Entenda a discussão sobre austeridade fiscal na Europa Após a vitória do socialista François Hollande nas eleições presidenciais da França, o debate em torno das medidas de austeridade implementadas pelos países da União Europeia para conter a crise financeira voltou a ganhar força. Tendo como principal promessa de campanha a renegociação do pacto fiscal firmado por 25 dos 27 países do bloco, Hollande defende que a Europa passe a se focar em medidas de estímulo ao crescimento – argumentando que os cortes não têm sido eficientes para combater os efeitos da turbulência financeira. “A Europa está nos observando, a austeridade não pode mais ser a única opção”, disse o político ao defender que os europeus estão insatisfeitos com as medidas tomadas pelos governos do bloco. Suas propostas, que já receberam uma clara negativa da maior economia europeia, a Alemanha, devem ter impacto sobre a Grécia, país mais afetado pela crise e que vive um momento crítico ao tentar formar um novo governo depois de eleições nas quais não houve maioria eleita em nenhum partido. O que é a austeridade? Entre as medidas de austeridade que podem ser implementadas por governos estão o aumento de impostos e cortes orçamentários. O objetivo é reduzir o deficit de um país, ou seja, o excesso de despesas em relação à receita anual dos cofres públicos. Após a crise financeira internacional de 2008, os níveis de endividamento dos governos - o total de todos os empréstimos - aumentou consideravelmente. Além disso, com os efeitos da turbulência sobre o setor privado (sobretudo nas instituições financeiras) e a consequente recessão, a arrecadação de impostos diminuiu. Os governos também foram acusados de terem gasto demais durante as “vacas gordas” e se viram sob pressão para gastar ainda mais para resgatar os bancos. Houve então um consenso entre líderes e instituições internacionais sobre a introdução de medidas de austeridade como o melhor caminho para lidar com a crise do deficit que atingiu sobretudo os Estados Unidos e a zona do euro. Na época houve ainda a crença de que os mercados “puniriam” os países que não estivessem fazendo o suficiente para reduzir seus deficits ao elevar os custos de novos empréstimos. Qual é o problema da austeridade? As medidas de austeridade se tornaram altamente impopulares com o público, já que de forma geral têm como resultado cortes em serviços públicos, aumento da idade de aposentadorias e reduções salariais para aposentados e funcionários públicos. Outra crítica é que tais medidas afetam o crescimento. “A austeridade por si só corre o risco de ser autodestrutiva, com a redução da demanda interna em linha com o aumento da preocupação do consumidor em relação aos empregos e aos salários, erodindo assim a geração de impostos”, disse a agência de classificação de risco Standard & Poor’s ao reduzir a nota de crédito da França no início deste ano. 1 Hollande não está sozinho ao defender que medidas que levem ao estímulo do crescimento são mais importantes. Muitos economistas renomados são favoráveis a essa ideia, entre eles o Prêmio Nobel Joseph Stiglitz. Mas, muitos apontam para o caso dos EUA, que decidiram não cortar os gastos tão rápido e de forma tão intensa. Embora a economia americana tenha crescido mais do que a do Reino Unido, por exemplo, a taxa de expansão continua lenta e o nível de desemprego continua alto, o que para alguns é visto como um sinal de que a estratégia de Washington pode não estar tão certa assim. Quais são as alternativas? Certos analistas e economistas argumentaram desde o início da crise que as medidas de austeridade não eram inevitáveis, ou seja, que as economias desenvolvidas poderiam começar a lidar com a turbulência financeira sem implementar cortes tão drásticos. Olli Rehn, comissário europeu para assuntos econômicos e monetários diz que a Europa precisa atingir um equilíbrio entre a redução de gastos e o estímulo ao crescimento. “A consolidação fiscal, quando necessária, [deve ser] feita em um ambiente propício ao crescimento e de forma diferenciada, para chegar a um equilíbrio entre a necessidade de consolidação fiscal e as preocupações com o crescimento”, avalia. O que Hollande propõe? O socialista que assumirá como novo presidente da França argumentou em sua campanha que o pacto fiscal firmado pela zona do euro precisa ser revisto para que mais ênfase ao crescimento seja introduzida nos termos do acordo. Para estimular o crescimento na França, ele disse que pretende criar 150 mil novos empregos e que deve introduzir duas novas e mais altas taxas de impostos, criar um novo imposto sobre transações financeiras e aumentar os tributos pagos pelos bancos. No entanto, alguns dizem que as propostas são apenas um tipo diferente de austeridade, com alvo nos mais ricos. É possível renegociar o pacto fiscal da União Europeia? O pacto fiscal europeu foi firmado por 25 dos 27 países que integram a União Europeia e está agora em processo de ratificação pelos Parlamentos de cada membro. O objetivo principal é tornar os governos mais disciplinados com relação às suas finanças e convencer os mercados de que os países europeus não terão mais a possibilidade de descontrole de seus gastos. As propostas de Hollande, de que o pacto deve passar a focar mais em crescimento, devem movimentar a política europeia. O editor de economia do Serviço Mundial da BBC, Andrew Walker, disse que há algumas semanas as queixas de Hollande poderiam entrar em conflito com os mentores do acordo fiscal costurado a duras penas. No entanto, nos últimos dias há cada vez mais sinais de uma mudança de ênfase nos países da zona do euro em direção a mais crescimento e menos austeridade, o que significa que o socialista francês pode ter suas ideias levadas em consideração. 2 Para a analista Pippa Malgrem, no entanto, os líderes eleitos no cenário pós-crise encontrarão dificuldades para se distanciarem das políticas de austeridade. Os países da zona do euro ainda precisam honrar pagamentos e por isso precisam “apertar o cinto”, diz. A Alemanha já descartou renegociar o atual pacto fiscal em processo de implementação mas disse que avalia a possibilidade de assinar um acordo em separado que possa aumentar a competitividade e fomentar o retorno do crescimento. E quanto à Grécia? O resgate pode estar ameaçado? Mais uma vez o futuro da Grécia voltou a ser colocado em dúvida após o resultado das eleições realizadas no país no fim de semana, nas quais nenhum partido conquistou mais de 20% dos votos. O partido Nova Democracia já tentou nesta segunda-feira formar um governo de apoio ao pacote de ajuda internacional costurado com a União Europeia, FMI (Fundo Monetário Internacional) e Banco Central Europeu, mas fracassou. Agora o líder da coalizão de esquerda Syriza deve tentar um governo alternativo. Caso o país passe a ser governado por esta coalizão, o pacote de ajuda internacional pode ser colocado em risco e caberia ao FMI e aos outros membros da zona do euro decidirem se o acordo de resgate do país seria mantido ou não. Na ausência de um acordo Atenas poderia abandonar a moeda única. Fonte BBC BRASIL. Entenda a discussão sobre austeridade fiscal na Europa. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/05/120507_qa_austeridade_europa_jp.sht ml>. Acesso em: 20 maio 2013. 3