EXMO - TJSP

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1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE ITAPIRA
Peças de Informação Autos n°37/08 – Promotoria de Justiça da Cidadania
Ação “Civil Pública”
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EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DE UMA DAS
VARAS CÍVEIS DA COMARCA DE ITAPIRA, ESTADO DE SÃO PAULO.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO
PAULO, por intermédio da Promotoria de Defesa dos Direitos Constitucionais do
Cidadão de Itapira, com gabinete sito na praça Coronel Souza Ferreira, s/n°, Centro,
edifício do Fórum, município e Comarca de Itapira, Estado de São Paulo, vem,
respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com base no art. 129, inciso III,
da Constituição da República e art. 5º da Lei nº 7.347/85, propor, pelo rito comum
ordinário, a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com incluso pedido de liminar
antecipatório, contra a PREFEITURA MUNICIPAL DE ITAPIRA, pessoa jurídica
de direito público interno, representada pelo Prefeito Municipal Antônio Hélio Nicolai,
com domicílio no Paço Municipal situado na rua João de Moraes, nº490, Centro,
município de Itapira, Estado de São Paulo, e da FAZENDA DO ESTADO DE SÃO
PAULO, pessoa jurídica de direito público interno, com domicílio legal em sua
Capital, São Paulo, representado juridicamente, nos termos do art. 12, I do Código
de Processo Civil e art. 99, I da Constituição Estadual, pelo Procurador-Geral do
Estado, com domicílio na rua José Bonifácio, nº 278, São Paulo/SP, pelas razões de
fato e de direito a seguir aduzidas.
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Ação “Civil Pública”
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DOS FATOS
Consta
dos
documentos
anexos
que
DANIEL
FERNANDES APORTA portador da cédula de identidade (RG/SSP-SP) 21.321.653,
residente na Avenida Comendador Virgolino de Oliveira, n°11, nesta cidade de
Itapira está acometido de grave doença, a saber, transtornos mentais e
comportamentais devidos ao uso de cocaína (catalogada na Classificação
Internacional de Doenças – CID – 10, pelo código F.14), observado o laudo médico
e relatórios de atendimento médico anexos (três laudas), firmados pelo Médico
público José Marcelino C. Ceccon (CRM-SP n°123.506-S), do Hospital Municipal de
Itapira, na data de hoje.
Ainda nos termos dos relatórios médicos antes
referidos, o interessado necessita, urgentemente, de internação psiquiátrica,
solicitada pelo Médico já nominado, para tratamento de sua moléstia, conforme ficha
de solicitação de internação psiquiátrica subscrita pelo facultativo público (uma
lauda). O doente pretende submeter-se voluntariamente à internação, apresentando
agitação psicomotora, risco de heteroagressividade, quadro delirante ou alucinatório,
não estando em contenção física, não usando atendimento extra-hospitalar nem
recebendo continência sócio-familiar – ou seja, caso não seja internado, corre risco
de vida e de saúde e coloca em risco a vida e a saúde das demais pessoas,
especialmente familiares.
O usuário é pessoa de poucas posses e não possui
condições de custear este tratamento. Conforme termo de declarações anexo, em
duas laudas, de seu sogro, sr. Aparecido Rodrigues de Abreu, DANIEL solicitou
vaga para internação e tratamento psiquiátrico, mas não a conseguiu. Não lhe foi
informada data para disponibilização da vaga. Malgrado DANIEL pretenda se
submeter à internação, ele e sua família sofrem com efeitos da grave doença – pois
já vendeu a maioria das coisas que possuía em casa, para custear o uso da droga e
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tem tamanhos distúrbios que o sr. Aparecido e sua filha não deixam DANIEL ficar
em companhia do próprio filho.
Não obstante a premente necessidade de DANIEL
receber o adequado tratamento médico, o fato é que nem o SUS, através do Estado
de São Paulo, nem a Prefeitura Municipal de Itapira, vêm lhe proporcionando o
tratamento, incorrendo o interessado em risco de graves prejuízos à saúde e em
perigo de vida para si e seus familiares. Isto é comprovado (a omissão estatal na
prestação do serviço público) não somente pela declaração do familiar do doente
(Aparecido Rodrigues de Abreu), como, igualmente, pelas anexas duas certidões
(duas laudas) da Secretaria da Promotoria de Justiça, dando conta da falta de vaga
para internação psiquiátrica voluntária do enfermo; assim como dos trâmites
excessivamente formais, burocráticos e lentos para a obtenção da vaga desejada.
