Aprendizagem e Memória CARATERÍSTICAS E RELAÇÕES (2) Aprendizagem Definição: A aprendizagem é um processo através do qual os seres vivos adquirem novos conhecimentos, desenvolvem novas competências e mudam os seus comportamentos, ou seja, a aprendizagem é uma modificação de comportamentos e de atitudes relativamente duradoura, que deriva da experiência e da prática e não da maturação ou de transformações físicas e fisiológicas. Aprendizagem por habituação A aprendizagem por habituação consiste na diminuição da tendência para responder a um certo estímulo. Este tipo de aprendizagem não associativa dá origem a que o ser humano consiga ignorar o que lhe é familiar e a focar o que realmente lhe interessa. A habituação torna possível que nos desliguemos de estímulos desnecessários e nos concentremos nas tarefas que estamos a realizar. Através dela respondemos a novos estímulos que podem ser perigosos e ignoramos estímulos que já reconhecemos serem inofensivos. Exemplo: Imaginemos que o Bruno está em casa a estudar e que o vizinho de baixo começa a martelar pregos na parede. Ao início, Bruno desconcentra-se e não consegue estudar, mas depois, Bruno habitua-se ao barulho e consegue novamente concentrar-se no seu estudo. Nesta fase é como se o barulho proporcionado pelo martelo não existisse. Aprendizagem por condicionamento clássico O que é? É uma forma de aprendizagem em que um estímulo neutro, ao ser sucessivamente emparelhado com um estímulo incondicionado, acaba, ao fim de algum tempo e em virtude deste condicionamento, por provocar o mesmo tipo de resposta do que o estímulo com o qual foi emparelhado. Torna – se assim um estímulo que por si só provoca uma resposta condicionada, similar à desencadeada pelo estímulo incondicionado ou natural. Experimentação de Pavlov Pavlov ao estudar a fisiologia da digestão, descobriu que os cães utilizados salivavam perante estímulos que não a comida (o som dos passos do tratador ou a sua simples presença). Tal descoberta levou a que Pavlov desenvolve-se estudos que consistiam na apresentação ao cão de um estímulo neutro (o som de uma campainha) e logo imediatamente a seguir um prato com carne em pó. O cão responde a este estímulo (não - condicionado) salivando. Depois de emparelhar o som da campainha e a comida várias vezes (20 vezes pelo menos) Pavlov verificou que o som da campainha era suficiente para produzir a resposta de salivação. Como os cães não salivam naturalmente em resposta a sons, Pavlov concluiu que a salivação era uma resposta resultante de aprendizagem: o cão foi condicionado a salivar quando a campainha toca (resposta condicionada). Exemplos em seres humanos O condicionamento clássico está sempre presente no nosso quotidiano. Por exemplo, o Miguel é um individuo que esteve na guerra do Vietname, onde via e ouvia aviões de guerra, que disparavam tiros mortíferos, a passar mesmo por cima da sua cabeça. Agora, Miguel mora numa cidade pacata mas, no entanto, quando Miguel ouve o som de um avião comercial, associa esse som ao de um avião de guerra e sentimentos como o medo, o perigo e o desespero despertam no Miguel como se estivesse perante uma situação de guerra. Aqui, o estímulo neutro – o som do avião comercial - é emparelhado com o estímulo incondicionado – o som do avião de guerra – que provoca uma resposta incondicionada ou natural – incómodo e medo, causados pelo som intenso. Por causa desta associação o estímulo neutro perde a sua neutralidade e passa a provocar o mesmo tipo de resposta do que o estímulo incondicionado (que provoca uma dada resposta sem ter de ser associado a nada). Existem cinco princípios básicos na aprendizagem por condicionamento clássico. 1 – Aquisição: formação de uma resposta aprendida a um estímulo neutro (não produtor de resposta) por o associarmos a um estímulo não condicionado. 2 -Extinção: enfraquecimento e eventual desaparição da resposta aprendida. A extinção é, em suma, o resultado da repetida apresentação do estímulo condicionado sozinho. 3 -Recuperação espontânea: reemergência de uma resposta condicionada extinta após algum tempo de descanso. 4– Generalização: Fala-se de generalização do estímulo quando a resposta condicionada é provocada não só pelo estímulo condicionado original como também por outros estímulos semelhantes a este. 5 – Discriminação: consiste na aptidão de discernir estímulos semelhantes, produzindo a resposta apenas no estímulo correto. Aprendizagem por condicionamento operante A aprendizagem por condicionamento operante consiste em associar um comportamento às suas consequências e efeitos. O condicionamento operante é uma forma de aprendizagem em que um dado comportamento de caráter ativo (operante no meio) é reforçado ou enfraquecido tendo em conta as suas consequências: conforme as consequências da ação assim ela tenderá a aumentar ou a diminuir (ou a extinguir-se) no futuro. Considera-se que o condicionamento operante foi descoberto por Edward Thorndike mais ou menos na mesma época em que Pavlov descobria os reflexos condicionados nos seus experimentos com cães. O experimento de Thorndike consistia no seguinte: colocou um gato no interior de uma caixa com aspeto de jaula. No exterior estava, à vista do gato, um recipiente com comida. O animal só poderia