1 Princípios Básicos em Hemostasia Claudio Roberto Scolari Pilon Filho Horácio Tamada INTRODUÇÃO O termo Hemostasia vem do grego(“hemo”=sangue;”stasis”=deter) sendo um conjunto de manobras que o cirurgião usa para prevenir,deter e diminuir o sangramento. Na prática cirúrgica ele tem como finalidade : evitar a perda de sangue, garantir uma boa visibilidade operatória e uma cicatrização adequada. CLASSIFICAÇÃO A hemostasia pode ser classificada em dois tipos: a espontânea(fisiológica) e a provocada ou induzida, sendo que esta última pode ser realizada pelo cirurgião ou por medicamentos específicos pró-coagulantes. HEMOSTASIA FISIOLÓGICA Os mecanismos fisiológicos envolvidos na hemostasia envolvem muitos componentes do nosso organismo, que são estreitamente regulados durante o processo, bem como órgãos indiretamente. É um sistema potente que se não for bem controlado, pode levar a hemorragias ou à trombose. Dentro do vaso, a resposta hemostática deve ser rápida, localizada e cuidadosamente regulada.Tanto a hemostasia como a trombose, são reguladas por três componentes gerais – a parede vascular, as plaquetas e a cascata da coagulação. O gatilho para o inicio deste processo envolve diversos elementos pode ocorrer por várias situações, dentre as quais se destacam: trauma a parede vascular e tecidos adjacentes e contato do sangue com células endoteliais lesionadas ou com colágeno e outros elementos teciduais fora do vaso sangüíneo. Na ocorrência de um destes processos, iniciam-se as reações que culminarão na formação da trombina,que é a chave do processo. O paciente que será submetido a uma cirurgia, seja ela de pequeno ou grande porte, será eletivamente traumatizado e, portanto, necessitará tanto de uma reserva fisiológica dos fatores de coagulação quanto da intervenção cirúrgica hemostática e alguns casos até mesmo o uso de medicamentos pró ou anti-coagulantes. O trauma 2 induzido pela diérese(1º tempo da operação)é o estimulo inicial para os eventos da coagulação, como a liberação de tromboxano A2 e endotelina pelas plaquetas, a qual causa vasoconstricção local. O coágulo começa a se formar entre 15 e 20 segundos se o trauma for grave e entre um a dois minutos em traumas pequenos. Neste momento substâncias ativadoras, produzidas pelo endotélio, plaquetas e proteínas iniciam o processo de coagulação de forma simultânea e equilibrada. Dentro de três a seis minutos após o estimulo inicial, toda a abertura do vaso é preenchida pelo coágulo(em lesões não muito grandes). A coagulação ocorre em três etapas essenciais: 1. Em resposta a ruptura do vaso ou problemas do sangue, ocorre no sangue a cascata da coagulação; 2. O ativador da protrombina catalisa a conversão de protrombina em trombina; 3. A trombina atua como uma enzima convertendo o fibrinogênio em fibras de fibrina, formando um emaranhado de plaquetas, células sangüíneas e plasma, para formar o coágulo. Estas etapas acontecem simultânea e harmonicamente e participam delas dezenas de substâncias, envolvidas em reações complexas da qual este capítulo não se aprofundará. Devido a complexidade do processo e participação de inúmeros fatores na hemostasia, o paciente que necessita de qualquer ato cirúrgico deve ser investigado a cerca de deficiência, seja ela congênita ou adquirida, ou outros fatores que influenciem na hemostasia. Portanto, a história clínica e exames laboratoriais básicos podem elucidar muitas coagulopatias ou distúrbios da coagulação que possam levar o paciente à graves complicações, durante ou após o ato cirúrgico. A HEMOSTASIA INDUZIDA CLASSIFICAÇÃO DOS MÉTODOS HEMOSTASIA Existem vários métodos de hemostasia que podem ser aplicados antes, durante e após o ato cirúrgico, estes foram divididos e agrupados e 3 grandes grupos: 1.Hemostasia prévia; 2.Hemostasia temporária; 3.Hemostasia definitiva. 