DO DIREITO
O Ministério Público tem legitimidade para propor a
presente ação, visto tratar-se de direito individual indisponível – direito à saúde e à
vida. Ademais, tem legitimidade para zelar pelo respeito dos Poderes Públicos à
regularidade do serviço público – dentre quais, o de saúde.
Neste sentido, o art. 127, caput, e 129, incs. II e III da
Constituição Federal:
“Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis.”
“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
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II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos
assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do
meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; “
A Constituição da República prevê a saúde como
direito social básico de todas as pessoas e dever do Estado, garantindo, dessa
forma, o acesso universal e igualitário às ações e aos serviços de saúde:
“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a
previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma
desta Constituição.”
“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”
A Lei Orgânica Nacional de Saúde (Lei n°8.080/90), não
destoa
dos
mandamentos
constitucionais
e
estabelece,
igualmente,
a
responsabilidade estatal pela adequada prestação de serviços de saúde às pessoas,
nos termos de seu artigo 2°.
Em caso análogo, no qual se postulava a concessão
gratuita de medicamento pelo Poder Público a paciente portador do vírus HIV, foi
estabelecido em julgado do STF, RE(AgRg)271.286-RS, no qual relator o Exmo.
Min. CELSO DE MELLO, sobre a concretização do mandamento veiculado no art.
196, acima transcrito:
“EMENTA: PACIENTE COM HIV/AIDS
FINANCEIROS
-
DIREITO
À
VIDA
E
À
- PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS
SAÚDE
-
FORNECIMENTO
GRATUITO
DE
MEDICAMENTOS - DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E
196) - PRECEDENTES (STF) - RECURSOS DE AGRAVO IMPROVIDO. O DIREITO PÚBLICO À
SAÚDE REPRESENTA CONSEQUÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁ-VEL DO DIREITO À
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VIDA. O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à
generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico
constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder
Público, a quem incumbe formular - e implantar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a
garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à
assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - .......... O Poder Público, qualquer que seja a esfera
institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se
indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda, que por censurável
omissão,
em
grave
PROGRAMÁTICA
comportamento
NÃO
PODE
inconstitucional.
TRANSFORMÁ-LA
A
EM
INTERPRETAÇÃO
PROMESSA
DA
NORMA
CONSTITUCIONAL
INCONSEQÜENTE. O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem
por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização
federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente,
sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade,
substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto
irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado.
DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. O reconhecimento
judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas
carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da
Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção de seu alcance, um
gosto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente, a não ser a
consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF.”
A Constituição Paulista também reconhece a saúde como
direito de todos e obrigação do Estado, garantindo o acesso universal e igualitário às
ações e ao serviço de saúde, em todos os níveis (art. 219 e § único).
O Código de Saúde do Estado de São Paulo (Lei
Complementar Estadual nº 791/95), no que concerne ao tema em pauta, estabelece
que:
a) o direito à saúde é inerente à pessoa humana, constituindo-se em
direito público subjetivo (art. 2º, § 1º);
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b) o estado de saúde, expresso em qualidade de vida, pressupõe (i)
condições dignas de alimentação e nutrição, assim como o acesso a esses bens; (ii)
reconhecimento e salvaguarda dos direitos do indivíduo, como sujeito das ações e
dos serviços de assistência em saúde, possibilitando-lhe exigir serviços de qualidade
prestados oportunamente e de modo eficaz; (iii) ser tratado por meios adequados e
com presteza, correção e respeito (art. 2º, § 3º, I, IV, “a” e “c”);
c) no território de nosso Estado, as ações e serviços de saúde implicam
co-participação e atuação articulada do Estado e dos Municípios na sua execução e
desenvolvimento, constituindo o Sistema Único de Saúde (art. 4º e § 1º; art. 9º, I; art.
11);
d) as ações e serviços assistenciais prestados pelo Sistema Único de
Saúde são gratuitos, vedada a cobrança, de qualquer tipo de despesa (art. 12, II,
“a”);
e) compete ao Estado, em caráter complementar, executar ações e
serviços de assistência integral à saúde e de alimentação e nutrição (art. 17, I, “a” e
“e”);
f) compete ao Município executar ações e serviços de assistência
integral à saúde e de alimentação e nutrição (art. 18, III, “a” e “e”).
