Abuso de opióides

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
PÓS-GRADUAÇÃO EM FARMÁCIA E QUÍMICA FORENSE
ABUSO DE OPIÓIDES
Laila Ferreira Metri 1
Brina Portugal 2
¹Farmacêutica Bioquímica Analista Clínica - Graduada pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), Aluna
da Pós Graduação em Farmácia e Química Forense pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás.
²Farmacêutica Clínico e Industrial - Graduada pela Universidade de Brasília (UnB), Especialista em Vigilância
Sanitária pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás.
Resumo
O abuso de drogas é um tema atual e preocupante, visto se tratar de um problema de saúde pública mundial. Os
opióides são uma classe de substâncias amplamente utilizada na clínica médica para tratamento de dores agudas
e crônicas. Esta classe de substâncias apresenta além de seus efeitos terapêuticos no usuário, efeitos euforizantes
e prazerosos, os que fazem desta uma droga de abuso. O objetivo deste artigo é apresentar, por meio de uma
revisão de literatura, o conceito de abuso de drogas de uma forma geral e especificar o abuso de opióides,
abordando sucintamente seus efeitos e as formas de tratamento. Foram utilizados para a elaboração deste artigo
textos oriundos da internet e de livros didáticos da área.
Palavras-chave: Abuso de drogas. Opióides. Abuso de opióides.
Opioids’ abuse
Abstract
Drug’s abuse is a current and alarming theme, as this is a public health problem worldwide. Opioids are a
chemicals class widely used in medical clinic for treatment acute and chronic pain. This class of substances has
therapeutic effects on the user and also presents euphoric and pleasurable effects, making her an abuse drug.
The purpose of this article is to present, through a literature review, the concept of drug abuse in general and
specify the opioids abuse, treating briefly its effects and treatment ways. Texts from internet and specific
textbooks were used to do this article.
Key-Words: Drugs Abuse. Opioids. Opioids Abuse.
1 INTRODUÇÃO
Substâncias desenvolvidas para o tratamento de alguma patologia ou disfunção
fisiológica podem ser usadas de forma inapropriada quando apresentam aos usuários efeitos
diferentes da indicação terapêutica, porém agradáveis. Daí surge o uso indevido de algumas
substâncias, que é conceituado como “Abuso de drogas” acarretando fenômenos como
dependência, tolerância, síndrome de abstinência (SILVA, 2002).
Vale destacar que o uso abusivo de drogas tem sido tema de discussão na nossa
sociedade atual, sendo considerado um dos problemas de saúde pública mais relevante e
grave, devido ao seu alto grau de incidência e sua presença em qualquer classe social
(SILVA, 2002).
Os opióides representam uma classe de medicamentos descobertos e utilizados há
muitos anos no tratamento das dores aguda e crônica e, apesar de serem uma dessas
substâncias que são utilizadas como drogas de abuso e apresentarem um alto poder de
indução de dependência, continuam a ser utilizadas em protocolos terapêuticos por
apresentarem propriedades analgésicas imprescindíveis e insubstituíveis para algumas
patologias (SILVA, 2002).
Assim, o abuso de opióides é um tema relevante e de importante discussão, o qual é
abordado neste artigo na forma de revisão de literatura baseada em trabalhos científicos que
abordam o tema em questão. O material utilizado foi pesquisado na internet, em sites de
pesquisa como: Scielo, Bireme, Google Acadêmico e artigos disponíveis em sites de
Universidades, e também, em livros acadêmicos de farmacologia. As palavras chaves
utilizadas foram: abuso de drogas; opióides; abuso de opióides.
