Aprendizado behaviorismo e propaganda

Propaganda
APRENDIZADO, BEHAVIORISMO E PROPAGANDA
DUARTE, Leopoldo e VASCONCELLOS, Nathália1
Resumo: O presente artigo tem como objetivo indicar alguns dos possíveis usos
em estratégias de propaganda, dos conceitos desenvolvidos por analistas do
comportamento humano e seu condicionamento. Após uma breve introdução aos
conceitos desenvolvidos pela corrente da psicologia comparativa do behaviorismo
mencionaremos alguns dos usos dessas teorias aplicadas ao condicionamento
dos hábitos do consumidor.
Palavras-chave: behaviorismo; publicidade; comportamento do consumidor.
O behaviorismo é um ramo da psicologia baseado no conceito de
persuasão como definido por Aristóteles na Grécia Antiga. A teoria behaviorista
defende que é possível condicionar o comportamento de seres humanos e
animais a partir de estratégias de condicionamento de estímulos exteriores, como
sinais sonoros ou até pequenos choques.
John Broadus Watson é considerado o fundador da teoria
behaviorista e defendia que a conduta (ou comportamento) dos indivíduos é tão
passível de observação, controle e previsão como o objeto de outras ciências,
naturais e exatas. Porém, um teórico behaviorista mais conhecido e utilizado por
pensadores da psicologia do consumo chamado Ivan Pavlov, que através de
experimentos com animais, mostrou a possibilidade de condicionamento do
comportamento destes. Adestrando-os a sentir fome através de determinado
estímulo provocado. A teoria behaviorista nos diz que o reflexo (ou instinto) é uma
conduta inata, uma resposta do indivíduo não pré-condicionada enquanto o
comportamento (behavior, em inglês) se dá quando o indivíduo está condicionado
por algum estímulo exterior (RIES, 2006, p. 39-47).
1
Alunos regularmente matriculados no terceiro período do curso de Publicidade e Propaganda da
Universidade Federal Fluminense sob a orientação da Profª. Drª. Arlete Eni Granero.
1
A publicidade tem como objetivo primário captar uma necessidade
do cliente e direcioná-la a um produto específico, torná-la desejo (KOTLER;
ARMSTRONG, 2007). Ou seja, a atividade publicitária tem como tarefa estimular
consumidores em potencial a agir de um modo específico: efetuar a compra de
dado bem ou serviço apresentado. Procuraremos então entender como a
publicidade utiliza conceitos behavioristas para apresentar uma necessidade
(existente ou não), condicionar a saciedade dessa necessidade com o bem ou
serviço oferecido e gerar uma resposta a esses estímulos fazendo com que a
compra seja efetuada.
O objetivo deste trabalho é investigar as relações da técnica
publicitária com as técnicas de condicionamento comportamental (behavior)
proposto pela teoria behaviorista da psicologia. Pretendemos observar como
algumas peças publicitárias utilizam princípios da persuasão aristotélica e de
conceitos
da
teoria
behaviorista
para
influenciar
o
comportamento
de
consumidores e afetar os estímulos necessários para que a compra seja efetuada.
A metodologia utilizada nesse trabalho será a de revisão
bibliográfica. Após apontar alguns itens das teorias behavioristas e de aprendizado
associativo pertinentes aos objetivos do trabalho exemplificaremos o seu uso em
técnicas de promoção a partir de alguns exemplos coletados através da
experiência empírica.
1 O objeto de estudo behaviorista
O cientista Baum (1999, p. 21-34) conta a história do behaviorismo
como parte da discussão sobre o status de cientificidade da psicologia, que como
muitas outras - como a “astronomia, física, química, biologia” - tiveram origem na
filosofia. Confiantes de que “para ser objetiva a psicologia deveria evitar qualquer
introspecção e apenas fazer constatações e observações relativas aos
comportamentos das outras pessoas” (WEITHEIMER, 1989, p. 149-161). Alguns
cientistas como os russos Ivan Pavlov e Vladmir Bechterev assumiram uma
posição contra o estudo do consciente (e inconsciente) e se dedicaram à
descrição e análise do comportamento de animais e humanos por fatos
2
observáveis como as suas reações ser um método de estudo mais próximo dos de
outras ciências e menos subjetivo.
