Brasil no cenário internacional Márcio G. P. Garcia Professor Associado Departamento de Economia - PUC-Rio BM&F 1º Congresso Internacional de Derivativos e Mercado Financeiro Campos do Jordão, SP – 22 de agosto, 2003 Do ponto de vista do Brasil, a maior inserção na economia mundial (comercial e financeira) é vista como a melhor forma de promover o crescimento econômico sustentado. (Vide discurso de FHC na abertura deste congresso.) O crescimento econômico sustentado é indispensável para se atingirem os inadiáveis objetivos sociais de redução da pobreza, erradicação da miséria e da fome e mais justa distribuição de renda. Como obter o retorno ao crescimento sustentado em um ambiente de maior integração econômica internacional? O crescimento econômico advém da incorporação de novos fatores de produção (capital e trabalho) e do aumento da produtividade dos fatores, normalmente associado à incorporação de novas tecnologias. Ou seja, é preciso investir. Quem vai investir? O governo? (outras funções prioritárias e está “quebrado”) O setor privado (nacional e estrangeiro). A maior inserção do Brasil na economia mundial só trará os benefícios pretendidos se houver um aumento do investimento produtivo. Portanto, é natural investiguemos os determinantes do investimento produtivo. O que diz a teoria econômica sobre os determinantes do investimento produtivo? Visão tradicional 1. Calcule o valor presente dos lucros a serem gerados pelo projeto de investimento (fábrica); 2. Calcule o valor presente das despesas para construir a fábrica; 3. Determine se a diferença [(1)-(2)]—o valor presente líquido (VPL ou NPV)—é maior que zero. Se for, então a fábrica deve ser construída. Visão moderna (abordagem das opções ou opções reais) (1/3) A visão tradicional erra por não considerar devidamente as três características fundamentais do investimento produtivo (irreversibilidade, incerteza e escolha temporal). Quando se faz um investimento perde-se a “opção de esperar”. Tal opção é uma opção de compra, e seu valor tem que ser deduzido do VPL da visão tradicional. Visão moderna (abordagem das opções ou opções reais) (2/3) O valor da opção de esperar é avaliado como uma opção de compra (call option), p.ex., através de BlackScholes. Black-Scholes nos diz que dentre os fatores que influem no valor de uma opção de compra está a volatilidade do preço do ativo subjacente. Quanto maior a volatilidade, maior o valor da opção de compra. Portanto, quanto maior a incerteza sobre os diversos aspectos que influenciam o resultado do investimento, maior é o valor da opção de esperar, menor é o NPV ajustado e menor é o volume de investimentos. Visão moderna (abordagem das opções ou opções reais) (3/3) The real options approach also suggests that various sources of uncertainty about future profits—fluctuations in product prices, input costs, exchange rates, tax and regulatory policies—have much more important effects on investment than does the overall level of interest rates. Uncertainty about the future path of interest rates may also affect investment more than the general level of the rates. Reduction or elimination of unnecessary uncertainty may be the best kind of public policy to stimulate investment. And the uncertainty generated by the very process of a lengthy policy debate on alternatives may be a serious deterrent to investment. (Dixit e Pindyck, “Investment under Uncertainty”, 1994.) Outro fator gerador de enorme volatilidade é a vulnerabilidade externa de nossa economia, que tem abortado surtos incipientes de crescimento. Apesar de termos domado a megainflação com o plano real, nesses nove anos a economia brasileira permaneceu incapaz de crescer sem gerar pressões inflacionárias ou no balanço de pagamentos, as quais exigem a manutenção de altas taxas de juros que prejudicam sensivelmente o investimento e o crescimento, além de tornar mais difícil a sustentabilidade da dívida pública (outro fator gerador de volatilidade). Como reduzir a vulnerabilidade de nossa economia (perda de PIB e alta de inflação) aos voláteis fluxos de capital? Na discussão de ontem sobre a ALCA e negociações comerciais, o prof. Pastore chamou a atenção que o crescimento econômico pressupõe grande volume de comércio internacional, e não grandes saldos comerciais. A literatura sobre desenvolvimento econômico há muito tempo chama a atenção para um conceito fundamental que está intimamente relacionado com a maior integração comercial da economia: exportabilidade. Exportabilidade ... The only secure way in which a country can finance the imports it needs to exploit the growth potential of its [rapidly expanding] activities is by being able to sell abroad a portion of the output of these same activities: only then will the spurts in imports caused by the growth pattern in the [rapidly expanding] activities be systematically offset by spurts in exports. Any offsetting by other exports is to a considerable extent a matter of luck. (Hirschman, “The Strategy of Economic Development”,1958) Como aumentar a exportabilidade da economia brasileira, assim diminuindo nossa vulnerabilidade externa e a volatilidade a ela associada? 1) A manutenção de uma taxa de câmbio real no longo prazo que remunere investimentos em exportação. 2) A desoneração tributária das exportações, que deverá ser contemplada dentro da reforma tributária. 3) O livre comércio, possibilitando que os produtos brasileiros possam incorporar componentes estrangeiros, fazendo-os competitivos (em termos de preço e de qualidade) aos produtos estrangeiros. (Exemplo da Embraer dado ontem por Pastore.) 4) Uma mão-de-obra educada que possa se adaptar aos modernos processos produtivos requeridos pelos produtos que são negociados internacionalmente. 5) A promoção de produtos brasileiros em mercados internacionais. O aumento da exportabilidade da economia brasileira, associada a modificações legais que melhorem o acesso dos investidores (tanto os estrangeiros quanto os nacionais) aos direitos de propriedade sobre os investimentos aqui realizados, permitirá uma maior integração do sistema financeiro nacional ao internacional, diminuindo a vulnerabilidade externa e a ocorrência de crises financeiras. Isso em muito contribuirá para estimular o investimento e o crescimento econômico. Outras formas importantes para reduzir a vulnerabilidade externa da economia brasileira: Aumentar a taxa de poupança doméstica; Fazer com que o sofisticado mercado financeiro nacional passe a realizar em maior volume e em melhores condições a intermediação de poupança para o financiamento do investimento produtivo. Conclusões (1/3): 1) A maior integração internacional nos interessa por possibilitar maior crescimento econômico; 2) O crescimento econômico pressupõe maior investimento privado, nacional e estrangeiro; 3) A teoria de opções reais demonstra que a volatilidade causada pela incerteza quanto a regras futuras e variáveis econômicas que determinarão o rendimento dos investimentos (impostos, regulação, crescimento, inflação, taxa de juros, taxa de câmbio, etc.) aumenta significativamente o valor da opção de esperar e reduz os investimentos; Conclusões (2/3): 4) Conseqüentemente, a discussão continuada sobre mudanças na política macroeconômica, bem como as ameaças de rompimento unilateral de contratos celebrados previamente, e a falta de clareza das regras a viger no futuro, aumentam a opção de esperar, e reduzem o investimento e o crescimento; 5) Regras claras para o investimento são condição sine qua non para deslanchar o “espetáculo de crescimento”; Conclusões (3/3): 6) A vulnerabilidade externa é outro fator gerador de incerteza que reduz o investimento; 7) Para reduzir a vulnerabilidade externa é necessário: a) ampliar a exportabilidade da economia; b) ampliar a integração financeira com o sistema financeiro internacional; c) aumentar a poupança doméstica; d) manter ou ampliar o esforço fiscal de forma a dirimir totalmente quaisquer dúvidas quanto à sustentabilidade da dívida pública; e) manter o regime monetário de inflation targeting e câmbio flutuante. (Autonomia operacional do BCB.)