Parte 1 Espaços de Banach 1.1 Espaços Normados Definição 1.1. Seja X um espaço vetorial sobre K (K = C ou K = R). Uma semi-norma em X é uma aplicação p : X → [0, +∞[ que satisfaz as seguintes propriedades: (N 1) p(λx) = |λ| · p(x), ∀x ∈ X, ∀λ ∈ K; (N 2) (Desigualdade triangular) p(x + y) ≤ p(x) + p(y), ∀x, y ∈ X. Se p satisfaz a propriedade adicional (N 0) p(x) = 0 ⇒ x = 0, p é dita uma norma em X e neste caso é comum escrever kxk no lugar de p(x). Observe que se p é uma semi-norma em X então segue imediatamente de (N 1) que p(0) = 0. Assim, p será uma norma se o único vetor x ∈ X com p(x) = 0 é o vetor nulo. Estaremos mais interessados nas normas, embora as semi-normas aparecerão em alguns momentos. Um espaço normado é um espaço vetorial sobre K munido de uma norma. Vejamos alguns exemplos. Exemplo 1.2. O corpo K (visto como espaço vetorial sobre si próprio) é um espaço normado se o equiparmos com a norma kλk = |λ|. Mais geralmente, Kp é um espaço normado, p pois sabemos que kxk = |x(1) |2 + |x(2) |2 + · · · + |x(p) |2 , onde x = (x(1) , x(2) , . . . , x(p) ), é 1 2 MAT5721 - Leonardo Pellegrini uma norma em Kp . É fácil verificar que kxk1 = |x(1) | + |x(2) | + · · · + |x(p) | e kxk∞ = max{|x(1) |, |x(2) |, . . . , |x(p) |} também são normas em Kp . As duas últimas normas são mais fáceis de se trabalhar e equivalentes à primeira (num sentido que precisaremos mais adiante). Para o próximo exemplo, lembramos que se A é um espaço topológico e f uma função f : A → K, então f é contı́nua em a ∈ A se, para todo ε > 0, existir um aberto V de A contendo a tal que |f (x) − f (a)| < ε, se x ∈ V . Exemplo 1.3. Seja A 6= ∅ um espaço topológico, e consideremos agora o espaço vetorial Cb (A) constituı́do de todas as funções f : A → K que são contı́nuas e limitadas. Definimos para f ∈ Cb (A) kf k = sup |f (x)|. x∈A Observe que pelo fato de f ser limitada tal supremo é finito. Então kf k ∈ [0, +∞[. Afirmamos que k · k é uma norma em Cb (A). De fato, se kf k = supx∈A |f (x)| = 0, então |f (x)| = 0 para todo x ∈ A. Logo, f é a função nula e (N 0) está mostrada. Para mostrar (N 1) observe que para cada x ∈ A |λf (x)| = |λ| |f (x)| ≤ |λ| sup |f (x)| = |λ| kf k. x∈A Então |λ| kf k é uma cota superior do conjunto {|λf (x)| : x ∈ A}. Então supx∈A |λf (x)| ≤ |λ| kf k, o que nos mostra que kλf (x)k ≤ |λ| kf k. Por outro lado, se λ 6= 0, temos que |f (x)| = |λ| |λ−1 | |f (x)| = |λ−1 | |λf (x)| ≤ |λ−1 | kλf k, e portanto, tomando o supremo, kf k ≤ |λ−1 | kλf k, ou seja |λ| kf k ≤ kλf k. Assim |λ| kf k = kλf k, se λ 6= 0. Porém, se λ = 0 a igualdade é imediata e portanto ela é valida para qualquer λ ∈ K. Finalmente, se f, g ∈ Cb (A) e x ∈ A, |f (x) + g(x)| ≤ |f (x)| + |g(x)| ≤ sup |f (x)| + sup |g(x)| = ||f k + kgk. x∈A x∈A Portanto kf + gk ≤ ||f k + kgk, o que demonstra (N 2). 1.2 A topologia da norma Se X é um espaço normado, então X é também um espaço métrico, onde a métrica é dada por d(x, y) = kx − yk. É quase que imediato que d é de fato uma métrica em X. Dizemos que d é induzida pela norma de X. 1.2. A topologia da norma 3 A topologia de X é definida a partir desta métrica: A bola aberta centrada em x0 def de raio r > 0 é o conjunto B(x0 , r) = {x ∈ X : kx − x0 k < r}. Um conjunto é aberto em X se é a reunião (finita ou não) de bolas abertas. Equivalentemente, um subconjunto V ⊂ X será aberto se para todo x0 ∈ V existir um r > 0 tal que B(x0 , r) ⊂ V . Os outros conceitos topológicos são definidos a partir destes abertos. Um conjunto F será fechado em X se seu complementar X \ F for aberto em X. Denotaremos a bola def fechada centrada em x0 de raio r > 0 por B[x0 , r] = {x ∈ X : kx − x0 k ≤ r}. Verifique que de fato B[x0 , r] é um conjunto fechado. Um ponto x0 ∈ X é chamado de aderente ao conjunto Z ⊂ X se toda bola centrada em x0 intercepta Z. Isso significa que há pontos de Z arbitrariamente próximos de x0 . O fecho de um subconjunto Z de X é conjunto de seus pontos aderentes e é denotado por Z. É fácil ver que Z é o menor fechado que contém Z. Uma sequência (xn )n∈N ⊂ X converge para x ∈ X se, para todo ε > 0 existe n0 ∈ N tal que n > n0 ⇒ kxn −xk < ε. Neste caso, dizemos que (xn )n é uma sequência convergente em X e que x é limite de (xn )n . Algumas propriedades das sequências convergentes estão destacadas nos exercı́cios. Vejamos agora algumas propriedades da topologia da norma. Lembramos que se Y e Z são espaços normados, estaremos considerando em Y × Z a topologia produto. Um conjunto é aberto em tal topologia se é reunião de conjuntos da forma U × V onde U é aberto em Y e V é aberto em Z. Proposição 1.4. Seja X um espaço normado. Então, são contı́nuas as aplicações • S : X × X → X dada por S(x, y) = x + y; • M : K × X → X dada por M (λ, y) = λy; • N : X → X dada por N (x) = kxk. Demonstração. Mostraremos primeiramente que a soma é contı́nua. Seja (x0 , y0 ) ∈ X×X. Dado ε > 0, tomando o aberto W = B(x0 , 2ε ) × B(y0 , 2ε ), teremos que ε ε e kv − y0 k < 2 2 ⇒ k(u + v) − (x0 + y0 )k ≤ ku − x0 k + kv − y0 k < ε (u, v) ∈ W ⇒ ku − x0 k < ⇒ kS(u, v) − S(x0 , y0 )k < ε, 4 MAT5721 - Leonardo Pellegrini o que mostra que S é contı́nua em (x0 , y0 ). Deixaremos a multiplicação como exercı́cio. Para mostrar que a norma é contı́nua, observe que para quaisquer vetores x, y ∈ X vale a desigualdade |kxk − kyk| ≤ kx − yk. De fato x, y ∈ X, kxk = kx − y + yk ≤ kx − yk + kyk e portanto kxk − kyk ≤ kx − yk. Trocando y por x, obtemos kyk − kxk ≤ kx − yk. Logo, |kxk − kyk| ≤ kx − yk. Isso mostra que |N (x) − N (y)| ≤ kx − yk, sendo N uma contração e portanto (uniformemente) contı́nua. A proposição anterior mostra que as operações de espaço vetorial são compatı́veis com a topologia da norma. Vejamos uma consequência. Antes, lembramos da seguinte caracterização computacionalmente mais simples: O fecho de Z é o conjunto de todos elementos x ∈ X para os quais existe uma sequência contida em Z convergindo para x. Proposição 1.5. Seja X um espaço normado e S um subespaço vetorial de X. Então o fecho que S também é um subespaço vetorial de X Demonstração. Claro que 0 ∈ S, pois 0 ∈ S e S ⊂ S. Sejam x, y ∈ S e λ ∈ K. Então existem sequências (xn )n , (yn )n ⊂ S com xn → x e yn → y. Pela continuidade das operaçôes em X segue que xn + λyn → x + λy e como S é um subespaço de X, (xn + λyn )n ⊂ S. Logo x + λy ∈ S. 1.3 Normas Equivalentes Dizemos que duas normas k · k e k · k0 definidas em um espaço vetorial X são equivalentes se geram a mesma topologia em X. Ou seja, se um subconjunto de X é aberto segundo k · k se, e somente o for segundo k · k. Assim, os valores kxk e kxk0 podem ser distintos mas todos os conceitos topológicos permanecem invariantes se trocarmos a norma k · k pela norma k · k0 em X. É facil verificar que duas normas são equivalentes se, e somente se, toda bola aberta centrada em x0 segundo uma norma contém uma bola aberta centrada em x0 segundo a outra. Destacaremos o seguinte critério: 1.4. Espaços de Banach 5 Proposição 1.6. Se existirem constantes positivas a e b tais que akxk0 ≤ kxk ≤ bkxk0 , ∀x ∈ X, então k · k e k · k0 são equivalentes. Demonstração. Considere uma bola aberta Bk·k (x0 , r) segundo a norma k·k. Então, se x ∈ Bk·k0 (x0 , rb ) então kx−x0 k0 < rb e portanto kx−x0 k ≤ bkx−x0 k0 < r. Logo Bk·k0 (x0 , rb ) ⊂ Bk·k (x0 , r). De maneira análoga mostramos que Bk·k (x0 , r · a) ⊂ Bk·k0 (x0 , r). Exemplo 1.7. As normas de Kp do exemplo 1.2 são equivalentes, pois kxk∞ ≤ kxk ≤ kxk1 ≤ pkxk∞ . A recı́proca da proposição anterior é verdadeira. Veremos a demostração mais adiante quando estudarmos as aplicações lineares. 1.4 Espaços de Banach Lembramos que uma sequência (xn )n∈N em um espaço métrico M é dita de Cauchy se, para todo ε > 0, exitir um n0 ∈ N tal que d(xn , xm ) < ε, se n, m > n0 . É imediato que toda sequência convergente é de Cauchy. Porém, nem toda sequência de Cauchy é converge. Um espaço metrico é dito completo se toda sequência de Cauchy converge (em M , claro). Definição 1.8. Um espaço normado X é chamado de Espaço de Banach se toda sequência de Cauchy em X converge. Assim, um espaço normado é um espaço de Banach se é um espaço métrico completo em relação à metrica induzida por sua norma. Vejamos agora alguns exemplos. Exemplo 1.9. O espaços normado R é um espaço de Banach, pois sabemos do curso de análise real que toda sequência de Cauchy de números reais converge. Exemplo 1.10. Vamos mostrar que Rp é um espaço de Banach. Seja (xn )n∈N uma sequência de Cauchy em Rp . Note que aqui cada xn é uma p-upla de números reais: (1) (2) (p) xn = (xn , xn , . . . , xn ). Como (xn )n∈N é uma sequência de Cauchy, para todo ε > 0, existe algum n0 ∈ N tal que q (1) (1) (2) (2) (p) (p) n, m > n0 ⇒ kxn − xm k = (xn − xm )2 + (xn − xm )2 + · · · + (xn − xm )2 < ε. 6 MAT5721 - Leonardo Pellegrini (i) (i) Em particular, para cada i = 1, 2, . . . , p, se n, m > n0 então |xn − xm | < ε. Isso nos (i) mostra que cada sequência (xn )n é uma sequência de Cauchy em R e portanto converge, (i) pelo exemplo anterior. Defina então x(i) = limn xn e considere x = (x(1) , x(2) , . . . , x(p) ). Claro que x ∈ Rp e vamos mostrar que este é o limite da sequência (xn )n . Seja então (i) (i) ε > 0. Como x(i) = limn xn , para cada i = 1, 2, . . . , p, existe ni tal que |xn −x(i) |2 < ε2 /p, se n > ni . Se k0 = max{ni : i = 1, 2, . . . , p}, então q (1) (2) (p) n > k0 ⇒ kxn − xk = (xn − x(1) )2 + (xn − x(2) )2 + · · · + (xn − x(p) )2 < ε, o que mostra que (xn )n converge para x em Rp . Observação 1.11. Como espaços normados, C é identico a R2 . Segue então pelo exemplo anterior que C é um espaço de Banach. Consequentemente, Cp também é um espaço de Banach. Exemplo 1.12. Consideremos agora o espaço Cb (A). Seja (fn )n uma sequência de Cauchy em Cb (A). Então para todo ε > 0, existe algum n0 ∈ N tal que n, m > n0 ⇒ kfn − fm k = sup |fn (x) − fm (x)| < ε. x∈A Como no exemplo anterior, vemos que para cada x ∈ A a sequência (fn (x))n uma sequência de Cauchy em K e portanto converge (pela observação anterior) para algum α(x) ∈ K. Defina f : A → K pondo f (x) = α(x). Observe que, se x ∈ A e n, m > n0 |fn (x) − f (x)| ≤ |fn (x) − fm (x)| + |fm (x) − f (x)| ≤ kfn − fm k + |fm (x) − f (x)| < ε + |fm (x) − f (x)|. Fazendo m → ∞, obtemos que |fn (x) − f (x)| ≤ ε para qualquer x ∈ A. Então, sup |fn (x) − f (x)| ≤ ε, se n > n0 (∗) x∈X Devemos mostrar que f está em Cb (A): Mostremos inicialmente que f é contı́nua. Sejam x0 ∈ A e ε > 0. Usando (∗) com 3ε , obtemos n fixo tal que |fn (x) − f (x)| ≤ 3ε , para qualquer x ∈ X. Ora, fn está em Cb (A). Então, existe um aberto Vε contendo