sair da caixa se carregasse num pedal que, accionado, abria uma pequena porta. O gato começou a arranhar e a morder ao acaso várias partes da caixa até que, de uma forma eventualmente acidental, pressionou o pedal que a abria e obteve a comida desejada. A partir daí, várias vezes colocado no interior da caixa, o gato gastou cada vez menos tempo para dela sair. Da primeira vez que repetiu a situação Thorndike reparou que o gato escapou da caixa em 15 segundos. Esta mudança de comportamento significava que o gato tinha aprendido não mediante um reflexo condicionado mas mediante tentativas cada vez mais eficazes que traduziam um papel ativo na aprendizagem. Thorndike explicou esta aprendizagem gradual e progressiva através da lei do efeito: «Respostas ou comportamentos seguidos por consequências ou efeitos satisfatórios tendem a repetir-se; respostas seguidas por consequências desagradáveis tendem a não se repetir». Experimentação de Skinner O primeiro projeto de investigação de Skinner consistia numa análise ao comportamento alimentar dos ratos. Skinner utilizou um artefacto por ele próprio construído e que tem hoje o seu nome: «A caixa de Skinner». Colocou dentro um rato com fome. O rato só poderia obter comida pressionando uma alavanca que libertava pequenas bolas de queijo de um recipiente numa das paredes da caixa. O rato começou imediatamente a explorar a caixa e ao fim de algum tempo, acidentalmente, pressionou a alavanca e a comida caiu. Progressivamente, o animal começou a pressionar a alavanca em intervalos de tempo cada vez menores. Segundo Skinner isso significava que aprendeu a obter comida mediante uma resposta condicionada pelas consequências ou efeitos da sua ação A partir desta e de muitas outras experimentações Skinner definiu a tese essencial do condicionamento operante: um organismo tende a repetir as respostas que têm consequências favoráveis. Reforço e punição O condicionamento operante é segundo Skinner uma forma de aprendizagem na qual a probabilidade de ocorrência de uma resposta ou comportamento aumenta ou diminui conforme a sua consequência é um reforço (positivo ou negativo) ou uma punição. Reforço: toda e qualquer consequência de uma ação que fortalece a nossa tendência para a repetir. Punição: toda e qualquer consequência de uma ação que enfraquece a nossa tendência para a repetir. Há ações que têm consequências boas e outras que têm consequências más, por exemplo, se fazemos dieta para emagrecer e emagrecemos efetivamente, é considerada uma ação com boas consequências. Por outro lado, se assaltássemos um banco, podíamos ser apanhados pela policia e aí a ação realizada seria considerada uma ação com más consequências. Reforço positivo ou negativo Reforço positivo: está-se perante uma situação de reforço positivo sempre que uma ação, em virtude das suas consequências, nos permite obter algo agradável. Tendemos, por isso, a repeti-la, de modo a fazer com que o reforço ocorra de novo. Ex: Estudar muito para conseguir ingressar na universidade. Reforço negativo: quando uma ação tem como consequência evitar uma situação indesejável, remover um obstáculo ou pôr termo a uma situação desagradável. Tende por isso a ser repetida. Ex: Trabalhar bem e evitar assim ser despedido. Punição Punir um comportamento é tornar provável que ele não se repita ou pelo menos que diminua a sua frequência. Por exemplo, se a Marta ajuda os pais na lida da casa para poder ir sair à noite com os amigos, é muito provável que o comportamento se repita no futuro para poder sair com os amigos sempre que queira. O comportamento – ajudar os pais na lida da casa – é reforçado negativamente: é um meio para evitar algo desagradável (não poder sair com os amigos). Se a Marta recusa ajudar os pais na lida da casa, os pais proíbem-na de sair com os amigos. Assim, estamos perante uma punição, um meio para retirar algo agradável ou para evitar que se repita algo de desagradável. Aprendizagem por observação e imitação A aprendizagem por observação é uma forma muito frequente de aprendizagem que ocorre quando o comportamento de um indivíduo é influenciado ou condicionado pelo comportamento de outros indivíduos denominados modelos. É uma aprendizagem social porque ocorre em contexto social. Tendo em conta que aprendemos identificando-nos e imitando um modelo (indivíduo que «demonstra» ou efectua uma ação constituindo-se como potencial exemplo a seguir), este tipo de aprendizagem recebe também o nome de aprendizagem por modelação. Condições necessárias para haver aprendizagem observacional: • Atenção Não é suficiente observar. Deve-se prestar atenção ao que o modelo observado faz, identificando a sua conduta. • Retenção Para imitar o comportamento de um modelo temos de o armazenar ativamente na memória, o que implica a representação mental das ações do modelo observado e a prática dos elementos, sequências ou etapas do comportamento. • Execução Memorizado o comportamento desejado, é necessário convertê-lo em ação, o que pode exigir bastante tempo e treino. • Motivação e reforço O desempenho de algo que adquirimos mediante observação depende da motivação ou incentivo para o efectuar. Fatores que influenciam a aprendizagem observacional: • Nível de desenvolvimento do observador