Boletim Econômico – Edição nº 81

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Boletim Econômico – Edição nº 81 – setembro de 2014
Organização: Maurício José Nunes Oliveira – Assessor econômico
O debate sobre a autonomia do
Banco Central
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Introdução
O Banco Central entrou no debate eleitoral. Mais especificamente, a
forma como ele será gerido. Na disputa pela simpatia do mercado
financeiro, Aécio e Marina se opõem à política econômica do governo
atual - a última defende total independência do órgão. O governo de
Dilma Rousseff, por sua vez, defende que a política econômica do País é
uma prerrogativa do Poder Executivo, e que o BC já tem autonomia
operacional.
Em linhas gerais, o que está em disputa é o conceito geral de como
cuidar da economia e, de certa forma, dos rumos da nação: de um lado
estão os que defendem a intervenção mínima do governo. Para estes, o
mercado pode se autorregular, e um BC totalmente independente é parte
do pacote. Do outro lado estão os que defendem alguma intervenção do
governo na economia, de forma a garantir que o Poder Executivo eleito
pela maioria da população (e não o mercado) seja a voz mais forte na
definição das prioridades da economia nacional.
O assunto pode soar arenoso ou parecer mera discussão técnica. Mas
não se engane: o regime do Banco Central pode influenciar diretamente
no dia a dia de sua família.
O que o Banco Central faz?
É responsável pelo sistema financeiro de um país ou de um bloco de
países, como no caso da União Européia. Emite a moeda e fixa a taxa de
juros básica, que serve de parâmetro para todas as demais taxas de juro
do mercado, como a do seu cartão de crédito. Atua no mercado de
câmbio, sendo o principal responsável, em última instância, pela cotação
do dólar e do euro, por exemplo.
O BC ainda coordena os depósitos compulsórios, mecanismo que
garante que o dinheiro de todas as contas e investimentos do País
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"exista de verdade". Em alguns casos, o Banco Central também
empresta dinheiro a bancos em dificuldades, buscando evitar que o país
entre em crise.
O BC é o guardião da moeda, controla a inflação através da taxa de
juros, regulamenta e fiscaliza o sistema bancário e é o responsável pela
estabilidade monetária e macroeconômica do país.
Quem nomeia o presidente do Banco Central?
No Brasil, o Poder Executivo indica a diretoria. Ou seja, é o presidente da
República quem indica o presidente do BC. Também é responsabilidade
do Executivo definir suas metas e supervisionar sua execução. É assim
que funciona no Brasil.
Com as mudanças propostas pela oposição, o presidente do Banco teria
um mandato a ser cumprido e não poderia ser demitido, a não ser em
circunstâncias extraordinárias, como a comprovação do seu
envolvimento em atividades ilícitas.
O que está sendo proposto por Dilma, Aécio e
Marina?
O PT de Dilma Rousseff defende a autonomia operacional do órgão, mas
argumenta que a economia precisa ser dirigida por aqueles que são
eleitos; Aécio Neves (PSDB) defende mais autonomia, mas diz ser mais
importante a sinalização que o presidente dá em relação a uma
autonomia completa do que uma lei propriamente dita que garanta a
independência do BC.
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Marina Silva (PSB) é que tem a posição mais firme no sentido de deixar
o mercado se autorregular. É a única dos três candidatos à Presidência
mais bem colocados nas pesquisas de intenção de votos que defende
uma independência garantida por lei. Eduardo Campos também defendia
maior autonomia do BC.
A posição da candidata difere da que ela defendeu no pleito de 2010,
quando disputou o Planalto pelo PV. À época, Marina falava em uma
autonomia operacional e não institucionalizada.
Quais seriam as vantagens da independência
do Banco Central?
Defensores de uma maior independência do Banco Central observam
que a independência impede que o Executivo interfira nas decisões do
BC. Seria uma forma de manter a entidade mais preservada de pressões
políticas e com maior credibilidade. Essa combinação "acalmaria" o
mercado e contribuiria, em teoria, para diminuir as expectativas de
inflação.
E quais seriam as desvantagens?
Os críticos da independência total do Banco Central argumentam que
quem tem de definir a política econômica do País, que tem forte impacto
no dia a dia da população, é um governo eleito, e não técnicos
financeiros. Para a equipe econômica de Dilma, o governo não pode abrir
mão de sua autoridade monetária. Por fim, não há consenso entre os
economistas sobre a relação direta entre uma maior independência do
BC e menores índices de inflação.