x0 tal que |fn (x) − fn (x0 )| < 3ε , se x ∈ Vε . Assim, para cada x ∈ Vε , |f (x) − f (x0 )| ≤ |f (x) − fn (x)| + |fn (x) − fn (x0 )| + |fn (x0 ) − f (x0 )| ≤ ε ε ε + + = ε, 3 3 3 1.4. Espaços de Banach 7 o que mostra que f é contı́nua. Claramente f é limitada, pois usando (∗) com ε = 1, obtemos n fixo tal que |fn (x) − f (x)| ≤ 1, para qualquer x ∈ A, e portanto |f (x)| ≤ |f (x) − fn (x)| + |fn (x)| ≤ 1 + kfn k. Finalmente, é imediato por (∗) que (fn )n converge para f em Cb (A). Isso completa a demonstração. O exemplo anterior é bem genérico. A seguir daremos dois exemplos particulares importantes baseados no anterior. Exemplo 1.13. (O espaço `∞ ) O espaço `∞ é definido fazendo A = N no exemplo def anterior. Assim, `∞ = Cb (N). Note que como toda função f : N → K é contı́nua (pois N é discreto), segue que `∞ é o espaço de Banach das sequências limitadas de escalares. Se x = (xn )n ∈ `∞ , então kxk = supn∈N |xn |. Exemplo 1.14. (Espaços C(K)) Seja agora A = K um espaço topológico compacto. Então toda função continua em K é limitada. Denotamos então o espaço Cb (K) simplesmente por C(K), o espaço de Banach das funções contı́nuas no compacto K. Observação 1.15. Veremos adiante que `∞ pode ser visto como um espaço da forma C(K), onde K é a compactificação de Stone-C̆ech de N (N não é compacto!!). Vejamos agora um exemplo de espaço normado não completo. Exemplo 1.16. (Um espaço normado que não é Banach) Seja X = c00 o espaço das sequências quase nulas. Ou seja, uma sequência pertence a c00 se possui apenas zeros a partir de um certo ı́ndice. Mostraremos que c00 não é um espaço de Banach. Para tanto, devemos exibir uma sequência de Cauchy em c00 que não converge. Considere a sequência (de sequências quase nulas) (xn )n definida por x1 = (1, 0, 0 . . . , 0, 0, . . .), 1 x2 = (1, , 0 . . . , 0, 0, . . .) 2 .. . 1 1 xn = (1, , 0, . . . , , 0, . . .) 2 n .. . 8 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Note que (xn )n é de Cauchy, pois dado ε > 0, existe n0 ∈ N, n0 > 1ε . Assim, se n > m > n0 , 1 1 1 1 1 kxn − xm k = (0, 0 . . . , , , . . . , , 0, 0, . . .) = < < ε. m+1 m+2 n m+1 n0 Porém, (xn )n não converge em c00 . De fato, suponha por absurdo que x = (x(1) , x(2) , . . . , ) ∈ c00 seja o limite de (xn )n . Então existe um k ∈ N tal que x(i) = 0, se i ≥ k. Assim, se n ≥ k, 1 kxn − xk = sup |xn − x| ≥ , k n∈N contradizendo o fato de (xn )n convergir para x. Note que c00 é um subespaço (vetorial e normado) de `∞ que não é completo, apesar deste ser. A proposição seguinte nos dá um critério para decidir se um subrespaço S de X é Banach. Quando nos referirmos a subespaço significará sempre que a norma de S é a induzida por X. Proposição 1.17. Todo subespaço fechado de um espaço de Banach é Banach. Reciprocamente, todo subespaço de Banach de um espaço normado é fechado. Demonstração. Suponha que S seja fechado em X Banach. Tomamos um sequência de Cauchy (xn )n ⊂ S. Mas (xn )n também é uma sequência de Cauchy em X que é completo. Logo, (xn )n converge para algum x ∈ X. Isso implica que x ∈ S̄. Sendo S fechado, temos que x ∈ S. Mostramos então que toda sequência de Cauchy em S converge (em S). Logo, S é completo. Reciprocamente, seja S completo no normado X. Considere x ∈ S̄. Então existe uma sequência (xn )n ⊂ S que converge para X. Ora, toda sequência convergente é de Cauchy. Assim, (xn )n é uma sequência de Cauchy em S que é completo e portanto converge para algum y ∈ S ⊂ X. Pela unicidade do limite em X (todo espaço normado é Hausdorff), temos que x = y, e portanto x ∈ S, sendo este fechado. A proposição anterior é útil para mostrar que determinados espaços normados são Banach. Vejamos alguns exemplos Exemplo 1.18. Seja A um espaço topológico Hausdorff e considere C0 (A) o subconjunto def das funções f ∈ Cb (A) tais que para cada ε > 0, o conjunto Vε (f ) = {x ∈ A : |f (x)| ≥ ε} é compacto. Vamos mostrar que C0 (A) é um espaço de Banach. Como uma aplicação da proposição anterior, mostraremos que é um subespaço fechado em Cb (A). 1.4. Espaços de Banach 9 Note que C0 (A) é um subespaço vetorial de Cb (A). De fato, a aplicação nula está em C0 (A) pois Vε (0) = {x ∈ A : 0 ≥ ε} = ∅. Além disso, se λ 6= 0 é um escalar e ε ε (f ), } = V |λ| f ∈ C0 (A), então Vε (λf ) = {x ∈ A : |λf (x)| ≥ ε} = {x ∈ A : |f (x)| ≥ |λ| sendo compacto. Finalmente, sejam f, g ∈ C0 (A). Como Vε (f + g) ⊂ Vε/2 (f ) ∪ Vε/2 (g) segue que Vε (f + g) é compacto, pois é fechado (f e g são contı́nuas) e está contido em um compacto. Logo f + g ∈ C0 (A). Mostremos agora que C0 (A). Seja f ∈ C0 (A) e tome uma sequência fn ⊂ C0 (A) convergindo para f . Temos que mostrar que para todo ε > 0, Vε (f ) é compacto. Sejam então ε > 0 arbitrário e x ∈ Vε (f ). Então |f (x)| ≥ ε. Como fn converge para f , existe N ∈ N tal que kfN − f k < ε/2. Assim ε ≤ |f (x)| ≤ |f (x) − fN (x)| + |fN (x)| ≤ kfN − f k + |fN (x)| < ε + |fN (x)|, 2 ou seja, |fN (x)| ≥ 2ε , o que mostra que x ∈ V 2ε (fN ). Logo, Vε (f ) ⊂ V 2ε (fN ) e este último é compacto. Isso mostra que Vε (f ) também é compacto (pois é um fechado contido em um compacto) e conclui a demonstração. Vejamos agora um importante caso particular do exemplo anterior. Exemplo 1.19. Suponha que A = N e considere C0 (N). Note que (xn ) ∈ C0 (N) ⇔ {n ∈ N : |xn | ≥ ε} é compacto, ∀ε > 0 ⇔ {n ∈ N : |xn | ≥ ε} é finito, ∀ε > 0 ⇔ xn → 0. Logo def c0 = C0 (N) = {(xn ) ∈ `∞ : xn → 0}. Lembrando que a norma é a induzida por `∞ . Finalizamos esta parte com a generalização de um resultado conhecido de R. Dizemos X que uma série xk em um espaço normado X é absolutamente convergente se a série k∈N numérica X kxk k for convergente. k∈N Teorema 1.20. Seja X um espaço normado. Então X é Banach se, e somente se, toda série de elementos de X absolutamente convergente é convergente. 10 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Demonstração. Seja X Banach. Tomamos uma série X xk absolutamente convergente. k∈N Temos que mostrar que a sequência de suas somas parciais (sn )n converge. Como X kxk k k∈N converge ela é uma série de Cauchy. Então, dado ε > 0 existe n0 ∈ N tal que m > n ≥ m X n0 ⇒ kxk k. Assim, se m > n ≥ n0 , k=n+1 m X ksm − sn k = k m X xk k ≤ k=n+1 kxk k < ε. k=n+1 Logo, (sn )n é uma sequência de Cauchy em X que é completo. Logo, (sn )n converge. Reciprocamente, Considere uma sequência (xn )n de Cauchy em X. Então, para j = 1, existe n1 ∈ N tal que kxm − xn k < 2−1 , se m, n ≥ n1 . Para j = 2 existe n2 > n1 tal que kxm − xn k < 2−2 , se m, n ≥ n2 . Prossegindo desta forma, construimos uma sequência crescente de ı́ndices (nj ) tal que kxm − xn k < 2−j , se m, n ≥ nj . Definimos y0 = xn1 e yj = xnj+1 − xnj , para j ∈ N. Vemos então que ∞ X kyj k < ky0 k + j=0 o que mostra que ∞ X ∞ X 2−j < ∞, j=1 yj é absolutamente convergente em X e portanto converge, por j=0 hipótese, para algum y ∈ X. Mas lim xnk = lim k k k−1 X yj = y. Vemos então que a sequência j=0 de Cauchy (xn )n possui um subsequência convergente. Logo, (xn )n é convergente. 1.5 Os Espaços `p e Lp Definição 1.21. O espaço vetorial das sequências de escalares absolutamente p-somáveis é denotado por `p . Ou seja, n o X `p = x = (xk )k∈N ∈ KN : |xk |p < ∞ . k∈N Tal espaço é munido de uma norma natural, dada por kxkp = P k∈N |xk |p p1 . 1.5. Os Espaços `p e Lp 11 Primeiramente, temos que verificar que `p é de fato um espaço vetorial e que k · kp 1 P p p é uma norma. Se λ é um escalar qualquer e x ∈ `p , então kλxkp = = k∈N |λxk | 1 P p p |λ| = λkxkp . Isso mostra que a operação de multiplicação por escalar está k∈N |xk | bem definida em `p e que kλxk1 = λkxk1 . É imediato que a sequência nula pertence a `p e que kxkp = 0 ⇒ x = 0. Quando p = 1, é fácil ver que `1 a soma em `1 é bem definida e que vale a desigualdade triangular: Sejam x, y ∈ `1 . Então, para todo n ∈ N, n X |xk + yk | ≤ k=1 n X |xk | + |yk | ≤ k=1 ∞ X |xk | + k=1 ∞ X |yk | < ∞. k=1 P∞ P∞ P∞ Assim, k=1 |xk + yk | ≤ k=1 |xk | + k=1 |yk |. Isso mostra que x + y ∈ `1 e que kx + yk1 ≤ kxk1 + kyk1 . Porém, para mostrar o mesmo quando 1 < p < ∞, precisamos de alguns resultados preliminares. Lema 1.22. Sejam p, q > 1, tais que ab ≤ 1 p + 1q = 1 (dizemos que q é conjugado de p). Então ap b q + , ∀a, b ≥ 0. p q Demonstração. Fixe b e considere a função ϕ(a) = ap p + bq q − ab. É um exercı́cio simples 1 de Cálculo 1 verificar que o mı́nimo absoluto de ϕ ocorre em a = b p−1 . Assim, para todo p a ≥ 0 (note que p−1 = q = q+p ), p p ϕ(a) ≥ ϕ(b e portanto ap p + bq q 1 p−1 q+p 1 bq b p−1 bq bq bq bq )= + − b p−1 b = + − b p = + − bq = 0, p q p q p q ≥ ab. Teorema 1.23. (Desigualdade de Hölder) Sejam p, q > 1, tais que p1 + 1q = 1. Então para quaisquer ak , bk ∈ K (k = 1, . . . , n), temos n X k=1 |ak bk | ≤ n X k=1 ! p1 |ak |p · n X ! 1q |bk |q . k=1 Demonstração. Se todos ak ’s ou todos bk ’s são nulos, então a desigualdade é trivial. Suponha então que nem todos ak ’s e nem todos bk ’s são nulos. Para k = 1, . . . , n de- 12 MAT5721 - Leonardo Pellegrini fina ak Ak = n X bk e Bk = ! p1 n X |ak |p k=1 ! 1q . |bk |q k=1 Aplicando o lema anterior para cada Ak e Bk , obtemos =1 =1 z }| { n 1X p Ak Bk ≤ A + p k=1 k k=1 n X z }| { n X 1 1 1 Bkq = + = 1, q k=1 p q e portanto n X |ak bk | = k=1 n X ! · Ak Bk k=1 n X ! p1 |ak |p k=1 · n X ! 1q |bk |q n X ≤ k=1 ! p1 |ak |p · k=1 n X ! 1q |bk |q . k=1 Teorema 1.24. (Desigualdade de Minkowski) Se p ∈ [1, ∞[ e ak , bk ∈ K (k = 1, . . . , n), então ! p1 ! p1 ! p1 n n n X X X |ak + bk |p ≤ |ak |p · |bk |p . k=1 k=1 k=1 Demonstração. A desigualdade para p = 1 já foi mostrada no inı́cio desta seção. Suponha então que p > 1 e seja q seu conjugado. Podemos assumir que ak , bk ≥ 0. Por Hölder obtemos que (Note que (p − 1)q = p) ! n n X X p (ak + bk ) = (ak + bk )p−1 (ak + bk ) k=1 k=1 = n X (ak + bk )p−1 ak + k=1 (H ölder) ≤ n X (ak + bk )p−1 bk k=1 n X (ak + bk )(p−1)q ! 1q n X · k=1 ! 1q · k=1 = k=1 |ak |p k=1 n X + (ak + bk )(p−1)q n X ! p1 ! p1 |bk |p k=1 ! 