COMPORTAMENTO HUMANO TRINÔMIO: CORPO, ALMA E MENTE. “Vocês, brancos, são loucos. Impelidos pelas suas máquinas, se matam de trabalhar até os 60 anos, depois, quando já velhos demais para fazê-lo, começam a pensar, a viajar, a divertir-se. Nós distribuímos as horas alegres ao longo de toda a vida”. Não terá razão o índio? Brochieri, in De Masi, A sociedade pós-industrial, 1999. Nunca, em toda a história de nosso desenvolvimento, tornou-se tão vital como agora a compreensão do comportamento humano. Há tempos, filósofos, psicólogos, administradores, sociólogos, antropólogos e outros interessados, buscam entender a lógica do comportamento das pessoas. A globalização dos mercados, com a socialização da informação induzida pela TI1 e a conseqüente miscigenação gradativa e acelerada de culturas, evidencia um novo mundo em que as pessoas passam a ser a única alternativa para a solução de problemas que impedem a evolução humana. No campo da Administração, por exemplo, as práticas de gestão mais modernas estão centradas nas pessoas, pois que se constituem no único recurso organizacional capaz de manipular todos os demais existentes, porque é vivo. É nas pessoas que encontramos as habilidades e as competências necessárias à construção de uma estrutura resiliente2, capaz de absorver os impactos do ambiente, sejam internos ou externos, sem perda da funcionalidade organizacional. COMPORTAMENTO – CONCEITO O Dicionário Aurélio conceitua comportamento como sendo: 1) maneira de se comportar; procedimento, conduta; 2) conjunto de atitudes e reações do indivíduo em face do meio social; e, 3) para a Psicologia, como sendo o conjunto das reações que se podem observar num indivíduo, estando este em seu ambiente, e em dadas circunstâncias. No campo da Administração, Chiavenato3 define comportamento como sendo “uma forma de proceder, refere-se à conduta da pessoa”. Assim “padrões de comportamento são os modos pelos quais a pessoa costuma conduzir-se em seus afazeres”. TI – Tecnologia da Informação Resiliência - Propriedade pela qual a energia armazenada em um corpo deformado é devolvida quando cessa a tensão causadora duma deformação elástica. 3 CHIAVENATO, Idalberto in Recursos Humanos na Empresa – páginas 93-99 – Ed. Atlas – 3ª. Edição – SP, 1994. 1 2 2 KANAANE4, entretanto, define de forma mais completa e clara comportamento “como um conjunto de operações materiais e simbólicas, entendido como um processo dialético5 e significativo em permanente interação. O aspecto dialético do comportamento possibilita-nos compreendê-lo como um sistema de múltiplas interações. A origem dessas operações situa-se no âmago das necessidades humanas, permitindo o surgimento de novas instâncias de comportamentos. Comportamentos podem ser definidos, portanto, como as reações dos indivíduos e as respostas que este apresenta a dado estímulo, sendo determinadas pelo conjunto de características ambientais (adquiridas) e hereditárias (genéticas), com absorção das pressões exercidas pelo meio ambiente. Tentar compreender, entretanto, o comportamento humano como determinado tãosomente por um destes fatores, ou seja, tentar defini-lo como função de hereditariedade ou do meio-ambiente limitaria muito a compreensão do homem em sua globalidade. TEORIAS COMPORTAMENTAIS – UMA MACROVISÃO DAS PRINCIPAIS ESCOLAS A Teoria de Campo de Lewin afirma que o comportamento humano é derivado da totalidade dos fatos coexistentes e que esses têm caráter de um campo dinâmico, onde cada campo depende de uma inter-relação dinâmica com as outras. É o que ele chama de campo psicológico. Noutras palavras, Lewin explica o comportamento humano sintetizando seu entendimento pela fórmula C = f (P, M), onde o comportamento C é o resultado da interação da função f (P=pessoa e M = meio ambiente). Festinger, por sua vez, afirma que o comportamento humano está em função de uma dissonância6 cognitiva7, onde o elemento cognitivo é uma espécie de crença, conhecimento ou opinião