Observa-se, portanto, que ao refundar a República do
Brasil em 1988, os Constituintes elencaram a cidadania e a dignidade da pessoa
humana como fundamentos da democracia a ser instalada (CF, art. 1º). Arrolaram
como objetivos fundamentais da nova República: a construção de uma sociedade
livre, justa e solidária; a garantia do desenvolvimento nacional; a erradicação da
pobreza e da marginalização; a redução das desigualdades sociais e regionais; e,
ainda, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor,
idade e quaisquer outras formas de discriminação (CF, art. 3º).
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Ora, aqueles que se propõem a cumprir tais objetivos,
com tais princípios, devem criar as condições que permitam e favoreçam o
desenvolvimento integral da pessoa, portanto, a viabilidade da vida, que implica,
dentre outras coisas, a promoção, a defesa e a recuperação da saúde individual e
coletiva. Por isso, a saúde ganhou tratamento especial na Constituição, com seção
própria e ênfase no acesso universal e igualitário às ações e serviços.
A Carta Paulista traduz, para o contexto regional, os
direitos estatuídos na Lei Maior e é complementada pelo Código de Saúde do
Estado, que expressamente reconhece a saúde como direito público subjetivo.
Ressalte-se que as Constituições da República e do
Estado e a legislação infraconstitucional dão ênfase à descentralização e
municipalização das ações e serviços públicos de saúde, constituindo um sistema
único (SUS), com competência definida em lei.
Em nosso Estado, compete originariamente à direção
municipal do SUS executar ações e serviços de assistência integral à saúde,
cabendo à direção estadual atuar em caráter complementar. Ou seja, no caso de
não-oferecimento ou oferta irregular desses serviços pelo Município, o Estado deve
supri-los. Neste sentido, basta a leitura das normas da Constituição Federal, artigo
198; Lei n°8.080/90, arts. 8°, 15, 16, 17 e 18; que estabelecem a existência de uma
rede regionalizada e hierarquizada de atendimento à saúde pelas três esferas de
governo do Executivo (União, Estados, Municípios).
Como se vê, não se trata de um conjunto de normas
programáticas. As Constituições e as leis tratam de assegurar efetividade social ao
direito fundamental à saúde, em toda a sua amplitude, reconhecendo-o como direito
público subjetivo.
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Nem se alegue que a concessão da tutela jurisdicional
requerida na presente Ação Civil Pública, consistente na internação psiquiátrica
antes especificada implica em indevida intromissão no poder discricionário do
administrador. O poder discricionário da Administração não é absoluto, sob
conseqüência de conferir ao Administrador, no caso, ao Prefeito ou ao Secretário de
Saúde, o poder divino de decidir sobre a vida ou morte do munícipe desprovido de
recursos econômicos, através do gratuito serviço de internação psiquiátrica.
Hely
Lopes
Meirelles
(in
Direito
Administrativo
Brasileiro, Ed. RT, 16ª ed., 1991), define poder discricionário como o direito
concedido à Administração de modo explícito ou implícito, para a prática de atos
administrativos com liberdade na escolha de sua conveniência, oportunidade e
conteúdo. Mais adiante o nobre jurista adverte que poder discricionário não se
confunde com poder arbitrário. Discricionariedade e arbítrio são atitudes inteiramente
diversas. Discricionariedade é liberdade de ação administrativa, dentro dos limites
permitidos em lei; arbítrio é ação contrária ou excedente da lei. Ato discricionário,
quando autorizado pelo direito, é legal e válido; ato arbitrário é sempre ilegítimo e
inválido.
Óbvio é que o desrespeito pelos requeridos às normas
constitucionais federal e estadual, condenando o interessado aos males de sua
enfermidade implica em ato administrativo arbitrário, suscetível, pois, de correção
pelo Poder Judiciário.
Não encontram os requeridos respaldo na simplória
alegação de falta de recursos ou de competente dotação orçamentária.
Sob o dever de eficiência cravado à Administração pelo art.