1q (ak + bk )p n X · n X k=1 ! p1 |ak |p + n X k=1 ! p1 |bk |p , 1.5. Os Espaços `p e Lp n X e portanto 13 ! q−1 q (ak + bk )p ≤ k=1 n X ! p1 |ak |p + k=1 n X ! p1 |bk |p . Como q−1 q = p1 , obtemos k=1 a desigualdade. Vamos mostrar agora que a soma em `p é bem definida a desigualdade triangular. Sejam então x, y ∈ `p . Então, por Minkowski, para todo n ∈ N, ! p1 ! p1 ! p1 ! p1 ! p1 n n ∞ ∞ n X X X X X ≤ + ≤ + < ∞. |xk |p |yk |p |xk |p |yk |p |xk + yk |p k=1 k=1 Assim, ∞ X k=1 k=1 k=1 ! p1 |xk + yk |p ≤ kxkp + kykp , o que mostra que x + y ∈ `p e que kx + ykp ≤ k=1 kxkp + kykp . Se p = ∞, o espaço `∞ foi definido em 1.13 e é um espaço de Banach. O proximo teorema diz que os outros `p ’s também são completos. Teorema 1.25. Seja 1 ≤ p ≤ ∞, então `p é um espaço de Banach. Demonstração. Se p = ∞ já sabemos. Suponha então que 1 ≤ p < ∞. Seja (xn )n∈N uma sequência de Cauchy em `p . Note que aqui cada xn é uma sequência de escalares (1) (2) xn = (xn , xn , . . .) ∈ `p . Como (xn )n∈N é uma sequência de Cauchy, para todo ε > 0, existe algum n0 ∈ N tal que ! p1 ∞ X (i) p n, m > n0 ⇒ kxn − xm kp = |x(i) < ε. (∗) n − xm | i=1 (i) (i) Em particular, para cada i ∈ N, se n, m > n0 então |xn − xm | < ε. Isso nos mostra que (i) cada sequência (xn )n é uma sequência de Cauchy em K e portanto converge, por este ser completo. (i) Defina então x(i) = limn xn e considere x = (x(1) , x(2) , . . .). Vamos mostrar que x ∈ `p . Como a sequência (xn )n é de Cauchy, então é limitada (Execı́cio). Logo, existe M > 0 ! p1 ! p1 ∞ k X X p p |x(i) ≤ M , para todo n ∈ N. Então |x(i) ≤ M , para todo tal que n | n | i=1 i=1 n, k ∈ N. Fazendo n → ∞, obtemos que k X i=1 ∞ X i=1 ! p1 |x(i) |p ≤ M , o que mostra que x ∈ `p . ! p1 |x(i) |p ≤ M , para todo k ∈ N. Então 14 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Resta mostrar que (xn )n converge para x (na norma de `p ). Dado ε > 0, fazendo ! p1 k X (i) p m → ∞ em (∗), obtemos que |x(i) ≤ ε, para n > n0 e k ∈ N. Então, n −x | i=1 kxn − xkp = ∞ X ! p1 (i) p |x(i) n −x | ≤ ε, se n > n0 . i=1 Definição 1.26. • Seja 1 ≤ p < ∞. Denotamos por Lp [0, 1] o espaço vetorial das classes de equivalências das funções escalares (Lesbesgue)-mensuráveis tais que R |f (t)|p dt < ∞ (Aqui duas funções estão na mesma classe se são iguais quase [0,1] sempre), munido de uma norma natural Z p1 p kf kp = |f (t)| dt . [0,1] • Denotamos por L∞ [0, 1] o espaço vetorial das classes de equivalências das funções escalares (Lesbesgue)-mensuráveis que são limitadas quase sempre munido da norma kf k∞ = inf{α > 0 : µ{t ∈ [0, 1] : f (t) > α} = 0}, onde µ denota a medida de Lesbeguem em [0, 1]. Os espaço acima definidos são espaços de Banach. A demonstração pode ser encontrada em qualquer livro sobre a medida de Lesbegue. 1.6 Espaços Separáveis Seja X um espaço métrico e suponha que D ⊂ A ⊂ X. Dizemos que D é denso em A se toda bola aberta centrada em elementos de A contém algum elemento de D. Observe que isso significa que todo elemento de A é aderente a D. Então, D é denso em A se D ⊃ A. É fácil ver que se D é denso em A e A é denso em X, então D é denso em X. Também é imediato que A é denso em Ā. Verifique como exercı́cio. Um subconjunto A ⊂ X é dito separável se possui um conjunto enumerável denso. Por exemplo, sabemos que um intervalo da reta é separável, pois o conjunto dos racionais deste intervalo é enumerável e denso. Em particular a reta é um espaço separável. Estaremos interessados em saber quando um espaço normado é separável. O seguinte critério é útil para decidir. Lembramos que se A é um subconjunto de X, então [A] denota o subespaço gerado por A (no sentido da Álgebra Linear). 1.6. Espaços Separáveis 15 Proposição 1.27. Seja X um espaço normado sobre K. (a) Se X possui um subconjunto A enumerável (podendo ser finito) tal que X = [A], então X é separável. (b) Se X possui um subconjunto B não enumerável tal que, para algum r > 0, kx−yk ≥ r, para qualquer par de elementos distintos x, y de B, então X não pode ser separável. Demonstração. (a) Seja S = [A]. Um elemento de S é portanto uma combinação linear (finita!!) de elementos de A. Seja D o subconjunto de S formado apenas pelas combinações lineares com coeficientes racionais (Se K = C, coeficientes com parte real e imaginária racionais). Então D tem a cardinalinada das funções finitas de N em Q e portanto é enumerável (aqui é importante que seja combinação finita). É fácil ver que D é denso em em S. Claramente, S é denso em S = [A] = X. Logo, D é denso em X, sendo separável. (b) Seja D um conjunto denso qualquer em X. As bolas centradas em elementos de B e raio r/2 são disjuntas. Cada uma dessas bolas deve conter pelo menos um elemento de D. Como há uma quantidade não enumerável dessas bolas, segue que D não pode ser enumerável. Logo, X não possui conjunto enumerável denso. Vamos usar a proposição anterior para dar exemplo de espaços separáveis e não separáveis. Exemplo 1.28. c0 é um espaço separável. De fato, considere a sequência unitária n−esima z}|{ canônica en = (0, . . . , 0, 1 , 0, . . .). Vamos mostrar que c0 = [en : n ∈ N] e portanto c0 será separável pela parte (a) da proposição anterior. Seja então x = (xn ) ∈ c0 e ε > 0. Então, existe n0 tal que |xn | < ε, se n > n0 . A sequência xε = (x1 , x2 , . . . , xn0 , 0, 0, . . .) está em [en : n ∈ N] e kx − xε k < ε. Como ε era arbitrário, segue que x ∈ [en : n ∈ N]. Exemplo 1.29. `∞ não é separável. Considere, para cada subconjunto N ⊂ N a sequência caracterı́stica de N . Ou seja, a sequência x = xN = (xn ), onde xn = 1 se n ∈ N e xn = 0 se n ∈ / N . Claro que cada uma destas sequências está em `∞ . Tomamos o conjunto B = {xN : N ⊂ N} ⊂ `∞ . Então a cardinalidade de B é a das partes de N e portanto não enumerável. Além disso, kxN − xN 0 k = 1, se N 0 6= N . Então, pela parte (b) da proposição anterior, `∞ não é separável. Exemplo 1.30. Qualquer espaço normado de dimensão finita é separável, pois é gerado por um conjunto finito. (Que conjunto é esse?) Exemplo 1.31. Pelo Teorema de Aproximação de Weierstrass, os polinômios são densos em C[0, 1] (Veja por exemplo o livro do Elon de Espaços Métricos). Então, [tn : n = 0, 1, . . .] = C[0, 1], o que mostra que C[0, 1] é sepárável. 16 1.7 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Aplicações Lineares Estaremos agora tratando das aplicações lineares entre espaços normados. Os aspectos algébricos destas aplicações são estudados no curso de Álgebra Linear. Como um espaço normado também possui uma estrutura topológica, é natural estudá-las também no que diz respeito à continuidade. Se X é um espaço normado denotaremos por BX a bola fechada de raio 1 centrada na origem. Ou seja BX = {x ∈ X : kxk ≤ 1}. A esfera unitária de X é o conjunto SX = {x ∈ X : kxk = 1}. Começamos com o seguinte resultado. Proposição 1.32. Sejam x e Y espaços normados e T : X → Y linear. Então são equivalentes: (a) T é contı́nua; (b) T é contı́nua na origem; (c) existe uma constante M > 0 tal que kT (x)k ≤ M para qualquer x ∈ BX . (d) existe uma constante M > 0 tal que kT (x)k ≤ M kxk para qualquer x ∈ X. Demonstração. (a) ⇒ (b): É evidente. (b) ⇒ (c): Como T é contı́nua na origem, para ε = 1, existe δ > 0 tal que, para k<δe qualquer x ∈ X, com kxk < δ, temos que kT (x)k < 1. Se x ∈ BX , temos que k δx 2 portanto kT δx k < 1. Então, pela linearidade de T , kT (x)k < 2δ . 2 x x ≤ M. (c) ⇒ (d): Se x ∈ X \ {0}, temos que kxk tem norma 1 e portanto T kxk Então, kT (x)k ≤ M kxk. Se x = 0, temos que T (x) = 0 e a desigualdade também é satisfeita. (d) ⇒ (a): Se existe M > 0 tal que kT (x)k ≤ M kxk para qualquer x ∈ X, então dados u, v ∈ X temos que kT (u) − T (v)k = kT (u − v)k ≤ M ku − vk. Isso mostra que T é lipschitziana e portanto (uniformemente) contı́nua. O item (c) nos mostra que aplicações lineares contı́nuas são limitadas sobre BX . É por esse motivo que aplicação lineares contı́nuas são também chamadas de limitadas. 1.7. Aplicações Lineares 17 Antes do próximo exemplo, salientamos que se k · k e k · k0 são normas equivalentes em X então uma função f definida em X será contı́nua segundo k · k se, e somente se, o for segundo k · k0 . Exemplo 1.33. Qualquer aplicação linear definida em Kp é contı́nua. Vamos demonstar este fato usando a norma da soma de Kp . Como sabemos, ela é equivalente à norma euclidiana e mais simples de se trabalhar. Seja {e1 , e2 , . . . , ep } a base canônica de Kp e considere uma aplicação linear T : Kp → Y linear. Então kT (x1 , . . . , xp )k = kx1 T (e1 ) + · · · + xp T (ep )k ≤ |x1 |kT (e1 )k + · · · + |xp |kT (ep )k ≤ max kT (ei )k · (|x1 | + · · · + |xp |) i=1,...,p = M k(x1 , . . . , xp )k1 , onde M = maxi=1,...,p kT (ei )k. Logo T é contı́nua pela proposição anterior. Exemplo 1.34. Considere o espaço vetorial P(R) de todos os polinômios reais munido da norma kpk = supt∈[0,1] |p(x)|. Então o operador derivação D : P(R) → P(R) não é contı́nuo, pois para cada n ∈ N o polinômio tn está em BP(R) mas sua derivada ntn−1 tem norma n. Como n pode ser suficientemente grande, segue que é impossı́vel encontrar M como na proposição anterior. Um isomorfismo entre espaços normados, ou simplesmente isomorfismo, é uma aplicações linear contı́nua inversı́vel e com inversa contı́nua. Ou seja, é um isomorfismo no sentido da Álgebra Linear e um homeomorfismo. Se há um isomorfismo entre X e Y , então diremos que X e Y são isomorfos e escreveremos X ∼ = Y. Lembramos que inversa de aplicação linear é sempre linear, mas nem sempre é contı́nua, como mostra o exemplo seguinte. Exemplo 1.35. Considere X = c00 e o operador linear T : c00 → c00 dado por T (x1 , x2 , x3 , . . .) = (x1 , x22 , x33 , . . .). Temos que, se x = (x1 , x2 , x3 , . . .) ∈ c00 , kT (x)k = k(x1 , x2 x3 x2 x3 , , . . .)k = sup{|x1 |, | |, | |, . . .} ≤ sup{|x1 |, |x2 |, |x3 |, . . .} = kxk. 2 3 2 3 n∈N n∈N Logo, T é contı́nua pelo item (c) da proposição. Porém, a inversa de T é dada por T −1 (x1 , x2 , x3 , . . .) = (x1 , 2x2 , 3x3 , . . .). Para cada n ∈ N, os vetores n−esima z}|{ en = (0, . . . , 0, 1 , 0, . . . , ) têm norma 1 mas kT (en )k = n. Logo, T −1 não satisfaz o item (c) da proposição. 