2 ABUSO DE DROGAS
O homem, desde as raízes de sua história, por quaisquer terras que habitasse e
qualquer que fosse seu grau ou gênero de cultura, utilizou substâncias, geralmente princípios
ativos de plantas, que lhe propiciassem prazer e sensação de bem estar, muitas vezes intensos,
a eles deixando-se acostumar (SILVA, 2002). Pode-se citar como exemplo o uso de plantas
contendo nicotina e folhas do arbusto Erythroxylum coca, da qual se deriva a cocaína, que
ocorre há muitos anos em determinadas comunidades, além da fermentação para produção do
álcool que data de aproximadamente 6000 a.C., um costume extremamente antigo e que
persiste (GUIZZO, 2010).
Com o passar dos anos, várias drogas capazes de modificar o psiquismo surgiram,
sendo úteis em tratamentos médicos. Juntamente com o uso terapêutico, a utilização dessas
drogas com finalidades não terapêuticas ocorreram, tendo um número considerável de
indivíduos empregado-as para buscar sensações especiais, sendo desta forma seu uso
considerado abusivo (SILVA, 2002).
Porém, para se conceituar o termo abuso de drogas deve-se levar em conta a ocasião,
época histórica e região em que esta é utilizada. Há drogas que dependendo do seu emprego,
mesmo que de forma contínua e em dosagens altas, não têm seus usos considerados abusivos.
Como exemplo disto tem-se o uso da morfina para aliviar dores de pacientes terminais.
Existem também aquelas substâncias que são usualmente utilizadas em determinadas regiões,
por hábitos da sociedade local, como a folha de coca nos planaltos andinos (SILVA, 2002).
De uma forma mais objetiva, o abuso de drogas é um efeito colateral sutil e retardado,
que pode passar despercebido durante anos de uso destas. Isto porque, primariamente, é
amplamente utilizada devido aos seus fins terapêuticos e essenciais para o tratamento de
alguma patologia, porém devido ao uso descontrolado desta droga ou até mesmo excessivo,
porém essencial, por se tratar de única para determinado tratamento, surge o que é chamado
de dependência física, adição e tolerância que, muitas vezes, inevitavelmente, levam ao uso
abusivo de determinadas substâncias (SILVA, 2002).
O abuso de opióides é um dos exemplos dos efeitos sutis e retardados observados após
anos de seu uso terapêutico. Inicialmente e precipuamente, os opióides foram e são utilizados
na clínica médica devido ao seu alto poder analgésico, muito requisitado para pacientes
oncológicos, com grandes queimaduras ou politraumatizados. No entanto, os opióides, após
seu uso crônico, podem levar o paciente/usuário ao estado de vício ou adição, dependência
psíquica, tolerância e dependência física, devido a seus efeitos euforizantes e prazerosos
(CEBRID, 20--).
Deve-se ressaltar que o uso abusivo de drogas pode desencadear a dependência
psíquica, fator determinante do vício. A necessidade frequente de seu uso (o vício) acarretará
a tolerância, a qual, por sua vez, induzirá a dependência física (SILVA, 2002).
Levando-se em consideração aspectos fisiológicos, segundo Guizzo (2010), as drogas
de abuso podem ser definidas como:
....substâncias ou moléculas que possuem atividade nos sistemas de reforçamento
positivo e negativo, induzindo uma sensação de desejo intenso (craving), ansiedade
e irritabilidade seguidas da retirada da droga (abstinência). O uso continuado de
drogas de abuso induz alterações neuroadaptativas relacionadas com a regulação de
sistemas de sinalização, transcrição de genes e expressão de proteínas, sendo que
estas alterações contribuem para a dependência, tolerância, abstinência e recaída.
Já, segundo conceitos farmacológicos, os efeitos prazerosos, vício e abstinência que as
drogas de abuso promovem, estão diretamente ou indiretamente relacionados com o sistema
dopaminérgico, mais precisamente com o aumento dos níveis de dopamina (DA) extracelular,
devido a uma diminuição do transporte e aumento na liberação de DA. O transporte desta
pode ser afetado por muitas drogas, incluindo álcool, cocaína, anfetamina e opióides
(GUIZZO, 2010).