37, caput, da Constituição Federal indubitável é que inúmeras outras despesas
públicas mereceriam corte, vg, com propaganda oficial, café para repartições
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públicas, etc., antes da supressão dos recursos destinados à aquisição do vital
medicamento para a interessada. Já restou decidido, inclusive, no Pedido de
Suspensão de Segurança nº 702-PR(98/0061247-5), no qual requerente o Estado do
Paraná e requerido o Des. Rel. do Mandado de Segurança nº 69.321-8, do TJ do
Paraná:
“Os obstáculos apontados pelo Estado, a fim de inviabilizar o pleito liminar dos Impetrantes revelamse frágeis: a aquisição de medicamentos essenciais à preservação da vida do enfermo pode ocorrer
em regime de urgência; previsão orçamentária geral, para compra de medicamentos destinados à
farmácia do SUS certamente há. Caso contrário, ao administrador é lícito remanejar rubricas, prática
usual da Administração Pública.”
Os instrumentos processuais de defesa jurisdicional desses
direitos são encontrados na Constituição (CF, art. 129, II e III) e na legislação
ordinária, em especial na Lei da Ação Civil Pública (LACP, arts. 1º, IV) corpo de
normas que mantém o espírito emancipador da Constituição da República.
Sobreleva-se, nesse passo, o instituto da Ação Civil Pública de tutela dos interesses
individuais indisponíveis, coletivos e difusos, para a qual legitima-se o Ministério
Público (LACP, art. 5º).
No
caso
presente,
trata-se
de
direito
individual
indisponível, o direito à saúde, de cuja defesa está legitimado o Ministério Público, a
teor do que dispõe o art. 127, in fine, da Constituição de 1988.
Analisando questão absolutamente semelhante ao E.
Supremo Tribunal Federal decidiu:
“Tal como pude enfatizar, em decisão por mim proferida no exercício da Presidência do Supremo
Tribunal Federal, em contexto assemelhado ao da presente causa (Pet 1.246-SC), entre proteger a
inviolabilidade direito à vida e à saúde que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado
a todos pela própria Constituição da República (art. 5º, “caput” e art. 196) ou fazer prevalecer, contra
essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez
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configurado esse dilema - que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível
opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humana, notadamente daqueles,
como os ora recorridos, que têm acesso, por força de legislação local, ao programa de distribuição
gratuita de medicamentos, instituído em favor de pessoas carentes. Cumpre assinalar, finalmente,
que a essencialidade do direito à saúde fez com que o legislador constituinte qualificasse, como
prestações de relevância pública, as ações e serviços de saúde (CF, art. 197), em ordem a legitimar a
atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário naquelas hipóteses em que os órgãos estatais,
anomalamente,
deixassem
de
respeitar
o
mandamento
constitucional,
frustrando-lhe,
arbitrariamente,
a eficácia jurídico-social, seja por intolerável omissão, seja por qualquer outra
inaceitável modalidade de comportamento governamental desviante.”[1]
Apreciando Recursos de Agravo interpostos contra
decisões de Juízos da Comarca de Ribeirão Preto, tirados em Ações Civis Públicas
promovidas pelo Exmo. Promotor de Justiça daquela comarca, Dr. Sebastião Sérgio
da Silveira (suas petições iniciais serviram de modelo para a presente peça
inaugural), que questionavam a concessão de liminar, o E. Tribunal de Justiça de
São Paulo rechaçou as preliminares levantadas pela Fazenda do Estado,
asseverando:
“Medicamentos para o tratamento de portador de hepatite “C” – O reexame necessário da sentença
que condena a Fazenda Pública, não impede sua sujeição a antecipação de tutela, decisão
interlocutória de caráter provisório – a proteção da vida humana prevalece sobre a necessidade de se
evitar a irreversibilidade do provimento – O Judiciário não invade a esfera de outro poder, quando
apenas determina que o Executivo cumpra sua obrigação legal e constitucional – Não se declara
nulidade processual quando a repetição do ato se tornou desnecessária.”[2]
“Estando provado nos autos que o autor está necessitando de certa medicação, por expressa
indicação do profissional competente, o Estado por qualquer de seus entes políticos, seja a União, o
Estado-Membro ou Município está obrigado a fornece-lo, pena de vulneração do mais importante dos
direitos garantidos constitucionalmente. Afinal, se a vida perece de que adiantará aos cidadãos outros
direitos. O Estado de São Paulo não compreendeu bem, o que profundamente lamentável, que o que
está em causa é o direito à vida, bem supremo, que é tutelado constitucionalmente. Não é hora de
buscar em certa retórica vazia do direito, uma maneira de subtrair-se à imposição constitucional. Se o
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Estado não atingiu, ainda o grau ético necessário a compreender essa questão, deve ser compelido
pelo Poder Judiciário, guardião da Constituição, a faze-lo.”[3]
”Ação Civil Pública – Liminar – Ajuizamento pelo Ministério Público em face da Prefeitura Municipal de
Ribeirão Preto e do Governo do Estado visando a imposição de obrigação de fazer consistente
fornecimento de medicamentos, sob pena de multa diária – Concessão com base no art. 12 da Lei
7.347/87 – Pressupostos legais – Recurso desprovido.”[4]
Uma vez, portanto, que a PREFEITURA MUNICIPAL DE
ITAPIRA e o GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO, por intermédio dos
respectivos serviços de saúde, ao não oferecerem eficiente e gratuitamente
necessária internação psiquiátrica ao doente, descumprindo assim a Constituição
Federal e legislação infraconstitucional pertinente e ofendendo direito individual
indisponível, devem ser compelidos judicialmente a proceder ao fornecimento dos
remédios necessários ao tratamento do paciente.