18 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Observe que no exemplo anterior o espaço normado em questão não era completo, como vimos em 1.16. Isso não foi por acaso. Veremos mais para frente que se os espaços forem completos, então a inversa é sempre contı́nua. Será uma consequência do Teorema da Aplicação Aberta. O seguinte critério é tão simples quanto útil. Proposição 1.36. Uma bijeção linear T : X → Y é um isomorfismo, se, e somente se, existem constantes positivas a e b tais que akxk ≤ kT (x)k ≤ bkxk, ∀x ∈ X. Demonstração. De fato, a segunda desigualdade nos diz que T é contı́nua. A primeira que T −1 é contı́nua, pois dado y ∈ Y , existe x ∈ X tal que T (x) = y e portando kT −1 (y)k = kxk ≤ a−1 kT (x)k = a−1 kyk. Corolário 1.37. Para que duas normas k · k e k · k0 sejam equivalentes é necessário e suficiente que existam constantes positivas a e b tais que akxk0 ≤ kxk ≤ bkxk0 , ∀x ∈ X. Demonstração. Que a condição acima é suficiente foi visto na proposição 1.6. Para mostrar que é necessária, basta observar que as normas serem equivalente significa que a identidade de X, k · k em X, k · k0 é um isomorfismo. Teorema 1.38. Seja T : X → Y um isomorfismo entre espaços normados. Então, se X for de Banach, então Y também será. Demonstração. Seja (yn )n uma sequência de Cauchy em Y . Temos que mostrar que (yn )n converge. Seja então ε > 0. Para cada n, yn = T (xn ), com xn ∈ X. Então, kxn − xm k = kT −1 (yn ) − T −1 (ym )k = kT −1 (yn − ym )k ≤ M kyn − ym k, pois T −1 é contı́nua. Logo, como (yn )n é de Cauchy existe n0 ∈ N tal que kyn − ym k < Mε , se n, m > n0 . Assim, se n, m > n0 , temos que kxn − xm k ≤ M kyn − ym k < M Mε = ε. Vemos que (xn )n é uma sequência de Cauchy em X e portanto converge para algum x ∈ X, já que X é completo. Pela continuidade de T , yn = T (xn ) → T (x), o que mostra que (yn )n converge. Observação 1.39. O teorema anterior nos diz que ‘ser Banach’ é preservado por isomorfismos. Talvez seja interessante observar que em espaços métrico em geral nem sempre ser completo é preservado por homeomorfismos. Por exemplo, N e {1/n : n ∈ N} são homeomorfos pois ambos são enumeráveis e discretos. Porém, N é completo e {1/n : n ∈ N} não (convença-se disso). O que acontece é que os isomorfismos são sempre homeomorfismos uniformes, pela proposição 1.32. Estes sempre preservam a completude. 1.7. Aplicações Lineares 19 Como uma aplicação do teorema anterior, vamos mostrar que todo espaço de dimensão finita é de Banach. Proposição 1.40. Seja V um espaço normado sobre K de dimensão finita p. Então V é isomorfo a Kp . Consequentemente, todo espaço normado de dimensão finita é de Banach. Demonstração. Tomamos uma base {v1 , v2 , . . . , vp } de V . Definimos a aplicação T : Kp → V pondo T (x1 , . . . , xp ) = x1 v1 + · · · + xp vp . Pela definição de base, T é um isomorfismo algébrico. Pelo exemplo 1.33, T é contı́nua. Resta mostrar que T −1 é contı́nua. SKp é um subconjunto limitado e fechado de Kp e portanto compacto. Então a função contı́nua x 7→ kT (u)k admite mı́nimo M em SKp . Mas como T é injetora, segue que T (u) 6= 0, para x )k ≥ M > 0 e todo u ∈ SKp e portanto kT (u)k ≥ M > 0. Assim, se x ∈ Kp \ {0}, kT ( kxk portanto kT (x)k ≥ M kxk. Isso mostra que T é um isomorfismo, pela proposição 1.36. Que V é um espaço de Banach segue imediatamente do teorema anterior. Corolário 1.41. Se X é um espaço normado, então todo subespaço V ⊂ X de dimensão finita é fechado. Demonstração. Se V tem dimesão finita, V é Banach e portanto fechado pela proposição 1.17. Corolário 1.42. Toda aplicação linear definida em um espaço normado de dimensão finita é contı́nua. Demonstração. Seja T : V → Y , V de dimensão finita. Tomamos S : Kp → V isomorfismo. Então T ◦ S é contı́nua pois está definida em Kp (exemplo 1.33). Mas T = (T ◦ S) ◦ S −1 e portanto é contı́nua. Corolário 1.43. Quaisquer duas normas definida em um espaço vetorial de dimensão finita são equivalentes. Demonstração. Se V tem dimensão finita então a aplicação identidade de V, k · k em V, k · k0 é sempre isomorfismo. Logo V, k · k e V, k · k0 têm a mesma topologia. 20 1.8 MAT5721 - Leonardo Pellegrini O espaço L(X; Y ) Sejam X e Y espaços normados. Denotaremos por L(X; Y ) o espaço vetorial das aplicações lineares contı́nuas (ou limitadas) de X em Y . As operações de espaço vetorial em L(X; Y ) são as usuais. Em particular, se Y = K denotaremos L(X; K) por X ∗ . Ou seja, X ∗ é o espaço de todos os funcionais lineares contı́nuos definidos em X. Note que X ∗ é sempre Banach, pois K é completo. Para evitar confusão, o espaço vetorial dos funcionais lineares em X será chamado de dual algébrico de X e o denotaremos por X # . Como vimos, se V tem dimensão finita, então todo funcional linear é contı́nuo e portanto V ∗ = V # . Porém, se X tem dimensão infinita X # sempre possui funcionais descontı́nuos. Veja os exercı́cios. Considere a função T ∈ L(X; Y ) 7→ kT k = supx∈BX kT (x)k. Pela proposição 1.32 temos que supx∈BX kT (x)k é finito e portanto kT k está bem definida. Se kT k = 0, kT (x)k = 0 para todo x em BX e portanto T é identicamente nula em BX . Pela linearidade, T é a aplicação nula. De maneira indêntica ao exemplo 1.3 mostramos que kλT k = |λ|kT k e kT + Sk ≤ kT k + kSk. Vemos então que kT k = supx∈BX kT (x)k é uma norma em L(X; Y ). Note que se T ∈ L(X; Y ) então é imediato pela linearidade de T e pela definição de supremo que kT (x)k ≤ kT kkxk, para todo x ∈ X. O próximo teorema é sobre a completude de L(X; Y ). Teorema 1.44. O espaço normado L(X; Y ) é um espaço de Banach, se Y o for. Demonstração. Seja (Tn )n uma sequência de Cauchy em L(X; Y ). Então para todo ε > 0, existe algum n0 ∈ N tal que n, m > n0 ⇒ kTn − Tm k = sup k(Tn − Tm )(x)k < ε. (∗) x∈BX Assim, para cada x ∈ X, kTn (x) − Tm (x)k = k(Tn − Tm )(x)k ≤ kTn − Tm kkxk. Então, para cada x fixado temos por (∗) que a sequência (Tn (x))n uma sequência de Cauchy em Y e portanto converge (pois Y é Banach). Defina T : X → Y pondo T (x) = lim Tn (x). n→∞ Observe que, se x ∈ BX e n, m > n0 kTn (x) − T (x)k ≤ kTn (x) − Tm (x)k + kTm (x) − T (x)k ≤ kTn − Tm k + kTm (x) − T (x)k < ε + kTm (x) − T (x)k. 1.8. O espaço L(X; Y ) 21 Fazendo m → ∞, obtemos que kTn (x) − T (x)k ≤ ε para qualquer x ∈ BX . Então, sup kTn (x) − T (x)k ≤ ε, se n > n0 (∗∗) x∈BX Devemos mostrar que T ∈ L(X; Y ). T é claramente linear, pois T (x + λy) = lim Tn (x + λy) = lim (Tn (x) + λTn (y)) = n→∞ n→∞ lim Tn (x) + λ lim Tn (y) n→∞ n→∞ = T (x) + λT (y), pela continuidade das operações. Mostremos agora que T é contı́nua. Fazendo ε = 1 em (∗∗), encontramos n tal que kTn (x) − T (x)k < 1 para qualquer x ∈ BX e portanto kT (x)k ≤ kT (x) − Tn (x)| + kTn (x)k ≤ 1 + kTn k, ∀x ∈ BX . Logo, T é limitada em BX . Finalmente, é imediato por (∗∗) que (Tn )n converge para T . Se Y não é Banach não há motivo de L(X; Y ) ser. Daremos exemplo nos exercı́cios. O proximo resultado é sobre extensão de aplicações lineares. Teorema 1.45. Sejam X um espaço normado e Y um espaço de Banach. Se M um subespaço de X e T ∈ L(M ; Y ), então T admite uma única extensão contı́nua T : M → Y . Tal extensão é também linear e kT k = kT k. Demonstração. Seja x ∈ M . Então existe uma sequência (xn )n convergindo para x. A sequência (xn )n , por ser convergente, é de Cauchy em M . Então T (xn )n também é de Cauchy em Y e portanto converge, por Y ser completo. Definimos T (x) = limn→∞ T (xn ). Note que se (yn )n é outra sequência que converge para x, então, limn→∞ T (xn )−limn→∞ T (yn ) = limn→∞ T (xn − yn ) = T (limn→∞ (xn − yn )) = 0. Logo, T está bem definida. É fácil ver que T é linear. Se m ∈ M , então tomando a sequência constante igual a m, vemos que T (m) = limn→∞ T (m) = T (m). Logo, T estende T . Pela densidade de BM em BM e pelo modo que T foi definida, vemos que supx∈M kT (x)k = supx∈M kT (x)k = kT k, o que mostra que T é contı́nua e kT k = kT k. A unicidade segue do fato de que se duas funções contı́nuas coincidem em um conjunto denso do domı́nio, então coincidem em todo domı́nio. 22 1.9 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Isometrias Uma aplicação linear T : X → Y é uma imersão isomética se kT (x)k = kxk, ∀x ∈ X. As seguintes propriedades são imediatas. Proposição 1.46. Seja T : X → Y uma imersão isomética. Então (a) T é contı́nua; (b) T é injetora; (c) T é inversı́vel sobre sua imagem e T −1 : Im T → X também é uma imersão isométrica e portanto é contı́nua. Demonstração. (a) Basta tomar M = 1 na proposição 1.32. (b) É injetora pois T (x) = 0 ⇒ kT (x)k = 0 ⇒ kxk = 0 ⇒ Ker T = {0}. (c) Dado y ∈ Im T , seja x ∈ X tal que T (x) = y. Então kT −1 (y)k = kT −1 T (x) k = kxk = kT (x)k = kyk. Logo T −1 : Im T → X é uma imersão isométrica e portanto contı́nua pelo item (a). Tendo em vista a proposição anterior, para uma imersão isométrica ser um isomorfismo basta que seja sobrejetora. Chameremos então uma imersão isométrica sobrejetora de isomorfismo isométrico ou simplesmente isometria. Se existir um isomorfismo isométrico entre X e Y escreveremos X ≡ Y . Quando dois espaços são isométricos, existe uma correspondência entre seus elementos que preserva tanto a estrutura algébrica quanto a norma. Ou seja, podem ser diferentes como conjunto, mas são idênticos como espaços normados. Veremos um exemplo importante de imersão isométrica quando estudarmos os espaços duais. 1.10 O espaço Quociente Seja X um espaço vetorial e M um subespaço de X. Lembramos que o espaço quociente de X por M é o espaço vetorial X/M formado pelas classes de equivalências 1.10. O espaço Quociente 23 x + M = {x + m : m ∈ M }, munido das operações (x + M ) + (y + M ) = (x + y) + M e λ(x + M ) = (λx) + M. Note que a classe x0 + M é igual a classe x + M se, e somente se, x0 − x ∈ M . De fato, se x0 + M = x + M então existem m, m0 ∈ M tais que x0 + m0 = x + m. Logo x0 − x = m0 − m ∈ M . Reciprocamente, se x0 − x ∈ M , então dado um elemento x + m ∈ x + M podemos escrever x + m = x + x0 − x0 + m = x0 + (x − x0 + m) ∈ x0 + M e portanto x + M ⊂ x0 + M . A outra inclusão se vê de maneira idêntica. A partir dai é fácil ver que as operações estão bem definidas. Por exemplo, x + M = x + M ⇒ x0 − x ∈ M ⇒ λ(x0 − x) ∈ M ⇒ λx0 − λx ∈ M ⇒ λx0 + M = λx + M . A soma se faz de maneira análoga. 0 As propriedades de espaço vetorial são fáceis de serem verificadas usando as de X. Salientamos apenas que o elemento neutro de X/M é 0 + M = M . Agora suponha que X seja normado. Estamos interessados em definir uma norma em X/M . Considere a função kx + M k = inf kx + mk. Como M é um subespaço, então m∈M inf kx + mk = inf kx − mk = d(x, M ) são outras formas de se calcular kx + M k. Temos m∈M m∈M o seguinte resultado. Proposição 1.47. Seja X um espaço normado e M um subespaço de X. Então a função definida em X/M por kx+M k = inf kx+mk é uma semi-norma. Se M for um subespaço m∈M fechado, então k · k será uma norma. Demonstração. Sejam x + M e y + M elementos de X/M . Para quaisquer m1 , m2 ∈ M temos que k(x + M ) + (y + M )k = k(x + y) + M k = inf kx + y + mk ≤ kx + y + (m1 + m2 )k m∈M ≤ kx + m1 k + ky + m2 k. Tomando o ı́nfimo obtemos k(x + M ) + (y + M )k ≤ kx + M k + ky + M k. Considere agora λ ∈ K \ {0}. Então kλ(x+M )k = kλx+M k = inf kλx+mk = inf kλx+λmk = |λ| inf kx+mk = |λ|kx+M k. m∈M m∈M m∈M O caso λ = 0 é trivial (note que 0 ∈ M !). Vemos então que k · k é uma semi-norma. Suponha agora que M seja fechado. Então kx + M k = 0 significa que d(x, M ) = 0 e portanto x ∈ M = M . Então x + M = M = 0. 