3 OPIÓIDES
3.1 Conceito
Opióides são todas as drogas, naturais e sintéticas, com propriedades semelhantes às
da morfina, incluindo peptídeos endógenos. Esse termo pode ser utilizado para agonistas,
agonistas parciais, agonistas-antagonistas e antagonistas competitivos (SILVA, 2002).
De acordo com Kay et al (2002) o termo opióide designa as drogas que agem em
receptores opióides, os quais são classificados em cinco tipos: mu, capa, delta, sigma e
épsilon, sendo que alguns desses ainda são subdivididos em subtipos. Ainda, segundo os
mesmos autores, apesar de diversos tipos de receptores farmacológicos, as respostas
farmacológicas e fisiológicas são melhores entendidas para os receptores mu e capa. O
receptor mu, do qual a morfina é o agonista protótipo, parece ser o mais intimamente
relacionado aos efeitos opióides analgésicos e opióides (KAY et al, 2002).
Os opióides podem ser substâncias endógenas, podem ocorrer naturalmente como a
morfina extraída da Papaver somniferum, serem derivados semi sintéticos como a heroína ou
sintéticos como a meperidina e têm como aplicação terapêutica principal a analgesia, podendo
ser utilizados também como anestésicos, antidiarréicos e supressores da tosse (KAY et al,
2002).
Figura 2. Estrutura química da morfina, opióide natural
Fonte: http://www.qmc.ufsc.br/qmcweb/artigos/dor/quimica_vs_dor.htm
Figura 3. Estrutura química da heroína, opióide semi sintético
Fonte: http://www.lookfordiagnosis.com/images.php?term=Estrutura
Molecular&photo_id=2739736392&lang=3
Figura 4. Estrutura química da meperidina, opióide sintético
Fonte: http://www.meperidina.com/
3.2 História
No ano 3 a.C., o extrato da papoula já era utilizado na medicina para controlar a
diarréia, porém logo seus efeitos analgésicos foram observados (GOZZANI, 1994). Desde
tempos imemoriais, o ópio e os seus derivados, além de exercerem ponderável influência
sobre o comportamento dos seres humanos, têm sido empregados como sedativo e como
analgésico (DUARTE, 2005).
Figura 1. Flor da papoula (Papaver Somniferum), parte da planta que contém extrato rico em opióides.
Fonte: http://www.qmc.ufsc.br/qmcweb/artigos/dor/quimica_vs_dor.htm
No início do século XIX a morfina foi descoberta por Friedrich Sertürner, um alemão,
assistente de farmacêutico, que trabalhou no isolamento de princípios ativos do ópio
(DUARTE, 2005). Nesta época, a morfina foi largamente utilizada no tratamento de soldados
feridos na Guerra Civil Americana o que possibilitou identificar os seus efeitos colaterais,
como também observar o desenvolvimento de tolerância e o risco de dependência com seu
uso (SILVA, 2002).
Após vários estudos, sabe-se hoje que o pó do ópio é constituído por no mínimo 25
alcalóides que de acordo com sua estrutura química e ação farmacológica são classificados em
dois grupos distintos. O grupo mais importante tem como protótipo a morfina e exerce sua
ação farmacológica sobre o Sistema Nervoso Central sendo representado quimicamente pelos
derivados do fenantreno (DUARTE, 2005).
Após elucidação da estrutura química dos derivados naturais do ópio, foram
desenvolvidos os derivados semi-sintéticos e sintéticos após modificações simples na
molécula da morfina e da tebaína (DUARTE, 2005).
Durante muito tempo os opióides foram tidos como drogas milagrosas, capazes de
aliviar grandes dores através de seu efeito analgésico e, até então, prejuízos individuais e
coletivos eram desconhecidos. Foi somente no início do século XIX que essas drogas
tornaram-se um problema médico e social, em função dos dados estáticos de mortalidade
(DUARTE, 2005). Segundo esses dados, um terço de todos os envenenamentos fatais foi
devido a casos de sobredose de ópio, quer tomado como fonte de prazer quer com intenções
suicidas (BOOFH, 1988 apud DUARTE, 2005).