3 HEMOSTASIA PRÉVIA A hemostasia prévia ou pré-operatória é realizada antes do ato cirúrgico e visa interromper de forma temporária o fluxo sanguíneo na ferida operatória, proporcionando um campo operatório exangue. Esta apresenta 3 características fundamentais: (1) é aplicada sobre o paciente sem que haja hemorragia, (2)o vaso deve ser comprimido de preferência sobre um plano resistente e (3)é aplicada principalmente sobre os grandes vasos arteriais na raiz dos membros. São habitualmente empregados na cirurgia dos membros e têm a finalidade de prevenir a hemorragia, entretanto, podem e devem ser aplicadas paciente traumatizado até que seja atendido no hospital. Tipos de hemostasia prévia. Sistema de Esmarch Garrote de borracha Compressão,em massa,do Faixa pneumática membro Torniquete Compressão elástica na base de um dedo Da carótida primitiva Da subclávia Compressão digital de Da braquial artérias Da femoral Compressão manual da aorta abdominal *FIGURAS HEMOSTASIA TEMPORÁRIA É aquela efetuada durante o ato cirúrgico com vistas a interrupção da circulação,de forma transitória, mediante a oclusão vascular, de forma suave e delicada. Pode-se utilizar de laçadas e pinçamentos,de modo que ocorra a oclusão temporária do vaso(sem que haja lesão do mesmo). Após a intervenção, o laço ou a pinça são retirados, restabelecendo a circulação local. Os métodos da hemostasia temporária tem 3 características: (1) são realizados através de uma ferida operatória, isto é, são cruentos; (2) a compressão é feita por pinças atraumáticas com a de Satinsky, Bulldog de Bakey e pinça de Cooley, que são usadas para prender vasos causando um trauma mínimo em sua parade, com fitas de algodão(cadarço) ou 4 plásticas especiais(vassel loop) e (3) tem o objetivo de restabelecer o fluxo sanguíneo no vaso que foi colapsado. * FIGURAS Um dos meios mais utilizados em cirurgia do trauma é o tamponamento compressivo. Este método especial visa a colocação de gazes ou compressas no local do sangramento, ou com pressão manual ou instrumental(afastadores ou valvas), permitidindo continuar o ato operatório e somente depois efetuar-se a hemostasia definitiva,se for o caso. Em alguns casos, quando a hemorragia é muito intensa, a única alternativa pode ser a de deixar várias compressas no local, cavidade abdominal por exemplo, tamponando as áreas sangrantes, fechar o local, encaminhar o paciente para a UTI e reoperá-lo no dia seguinte ou em 48 horas, retirando as compressas cuidadosamente uma por uma e completar a operação. * FIGURAS HEMOSTASIA DEFINITIVA É aquela que oblitera de forma permanente um vaso.É indicada para coibir de forma definitiva todo tipo de hemorragia. Em geral,este método é utilizado em vasos periféricos e superficiais,isso porque após a oclusão total do vaso,ocorrerá isquemia no tecido que era irrigado por ele. A hemostasia definitiva de vasos arteriais não é recomendada,visto a conseqüente isquemia que a mesma proporcionará. O cirurgião deverá estar ciente das conseqüências antes de utilizar de tal técnica visto que algumas regiões e segmentos corporais são irrigados por um único vaso,e a obliteração do mesmo,pode levar a gangrena . Métodos da hemostasia definitiva As principais manobras operatórias para a hemostasia definitiva são: 1.Por pinçamento e laqueadura: * FIGURAS Fig.X a)O cirurgião pinça a ponta do vaso sangrante; b)após isso entregua a pinça ao auxilar; c)este por sua vez mantém a pinça perpendicular ao plano do corte, para que o cirurgião aplique o fio por detrás dela; d)O auxiliar vai abaixando a pinça levemente afim de apresentar o vaso que será laqueado; e) O cirurgião aplica o primeiro nós cirúrgico; f)O cirurgião aperta o nó e realiza a hemostasia definitiva e o auxiliar retira a pinça. 