24 MAT5721 - Leonardo Pellegrini O proposição anterior nos diz que X/M é mais interessante quando M for fechado, pois neste caso X/M é normado. Além disso, se X é completo, tal propriedade é repassada para X/M : Teorema 1.48. Seja X um espaço de Banach e M um subespaço fechado de X. Então X/M é um espaço de Banach. Demonstração. Pela proposição anterior X/M é um espaço normado. Temos apenas que X mostrar que é completo. Usaremos a caracterização vista em 1.20. Seja xn + M uma n∈N série absolutamente convergente em X/M . Pela definição de ı́nfimo, X para cada n ∈ N existe yn ∈ xn + M com kyn k < kxn + M k + 2−n . Então a série yn é absolulamente n∈N convergente no espaço de Banach X e portanto converge. Seja y seu limite e considere a classe y + M . Como k(y + M ) − k X (xn + M )k ≤ ky − n=1 vemos que X k X k→∞ yn k −→ 0, n=1 xn +M converge para y+M . Mostramos então que toda série absolutamente n∈N convergente em X/M converge, o que equivale dizer que X/M é Banach. Seja M subespaço fechado do normado X. A aplicação quociente de X em X/M é definida por π(x) = x + M . Veremos agora algumas propriedades dessa aplicação. Teorema 1.49. Se M é um subespaço fechado de um espaço normado X, aplicação quociente π : X → X/M tem as seguinte propriedades: (a) π é aplicação linear contı́nua. (b) π leva a bola unitária aberta de X na de X/M . (c) π é uma aplicação aberta. (d) Ker π= M Demonstração. (a) Pela definição das operações em X/M , π é claramente linear. Dado x ∈ X, pela definição da norma em X/M temos que kπ(x)k = kx + M k ≤ kxk, o que mostra que π é contı́nua. 1.10. O espaço Quociente 25 (b) Sejam U1 e U2 as bolas unitárias abertas de X e X/M respectivamente. Se x ∈ U1 , kπ(x)k = kx + M k ≤ kxk < 1. Logo π(x) = x + M ∈ U2 . Seja agora x + M ∈ U2 . Então kx + M k < 1. Novamente pela definição de ı́nfimo, existe y ∈ x + M tal que kx + M k ≤ kyk < 1. Então y ∈ U1 e π(y) = y + M = x + M , e portanto π(U1 ) ⊃ U2 . (c) Considere um conjunto U 6= ∅ aberto em X. Seja x + M ∈ π(U ) arbitrário. Como U é um conjunto aberto, deve existir r > 0 tal que x + rU1 ⊆ U . Logo, pela linearidade de π e pelo item anterior, π(y) + rπ(U1 ) = (x + M ) + rU2 ⊂ T (U ). Segue então que T (U ) é um conjunto aberto. (d) Claro que M está contido no núcleo de π. Por outro lado, se π(x) 6= 0, então x + M 6= 0 = M e assim kx + M k = d(x, M ) 6= 0. Logo x 6∈ M . Para definirmos uma aplicação em X/M temos que tomar certo cuidado para não depender da escolha dos representantes das classes. Veja como fizemos quando definimos as operações em X/M . Neste sentido, o teorema seguinte é útil. Teorema 1.50. Sejam X e Y espaços normados e T : X → Y linear. Suponha que M seja um subespaço fechado de X contido no núcleo de T . Então existe uma única função S : X/M → Y tal que T = S ◦ π. Tal função S é linear e tem a mesma imagem de T . Se M = Ker T , S será injetora. A aplicação S será contı́nua se, e somente se, T o for. Neste caso, kSk = kT k. Analogamente, S será aberta se, e somente se, T também for aberta. Demonstração. Defina S(x + M ) = T (x) para cada x ∈ X. Se x + M = y + M , então x − y ∈ M ⊂ Ker T e portanto T (x) = T (y). Então S está bem definida. É imediato que T = S ◦ π e portanto está provada a existência. Suponha que S 0 : X/M → Y seja tal que T = S 0 ◦ π. Então S 0 (x + M ) = S 0 (π(x)) = T (x) = S(x). Isso mostra a unicidade. Também é imediato que S é linear e que T e S têm a mesma imagem. Suponha então que M = Ker T . Então S(x + M ) = 0 ⇒ S(π(x)) = 0 ⇒ T (x) = 0 ⇒ x ∈ Ker T ⇒ x ∈ M ⇒ x + M = M = 0. Logo S é injetora. Se U1 e U2 denotam as bolas abertas unitárias de X e X/M respectivamente, então pelo Teorema 1.49 π(U1 ) = U2 e portanto sup kS(x + M )k = sup kS(π(x))k = sup kT (x)k. x+M ∈U2 x∈U1 x∈U1 26 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Assim, S será contı́nua se, e somente se, T for contı́nua e em caso afirmativo, kSk = kT k. Finalmente, se S for aberta, T também será, como composta de aplicações abertas. Reciprocamente, se T é aberta, então dado um aberto U em X/M temos que S(U ) = S π(π −1 (U )) = T (π −1 (U )). Pelo Teorema 1.49, π é contı́nua e portanto π −1 (U ) é aberto em X/M . como T é aberta, segue que S(U ) é aberto em X. Logo, S também é aberta. Nos exercı́cios há algumas aplicações do teorema anterior. Dele também resultará o Teorema do Isomorfismo para espaços de Banach, que é uma versão do conhecido teorema homônimo para grupos. Mas antes precisaremos do Teorema da Aplicação Aberta, que veremos na parte seguinte. 1.11 Exercı́cios Topologia dos espaços normados 1. Seja X um espaço normado. (a) Mostre que toda sequência convergente em X é limitada, de Cauchy e possui um único limite. (b) Mostre que se uma sequência (xn ) ⊂ X é convergente, então qualquer subsequência de (xn ) ⊂ X converge para o mesmo limite. (c) Mostre que se uma sequência de Cauchy possui uma subsequência convergente, então ela é convergente. 2. Seja X um espaço normado. (a) Mostre que se x0 ∈ X e λ ∈ K \ {0} então são homeomorfismos as aplicaçôes x ∈ X 7→ x + x0 ∈ X e x ∈ X 7→ λx ∈ X. (b) Conclua que um subconjunto A de X é aberto se, e somente se, def x0 + A = {x0 + a : a ∈ A} é aberto. Mostre o resultado análogo para def λA = {λa : a ∈ A} com λ ∈ K \ {0}. def (c) Mostre que se A é aberto e B é um conjunto qualquer, então A + B = {a + b : a ∈ A, b ∈ B} é aberto em X. Sugestão: Escreva A + B como união de conjuntos abertos. (d) Se F e G são fechados em X, F + G é necessáriamente fechado? Prove ou dê 1.11. Exercı́cios 27 um contra-exemplo. (e) Mostre que se F é fechado e K é compacto então F + K é fechado. Sugestão: Use a caracterização de compacidade por sequência, válida para espaços métricos. (f) Mostre que A + B ⊂ A + B. É válida a inclusão contrária? O item (d) pode ajudar. 3. (Conjuntos convexos) Um subconjunto C de um espaço vetorial é convexo se, para todo escalar λ ∈ [0, 1] e x, y ∈ C temos que λx+(1−λ)y ∈ C. Por exemplo, as bolas de um espaço normado são convexas (verifique). Mostre que se C é um subconjunto convexo de um espaço normado, então seu fecho também é convexo. 4. (Distâcia de ponto a conjunto) Se A é um subconjunto de um espaço normado X, definimos a distância de x ∈ X a A pondo d(x, A) = inf{kx − ak : a ∈ A}. Prove que x ∈ A ⇔ d(x, A) = 0. Espaços de Banach 5. Mostre que c o espaço vetorial das sequências convergentes munido da norma do supremo é um espaço de Banach. 6. Mostre que `1 equipado com a norma do sup não é um espaço de Banach. 7. (Soma direta externa) Sejam (X, k · k) e (Y, k · k0 ) espaços normados. (a) Mostre que ||| · ||| : X × Y → R+ dada por |||(x, y)||| = max{k x k, k y k0 } é uma norma em X × Y . (b) Se X e Y são espaços de Banach, mostre que X × Y, ||| · ||| é um espaço de Banach. X × Y, ||| · ||| é chamado de soma direta externa de X e Y . Z 1 8. (a) Mostre kf k1 = |f (x)|dx é uma norma em C[0, 1]. (b) Verifique se C[0, 1], k · k1 é um espaço de Banach. (c) Qual a relação entre as topologias geradas por k · k1 e k · k∞ ? 0 9. Mostre que `p e Lp [0, 1] são separáveis se 1 ≤ p < ∞. Sugestão: Use o fato de que as funções contı́nuas são densas em Lp [0, 1] (com a norma p!) se 1 ≤ p < ∞. 10. Mostre que se X é separável, qualquer subconjunto de X é separável. Consequentemente, qualquer subespaço de X é separável. 28 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Aplicações Lineares 11. (a) Mostre que se X é um espaço normado de dimensão infinita e Y 6= {0}, então existe uma aplicação linear de X em Y descontı́nua. Sugestão: Use uma base algébrica de X e construa uma aplicação linear não limitada (b) Conclua que se X é um espaço normado de dimensão infinita então X ∗ 6= X # . 12. Se T ∈ L(X, Y ), é imediato da continuidade de T que kerT = T −1 ({0}) é fechado em X (por que?). Mostre que a recı́proca é falsa exibindo uma aplicação linear descontı́nua de núcleo fechado. Sugestão: Pense em alguma aplicação injetora descontı́nua. 13. Mostre que a imagem de um operador linear contı́nuo não precisa ser fechada. 14. Sejam X e Y espaços normados. (a) Mostre se Tn → T em L(X, Y ), então Tn (x) → T (x), ∀x ∈ X. Ou seja, a convergência em L(X, Y ) implica convergência pontual. (b) Mostre que a recı́proca não é verdadeira. Para isso, considere a sequência en : c0 → K definida por e∗n (xm )m = xn . Mostre que (e∗n ) converge pontualmente para o funcional nulo mas não em norma. 15. Mostre que se Y não for Banach, então L(X, Y ) pode não ser completo. Sugestão: Talvez seja fácil construir uma sequência de Cauchy em L(`∞ , c00 ) não convergente. Na verdade, sempre que Y não for completo L(X, Y ) também não será. Veremos isso mais adiante. 16. Sejam X, Y e Z espaços normados sobre K. Sejam T ∈ L(X, Y ) e S ∈ L(Y, Z). (a) Prove que S ◦ T ∈ L(X, Z) e que k S ◦ T k ≤ k S k k T k. (b) Dê um exemplo para mostrar que a desigualdade pode ser estrita. R1 17. Seja T : C[0, 1] → C[0, 1] dada por T (f ) = g, onde g(t) = 0 k(t, s)f (s)ds e k é uma função contı́nua em [0, 1] × [0, 1]. Prove que T é um operador linear contı́nuo. 18. Verifique que uma aplicação linear entre espaços normados é contı́nua se, e somente se, é limitada em alguma bola. 19. Mostre que se D é um subconjunto denso em BX e T ∈ L(X, Y ), então kT k = sup kT (d)k. d∈D 20. Mostre que se T ∈ L(X, Y ), então kT k = sup kT (x)k = sup kT (x)k. kxk=1 kxk<1 1.11. Exercı́cios 29 21. Mostre que c é isomorfo a c0 mas não isométrico. Sugestão: Para mostrar que não são isométricos mostre que dado um elemento x ∈ c0 de norma 1, existem x1 e x2 distintos em c0 também de norma 1 tais que x = 21 (x1 + x2 ). 22. Mostre que `p pode ser isometricamente imerso em Lp [0, 1]. Ou seja, que `p é isométrico a um subespaço de Lp [0, 1]. 23. Mostre que L∞ [0, 1] não é separável. 24. Mostre que `∞ é isométrico a C(βN), onde βN é a compactificação de Stone-C̆ech dos Naturais. A compactificação de Stone-C̆ech βN dos Naturais é o único espaço topológico compacto (a menos de homeomorfismo) que contém N densamente com a propriedade de que toda função de N em [0, 1] se estende continuamente a βN. Quociente 25. Seja M = {f ∈ C[0, 1] : f (0) = 0}. Mostre que M é um subespaço fechado de C[0, 1]. Dê uma expressão mais simples para a norma quociente de C[0, 1]/M . Este quociente é isométrico a qual espaço conhecido? Explicite a isometria. 26. Seja M o subespaço de c formado pelas sequências constantes. c/M é isomorfo a qual espaço conhecido? 27. (Operadores de Posto Finito) Um operador linear tem posto finito se sua imagem (que é sempre um subespaço vetorial) tem dimensão finita. Mostre que um operador linear de posto finito é contı́nuo se, e somente se, seu núcleo é fechado. Sugestão: Um lado é direto. Para o outro, use o quociente do domı́nio do operador por seu núcleo. Compare com o exercı́cio 12. Observe que funcionais lineares têm posto finito. 