Porém foi somente no século XX que os conceitos de tolerância, dependência psíquica
e física, bem como os de vício começaram a ser amplamente discutidos e estudados
(DUARTE, 2005) e questões inicialmente levantadas nesta época continuam a permear as
discussões sobre o uso de opióides- que sem dúvida é um potente agente analgésico- apesar de
seu alto poder de causar diferentes tipos de dependência em seus usuários ou, até mesmo, ser
utilizado como droga de abuso.
3.3 Usos terapêuticos
O tratamento de síndromes de dores agudas e crônicas requer um diagnóstico
adequado para que se possa determinar um tratamento medicamentoso eficaz para o alívio da
dor. Porém, apesar da disponibilidade de drogas eficientes no mercado farmacêutico, a
terapêutica apropriada não vem sido aplicada. No caso de opióides, os médicos apresentam
receio em utilizá-los pelas seguintes razões, segundo Silva (2002):
- Medo de adição e tolerância;
- Dificuldade em diferenciar as pessoas que apenas procuram drogas das que podem
beneficiar-se com o medicamento;
- A idéia de que o uso crônico de opióide é prejudicial;
- Medo dos efeitos colaterais e de problemas com o Conselho Regional de
Medicina.
É importante observar que o uso de opióides por longos períodos raramente leva ao
desenvolvimento de tolerância e que eles podem beneficiar pacientes com dor somática, dor
visceral e dor neuropática (SILVA, 2002).
Ressalta-se que a morfina, fármaco de referência dos analgésicos opióides, produz
uma sensação intensa de contentamento e bem-estar, a qual para pacientes que sofrem de dor
crônica é muito desejável, pois estes pacientes apresentam agitação e ansiedade associadas
com a dor (RANG et al, 2004).
Além de ter ação analgésica, alguns opióides são utilizados clinicamente no tratamento
na supressão da tosse (RANG et al, 2004). A codeína suprime a tosse em doses
subanalgésicas e é, com frequência, usada em medicamentos antitussígenos. A folcodina é
ainda mais seletiva, embora um dos efeitos indesejáveis desses agentes seja a constipação
(RANG et al, 2004).
As demais ações farmacológicas dos opióides não são consideradas terapêuticas e,
sim, como efeitos indesejáveis durante qualquer tratamento em que esses fármacos são
empregados. Podemos citar dentre essas ações: a depressão respiratória, náusea e vômito,
constrição pupilar, constipação, bronconstrição, hipotensão e bradicardia (RANG et al, 2004).
4
VÍCIO,
DEPENDÊNCIA
PSÍQUICA,
DEPENDÊNCIA
FÍSICA,
TOLERÂNCIA E SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA
Quando o grau de comprometimento do indivíduo com a droga é muito profundo, falase em vício, dependência e toxicomania (SILVA, 2002). Este grau de comprometimento
profundo da droga serve para diferenciar vício de hábito, pois neste último a dependência é
mínima, não havendo prejuízo para sociedade ou danos importantes para o próprio indivíduo
(SILVA, 2002). O termo addiction (adição) é utilizado na língua inglesa, tratando-se de um
sinônimo de vício (SILVA, 2002).
Segundo Silva (2002), ao citar Jaffe (1990), o estado de vício caracteriza-se quando
três ou mais dos critérios descritos a seguir são observados, conforme manifesto da Sociedade
Americana de Psiquiatria:
1) uso da droga com maior frequência e em quantidades mais elevadas do que o
pretendido;
2) insucesso nos esforços para abandonar ou reduzir o uso;
3) longo tempo despendido para adquirir, usar a droga ou recuperar-se de seus
efeitos;
4) intoxicação frequente ou sintomas de abstinência;
5) abandono de atividades sociais ou ocupacionais em decorrência do uso da droga;
6) uso contínuo, apesar dos prejuízos psicológicos ou físicos;
7) acentuada tolerância;
8) uso frequente da droga para aliviar os sintomas da crise de abstinência.