que o indivíduo tem de si mesmo ou do meio externo. Afirma ele que as pessoas por não tolerarem a inconsistência, buscam estabelecer um estado de consonância ou consistência com ele mesmo e com o ambiente que o rodeia. Festinger, de certa forma, justifica a complexidade e a diversidade do comportamento humano. Há, ainda, autores que buscam compreender e explicar o comportamento humano considerando o indivíduo como um micro sistema, ou seja, como um sistema de partes inter- KANAANE, Roberto in Comportamento Humano nas Organizações – O Homem rumo ao Séc. XXI – Capítulo 4, página 81 – Ed. Atlas – 2ª. Edição – SP, 1999. 5 Filos. Arte do diálogo ou da discussão quer num sentido laudativo, como força de argumentação, quer num sentido pejorativo, como excessivo emprego de sutilezas. Conforme Hegel (v. hegelianismo), a natureza verdadeira e única da razão e do ser que são identificados um ao outro e se definem segundo o processo racional que procede pela união incessante de contrários -- tese e antítese -- numa categoria superior, a síntese. Segundo Marx (v. marxismo), o processo de descrição exata do real. 6 Dissonância = Desarmonia, discordância (de cores, de estilos, de opiniões, de formas etc.). 7 Cognitiva - Relativo à cognição ou ao conhecimento. 4 3 relacionadas que interagem com o seu ambiente de vida. Este ambiente, por sua vez, contém uma variedade enorme de forças externas que interagem e o pressionam. Nesse contexto, o comportamento humano pode também ser mais bem entendido se considerarmos cada indivíduo como uma unidade processadora das informações originadas de seu ambiente de vida. O comportamento humano estaria explicado e justificado em função da percepção que cada indivíduo tem do ambiente que o rodeia. Seu comportamento está sujeito, portanto, à sua visão etnocentrista8, também distorcida, porque influenciada por experiências passadas, expectativas, necessidades íntimas, conseqüências possíveis, campo psicológico etc. A abordagem dada por essas escolas leva-nos a concluir que o comportamento humano é influenciado por três diferentes perspectivas: fatores externos (ambientais) que envolvem o indivíduo influenciando-o permanentemente; fatores diretivos internos que são as características estruturais de cada personalidade; e os fatores dinâmicos internos que são os componentes dinamizadores da personalidade, as forças motivadoras que ativam e direcionam o comportamento humano. A ABORDAGEM DE CHIAVENATO Chiavenato defende a idéia de que, em linhas gerais, o ser humano, por natureza, é: a) transacional que não só recebe insumos do ambiente e reage a eles, mas também adota uma posição proativa, antecipando-se e, muitas vezes, provocando as mudanças que ocorrem em seu ambiente; b) de comportamento dirigido para um objetivo, o que significa dizer que é capaz de ter objetivos ou aspirações e de aplicar grandes esforços no sentido de alcançá-los; e, c) um modelo de sistema aberto, onde é dirigido para objetivos, interdependente do meio físico e social e ativamente envolvido em transações com esse ambiente à medida em que persegue seus objetivos. Esse enfoque leva-nos à idéia de que o comportamento estaria justificado pela premissa de que o ser humano, no geral, governaria suas atitudes com o objetivo de se manter sempre consonante com seus desejos e/ou receios. Nessa premissa foram construídas diversas teorias motivacionais que, de certa forma, buscaram justificar e compreender o comportamento humano. Citamos como exemplo, porque mais significativas, as teorias: Motivacional de Maslow, fundamentada no atendimento das necessidades primárias e secundárias do ser humano; a de Herzberg, alicerçada nos fatores satisfacientes e insatisfacientes (higiênicos); o Modelo Contingencial de Motivação de Victor H. Wroom (expectativas, recompensas e relação 8 Tendência do pensamento a considerar as categorias, normas e valores da própria sociedade ou cultura como parâmetro aplicável a todas as demais. 