28. Mostre que se X for separável, qualquer quociente de X também será. Parte 2 Os Teoremas Fundamentais 2.1 Consequências do Teorema de Baire Lembramos que um subconjunto de um espaço topológico X é de primeira categoria em X se pode ser escrito como união enumerável de conjuntos cujos respectivos fechos têm interior vazio. Por exemplo, Q é de primeira categoria em R, pois Q é união enumerável de seus pontos que evidentemente têm interior vazio. Um subconjunto é de segunda categoria se não é de primeira categoria. Ou seja, se não é possı́vel escrevê-lo como união enumerável de conjuntos cujos fechos têm interior vazio. Destacamos a seguir o Teorema de Baire. Teorema 2.1. (de Baire) Seja M um espaço métrico completo. Então cada aberto de M é de segunda categoria em M . Em particular, M é de segunda categoria em si próprio. A demonstração pode ser encontrada, por exemplo, no livro de Espaços Métricos do Elon. Veremos como o Teorema de Baire é usado para demonstrar os três teoremas fundamentais para espaços de Banach, o Princı́pio da Limitação Uniforme, o Teorema do Gráfico Fechado e o Teorema da Aplicação Aberta. Daremos aqui uma demonstração adaptada da obtida originalmente por P.P. Zabreı̆ko para espaços vetorias topológicos metrizáveis e completos. Definição 2.2. Seja X um espaço normado. Uma função p : X → R+ é dita enumerav P∞ P∞ P∞ elmente sub-aditiva se p n=1 xn ≤ n=1 p(xn ) para toda série covergente n=1 xn de termos em X. 30 2.1. Consequências do Teorema de Baire 31 Seja p uma semi-norma contı́nua definida em um espaço normado X. Então p é enumeravelmente subaditiva. De fato, segue imediatamente por indução que Pm Pm p n=1 xn ≤ n=1 p(xn ), para qualquer m ∈ N. Usando a continuidade de p, obtemos m m ∞ X X X P∞ que p x = lim p x ≤ lim p(x ) = p(xn ). n n n=1 n m→∞ m→∞ n=1 n=1 n=1 O Lema de Zabreı̆ko trata da recı́proca para espaços de Banach. Antes de demonstrálo, vejamos um resultado sobre a continuidade de semi-normas. Proposição 2.3. Seja X espaço normado e p : X → R+ uma semi-norma. Então, são equivalente: (a) p é contı́nua; (b) p é contı́nua na origem; (c) p é limitada em alguma bola centrada na origem. Demonstração. A única implicação que não é imediata é (c) ⇒ (a). Para demonstrá-la, x−y suponha que p(x) ≤ M para x ∈ B[0, r]. Então, se x, y ∈ X, temos que p r kx−yk ≤M e −1 portanto p x − y ≤ M r kx − yk. Então |p(x) − p(y)| ≤ |p(x − y)| ≤ M r−1 kx − yk, O que mostra que p é contı́nua. Teorema 2.4. (Lema de Zabreı̆ko) Se X é um espaço de Banach, então toda semi-norma enumeravelmente sub-aditiva é contı́nua. Demonstração. Para cada ε > 0, definimos o conjunto ∆(ε) = {x ∈ X : p(x) ≤ ε}. S Claramente X = n∈N n∆(ε/2), pela propriedade N1) de semi-norma. Pelo teorema de Baire, para algum n, n∆(ε/2) = n∆(ε/2) tem interior não vazio. Consequentemente ∆(ε/2) também tem interior não vazio (pois são homeomorfos). Então existe uma bola B(x0 , rε ) ⊂ ∆(ε/2). Como ∆(ε/2) é simétrico, B(−x0 , rε ) = −B(x0 , rε ) ⊂ −∆(ε/2) = −∆(ε/2) = ∆(ε/2), 32 MAT5721 - Leonardo Pellegrini ou seja, ∆(ε/2) também contém a bola B(−x0 , rε ). Assim B(0, rε ) ⊂ B(x0 , rε ) + B(−x0 , rε ) ⊂ ∆(ε/2) + ∆(ε/2) ⊂ ∆(ε/2) + ∆(ε/2) ⊂ ∆(ε), ou seja, ∆(ε) contém uma bola centrada na origem B(0, rε ). Podemos supor que rε ≤ ε. Então, definindo o conjunto def A(ε) = B(0, rε ) ∩ ∆(ε), temos que A(ε) é um subconjunto denso em B(0, rε ) (∗). Considere então, fazendo ε = 1, a bola B = B(0, r1 ). Para mostrar que p é contı́nua, pela proposição anterior basta mostrar que é limitada nesta bola. Seja então x ∈ B(0, r1 ). Pela densidade, existe x1 ∈ A(1) com kx − x1 k ≤ r 1 . Fazendo ε = 12 em (∗), encontramos 2 x2 ∈ A( 21 ) com kx − x1 − x2 k < r 12 . Prosseguindo assim, para cada n ∈ N, encontraremos 2 P 1 ) com kx − x1 − x2 − · · · − xn k < r 1n . Vemos então que a série ∞ xn ∈ A( 2n−1 n=1 xn 2 converge para x (note que supusemos r 1n ≤ 21n ). Como p é enumeravelmente sub-aditiva 2 1 e cada xn ∈ A( 2n−1 ), ∞ ∞ X X 1 p(xn ) ≤ = 2. p(x) ≤ n−1 2 n=1 n=1 Como x ∈ B era arbitrário, vemos que p(x) ≤ 2, ∀x ∈ B, sendo p contı́nua. Teorema 2.5. (Princı́pio da Limitação Uniforme) Seja F uma famı́lia não-vazia de operadores lineares contı́nuos definidos num espaço de Banach X e tomando valores no espaço normado Y . Se, para cada x ∈ X, cx = sup{kT (x)k : T ∈ F} é finito, então sup{kT k : T ∈ F} é finito. Em outras palavras, toda famı́lia pontualmente limitada é limitada em norma. Demonstração. Defina a aplicação p : X → R como sendo, para cada x ∈ X, p(x) = sup{kT (x)k : T ∈ F}. Como a famı́lia é pontualmente limitada, tal supremo é finito. Ainda, pela linearidade de T vemos que p é uma semi-norma. Para mostrar que p é enumeravelmente sub-aditiva, P suponha que seja dada uma série convergente ∞ n=1 xn de termos em X. Para cada T ∈ F fixado, ∞ ∞ ∞ ∞ X X X X xn = T (xn ) ≤ kT (xn )k ≤ p(xn ). T n=1 n=1 n=1 n=1 2.1. Consequências do Teorema de Baire 33 P P∞ ∞ Portanto, p x ≤ n=1 n n=1 p(xn ). Assim, p é uma semi-norma enumeravelmente sub-aditiva definida no espaço de Banach X. Então p é contı́nua, pelo Lema de Zabreı̆ko. Logo, para ε = 1, existe δ > 0 tal que kxk ≤ δ ⇒ p(x) ≤ 1. Assim, se x ∈ BX , kδxk ≤ δ e portanto p(δx) ≤ 1, o que implica p(x) ≤ δ −1 . Vemos então que, para cada x ∈ BX fixado, kT (x)k ≤ sup{kT (x)k : T ∈ F} ≤ δ −1 , donde segue que kT k ≤ δ −1 , ∀ T ∈ F. Logo, sup{kT k : T ∈ F} < ∞. Corolário 2.6. Seja Tn uma sequência de operadores lineares contı́nuos definidos em um espaço de Banach X e tomando valores em um espaço normado Y . Então se para cada x ∈ X, (Tn (x))n converge, então a aplicação definida por T (x) = limn∈N Tn (x) é linear e contı́nua. Demonstração. Claramente T é linear. Como (Tn (x))n converge então, para cada x ∈ X a sequência (Tn (x))n é limitada. Pelo princı́pio da Limitação Uniforme, existe M tal que kTn k ≤ M , ∀n ∈ N. Seja x ∈ BX . Dado ε > 0, existe N ∈ N tal que kTN (x) − T (x)k < ε, e portanto kT (x)k ≤ kTN (x) − T (x)k + kTN (x)k < ε + M, ∀ε > 0. Então, kT (x)k ≤ M , ∀x ∈ BX , o que mostra que T é contı́nua com kT k ≤ M . Outra aplicação do Lema de Zabreı̆ko (e portanto do teorema de Baire) é o Teorema da Aplicação Aberta. Lembramos que Uma aplicação ϕ : A → B entre dois espaços topológicos é dita aberta se ϕ(U ) for um conjunto aberto em B sempre que U for aberto em A. Teorema 2.7. (da Aplicação Aberta) Toda transformação linear contı́nua e sobrejetora entre dois espaços de Banach é uma aplicação aberta. Demonstração. Seja T : X → Y contı́nua e sobrejetora. Mostraremos inicialmente que T (UX ) é um conjunto aberto em Y , onde é UX é a bola aberta unitária centrada na origem de X. Definimos a aplicação p : Y → R+ pondo p(y) = inf{kxk : x ∈ X, T (x) = y}. Note que p está bem definida, pois T é sobrejetora. Se y ∈ Y e λ é um escalar não nulo, {x ∈ X : T (x) = λy} = {x ∈ X : T 1 x = y} = {λx ∈ X : T (x) = y}. λ 34 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Logo, p(λy) = inf{kxk : x ∈ X, T (x) = λy} = inf{|λ|kxk : x ∈ X, T (x) = y} = |λ|p(y). Como o caso λ = 0 é trivial, segue-se que p(λy) = |λ|p(y) para qualquer vetor y ∈ Y e escalar λ ∈ K. Note que a desigualdade triangular seguirá imediatamente se mostrarmos que p é enumeravelmente sub-aditiva. Mostremos então que p é enumeravelmente sub-aditiva. Considere uma série conver P∞ P P∞ gente ∞ n=1 yn em Y . Observe que como queremos mostrar que p n=1 yn ≤ n=1 p(yn ), P∞ podemos supor, sem perda de generalidade, que n=1 p(yn ) é convergente, pois caso P∞ contrário terı́amos n=1 p(yn ) = +∞ e a desigualdade seria trivial. Seja ε > 0. Pela definição de ı́nfimo, podemos tomar uma sequência (xn )n∈N em X tal que, T (xn ) = yn e P P∞ P∞ kxn k < p(yn ) + 2−n ε. Logo, ∞ kx k ≤ p(y ) + ε, e portanto n n n=1 n=1 n=1 xn é uma série absolutamente convergente em X e, como este espaço é de tal série converge. Banach, P∞ P∞ P∞ = Portanto, como T é um operador contı́nuo, T n=1 yn . n=1 T (xn ) = n=1 xn Logo, p ∞ X n=1 yn ∞ ∞ ∞ X X X p(yn ) + ε. kxn k ≤ xn ≤ ≤ n=1 n=1 n=1 P P ∞ y ≤ ∞ Como ε > 0 era arbitrário, segue que p n=1 p(yn ), e portanto p é n=1 n uma semi-norma enumeravelmente sub-aditiva. Como está definida no espaço de Banach Y p é contı́nua pelo Lema de Zabreı̆ko. Assim, como T (UX ) = {y ∈ Y : p(y) < 1} = p−1 (] − ∞, 1[), segue que T (UX ) é aberto em Y . O caso geral segue facilmente da linearidade de T : Considere um conjunto U 6= ∅ aberto em X, e tome y ∈ T (U ) arbitrário. Seja x ∈ U tal que T (x) = y. Como U é um conjunto aberto, deve existir r > 0 tal que x + rUX ⊆ U . Logo, pela linearidade de T , y + rT (UX ) ⊂ T (U ). Pelo que mostramos anteriormente T (UX ) é um conjunto aberto em Y . Segue então que T (U ) é um conjunto aberto. Corolário 2.8. Toda bijeção linear contı́nuas entre dois espaços de Banach é um isomorfismo. Demonstração. Pois tal bijeção será aberta pelo teorema anterior, o que implica a continuidade de sua inversa. 2.1. Consequências do Teorema de Baire 35 Corolário 2.9. Sejam k · k e k · k0 são duas normas em um espaço vetorial X munido das quais X é completo. Então, se existir M > 0 tal que kxk ≤ M kxk0 , para todo x ∈ X, então as normas são equivalentes. Demonstração. De fato, as hipóteses implicam que a identidade de X, k·k0 em X, k·k é uma bijeção linear contı́nua. Basta então usar o corolário anterior para concluir que é um isomorfismo. Logo, X, k · k0 em X, k · k têm a mesma topologia. Como uma última aplicação do Teorema da Aplicação Aberta, demonstraremos o Teorema do Isomorfismo para espaços de Banach: Teorema 2.10. (do Isomorfismo para espaços de Banach) Sejam X e Y espaços de Banach e T ∈ L(X, Y ). Suponha que a imagem de T seja fechada em Y . Então X/Ker T ∼ = T (X) Demonstração. Seja S : X/Ker T → T (X) a aplicação obtida pelo Teorema 1.50 com M = Ker T . Então pelo referido teorema, S é uma bijeção linear contı́nua. Como T (X) é Banach pois é fechado em Y , segue que S é um isomorfismo. Vejamos agora o Teorema do do Gráfico Fechado. Lembramos que se A e B conjuntos não vazios e f : A → B uma função, então o gráfico de f é o subconjunto Graf(f ) = {(x, y) ∈ A × B : y = f (x)} de A × B. Se X e Y forem espaços normados então o gráfico de uma aplicação f : X → Y contı́nua é sempre fechado, pois é a imagem inversa do vetor nulo de Y pela aplicação contı́nua (x, y) 7→ ky − f (x)k. Na verdade, é um exercı́cio simples de topologia que o gráfico de uma aplicação contı́nua entre dois espaços topológicos Hausdorff é sempre fechado. O teorema do Gráfico Fechado é a recı́proca deste