O vício foi definido por um Comitê da Organização Mundial de Saúde como citado no
texto de Duarte (2005):
...um estado de intoxicação periódico ou crônico, prejudicial ao indivíduo e à
sociedade, produzido pelo uso repetido de uma droga. Tem como características:
necessidade absoluta de continuar a utilizar a droga (compulsão) e de obtê-la por
qualquer meio e, ainda, tolerância, dependência psíquica e, às vezes, dependência
física.
A tolerância se desenvolve quando, depois de repetidas administrações de uma
determinada dose de uma substância, não se obtém o efeito observado inicialmente com o uso
desta ou quando doses maiores são necessárias para se alcançar este efeito primário
(BALTIERI et al, 2004). A tolerância ocorre independentemente de condições sociais e
psicológicas do usuário de determinada substância (BERSOT et al, 2001).
A tolerância com o uso de opióide pode se dar na primeira dose, mas se manifesta
clinicamente somente após a segunda ou terceira semana de tratamento e ocorre mais nos
efeitos de analgesia, euforia e depressão respiratória desta classe de substâncias (SILVA,
2002).
A dependência psíquica é o denominador comum de todas as formas de abuso crônico
de drogas, onde o viciado requer a manutenção de um estado perfeito de bem estar, produzido
pelo efeito da droga ou pelas condições associadas ao seu emprego (SILVA, 2002). Ocorre
quando o indivíduo sente necessidade e compulsão para o consumo da droga. As drogas
provocam sempre dependência psicológica, porém somente algumas poderão causar
dependência física (COMPÊNDIO DE FARMACOLOGIA, 2004/2005).
A dependência física é um estado que se desenvolve como resultado da adaptação
(tolerância) provocada por um reajuste dos mecanismos homeostáticos em resposta ao uso
repetido de certa substância (BERSOT et al, 2001). É caracterizada por uma síndrome de
abstinência nítida, a qual leva o usuário a apresentar uma necessidade contínua de utilizar a
droga para não manifestar esta síndrome (RANG et al, 2004).
No caso de dependência física de opióides, a síndrome de abstinência manifesta-se
pelos sintomas de rinorréia, lacrimejamento, diaforese, bocejos, calafrios, ansiedade,
irritabilidade, e ocorre alguns dias após a última dose (SILVA, 2002).
A agitação e angústia extremas, também sintomas físicos característicos da síndrome
de abstinência de opióides, acompanham-se de uma forte compulsão pela droga e ocorrem
após 2-3 dias após seu uso, desaparecendo em 8-10 dias. Para cessar rapidamente a crise de
abstinência basta a administração novamente do opióide (RANG et al, 2004).
A síndrome de abstinência ou síndrome da retirada descreve os efeitos adversos,
físicos e psicológicos, da interrupção de tomar um fármaco (RANG et al, 2004).
A síndrome de abstinência clássica dos opióides semelhantes à morfina é conhecida
como a síndrome de abstinência dos agonistas mu e sua intensidade depende de fatores
individuais, do opióide utilizado, de sua dosagem e do tempo de uso, sendo provocada pela
descontinuação do uso crônico ou pela administração de antagonistas opióides
(LARANJEIRA; ARAÚJO, 20--).
O início dos sinais e sintomas e a duração destes são dependentes da meia-vida do
opióide utilizado. (LARANJEIRA; ARAÚJO, 20--) De um modo geral, observa-se humor
deprimido e ansiedade, disforia, fissura, piloereção, lacrimejamento ou rinorréia, hiperalgesia,
dores nas juntas e músculos, diarréia, cãibras gastrointestinais, náusea, ou vômitos, dilatação
pupilar e fotofobia, insônia, hiperatividade autonômica (hiperreflexia, taquicardia,
hipertensão, taquipnea, sudorese, hipertermia) (Martin e Hubbard, 2000, p. 233-259 apud
BALTIERI et al, 2004).
