O Globo, 2 jul 2015 Entrevista Luiz Carlos Prado ‘Recessão é comparável à Grande Depressão dos anos 30’ ZoomMarcarPartilharImprimirTraduzir Para professor da UFRJ, ajuste proposto pode gerar grave crise social e, como na América Latina dos anos 1980, não daria certo PETROS KARADJIAS/APImpasse. Cartaz no centro de Atenas, defendendo o “não” no referendo do próximo domingo: a população votará a favor ou contra o acordo com a UE As demandas da Grécia são justas? Hoje, na Grécia, o aposentado mais velho está sustentando os familiares desempregados. Um corte nas aposentadorias terá um impacto muito grande entre aqueles que já estão desempregados. O grau de queda do nível de atividade da Grécia é comparável ao da Grande Depressão dos anos 1930. A economia grega não recuou 1%, 2% ou 3%, foi mais de 20%. Imagine um cenário desse na Alemanha, na França, ou até mesmo na Espanha. Independentemente dos equívocos da política grega, que realmente ocorreram, o grau de ajuste gera desequilíbrios sociais muito graves. Estão forçando a Grécia a fazer um ajuste por tempo indefinido. Isso aconteceu na Alemanha nos 1920 e na América Latina na década de 80, e não deu certo. Qual a solução? Os credores da Grécia teriam que diminuir o tamanho da dívida. Os credores não aceitam isso. Não adianta um corte de 20% e 30%, é necessário um corte ainda maior. Na estrutura atual, não tem muito modelo alternativo. Essa situação de austeridade vem desde 2010 e vai se estender por tempo indeterminado. Daqui a três, quatro anos, o país vai viver outra crise dessa com a economia mais fragilizada. É melhor para Grécia sair da zona do euro? Se a Grécia sair, vai suspender o pagamento de todas as dívidas. A perda para os credores será real. Mas o poder aquisitivo da população grega vai cair. Acontece o pior dos mundos, os dois perdem. Aceitar o acordo, sob o ponto vista estritamente econômico, talvez seja menos ruim. Os aposentados perdem, mas a moeda se mantém estável. Politicamente, porém, pode ser inviável, já que não oferece uma perspectiva de melhoria, principalmente para a população que está sofrendo com taxa de desemprego de mais de 25%. Com a saída do euro, a moeda grega desvaloriza e vai haver uma pressão inflacionária muito grande e o país fica fora do mercado financeiro internacional. Há risco para zona do euro se houver a saída da Grécia? Países como Portugal e Espanha, que sofreram com a crise da dívida soberana, podem tomar o mesmo caminho. A partir do momento que o primeiro país sair, a zona do euro pode começar a se fragmentar. Mas não há qualquer procedimento de saída. Quando o euro foi assinado, ninguém pensou nesse processo. Mas a União Europeia não quer abrir mão da austeridade. Mas há toda uma geração sem perspectiva de trabalho na Grécia. Esses jovens estão mais impacientes, os movimentos nas ruas estão ficando mais radicais. Se o referendo disser “não” para o acordo, eu suspeito que a União Europeia vai propor um novo acordo. O “não” alavanca politicamente o governo grego. Os críticos afirmam que a Grécia não tem ajustado suas contas públicas. A Grécia tem feito o ajuste sim, a ponto de a economia já ter caído bastante. Cortou salários de funcionários, mas se quer que se aumente continuamente a idade da aposentadoria. Já não tem muito o que privatizar. Mas não podemos negar que houve má gestão pública na Grécia.