fato, porém para espaços de Banach. Teorema 2.11. (do Gráfico Fechado) Seja T uma transformação linear definida num espaço de Banach X tomando valores num espaço de Banach Y . Se o gráfico de T é um subconjunto fechado de X × Y , então T é contı́nua. Demonstração. Seja p(u) = kT (x)k, x ∈ X. É imediato que p é uma semi-norma em X. Provemos p que é enumeravelmente sub-aditiva. De fato, dada uma série converP∞ gente n=1 xn em X. Novamente, podemos supor, sem perda de generalidade, que 36 MAT5721 - Leonardo Pellegrini P∞ P∞ kT (xn )k converge. Logo, como a série absolutamente convergente n=1 T (xn ) Pm (m→∞) P∞ está definida num espaço de Banach, converge. Note que −→ n=1 xn n=1 xn Pm Pm (m→∞) P∞ e que T = T (xn ) −→ n=1 xn n=1 T (xn ). Vemos então que a sequência n=1 Pm Pm xn m pertence ao gráfico de T e converge, na topologia produto de n=1 xn , T Pn=1 P ∞ X × Y , para ( n=1 xn , ∞ (xn ))m . Como o gráfico de T é fechado em X × Y , segue n=1 T P∞ P∞ que n=1 T (xn ) = T n=1 xn , o que implica que n=1 p ∞ X n=1 ∞ ∞ ∞ ∞ X X X X T (xn ) ≤ kT (xn )k = p(xn ). xn = T x n = n=1 n=1 n=1 n=1 Então p é uma semi-norma enumeravelmente sub-aditiva, sendo contı́nua pelo Lema de Zabreı̆ko. Então exite δ > 0 tal que kxk ≤ δ ⇒ p(x) = kT (x)k ≤ 1, o que mostra que T é contı́nua pois é limitada na bola B[0, δ]. Observação 2.12. Para mostrar que uma aplicação T : X → Y entre espaços normados é contı́nua, em princı́pio temos que mostrar que xn → x =⇒ T (xn ) → y e y = T (x). O Teorema do Gráfico fechado diz que se X e Y forem espaços de Banach, então basta mostrar que xn → x e T (xn ) → y =⇒ y = T (x). O exemplo seguinte, apesar de artificial, mostra que não podemos tirar a hipótese “Banach”do contra-domı́nio de T . Nos execı́cios há um exemplo que mostra o análogo para o domı́nio. Exemplo 2.13. Seja (X, k · k) um espaço de Banach separável de dimensão infinita. Por exemplo, X pode ser `1 ou c0 . Tome uma base algébrica {xi : i ∈ I} normalizada de X. Então I é não enumerável (veja os exercı́cios). Cada x ∈ X se escreve de maneira única P P na forma x = αi xi (soma finita). Defina uma outra norma em X pondo kxk0 = |αi |. Temos que X X kxk ≤ |αi |kxi k = |αi | = kxk0 . Logo, a identidade Id : X, k · k0 → X, k · k é contı́nua e portanto seu gráfico é fechado, pela observação feita pouco antes do teorema. Claro que o gráfico de Id−1 também é fechado. Porém, Id−1 não pode ser contı́nua, pois se fosse, a identidade seria um isomorfismo e X, k · k0 seria também separável, um absurdo, pois para i 6= j, kxi − xj k0 = 2 e há uma quantidade não enumerávem de x0i s. 2.2. O Teorema de Hahn-Banach 2.2 37 O Teorema de Hahn-Banach Sejam X e Y espaços normados e M um subespaço de X. Nem sempre uma aplicação linear contı́nua T : M → Y pode ser estendida continuamente para X (Veja os exercı́cios). O Teorema de Hahn-Banach assegura que sempre é possı́vel estender quando Y = K. Começamos com uma definição: Definição 2.14. Seja X um espaço vetorial. Uma função p : X → R é sublinear se (i) p(tx) = tp(x), para todo x ∈ X e t > 0; (ii) p(x + y) ≤ p(x) + p(y), para todo x, y ∈ X. Lema 2.15. Sejam X um espaço vetorial sobre R, p : X → R sublinear e M um subespaço próprio de X. Dado y ∈ X \ M , seja N = M + [y]. Se ϕ é um funcional linear em M com ϕ(x) ≤ p(x), ∀x ∈ M, então existe φ ∈ N # tal que φM = ϕ e φ(x) ≤ p(x), ∀x ∈ N. Demonstração. Para x1 , x2 ∈ M , temos que ϕ(x1 ) + ϕ(x2 ) = ϕ(x1 + x2 ) ≤ p(x1 + x2 ) = p(x1 − y + y + x2 ) ≤ p(x1 − y) + p(y + x2 ), e portanto ϕ(x1 ) − p(x1 − y) ≤ p(y + x2 ) − ϕ(x2 ). Assim, sup {ϕ(x) − p(x − y)} ≤ inf {p(y + x) − ϕ(x)}. Seja η ∈ R qualquer satisfazendo x∈M x∈M sup {ϕ(x) − p(x − y)} ≤ η ≤ inf {p(y + x) − ϕ(x)}. Então, pelo modo que η foi escolhido, x∈M x∈M ϕ(x) − p(x − y) ≤ η ≤ p(y + x) − ϕ(x), ∀x ∈ M. (∗) Para cada z ∈ N , podemos escrever de maneira única z = x + λy, onde x ∈ M e λ ∈ R. Definimos φ(x + λy) = ϕ(x) + λη. Claro que φ é linear. Além disso, para cada z = x + λy ∈ N temos que Se λ > 0, φ(x + λy) = λφ x (∗) x +y =λ ϕ + η ≤ λp + y = p(x + λy). λ λ λ x 38 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Se λ < 0, −λ é positivo e portanto x x (∗) x φ(x + λy) = −λφ − − y = −λ ϕ − − η ≤ −λp − − y = p(x + λy). λ λ λ Como o caso λ = 0 é imediato, segue φ(x) ≤ p(x), ∀x ∈ N. Vejamos agora o caso geral. Na demonstração usaremos o Lema de Zorn cujo enunciado destacaremos a seguir. Lembramos que um elemento m de um conjunto parcialmente ordenado P é dito maximal se m ≤ x implica m = x, para qualquer x ∈ P. Lema de Zorn: Se, em um conjunto não-vazio P parcialmente ordenado, toda cadeia (subconjunto totalmente ordenado de P) tem uma quota superior, então P possui um elemento maximal. Teorema 2.16. (de Hahn-Banach para espaços vetoriais reais) Sejam X um espaço vetorial sobre R, p : X → R sublinear e M um subespaço X. Se ϕ é um funcional linear em M com ϕ(x) ≤ p(x), ∀x ∈ M, então existe φ ∈ X # tal que φM = ϕ e φ(x) ≤ p(x), ∀x ∈ X. Demonstração. Seja P a famı́lia de todos os pares N, ψ tais que N é um subespaço de X que contém M e ψ é um funcional linear em N tal que ψ M = ϕ e ψ(x) ≤ p(x), ∀x ∈ N. Note que P é não vazia, pois M, ϕ ∈ P. Definimos em P a seguinte ordem parcial N1 , ψ1 ≤ N2 , ψ2 ⇐⇒ N1 ⊂ N2 e ψ2 = ψ1 . N1 Usaremos o Lema de Zorn para mostrar que P possui um elemento maximal. Seja C [ um cadeia (subconjunto totalmente ordenado) em P. Definimos N̄ = Ni e ψ̄ ∈ N # i∈I definido por ψ̄(x) = ψi (x), se x ∈ Ni . Note que como C é totalmente ordenado, N̄ é um subespaço de X e ψ̄ está bem definida. Obviamente N̄ , ψ̄ ∈ P e é uma cota superior de C. Pelo Lema de Zorn, P possui um elemento maximal N, φ . Vamos mostrar que N = X. Suponha que N 6= X, tomamos y ∈ X \ N e definimos S = N + [y]. Pelo lema anterior, existe ψ ∈ S # com ψ N = φ e ψ(x) ≤ p(x), se x ∈ S. Então S ) N ⊃ M e ψ M = φM = ϕ. Portanto S, ψ ∈ P e S, ψ > N, φ , contrariando o fato de N, φ ser maximal. Devemos ter então N = X e φ é o funcional procurado. 2.2. O Teorema de Hahn-Banach 39 Vejamos agora uma versão do teorema anterior válida para espaços complexos. Seja X um espaço vetorial complexo. Restringindo a operação de multiplicação por escalar de C para R, X pode ser visto como um espaço vetorial real. Denotaremos tal espaço por XR . Diremos que um funcional u : X → R definida em um espaço vetorial complexo X é R-linear se é um funcional em XR . Ou seja, se a definição de linearidade é satisfeita para os escalares reais. Proposição 2.17. Seja X um espaço vetorial complexo. Então, dado u : X → R com u R-linear, φ(x) = u(x) − iu(ix), (∗) define um funcional φ ∈ X # . Reciprocamente, cada funcional φ em X pode ser escrito na forma (∗) com u R-linear. Demonstração. Seja u R-linear. Então para x ∈ X, φ(ix) = u(ix) − iu(−x) = u(ix) + iu(x) = i (−iu(ix) + u(x)) = iφ(x). A partir dai é facil concluir que φ é C-linear. Por outro lado, dado φ ∈ X # definimos u(x) como sendo a parte real de φ(x). Então claramente u é R-linear. Como a parte imaginária de um número complexo α é a parte real de −iα, temos também que φ(x) = Re(φ(x)) − iRe(iφ(x)) = Re(φ(x)) − iRe(φ(ix)) = u(x) − iu(ix). Teorema 2.18. (de Hahn-Banach para espaços vetoriais) Sejam X um espaço vetorial sobre K e M um subespaço de X. Suponha que ϕ : M → K seja um funcional linear e que p : X → R seja uma semi-norma tais que |ϕ(x)| ≤ p(x), para todo x ∈ M . Então existe φ ∈ X # tal que φM = ϕ e |φ(x)| ≤ p(x), ∀x ∈ X. Demonstração. Suponha primeiramente que X seja um espaço vetorial real e seja ϕ como na hı́potese do teorema. Para x ∈ M , ϕ(x) ≤ |ϕ(x)| ≤ p(x). Então pelo Teorema de Hahn-Banach real existe φ ∈ X ∗ tal que φM = ϕ e φ(x) ≤ p(x), ∀x ∈ X. Mas como −φ(x) = φ(−x) ≤ p(−x) = p(x), segue que |φ(x)| ≤ p(x), ∀x ∈ X. Suponha agora que X seja complexo. Pela proposição anterior podemos escrever ϕ(x) = u(x) − iu(ix), x ∈ M , com u R-linear. Note que |u(x)| ≤ |ϕ(x)| ≤ p(x). 40 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Aplicando o que fizemos anteriormente para o espaço real XR e o funcional u, obtemos U R-linear tal que U = u e |U (x)| ≤ p(x), ∀x ∈ X. M Definimos φ(x) = U (x)−iU (ix). Novamente pela proposição anterior φ ∈ X # . Se x ∈ M , então também temos que ix ∈ M e portanto φ(x) = U (x)−iU (ix) = u(x)−iu(ix) = ϕ(x). Então φM = ϕ. Resta apenas mostrar que φ é dominado pela semi-norma. Seja então x ∈ X. Se φ(x) = 0 é trivial. Suponha então que φ(x) 6= 0. Tomamos θ ∈ R tal que φ(x) = eiθ |φ(x)|. Assim, |φ(x)|≥0 |φ(x)| = e −iθ −iθ φ(x) = φ(e x) = U (e −iθ x) − iU (ie −iθ z}|{ x) = U (e−iθ x) ≤ p(e−iθ x) = p(x), o que completa a demonstração. Teorema 2.19. (de Hahn-Banach para espaços normados) Sejam X um espaço vetorial sobre K, M um subespaço de X e ϕ : M → K um funcional linear contı́nuo em M . Então existe φ ∈ X ∗ tal que φ = ϕ e kφk = kϕk. M Demonstração. Para x ∈ X definimos a semi-norma p(x) = kϕkkxk. Pela continuidade de ϕ, se x ∈ M , |ϕ(x)| ≤ kϕkkxk = p(x). Então, pelo Teorema de Hahn-Banach para espaços vetoriais existe φ ∈ X # tal que φM = ϕ e |φ(x)| ≤ p(x) = kϕkkxk, ∀x ∈ X. Então se kxk ≤ 1, |φ(x)| ≤ kϕk e portanto φ é contı́nua e kφk ≤ kϕk. Mas por ser uma extensão de ϕ, kφk ≥ kϕk. Logo kφk = kϕk. Corolário 2.20. Seja X um espaço normado e x0 ∈ X \ {0}. Então existe φ ∈ X ∗ tal que kφk = 1 e φ(x0 ) = kx0 k. Demonstração. Seja M = [x0 ]. Defina em M o funcional ϕ por ϕ(λx0 ) = λkx0 k. Então ϕ é claramente linear e contı́nuo, pois M tem dimensão finita. Note que φ(x0 ) = kx0 k e kϕk = sup |ϕ(x)| = sup |λ|kxk = 1. x∈SM kλxk=1 Pelo Teorema de Hahn-Banach, existe φ ∈ X ∗ tal que φM = ϕ e kφk = kϕk. Então φ(x0 ) = ϕ(x0 ) = kx0 k e kφk = 1. 2.3. Exercı́cios 41 Corolário 2.21. Seja X um espaço normado e x ∈ X. Então kxk = sup |ϕ(x)|, ϕ∈BX ∗ e tal supremo é atingido para algum ϕ ∈ BX ∗ . Demonstração. Se kϕk ≤ 1, então |ϕ(x)| ≤ kϕkkxk ≤ kxk. Logo supφ∈BX ∗ |ϕ(x)| ≤ kxk. Mas pelo corolário anterior, existe φ ∈ SX ∗ tal que φ(x) = kxk. Então kxk = sup |ϕ(x)| ϕ∈BX ∗ e o supremo é atingido em φ. Corolário 2.22. Seja M um subespaço fechado de um espaço normado X. Então dado x0 ∈ X \ M , existe φ ∈ X ∗ tal que φM ≡ 0, kφk = 1 e φ(x0 ) = d(x0 , M ). Demonstração. Sendo M fechado, X/M é um espaço normado. Como vimos, a norma em X/M é dada por kx+M k = d(x, M ). Como x0 ∈ / M , x0 +M 6= 0 em X/M . Pelo primeiro ∗ corolário aplicado em X/M , existe φ̃ ∈ (X/M ) com kφ̃k = 1 e kφ̃(x0 + M )k = kx0 + M k. Seja π : X → X/M a aplicação quociente e definimos φ = φ̃ ◦ π : X → K. Então φ é linear e contı́nua. Se x ∈ M , então φ(x) = φ̃(M ) = 0, e portanto φM ≡ 0. Pelo teorema 1.50, kφk = kφ̃k = 1. Finalmente, φ(x0 ) = φ̃(x0 + M ) = kx0 + M k = d(x0 , M ). Outras consequências do Teorema de Hahn-Banach estão nos exercı́cios. 2.3 Exercı́cios Consequências do Teorema de Baire 1. (a) Mostre que todo subespaço próprio de um espaço normado X tem interior vazio. (b) Use o teorema de Baire para mostrar que não existem espaços de Banach de dimensão enumerável. 