DOS PEDIDOS LIMINARES ANTECIPATÓRIOS
Justifica-se
a
concessão
de
medida
liminar,
independentemente de justificação, como autoriza o artigo 12 da Lei nº 7347/85 e,
para impor/ordenar aos réus:
1. O cumprimento da obrigação de fazer consistente NA
imediata INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA DO DOENTE INTERESSADO (Daniel
Fernandes Aporta), EM VINTE E QUATRO HORAS E pelo prazo necessário, a
critério médico, sob pena de pagamento de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos
reais), a ser revertido para fundo previsto pelo art. 13, da Lei nº 7.347/85; e eventual
crime de desobediência e ato de improbidade administrativa;
A plausibilidade do direito ameaçado de lesão — fumus
boni iuris — está demonstrada pelo reconhecimento do direito à saúde como direito
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público subjetivo de todos, bem assim pelos laudos médicos que acompanham a
inicial e prova oral e documental (certidões) de omissão em serviço público; e o
periculum in mora manifesta-se na necessidade de se controlar, urgentemente, o
grave quadro de saúde sofrido pelo interessado, que poderá se agravar ainda mais
caso não receba o tratamento indicado.
DOS PEDIDOS PRINCIPAIS
Diante de todo o exposto e do constante da
documentação inclusa, que desta petição faz parte integrante, propõe o
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO a presente ação, para que
o MUNICÍPIO DE ITAPIRA e o ESTADO DE SÃO PAULO sejam condenados:
a) a adotar, em definitivo, o procedimento cuja imposição foi objeto de pedido
liminar antecipatório – proceder à internação psiquiátrica do paciente indicado, em
vinte e quatro horas e enquanto persistir a necessidade médica, sob pena de
responder por multa diária nos moldes já referidos e de crime de desobediência e
ato de improbidade administrativa;
b) pagar as custas processuais.
Posto isso, requer o autor a citação dos réus, nas
pessoas do Prefeito Municipal e do Procurador-Geral do Estado, para querendo,
contestarem a presente Ação Civil Pública, sob pena de revelia e confissão.
Protesta por todos os meios de prova admitidos em
direito, em especial juntadas de novos documentos e perícia.
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Dá-se a causa o valor de R$ 1.000,00.
Itapira, 16 de setembro de 2008.
ALEXANDRE DE PALMA NETO
Promotor de Justiça
-------------------------------------------------------------------------------[1] RE 267.612-RS, Rel. Min. Celso Mello, publicado no DJU 23.8.2000.
[2] T.J.S.P., A.I. nº 174.300-5/3-00-Ribeirão Preto, 8ª Cam. Cível, rel. Des. Teresa
Ramos Marques, j. 16.08.200.
[3] T.J.S.P., A.I. nº 170.097-5/6-00 – Ribeirão Preto, 3ª de Direito Público, Rel. Des.
Magalhães Coelho, j. 26.09.2000.
[4] T.J.S.P., A.I. nº 160.733-5/1-00, 2ª Vara de Ribeirão Preto, Rel. Des. Paulo
Travain.
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