Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde – FEPECS Escola Superior de Ciências da Saúde – ESCS Hospital Regional da Asa Sul – HRAS Internato em Pediatria Dionísio de Figueiredo Lopes José Gilmar Gomes Júnior Coordenação: Sueli R. Falcão www.paulomargotto.com.br 2/9/2008 IDENTIFICAÇÃO: L.F.G.N, 12 anos, masculino, pardo, estudante, natural de Brasília e residente em São Sebastião; QP: “Dor nas juntas há 3 semanas” HDA: Paciente com dor em grandes articulações (punho, tornozelo e joelho) há 3 semanas, constante, moderada, migratória, com presença de edema, sem deformidade, que piorava à noite, melhora parcialmente com uso de analgésico comum. Febre predominantemente noturna (38,50 – 390 C), que cedia com uso de antitérmicos. REVISÃO DE SISTEMAS: Quadro febril 1 semana antes do quadro atual; Odinofagia 1 semana antes do quadro atual; Sem demais queixas. ANTECEDENTES FISIOLÓGICOS: Parto normal, à termo; chorou ao nascimento. Peso: 5300 g Estatura: 50 cm Crescimento e desenvolvimento adequado para a idade. Vacinação em dia. ANTECEDENTES PATOLÓGICOS Nega patologias prévias (doenças comuns da infância), traumas e/ou cirurgia, uso de medicamentos, alergia medicamentosa; Refere hospitalização há 3 anos por quadro semelhante. ANTECEDENTES FAMILIARES Pai falecido por Chagas; Nega demais patologias na família. HÁBITOS DE VIDA Mora em casa de alvenaria, com água encanada e rede de esgoto, sem animal de estimação; Nega etilismo e tabagismo, bem como uso de drogas; Não iniciou vida sexual. EXAME FÍSICO Sinais vitais: T: 36,50 PA: 110 X 70 mmHg FC:76bpm FR16 ipm BEG, hidratado, normocorado, eupnéico, afebril ao toque, acianótico, anictérico, lúcido e orientado no tempo e espaço. Pele, mucosas e linfonodos sem alterações. Olhos, ouvido, cavidade nasal e oral sem alterações. Dentes em bom estado de conservação. AR – Tórax simétrico, sem retrações, boa expansibilidade. MVF, s/ ruídos adventícios; EXAME FÍSICO ACV – Precórdio calmo, ictus visível no 5 EIC linha hemiclavicular, medindo 2 polpas digitais.RCR, 2T, BNF, presença de sopro sistólico(2+/6) em focos mitral, tricúspide, sopro diastólico (3+/6) em aórtico acessório, com irradiação para carótidas, sem frêmito. Pulsos periféricos com boa amplitude, freqüência regular e simétricos. Abdome – Plano, RHA +, depressível, normotenso, indolor a palpação, s/ VMG e/ou massas palpáveis. Extremidades – Dor à palpação e edema em tornozelo D e joelho D. Boa perfusão. Hipóteses diagnósticas Febre reumática; Endocardite infecciosa; Anemias hemolíticas - anemia falciforme; Leucoses - leucemia linfoblástica aguda; Colagenoses: LES; Cardite viral. Exames complementares Hemograma completo: Leucócitos 11200 - Hemoglobina 9,6mg/dl Seg 67% Bast 03% Linf 23% Mono 06% Eos 01% EAS sem alterações; Rx tórax; Exames complementares Atividade inflamatória: VHS: 60 PCR: 4,47 ASLO: 2410 GAC: 249 ECG ECOCARDIOGRAMA CINTILOGRAFIA “A Febre Reumática lambe as articulações e morde o coração...” Alguém em seu leito de morte Definição Complicação não supurativa (autoimune) da infecção da orofaringe streptococcus b-hemolítico do grupo A de Lancefield, Hospedeiro susceptível Infecções cutâneas pelo streptococcus B-hemolítico não causam DR São nefritogênicos Causam glomerulonefrite aguda Epidemiologia Característica de países subdesenvolvidos Baixo nível socioeconômico Crianças