5 ABUSO DE OPIOIDES
5.1 Conceito e História
O uso terapêutico dos opióides, como descrito anteriormente, data de tempos remotos,
tendo sido aplicados inicialmente no controle da disenteria. O costume de fumar ópio tornouse popular no Oriente no século XVIII, sendo socialmente bem aceito (SILVA, 2002).
O vício de opióides, especificamente da morfina, disseminou-se durante a Guerra
Civil Americana quando a morfina era usada para aliviar as dores dos combatentes. Por isso,
a dependência da morfina recebeu o nome de “mal do soldado”. No início dos anos 70
observou-se um número considerável e crescente de dependentes em heroína nos Estados
Unidos (SILVA, 2002).
Importante mencionar que na passagem do século XIX para o século XX surgiu o
fenômeno “paradoxo da heroína”, quando esta substância foi eleita como a substituta da
morfina, uma vez que era capaz de aliviar os sintomas da síndrome da abstinência da
morfina, causando o mesmo efeito terapêutico, a analgesia. Esta concepção perdurou por 12
anos, quando se constatou que a heroína é um dos alcalóides do ópio que mais rapidamente
promove dependência (DUARTE, 2005).
Foi então, no século XX, diante destes últimos acontecimentos, que os conceitos de
tolerância, dependência psíquica e física, de vício e abuso passaram a ser amplamente
discutidos (DUARTE, 2005).
Atualmente, os opióides têm mantido a sua posição como grupo farmacológico que
confere analgesia mais potente (DUARTE, 2005). Os opióides não apresentam efeito-teto da
analgesia, ou seja, a analgesia se intensifica progressivamente com o escalonamento das
doses (MILLER, 2004 apud TEBALDI et al,, 2005). No entanto, algumas indagações quanto
à perduração do uso clínico de opióides continuam, devido a seu alto poder de criar
dependência e seus efeitos euforizantes e prazerosos que podem levar a ser usados como
droga de abuso (DUARTE, 2005).
Conceituando-se abuso de opióides, pode-se dizer que é um padrão inadequado de uso
intermitente destas substâncias em situações perigosas, como na direção de automóveis ou
em trabalho em locais perigosos, ou de uso periódico que pode resultar em problemas sociais,
legais e interpessoais. Todos esses sinais e sintomas também podem ser vistos em pessoas
dependentes de opióides, sendo que para se diferenciar dependência de abuso deve-se
observar que no abuso não há tolerância ou abstinência significativas, bem como o uso da
substância é menos regular (KAY et al, 2002).
Ainda, conforme citado por Baltieri et al (2004) no seu artigo publicado na Revista
Brasileira Psiquiatria sobre Diretrizes para o tratamento de pacientes com síndrome de
dependência de opióides no Brasil:
De acordo com o DSM-IV-TR, o abuso de opióides é um padrão mal adaptativo do
uso de opióides que leva a um prejuízo ou sofrimento importante, manifestando-se
por um (ou mais) dos seguintes sintomas, em um período de 12 meses:
i) Uso recorrente da substância, resultando em uma incapacidade de realizar
obrigações funcionais importantes no trabalho, escola ou em casa;
ii) Uso recorrente da substância em situações em que é fisicamente arriscado;
iii) Problemas legais recorrentes relacionados ao uso da substância;
iv) Uso contínuo da substância, apesar de ter problemas sociais ou interpessoais
recorrentes causados ou exacerbados pelos efeitos da substância.
5.2 Opióides que são usados de forma ilícita
Heroína, ópio, codeína, petidina e morfina são as substâncias da classe dos opióides
que são usadas de forma ilícita e abusiva (BALTIERI et al, 2004).