Conforme vamos crescendo somos capazes de concentrar a nossa atenção durante mais tempo, de processar cada vez melhor a informação e de nos auto-motivarmos. • Estatuto do modelo As crianças, por exemplo, revelam uma acentuada tendência para imitarem as ações de pessoas que consideram prestigiadas, famosas e de quem gostam (pais, irmãos mais velhos, professores, atletas, heróis de filmes de ação, estrelas rock). Esta tendência depende da idade e dos interesses da criança. • Consequências vicariantes Observando as consequências das ações dos potenciais modelos obtemos informação sobre o que é apropriado para nós e sobre as prováveis consequências da imitação da conduta de quem observamos. As consequências positivas (que não são necessariamente de reconhecido valor moral) motivam os observadores. • Autoeficácia Os observadores tendem a imitar determinados modelos quando acreditam que são capazes de aprender e de desempenhar o comportamento - modelo, isto é, quando possuem um certo nível de autoconfiança e de autoeficácia. Experimentação de Bandura Para demonstrar a sua teoria sobre a aprendizagem por modelação, Bandura mostrou a crianças com quatro anos de idade um filme em que um adulto esmurrava e pontapeava um boneco insuflável. Bandura dividiu o grupo de 66 crianças em três grupos de 22 elementos cada. No filme um modelo adulto encaminhava-se na direcção do boneco insuflável e ordenava-lhe que saísse da sua frente, o boneco não «obedecia» e era vítima de uma série de atos agressivos. Todas as crianças assistiram a estes comportamentos agressivos mas o pequeno filme tinha um final diferente por cada grupo de crianças, ou seja, três versões diferentes das consequências do comportamento do adulto eram exibidas. Assim, um grupo de crianças viu que o adulto agressivo era recompensado por um outro adulto que o elogiava chamando-lhe «campeão» e lhe dava uma grande quantidade de doces e de refrigerantes. Bandura designou este grupo de crianças como grupo do modelo recompensado; o segundo grupo de crianças, que, é claro, estava a ver o filme numa sala diferente, assistiu a uma versão final completamente diferente: o adulto agressivo foi asperamente censurado por um outro adulto que lhe chamou «má pessoa». Bandura deu a este grupo de crianças o nome de grupo do modelo punido; quanto ao terceiro grupo, assistiu aos comportamentos agressivos mas não lhe foi exibido nenhum final mostrando se as consequências de tais comportamentos eram positivas ou negativas. Bandura deu-lhe o nome de grupo de condição neutral. Depois da exibição das diferentes versões do filme foi permitido às crianças dos vários grupos brincarem com o boneco insuflável e outros brinquedos. Como Bandura previra, as crianças do grupo que vira o adulto ser recompensado pelo seu comportamento agressivo mostraram maior índice de agressividade do que as outras, imitando os atos do adulto. As crianças de todos os grupos tinham aprendido de igual modo a reproduzir mentalmente os diversos comportamentos agressivos observados, isto é, estavam em condições de desempenhar o comportamento do modelo igualmente bem e de forma precisa. Métodos de aprendizagem • Aprendizagem espaçada É um método de aprendizagem que distribui ao longo do tempo e de forma regular o que se está a aprender. É considerado o melhor método para consolidar e armazenar a longo prazo as aprendizagens efetuadas. • Aprendizagem concentrada É um método de aprendizagem que consiste em estudar intensivamente e sem intervalos de tempo significativos. Relação entre aprendizagem e memória É a aprendizagem que determina o nosso pensamento, a nossa linguagem, as motivações, as atitudes e a personalidade. Existem aprendizagens simples e aprendizagens complexas que implicam uma atividade mental diversificada. Inerente aos processos de aprendizagem está a memória. Só a memória nos possibilita reter o que aprendemos, para responder adequadamente à situação presente e proporcionar a possibilidade de projetar o futuro. A memória é a condição que torna possíveis os processos de aprendizagem. Só aprendemos quando o que adquirimos é retido e passível de recuperação. O próprio conceito de aprendizagem implica o de memória. Com efeito, a aprendizagem é uma mudança relativamente estável no comportamento como resultado da prática e da experiência. A estabilidade e a mudança dependem da memória: o novo saber só é novo se o anterior não tiver desaparecido e enquadra-se ou engloba os saberes possuídos como ultrapassados. Não poderíamos aplicar o saber adquirido a novas situações sem a relativa permanência que a memória assegura. Conclusão Tanto a aprendizagem como a memória são funções e capacidades essenciais para a nossa vida. A aprendizagem permite-nos adquirir novos conhecimentos, desenvolver novas competências e mudar os nossos comportamentos. A memória permite-nos adquirir e armazenar informação para a utilizarmos nas mais diversas situações da vida. A aprendizagem não existe sem a memória e vice-versa. Sem a aprendizagem, não conseguiríamos fazer coisas que nos são tão comuns, como por exemplo, ser estudante. Sem a memória, seriamos incapazes de existir simplesmente, pois, por exemplo, é através dela que conseguimos realizar até os mais básicos movimentos psicomotores.