e adolescentes (5 – 15 anos) Incidência – 100 a 200/100 mil crianças 3% Faringoamigdalites não tratadas DR Fatores de Risco História prévia de Febre Reumática - Caráter recidivante em 20% dos casos - Freqüência 2-5 primeiros anos - Cardite reumática 50% - Penicilina G reduz de 20% para 2% Magnitude da resposta imunológica - Títulos de Antiestreptolisina O (ASO) - Altos títulos 5X mais chance DR Patogenia IVAS Anticorpos Semelhança antigênica Auto-anticorpos 1-4 semanas latência Resposta inflamatória sistêmica Streptococcus beta-hemolítico do grupo A Articulações Tropomiosina Endotélio vascular Núcleo caudado talâmico e subtalâmico Resposta inflamatória sistêmica Manifestações Clínicas Fase Aguda: - Febre - Sintomas Gerais (Artralgia) - Poliartrite 60 – 80% - Cardite 50% - Coréia 20% - Eritema Marginatum - Nódulos subcutâneos 5% Poliartrite Ocorre até a 3a semana Duração de 2 – 4 semanas Poliarticular, assimétrica e migratória Grandes articulações periféricas (1-5 dias em cada) Resposta dramática aos salicilatos (até 48 h) Líquido sinovial - 5000 a 20000 leucócitos/mm3 Cardite Duração de até 2 meses Pancardite reumática - Endocárdio, miocárdio e pericárdio Cardite Leve: - Taquicardia sinusal (desproporcional a febre) - Alargamento de PR - Hipofonese de B1 - Sopros discretos em foco mitral Cardite Cardite Moderada: dor precordial - Sinais de Pericardite aguda atrito pericárdico - Sopros exuberantes: Mitral ou aórtico - Aumento moderado da área cardíaca (Rx) - ECG – sobrecarga ventricular ou derrame pericárdico - Pode haver aumento de QT Cardite Cardite Grave - Sinais e Sintomas de IC - Astenia - Palidez - Anorexia - Taquipnéia - Hepatomegalia - Edema - Ritmo de galope - Estase jugular Endocardite e Valvulite Sopros presentes em 80% das Cardites Reumáticas Endocardite Disfunção Valvar Aguda Valva edemaciada e amolecida Regurgitação valvar Sopro da Insuficiência Mitral Mais comum Holo ou protossistólico Média/alta freqüência Mais nítido com o diafragma Melhor audível na ponta De grande intensidade (3-4+/6+) Irradiação para axila ou dorso Leve a moderada repercussão hemodinâmica Sopro de Carey-Coombs Praticamente igual à um sopro de estenose mitral ( ≠ estalido de abertura e hiperfonese de B1) Ruflar mesodiastólico Audível na ponta (decúbito lateral esquerdo) De baixa freqüência Mais nítido com a campânula Baixa intensidade Hiperfluxo através de uma valva mitral inflamada Sopro da Insuficiência Aórtica Aguda Menos freqüente Sopro protodiastólico Timbre característico Mais bem audível no foco aórtico acessório Leve a moderada repercussão hemodinâmica Ecocardiograma Espessamentos e insuficiências valvares Pequenas verrucosidades nas bordas das válvulas (característicos da DR) Miocardite Reumática Subclínico na maioria das vezes Aumento da área cardiaca no Rx Aumento dos volumes ventriculares no Eco Pode ocorrer: - Dispnéia aos esforços - Anasarca - Turgência jugular - Hepatomegalia - 3a bulha cardíaca Nódulos de Aschoff Patognomônicos de DR 80 – 90% dos casos Lesões inflamatórias caracterizadas pela presença de necrose fibrinóide central, cercada por histiócitos modificados (células gigantes de Aschoff Pericardite Reumática 5 – 10% dos casos Muitas vezes assintomática Diagnóstico nesse caso Ausculta : Atrito Pericárdico Eco: Derrame Pericárdico ECG: - Supra ST côncavo em várias derivações - Infra PR Pericardite Reumática Quando Sintomático - Dor retroesternal ou precordial - Piora com o decúbito dorsal - Melhora com a posição sentada e flexão do tronco Tamponamento é raro Pericardite exsudativa Compromete ambos os folhetos pericárdicos Aspecto em “pão com manteiga” Eritema Marginatum Rash eritematoso maculopapular Bordas nítidas avermelhadas Serpiginosas Centro claro Não pruriginosa, nem dolorosa Tronco e porções proximais dos membros Caráter migratório Duração de semanas ou meses Eritema Marginatum Nódulos Subcutâneos Nódulos firmes, indolores Medindo 0,5 a 2 cm Solitários, numerosos, sem sinais flogísticos Localização: - Superfícies distais extensoras dos membros - Tendões - Proeminências ósseas Quando associado a Cardite esta costuma ser grave Início em 3 semanas após a cardite Duração de 1 – 2 semanas Coréia de Sydenham “Dança de São Vito” 1 – 6 meses após o início do quadro (geralmente após dos outros sintomas maiores) Tipo de movimento involuntário - Movimentos bruscos e fora de propósito - Extremidades e face 2 : 1 / 5 – 15 anos Disartria e movimentos involuntários da língua Desaparecem com o sono e a sedação Pioram com o stress Autolimitada (3 - 4 meses) Alterações Laboratoriais PCR – aumentado - Primeiro marcador a subir (1as 24h) - Primeiro a normalizar (final da 2a semana) VHS - aumentado - Segundo marcador a subir (50 – 100 mm/h) < 10 mm/h < 20 mm/h Muco proteínas - aumentado - Último a se elevar (6 – 9 mg/dl) - Normal (até 4 mg/dl) Provas Imunológicas FAN e fator reumatóide negativos ASO aumentado em 80% dos casos Elevado por 1 – 6 meses após fim at. Reumática ASO Anti-DNAse B Anti-Hialuronidase 95% Diagnóstico 1944 – T. Duckett Jones - Critérios clínicos p/ diagnóstico 1992 – American Heart Association - Reformulação dos critérios Critérios de Jones modificados 2 critérios maiores ou 1 maior e 2 menores Obs.: Coréia isolada permite o diagnóstico Critérios de Jones Erradicação do S. pyogenes Penicilina G benzatina, IM – dose única - 1.200.000 UI adulto - 600.000 UI criança com menos de 25 Kg Penicilina V oral - crianças: 250mg - 8/8h - p/ 10 dias - adultos: 500mg - 8/8h - p/ 10 dias Eritromicina - 40 mg/Kg/dia (dividido 3 – 4 doses) p/ 10 dias Poliartrite, Febre e Sintomas Gerais Agentes antiinflamatórios – AAS - 4 tomadas diárias de: - crianças – 100 mg/Kg/dia - adulto – 3g/dia Resposta dramática Dose máxima até cessar os sintomas 2/3 da dose até normalizar os marcadores Após, redução paulatina. Se resposta ruim em adultos, fazer prednisona 1mg/Kg/dia Cardite Reumática Prednisona - 1–2mg/Kg/dia VO, em 3-4 tomadas diárias (não ultrapassar 60 mg/dia) - mantida por 2 – 3 meses em dose plena - após, retirada progressiva - associar AAS 75 mg/Kg/dia durante a retirada Alguns pacientes tem indicação de cirurgia de troca valvar Coréia Ambiente tranqüilo Benzodiazepínicos Carbamazepina Haloperidol – pode induzir seqüelas graves - 1 mg/dia pela manhã Profilaxia Profilaxia Primária - Penicilina G benzatina 1.200.000 UI, IM, dose única Profilaxia Secundária - Penicilina G benzatina 1.200.000 UI, IM, 21/21 dias 600.000 UI em crianças < 25 Kg Profilaxia Duração Sem Cardite - Mínimo de 5 anos - Pelo menos até os 21 anos Com Cardite sem doença valvar - Mínimo de 10 anos - Pelo menos até os 25 anos Com Cardite e lesão valvar - Mínimo de 10 anos - Pelo menos até os 40 anos