5 2.Por sutura: * FIGURAS Fig.X Um exemplo de sutura hemostática mediante a aplicação de fios. 3.Por transfixação: * FIGURAS Fig.X Hemostasia definitiva sendo realizada mediante a transfixação. 4.Por bisturi elétrico(termocautério): Neste método o auxiliar apresenta a pinça hemostática, já posicionada, ao cirurgião para que este encoste a caneta do eletrocautério na pinça, realizando assim a hemostasia definitiva. Este método é recomendado apenas para vasos de pequenos calibre, sendo os de maior recomendada o laqueamento. Na dúvida entre um e outro, sempre optar pela laqueadura. * FIGURAS Fig.X Hemostasia com eletrocautério (definitiva). 5. Bisturi utilizado em cirurgia vídeo assistida: o bisturi harmônico (Ultracision ®), pode ser utilizado para realizar a secção e hemostasia de vasos sanguíneos com diâmetro inferior a 5mm por meio de ondas ultrassônicas, sendo utilizado mais em cirurgias videolaparoscópicas. 6. Por métodos químicos e biológicos(trombina solúvel,espuma de fibrinogênio): Este método tem como objetivo a antecipação dos mecanismos fisiológicos da hemostasia, aplicando rápida e localmente trombina ou fibrinogênio, sendo uma espécie de “atalho” na coagulação normal, promovendo rapidamente a formação do trombo, garantindo dessa forma a hemostasia. * FIGURAS Esta hemostasia é efetuada mediante pinças apropriadas chamadas pinças hemostáticas ,do tipo Kelly, Crile, Halsted Mosquito,Rochester, Kocher e Adson. O 6 cirurgião evitar o pinçamento às cegas ou em massa,que além de constituir um erro técnico,pode provocar graves conseqüências. * FIGURAS CONSIDERAÇÕES FINAIS Manter o campo operatório seco e com boa visualização é a tarefa fundamental do auxiliar,no ato operatório. Para isso ele deverá utilizar os métodos citados ao longo deste capítulo,bem como realizá-los com toda a cautela. Vale ressaltar que,tanto o cirurgião como o auxiliar,devem atentar quanto ao uso de gazes. A gaze não pode ser abandonada,solta sem controle,pois tem o risco de ser deixada no doente. O mesmo se refere ao uso das compressas. O controle e vigilância do cirurgião e seus auxiliares evitarão este erro técnico. Nunca deixar uma gaze abandonada. A gaze suja deve ser jogada imediatamente no lixo. O cirurgião deverá analisar cada caso e calcular os riscos no paciente que sofre de coagulopatias ou tem suas reservas sangüíneas comprometidas. Durante o ato operatório a equipe cirúrgica deve evitar a perda de sangue que é um dos princípios da hemostasia cirúrgica. Uma hemostasia bem feita propicia a cicatrização mais rápida,evita infecções e outras complicações. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS GOLDENBERG, S.; BEVILACQUA, R. G. Bases da Cirurgia. São Paulo: EPU,1981. PETROIANU,A.;MIRANDA, M. E.;OLIVEIRA, R. G. Blackbook Cirurgia. Belo Horizonte: Blackbook Editora,2008. FERRAZ, A. A. B. Bases da técnica cirúrgica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. GYTON,A. C.;HALL,J. E. Tratado de Fisiologia Médica.11ª Edição.Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. KUMAR,V.;ABBAS,A. K.;FAUSTO,N. Patologia – Bases Patológicas das Doenças.7ª Edição.Rio de Janeiro:Elsevier,2005. MINISTÉRIO DA SAÚDE.Manual de atendimento odontológico a pacientes com coagulopatias hereditárias.Brasilia: Editora do Ministério da Saúde,2005. http://www.sbcp.org.br/pdfs/23_1/03.pdf acesso em : 24/05/2009. 7 PALAVRAS-CHAVE Hemostasia; Cascata da coagulação ; Trombose ; Fibrinólise ; von Willebrand ; trombina ; fibrina ; hemofilia ; coagulopatias.