Baum (1999) aponta dois movimentos da psicologia que marcam
essa busca por métodos de pesquisa mais respeitado pelas outras ciências: a
psicologia objetiva – que enfatizava a observação e a experimentação, alguns
seguiram os estudos sobre aprendizagem, associação e condicionamento
desenvolvido por Pavlov; e a psicologia comparativa – que defendia uma origem
comum entre os seres vivos que poderia ajudar a entender o comportamento
humano.
John Watson, fundador do behaviorismo, concordava com as idéias
da psicologia comparativa e acreditava que “se era possível empregar
observações objetivas para compreender os processos psicológicos de animais o
mesmo poderia ser feito com seres humanos” (WETHEIMER, Ibidem, p.151), mas
discordava da ênfase dada ao “consciente animal” e de analogias entre animais e
seres humanos. Watson acreditava que a incapacidade da psicologia se tornar
uma ciência de verdade era porque o estudo da consciência era pouco confiável e
muito dependente de especulações sobre indivíduos. O objeto da psicologia
deveria
ser o
“comportamento
objetivamente observável”
por ser mais
“defensável” sobre a ótica cientificista (BAUM, 1999, p. 27-28).
2 O behaviorismo de Watson
No sistema proposto por Charles Watson o objetivo da psicologia era
descrito como “a atividade e a conduta humana e animal” e a meta da psicologia
devia ser “prever o comportamento, formular leis a seu respeito e controlá-lo”. O
psicólogo Michael Wertheimer credita o sucesso do behaviorismo watsoniano,
pelo menos em parte, “à ideologia política americana de que todos os homens
foram criados iguais e qualquer um poderia conseguir êxito”.
Para o behaviorismo watsoniano o principal método da psicologia
deveria ser o “estudo do reflexo condicionado” e o condicionamento do
comportamento era “a chave para a compreensão do comportamento e seu
3
potencial era considerado ilimitado” (WERTHEIMER, p. 151-154). Baum (1999,
s/p.) aponta para o fato de que:
Na
idéia
de
que
é
possível
uma
ciência
do
comportamento está implícito que o comportamento,
como qualquer objeto de estudo científico, é ordenado,
pode ser explicado, pode ser previsto desde que se
tenham os dados necessários, e pode ser controlado
desde que se tenham os meios necessários. Chama-se
isso determinismo, a noção de que o comportamento é
determinado unicamente pela hereditariedade e pelo
ambiente.
Essa linha de pensamento que diz que as ações do homem são
determinadas de acordo com fatores hereditários e com o ambiente (sóciocultural) em que o indivíduo está inserido seria uma visão que excluiria a idéia
de livre-arbítrio defendido pela maioria das sociedades judaico-cristãs. Baum
(1999) argumenta que pela impossibilidade dos cientistas preverem de maneira
infalível o comportamento humano, assim como a inexistência de tal livrearbítrio essa questão acerca do comportamento humano é descrita como um
“mistério”.
A
condicionamento
seguir
apresentaremos
comportamental
uma
desenvolvida
das
teorias
sobre
pelo
behaviorista
o
mais
conhecido depois de Watson, o também norte-americano Burrhus Frederic
Skinner, responsável pelo o que é conhecido como behaviorismo radical que
definia o comportamento de maneira “estritamente operacional” condicionada
através do reforço (WERTHEIMER, 1989, p.159).
3 Uma teoria de aprendizado pós-watsoniana
Dentro da psicologia e da pedagogia, há duas vertentes que dividem
o aprendizado em: associativo e cognitivo. Este artigo abordará somente os
estudos do aprendizado associativo.