A heroína é usada tanto nos Estados Unidos como no Brasil como droga de abuso
principalmente por adolescentes e pessoas jovens. O ópio é produzido ilegalmente no
Afeganistão (76%), Mianmar (18%), Laos (2%) e Colômbia (1%) (BALTIERI et al, 2004).
No Brasil, durante levantamentos sobre uso de drogas entre estudantes de escola
pública realizados em dez capitais de todo o país nos anos de 1987, 1989, 1994 e 1997, o uso
não médico de xarope de codeína foi observado, como também houve um relato de uso de
petidina injetável em Recife e um de uso de morfina injetável em Porto Alegre (BALTIERI et
al, 2004).
A morfina e a heroína são responsáveis pelo vício mais profundo que existe, podendo
levar ao grau máximo de dependência e de escravidão absoluta.
A heroína é a droga
preferida pelos toxicômanos, embora não esteja demonstrado que seja mais euforizante que a
morfina. As demais drogas do grupo dos opiáceos são consideradas inferiores em relação ao
efeito euforizante e prazeroso, sendo utilizadas somente em situações emergenciais (SILVA,
2002).
O que se pode inferir de todos os estudos que fazem levantamentos de abuso de
opióides é que esta forma de uso desta classe de substâncias não é muito frequente. Porém,
devido ao seu alto potencial de indução de dependência, qualquer uso abusivo de opióides
deve ser considerado e prevenido para se evitar uma epidemia deste tipo de vício (BALTIERI
et al, 2004).
5.3 Sinais físicos e psicológicos do abuso de opióides
Sensação de euforia, de bem estar profundo, supressão de preocupações e tensões são
os sinais psicológicos habitualmente relatados pelos viciados em opióides. Já os sinais físicos
clássicos são disforia, náuseas, vômitos, sudorese e mal estar, os quais são indesejáveis por
estes viciados. Sendo assim, muitos indivíduos abandonam a droga logo após o primeiro
contato devido a estes sinais físicos, entretanto, alguns indivíduos descobrem uma sensação
de bem estar muito “especial”, descrito desta forma por eles, o que os leva a utilizar
novamente e repetidamente a droga até se tornarem dependentes (SILVA, 2002).
Os usuários crônicos de opióides apresentam lentidão geral, sonolência, constipação
intestinal, miose, sensação de calor em certas partes do corpo e sensação no baixo ventre, que
eles comparam com orgasmo sexual (SILVA, 2002).
Os viciados que têm facilidade em conseguir a substância responsável pelo seu vício
conservam-se relativamente equilibrados. Observa-se que o uso moderado dos opióides é
compatível com o bom estado de saúde física e mental do usuário e, que somente após
muitos anos de uso, certo grau de deterioração pessoal é percebido (SILVA, 2002).
6 TRATAMENTO DO ABUSO
O abuso de opióides apresenta frequentemente como principal consequência para o
usuário o desenvolvimento de dependência e/ou a intoxicação. Desta maneira, o tratamento
do abuso passa necessariamente pelo tratamento da dependência e da intoxicação.
As principais formas de tratamento para transtornos de uso de substâncias são:
psicoterapias, grupos de auto-ajuda mútua (Narcóticos Anônimos), tratamento hospitalar,
tratamento ambulatorial e tratamento psicofarmacológico, porém, diferentemente de adições
de outras substâncias, o tratamento farmacológico é o mais eficaz enquanto os demais
apresentam eficácia questionável (BALTIERI et al, 2004).
6.1 Manejo da intoxicação de opióides
A intoxicação de opióides geralmente ocorre em pessoas com baixa tolerância ou
relativamente inexperientes no uso de opióides, em dependentes que misturam o uso de
opióides com outras drogas que deprimem o SNC e em pessoas que variam na dosagem
(BALTIERI et al, 2004).