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Há algum projeto de
Congresso sobre o tema?
lei
tramitando
no
Há um projeto de lei que prevê maior autonomia do BC, de autoria do
senador Arthur Virgílio (PSDB-AM), um substitutivo da proposta do
senador Francisco Dornelles (PP-RJ). Pelo texto, os diretores teriam seis
anos de mandato. Além disso, caso haja demissão do presidente ou dos
diretores do BC pelo presidente da República, isso teria de ser justificado
e aprovado pelo Senado, assim como a nomeação. O texto, aprovado
pelo plenário do Senado, seguiu para discussão na Câmara e não tem
data para ser votado.
Como funciona o Banco Central em outros
países?
Como no Brasil, o Federal Reserve (Banco Central norte-americano) é
presidido por um nome indicado pelo chefe do Executivo. A diferença é
de que lá existe um mandato de quatro anos para o cargo, que pode ser
renovado. O presidente dos EUA não tem poder para depor esse
mandatário do Federal Reserve, e este deve se reportar ao Senado e à
Câmara.
Na Europa desde 1988 a principal atribuição do Banco Central Europeu
(BCE) é administrar o euro. Para isso trabalha em conjunto com os
bancos centrais dos países que fazem parte da Zona do Euro.
O Reino Unido faz parte da União Européia, mas a população votou
contra a unificação econômica, então lá circula a libra e não o euro. E é o
governo que estabelecem quais são as metas de seu Banco Central. O
BC britânico, contudo, tem autonomia para determinar qual caminho
utilizará para atingir as metas propostas pelo governo.
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Vários outros bancos centrais ao redor do mundo têm autonomia formal
garantida em lei. Além do Fed e do BCE, os bancos centrais do Japão,
Chile e México mantêm certa autonomia em relação às decisões dos
governos de seus países.
O assunto sempre foi polêmico
Os principais candidatos da oposição às eleições presidenciais já
adiantaram que defenderão a institucionalização, em lei, da autonomia
operacional do Banco Central. Este pode não ser um tema de forte apelo
eleitoral, mas aponta para a solução de um problema que é foco de
insegurança desde 1988.
Entre as esquerdas brasileiras, ainda há muito debate sobre o assunto.
Muitos ainda definem um modelo centralizado de governo, que também
não pode abrir mão do controle total sobre as políticas executadas pelo
Banco Central.
A plena autonomia decorre da necessidade de preservar um dos mais
importantes patrimônios do País, a moeda, do assédio dos políticos.
Deixar a decisão de emitir nas mãos de quem só pensa em expandir as
despesas públicas seria nomear o lobo para tomar conta da carneirada.
Em condições assim, não é possível garantir nem estabilidade
econômica nem estabilidade política.
A objeção de que não se pode, numa democracia, entregar tanto poder a
gente que nem é escolhida pelo voto, como ainda se argumenta por aí,
não se sustenta. Os membros do Judiciário também detêm enorme
parcela de poder. Os juízes absolvem ou condenam, soltam ou prendem
e impõem sanções. E, no entanto, não são escolhidos pelo voto da
população. Operam com total autonomia, tanto de fato quanto na lei.
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Durante o governo Fernando Henrique, a autonomia do Banco Central foi
relativa. Quando em 1999 o então nomeado presidente do Banco
Central, Chico Lopes inventou aquele "câmbio de banda endógena que
se movimenta em diagonal", que ninguém entendeu, o pânico se instalou
na economia e o então ministro da Fazenda, Pedro Malan, não vacilou
em intervir. Destituiu o presidente do Banco Central e, por algumas
horas, comandou pessoalmente a mesa de câmbio.
Ao longo do governo Lula, a direção do Banco Central teve relativa
independência, mais por decisão do governo do que por imposição das
circunstâncias. E neste primeiro mandato Dilma, o Banco Central perdeu
credibilidade porque a autonomia ficou prejudicada pelas notórias
interferências do Palácio do Planalto.
O regime atual, em que qualquer diretor do Banco Central é nomeado
pelo governo e que, a qualquer momento e com o simples manejo de
uma esferográfica, pode ser destituído "ad nutum", é ruim porque deixa o
sistema financeiro vulnerável a pressões.
Há quem argumente que a autonomia do Banco Central não tem de ser
institucionalizada, mas conquistada todos os dias, como o amor no
casamento. Mas, também como nos casamentos, isso só funciona
episodicamente. Se os dirigentes de qualquer banco central agem sob
coação da demissão, não podem sempre adotar a melhor opção em
defesa da moeda. A autonomia só fica garantida com mandatos fixos,
não coincidentes com os dos chefões do poder executivo, e só passíveis
de interrupção em casos graves.
O artigo 192 da Constituição prevê lei complementar que regule todo o
sistema financeiro e também o Banco Central. O principal anteprojeto
nesse sentido, cujo relator é o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), está
parado no Congresso desde 2007.
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