4
Na vertente associativa, Burrhus Frederic Skinner, baseado nas
descobertas de Pavlov, expandiu os estudos do behaviorismo watsoniano - que se
baseiam no comportamento observável - para a idéia de aprendizado (como
mudança no comportamento manifesto). Segundo ele, a resposta a um
determinado estímulo é condicionada ou adquirida. Desde então, a escola
associativa entendeu que a associação entre um estímulo e uma resposta ocorre
quando há conexão entre os dois e que a repetição dessa associação é
fundamental para o processo de aprendizagem (GADE, 1998).
O surgimento de novas associações está relacionado com as
necessidades dos indivíduos, ou seja, está relacionado a "estímulos internos ou
externos que direcionam o indivíduo para a ação." Estas necessidades podem ser
primárias ou instintivas, como a fome, e secundárias ou aprendidas, como comer
cereais. Portanto, se ambas as necessidades aparecerem de forma conectada e
repetidamente em todo desjejum, por exemplo, haverá um aprendizado
associativo ou um condicionamento ligado a fome e/ou produto no desjejum (Idem,
Ibidem).
4 O aprendizado associativo usado na propaganda
Segundo Gade (1998), “existe grande controvérsia sobre até que
ponto a propaganda e outros tipos de promoção conseguem persuadir o
consumidor a usar produtos de que não tem necessidade ou que não deseja.” Há
teóricos do comportamento que dizem que não é possível ensinar indivíduos a
gostar e a consumir produtos que elas não desejam. Por outro lado, os estudiosos
da aprendizagem mostram, através de pesquisas com animais, que é possível
ensinar o indivíduo a gostar de um produto que não gostava e não necessitava. O
estudo do aprendizado e a análise das necessidades dos consumidores tornam-se
úteis, do ponto de vista da propaganda, já que este permite verificar como se
estabelece a preferência pelas marcas na cabeça do consumidor. Ainda segundo
a autora “um indivíduo muito sedento, num verão tropical, poderá aprender com
facilidade o nome do refrigerante com o qual saciou a sua sede”. Baseados
nesses estudos, os publicitários conseguem direcionar de forma otimizada a
5
comunicação de forma que a sua marca esteja presente na cabeça do
consumidor, quando este tiver alguma necessidade primária. Alguns exemplos de
utilização dessa teoria como ferramenta publicitária é a produção de outdoors,
cartazes de rua e anúncios em veículos de massa. Dessa forma, os profissionais
de propaganda e marketing acreditam que o consumidor, ao entrar numa loja terá
visto recentemente um anúncio de um determinando produto, o que o deixaria
estimulado a optar por ele, mesmo que o consumidor não tenha a necessidade ou
não deseje esse produto (GADE, 1998).
Há estudos que comprovam que para o sucesso da aprendizagem
do consumidor em relação a marca desejada é indispensável a constante
(re)apresentação da marca através de propagandas. De acordo com esses
estudos, as propagandas devem ser contínuas para que não sejam esquecidas ou
substituídas a logo prazo (KASSARJIAN; BENNET, 1980).
5 As teorias comportamentais a serviço da propaganda
John Watson após alguns anos no academicismo mudou de carreira
e começou a trabalhar em uma grande firma de publicidade de Nova York. A ele é
atribuída a respeitabilidade do uso do cigarro pelas mulheres. Wertheimer (1989)
menciona um anúncio da marca Lucky Strike que foi executada, com sucesso, por
vários anos onde a frase de efeito era “Pegue um Lucky em vez de um doce”.
Com toda a imagem de glamour associada ao uso feminino de
cigarro demonstrada por estrelas do cinema hollywoodiano esta campanha pode
ter sido bem-sucedida por, devido também a repetição, pelo posicionamento do
cigarro como um substituto de engordativos doces.