4 expectativa/recompensa) que originou a Teoria da Motivação de Objetivos Gradativos; e, a Teoria da Expectação de Lawler III, evidenciando que o dinheiro pode motivar o desempenho e, portanto, o comportamento humano. A ABORDAGEM BIOPSICOSOCIAL As teorias mais modernas sobre o comportamento humano apregoam que em última instância as pessoas buscam como retribuição de seus esforços a qualidade de vida. Adotaremos o conceito genérico de qualidade de vida como o resultado de um conjunto de ações adotadas pelo indivíduo que lhe assegure bem estar geral (Limongi-França 1996) 9. Nesse escopo, este conceito envolve uma série de aspectos que se auto-relacionam. É indispensável, entretanto, ressaltar a visão biopsicossocial nele embutido. Essa visão originou-se na medicina psicossomática, com Liposwiski, nos anos 1970, com o resgate da visão integrada e holística10 do ser humano em oposição à abordagem cartesiana, que divide o ser humano em partes. O ser humano não se divide, toda manifestação é complexa e interligada. Cada pessoa é como um complexo biopsicossocial composto de interfaces biológicas, psicológicas e sociais que reagem simultaneamente aos estímulos recebidos. A esfera biológica refere-se a características físicas, como metabolismo ou vulnerabilidade dos órgãos herdadas ou adquiridas no decorrer da vida. A esfera psicológica envolve as características que formam a personalidade de cada indivíduo. Incluem-se nessa categoria todos os processos afetivos, emocionais e de raciocínio. A esfera social relaciona os aspectos culturais da pessoa, com seus valores, suas crenças e os papéis no trabalho e na família. LIMONGI-FRANÇA, Ana Cristina e ZAIMA, Gustavo Zaima in GESTÃO DE QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO —— GQVT - Com ênfase em pessoas, equipes e liderança. Manual de Gestão de Pessoas e Equipes – 1ª. Edição - Editora Gente - SP, 2002. 10 Holismo = Teoria segundo a qual o homem é um todo indivisível, e que não pode ser explicado pelos seus distintos componentes (físico, psicológico ou psíquico), considerados separadamente. 9 5 Enfoque biopsicossocial — esfera biológica, psicológica e social A visão biopsicossocial da qualiidade de vida revela a preocupação com o indivíduo como um todo, adotando uma visão moderna e ampla do conceito de saúde. A saúde não é apenas a ausência de doença, mas também o completo bem-estar biológico, psicológico e social, como estabeleceu a Organização Mundial de Saúde nos anos 1980. A visão biopsicossocial possibilita a melhor compreensão do comportamento humano e e de sua interação com os diversos ambientes de vida, fornecendo indícios de disfunções com base na análise dos sintomas apresentados. COMPORTAMENTO HUMANO - TRINÔMIO: CORPO, ALMA E MENTE. Compreendida a dinâmica dos fatores que motivam o comportamento, sejam eles fundamentados na escola behaviorista (estímulo/resposta) ou na visão holística, o importante é ressaltar que a busca permanente do homem é por sua consonância com o mundo. O ser humano estará bem consigo mesmo a partir do momento em que corpo, mente e alma estejam estáveis, integrados e harmônicos quanto ao atendimento de suas necessidades mais íntimas. A busca desse equilíbrio é o que também, de certa forma, explica o comportamento humano dentro da perspectiva anunciada por Chiavenato: a de que o comportamento das 6 pessoas é dirigido para objetivos, interdependente do meio físico e social, ativo e permanentemente envolvido em transações com o ambiente à medida que persegue seus objetivos. Bibliografia KANAANE, Roberto. Comportamento Humano nas Organizações. São Paulo: Editora Atlas, 1999. CHIAVENATO, Idalberto. Recursos Humanos na Empresa. São Paulo: Editor Atlas, 1994. CHOWDHURY, Subir. Administração do Século XXI – O Estilo de Gerenciar Hoje e no Futuro. Editora Pearson Education, 2003. ______. Manual de Gestão de Equipes e Pessoas. Volume II. São Paulo: Editora Gente, 2002. ______. Dicionário Aurélio – São Paulo: 2002.