ou situações que ponha a nossa
liberdade em risco.
Tal como disse o grande filósofo existencialista Jean-Paul Sartre : “Estou condenado a
ser livre”, pois todo homem têm direito a sua liberdade, uma vez que se o homem está
condenado a ser livre, a humanidade, em geral, está condenada a fazer conviver essa
liberdade.
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REFERÊNCIAS
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 15. ed. São Paulo, Atlas: 2004.
PACHECO, José Ernani de Carvalho. Habeas corpus. 7. ed. Curitiba: Juruá, 1998.
[1] FERREIRA, Pinto. Teoria e Prática de hábeas corpus, São Paulo, Saraiva, 1982, 2ª
ed – P. 13
[2] STF – 1ª T. – HC nº 69.419-5 MS – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – v.u. Diário da
Justiça, seção I, 28/8/92.
[3] Conforme entendeu o STF “a jurisprudência desta corte tem admitido que se
conceda hábeas corpus de ofício, ainda quando o pedido originário não possa ser
conhecido” (RT 650/331)
[4] C.F. art. 5º, LXXVII – “são gratuitas as ações de hábeas corpus e hábeas data e, na
forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania”.
[5] TUCCI, Rogério Lauria. Hábeas corpus e mandado de segurança: diversificações
conceptuais. In Ciência Penal 31/03
[6] MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de Processo Penal interpretado. 4ª ed. São
Paulo: Atlas, 1996, P. 765.
[7] Assim decidiu o TJPR: “Não se pode nem se deve permitir a prisão em cárcere
privado ou sem liberdade de ir e vir, de alguém, em qualquer hospital, por não possuir
recursos financeiros para pagar dívidas ou despesas, provenientes de tratamento ou
internamento”.
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