Giglio (2005, p. 85) diz que os estímulos anteriores a compra
“pretendem levar a pessoa a comprar (nem que seja uma vez só)” enquanto que
os estímulos posteriores condicionam o comportamento, ou seja, “pretendem fazer
com que as pessoas continuem a comprar após a primeira vez ou aumentem a
freqüência da compra”. O autor destaca que essa segunda compra só poderá ser
6
motivada caso seja “sucedido de uma recompensa importante para o sujeito”; e
aponta que “todas as promessas de prêmios, presentes e brindes seguem essa
mesma estrutura do estímulo primário („eliciador‟) e do estímulo secundário
(„reforçador‟)”.
As propagandas funcionariam então, principalmente, como um
primeiro estímulo convidativo a compra já que atualmente o primeiro contato de
um indivíduo com um produto passa pelas campanhas publicitárias que
posicionam a marca e “identificam” seus potenciais compradores, enquanto que as
estratégias de venda do marketing, como brindes, seriam responsáveis pelo
condicionamento. Sendo que uma mudança no posicionamento da marca pode
fazer com que esta perca fiéis consumidores e/ou selecione outros novos que se
identificam mais com esse novo posicionamento.
Considerações Finais
Apesar
de
experiências
bem-sucedidas
do
condicionamento
do
comportamento do consumidor Giglio aponta que “o estímulo reforçador muda não
só em questão de tempo, como de categoria e importância” (GIGLIO, 2005, p. 46)
o que significa que ao longo do tempo, repetidas vezes, tal iniciativa de estímulo
poderia ficar mais cara para o produtor e menos eficiente. Assim como a utilização
de um mesmo posicionamento, sem nenhum outro valor agregado, pode fazer
com que os consumidores que não são realmente fiéis a marca e se identificam
com ela percam o interesse ou acabem descobrindo uma identificação maior com
outro posicionamento de outra marca.
Baum (1999) diz que é necessário que o comportamento do indivíduo
esteja aberto à influência e persuasão, no caso do discurso publicitário, para sofrer
condicionamento e gerar hábitos de consumo. No entanto “em momentos de crise
e mudança como casamentos, nascimentos, separação” as pessoas são
obrigadas a rever todos os seus hábitos como as suas rotinas de trabalho/estudo;
seus costumes; suas referências sociais; o tempo e práticas de lazer; e entre
outros os hábitos de consumo, o que faria com que as pessoas estivessem em
7
constante trânsito de segmentos de mercado o que impossibilitaria a determinação
dos hábitos de consumo de uma pessoa para o resto de sua vida.
Embora os métodos e ideais behavioristas impliquem numa negação do
livre-arbítrio acreditamos que esse determinismo implícito não é totalitário e que
ao transcorrer da vida de cada indivíduo novas necessidades, de consumo ou não,
são modificadas e cabe ao consumidor identificar e priorizar tais necessidades,
sendo impossível que haja algum tipo de manipulação determinante por parte das
atividades de promoção/divulgação de produtos que submetam pessoas a adquirilos de forma condicionada e impensada.
Referências
BAUM, W. M. Compreender o behaviorismo: ciência, comportamento e cultura.
Porto Alegre: Artmed, 1999.
GADE, Christiane. Psicologia do consumidor e da propaganda. São Paulo: EPU,
1998.
KOTLER, Phillip; ARMSTRONG, Gary. Princípios de Marketing. São Paulo:
Pearson Prentice Hall, 2007.
KASSARJIAN, Harold e BENNET, Peter. O Comportamento do consumidor. São
Paulo: Atlas, 1980.
GIGLIO, Ernesto Michelangelo. O comportamento do consumidor. São Paulo:
Pioneira Thomson Learning, 2005
RIES, Bruno Edgard. . Condicionamento respondente: Pavlov. In: Jorge La Rosa.
(Org.). Psicologia e Educação: Significado do aprender. Porto Alegre: EdiPucRS,
2006.
WERTHEIMER, Michael. Pequena história da psicologia. São Paulo: Nacional,
1989.
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