Nestes casos, atitudes emergenciais devem ser tomadas, providenciando-se um
suporte ventilatório adequado, uma correção da hipotensão, uma avaliação da temperatura
corporal e, no caso de coma, depressão respiratória ou convulsões, achados comuns na
intoxicação por opióides, administração intravenosa de naloxona (BALTIERI et al, 2004).
Importante ressaltar o papel da naloxona como antídoto para intoxicação por qualquer
opióide, capaz de reverter todos os seus efeitos. A naloxona é estruturalmente relacionada à
morfina e tem ação antagonista em receptores mu, capa e delta. Deve-se considerar que a
naloxona pode induzir a síndrome de abstinência em indivíduos dependentes (SILVA, 2002).
6.2 Tratamento farmacológico da síndrome de dependência de opióides
Como visto anteriormente, a dependência de opióides se desenvolve rapidamente,
podendo ocorrer com a ingestão da primeira dose. Sintomas leves ou moderados podem ser
observados após o uso regular de um opióide por somente alguns dias (BALTIERI et al,
2004).
O tratamento farmacológico pode ser feito por dois métodos, a abstinência
supervisionada ou a manutenção (BALTIERI et al, 2004).
A abstinência supervisionada, também conhecida como desintoxicação, varia de
acordo com o tempo de abstinência e com o tipo de medicamento utilizado. Em relação ao
tempo de abstinência, observa-se que períodos maiores de abstinência supervisionada, feita
em pacientes ambulatoriais, apresentam maior êxito quando feito por tempo mais prolongado
(BALTIERI et al, 2004).
Quanto ao tipo de medicamento utilizado, a abstinência supervisionada é dividida em
terapia de substituição e em tratamento sintomático. Na terapia de substituição as medicações
utilizadas são da mesma classe da substância abusada - atualmente, os dois medicamentos
habitualmente prescritos são a metadona e buprenorfina – e na terapia de tratamento de
sintomas da abstinência objetiva-se tratar sinais e sintomas relacionados com a abstinência de
opióides – o medicamento mais efetivo é a clonidina, que reduz sinais e sintomas como
sudorese, piloereção, formigamento, náusea e vômito (BALTIERI et al, 2004).
O tratamento de manutenção baseia-se em administração contínua de medicamento,
que pode durar anos, e não ocorre diminuição gradual da dose deste medicamento durante o
tratamento. As substâncias mais utilizadas são buprenorfina, clonidina, metadona, codeína,
tramadol e pelo menos 15 dias após a retirada de qualquer opióide, naltrexona. Importante
ressaltar que este tipo de tratamento deve estar associado com outra terapia, como grupos de
ajuda mútua, psicoterapias ou suporte psicossocial (BALTIERI et al, 2004).
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O uso de opióides apresenta uma dualidade considerável, pois apesar de beneficiarem
milhões de pessoas que sofrem de síndromes dolorosas, acarretam em seus usuários, tanto os
que o fazem de forma terapêutica como os que fazem de forma abusiva, fenômenos como
tolerância, dependência física e outros efeitos adversos que limitam o seu emprego.
Sendo assim, diante da impossibilidade de descarte do uso de opióides, a prescrição
destas substâncias deve ser feita de forma controlada e eficiente, de modo que haja uma
administração cuidadosa e monitorada destas. Além disso, o abuso de opióides deve ser
analisado de forma aprofundada, como vem sido feito, com a descrição de seus sinais clínicos
e psicológicos, de seu mecanismo de desenvolvimento e de formas de tratamento, para que,
diante deste conhecimento, os distúrbios associados ao uso de opióides sejam minimizados ou
amenizados em pessoas que necessariamente precisam fazer uso clínico destes.
Paralelamente a atitudes paliativas para se evitar ou amenizar o abuso de opióides,
estudos vêm sido feitos para desenvolver medicamentos com a mesma propriedade analgésica
dos opióides, porém com um menor potencial de criar dependência, o que, futuramente,
poderá possibilitar a inclusão dos opióides na lista de medicamentos proscritos no Brasil.
8 REFERÊNCIAS
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