2. Seja X um espaço de Banach de dimensão infinita e considere uma base algébrica B = {xi : i ∈ I} de X. Então I é não enumerável pelo exercı́cio anterior. Considere os funcionais coordenados x∗i , i ∈ I. Mostre que apenas um número finito destes funcionais são contı́nuos. 42 MAT5721 - Leonardo Pellegrini 3. Sejam X = C 1 [0, 1] o espaço das funções com a primeira derivada contı́nua e Y = C[0, 1], ambos com a norma do supremo. Mostre que o operador derivação D : X → Y tem gráfico fechado, mas não é contı́nuo. Conclusão? 4. Mostre que se T : X → é uma aplicação linear do espaço de Banach X no espaço normado Y , então T é contı́nua se, e somente se, T −1 (BY ) tem interior não vazio. 5. (Aplicações Bilineares Contı́nuas) Sejam X, Y e Z espaços vetoriais normados sobre K e B : X × Y → X uma aplicação bilinear. Mostre que as seguintes condições são equivalentes: (a) B é contı́nua; (b) B é contı́nua na origem (0, 0) ∈ X × Y ; (c) Existe M > 0 tal que kB(x, y)k ≤ M kxkkyk para quaisquer x ∈ X, y ∈ Y . 6. Mostre que toda bilinear separadamente contı́nua (ou seja, contı́nua na primeira variável e contı́nua na segunda separadamente) definida em espaços de Banach é contı́nua. Sugestão: Use o Princı́pio da Limitação Uniforme. 7. Mostre que uma aplicação bilinear definida em espaços de dimensão finita é sempre contı́nua. 8. Suponha que k · k e k · k0 sejam duas normas definidas em um espaço vetorial X com as quais X, k · k e X, k · k0 sejam espaços de Banach. Mostre que se existe M > 0 tal que kxk0 ≤ M kxk, para todo x ∈ X, então as normas não equivalentes. 9. Mostre que a norma k · k1 é uma semi-norma enumeravelmente sub-aditiva em c00 que não é contı́nua. Qual o motivo? 10. O objetivo deste exercı́cio é mostrar que todo espaço separável é um quociente de `1 . Seja X um espaço separável e considere um conjunto {dn : n ∈ N} denso em BX . P (a) Mostre que a (αn )n ∈ `1 7→ n∈N αn dn ∈ X é uma aplicação linear contı́nua de `1 em X sobrejetora. (b) Mostre que existe um subespaço fechado MX de `1 tal que `1 /MX ∼ = X. Sugestão: Teorema do Isomorfismo. 11. (Base de Schauder) Uma sequência (xn )n de elementos de um espaço de Banach X é chamada de base de Schauder se cada elemento x ∈ X pode ser escrito de P modo único na forma x = n∈N αn xn (Note que na definição de base algébrica só é 2.3. Exercı́cios 43 permitido usar somas finitas). (a) Mostre que se X possui uma base de Schauder então X é separável. (b) Seja (xn )n uma base de Schauder para um espaço de Banach X, k · k . Mostre que a função k X X αn xn (x = kxk(xn ) = sup α n xn ) k∈N n=1 n∈N define uma outra norma em X. (c) Mostre que X, k · k(xn ) também é um espaço de Banach. (d) Mostre que k·k(xn ) é equivalente a norma original de X. Exercı́cio 8 pode ajudar. (e) Mostre que as projeções Pk : x = X αn xn ∈ X 7→ k X αn xn ∈ [x1 , x2 , . . . , xk ] n=1 n∈N são contı́nuas. Conclua que os funcionais lineares X ∗ xk αn xn = αk n∈N são contı́nuos. Tais funcionais são chamados de funcionais coordenados em relação à base de Schauder (xn )n . Compare com o exercı́cio 2. Teorema de Hahn-Banach 12. Mostre que o operador identidade em c00 não pode ser estendido a uma aplicação contı́nua de c0 em c00 . \ Ker ϕ : ϕM ≡ 0 . 13. Seja M um subespaço de um espaço normado X. Mostre que M = 14. Mostre que X ∗ separa pontos de X. Ou seja, mostre que dados x, y ∈ X com x 6= y existe ϕ ∈ X ∗ tal que ϕ(x) 6= ϕ(y). 15. Um espaço de Banach Y é chamado de isometricamente injetivo se o teorema de Hahn-Banach continua válido com Y no lugar de K. Mostre que `∞ é isometricamente injetivo. Parte 3 Duais e Biduais 3.1 O Espaço Dual Lembramos que se X é um espaço normado, o dual (topológico) de X é o espaço de def Banach X ∗ = L(X; K). O espaço vetorial dos funcionais lineares em X é chamado de dual algébrico de X e é denotado por X # . Exemplo 3.1. Seja X = c0 . Então X ∗ ≡ `1 . X De fato, considere a aplicação T : `1 → c∗0 definida por T (βn )n (αn )n = βn αn . T está n∈N bem definida, pois para cada k ∈ N, k X |βn αn | ≤ max |αn | n=1,...k n=1 Logo, X k X |βn | ≤ k(αn )n k∞ k(βn )n k1 . n=1 βn αn é absolutamente convergente e portanto converge em K. Vemos também n∈N pelas desigualdades acima que se k(αn )n k∞ ≤ 1, kT (βn )n (αn )n k ≤ k(βn )n k1 . Então kT (βn )n k ≤ k(βn )n k1 . (1) É imediato que T é linear e injetora. Vamos mostrar que T é sobre c∗0 . Seja então ϕ ∈ c∗0 . Para cada n, definimos βn = ϕ(en ), onde en = (0, . . . , 0, 1, 0, . . . , ). Tomamos γn escalar de módulo 1 tal que |βn | = γn βn . Assim, ! k k k X X X |βn | = γn ϕ(en ) = ϕ γn en ≤ kϕk, n=1 n=1 n=1 44 3.1. O Espaço Dual 45 P pois kn=1 γn en tem norma um em c0 . Logo, (βn )n ∈ `1 e k(βn )n k1 ≤ kϕk (2). Além disso, para todo (αn )n ∈ c0 , ! X X X ϕ(αn )n = ϕ αn en = αn ϕ (en ) = αn βn = T (βn )n (αn )n , n∈N n∈N n∈N e portanto T (βn ) = ϕ, mostrando que T é sobrejetora. Finalmente, por (1) e (2) T é uma isometria. O exemplo anterior mostra que o dual de c0 pode ser identificado de umaX maneira natural com `1 , onde a ação de (βn )n ∈ `1 em (αn )n ∈ c0 é dada por (βn )n (αn )n = βn α n . n∈N Os duais de outros espaços de sequências podem ser identificados da mesma maneira. Exemplo 3.2. Se 1 ≤ p < ∞, então `∗p ≡ `q , onde q é o conjugado de p. Em particuX βn α n . lar, `∗1 ≡ `∞ . As identificações são como no exemplo anterior: (βn )n (αn )n = n∈N Deixaremos a demonstração como exercı́cio. Exemplo 3.3. Se 1 ≤ p < ∞, o dual de Lp [0, 1] pode ser identificado com Lq [0, 1], onde q é o conjugado de p. Se ϕ ∈ Lp [0, 1]∗ está identificado com g ∈ Lq [0, 1], então R ϕ(f ) = [0,1] f gdµ. Definição 3.4. Seja X um espaço normado. Se A é subconjunto de X, definimos o anulador de A por A⊥ = {x∗ ∈ X ∗ : x∗ (a) = 0, ∀a ∈ A}. Se B é um subconjunto de X ∗ , definimos o anulador à esquerda de B por ⊥ B = {x ∈ X : b(x) = 0, ∀b ∈ B}. É fácil ver que A⊥ e ⊥B são subespaços fechados de X ∗ e X, respectivamente (exercı́cio). Além disso, temos o seguinte fato: Proposição 3.5. Sejam A e B como na definição anterior. Então ⊥(A⊥ ) = [A]. Consequentemente, se A é um subespaço de X, então ⊥(A⊥ ) = A. Demonstração. Pela observação feita anteriormente, ⊥(A⊥ ) é um subespaço fechado de / A. X. Claramente ⊥(A⊥ ) contém A. Logo ⊥(A⊥ ) ⊃ A. Por outro lado, suponha que x ∈ ∗ Então por Hahn-Banach, exite um um funcional ϕ ∈ X que se anula em A mas não em x. Então ϕ ∈ A⊥ . Mas como ϕ(x) 6= 0, segue que x ∈ / ⊥(A⊥ ). Logo ⊥(A⊥ ) = A. 46 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Os anuladores podem ser usados para identificar certos duais. Vejamos alguns exemplos: Teorema 3.6. Seja X normado e M um subespaço fechado de X. Então o dual de X/M é isométrico a M ⊥ . Demonstração. Seja π : X → X/M a projeção natural. Definimos a aplicação T : (X/M )∗ → M ⊥ pondo T (ϕ) = ϕ ◦ π. Note que T está bem definida, pois π(M ) = {0}. Seja x∗ ∈ M ⊥ . Então M ⊂ Ker x∗ e portanto pelo teorema 1.50 existe um único funcional linear ϕ : X/M → K tal que x∗ = ϕ ◦ π e além disso kx∗ k = kϕk. Então T (ϕ) = ϕ ◦ π = x∗ . Vemos então que T é uma aplicação sobrejetora e kT (ϕ)k = kx∗ k = kϕk, o que mostra que T é uma isometria. Mais explicitamente, o teorema anterior diz que (X/M )∗ pode ser identificado com M ⊥ da seguinte forma: Se ϕ ∈ (X/M )∗ está identificado com m⊥ ∈ M ⊥ , então m⊥ (x + M ) = m⊥ (x). A próxima identificação é bastante intuitiva. Teorema 3.7. Seja X normado e M um subespaço de X. Então existe uma isometria que que identifica o dual de M com X ∗ /M ⊥ da seguinte forma: Se um elemento de M ∗ é visto como um elemento x∗ + M ⊥ ∈ X ∗ /M ⊥ , então x∗ + M ⊥ age em m ∈ M por x∗ + M ⊥ (m) = x∗ (m). Demonstração. Considere T : X ∗ /M ⊥ → M ∗ definida por T (x∗ + M ⊥ ) = x∗ M . Temos que mostrar que T está bem definida, ou seja, que independe dos representantes da classe x∗ +M ⊥ . Tomamos então y ∗ +M ⊥ = x∗ +M ⊥ . Pela definição do quociente, y ∗ −x∗ ∈ M ⊥ e portanto y ∗ − x∗ se anula em M . Isso mostra que x∗ M = y ∗ M e T está bem definida. Claramente T é linear. T também é sobrejetora pois dado m∗ ∈ M ∗ , basta tomarmos m̃∗ ∈ X ∗ uma extensão de Hahn-Banach de m∗ que teremos T (m̃∗ + M ⊥ ) = m∗ . Resta mostrar que T preserva norma. Seja então x∗0 +M ⊥ ∈ X ∗ /M ⊥ e considere m∗ = T (x∗0 +M ⊥ ) ∈ M ∗ . Então m∗ = x∗0 M . Tomamos uma extensão de Hahn-Banach x∗ ∈ X ∗ de m∗ . Então x0 e x coincidem em M e portanto x∗0 + M ⊥ = x∗ + M ⊥ . Se y ⊥ ∈ M ⊥ , então km∗ k = sup |x∗ (m)| = sup |(x∗ + y ⊥ )(m)| ≤ sup |(x∗ + y ⊥ )(x)| = kx∗ + y ⊥ k, m∈BM m∈BM x∈BX 3.2. O Adjunto de um operador linear e assim km∗ k ≤ 47 inf kx∗ + y ⊥ k = kx∗ + M ⊥ k = kx∗0 + M ⊥ k. Mas por outro lado, kx∗0 + y ⊥ ∈M ⊥ M ⊥ k ≤ kx∗ k = km∗ k. Isso mostra que T preserva norma e conclui a demonstração. 3.2 O Adjunto de um operador linear Definição 3.8. Sejam X e Y espaços normados e T ∈ L(X; Y ). Então o (Banach) adjunto de T é a aplicação linear T ∗ : Y ∗ → X ∗ definida por T ∗ (y ∗ ) = y ∗ ◦ T . Lema 3.9. Sejam X e Y espaços normados. (a) Se T : X → Y é linear, então T é contı́nuo se, e somente se, sup{|y ∗ (T (x))| : x ∈ BX , y ∗ ∈ BY ∗ } < ∞. Neste caso. kT k = sup{|y ∗ (T (x))| : x ∈ BX , y ∗ ∈ BY ∗ }. (b) Se T : Y → X ∗ é linear, então T é contı́nuo se, e somente se, sup{|T (y)(x)| : x ∈ BX , y ∈ BY } < ∞. Neste caso. kT k = sup{|T (y)(x)| : x ∈ BX , y ∈ BY }. Demonstração. (a) Por Hahn-Banach, kT (x)k = sup{|y ∗ (T (x))| : y ∗ ∈ By∗ }. Logo supx∈BX kT (x)k = sup{|y ∗ (T (x))| : x ∈ BX , y ∗ ∈ By∗ }. Assim, T é contı́nua se e somente se tal supremos é finito. E neste caso, kT k = sup{|y ∗ (T (x))| : x ∈ BX , y ∗ ∈ By∗ }. (b) É parecida com o item anterior e deixaremos como exercı́cio. Teorema 3.10. Seja T ∈ L(X; Y ) e considere T ∗ : Y ∗ → X ∗ seu adjunto. Então T ∗ é contı́nuo e kT k = kT ∗ k. Se T é um isomorfismo (ou isometria), então T ∗ também é isomorfismo (ou isometria). Demonstração. Pelo lema anterior, partes (a) e (b) (a) kT k = sup{|y ∗ (T (x))| : x ∈ BX , y ∗ ∈ By∗ } = sup{|T ∗ (y ∗ )(x)| : x ∈ BX , y ∗ ∈ By∗ } (b) = kT ∗ k. Agora suponha que T seja isomorfismo. Então, T ∗ é injetor, pois T ∗ (y ∗ ) = 0 ⇒ T ∗ (y ∗ )(x) = 0, ∀x ∈ X ⇒ y ∗ (T (x)) = 0, ∀x ∈ X ⇒ y ∗ ≡ 0, pois T é sobrejetor. T ∗ também é sobrejetor, pois dado x∗ ∈ X ∗ tomamos x∗ ◦ T −1 ∈ Y ∗ . Assim, T ∗ (x∗ ◦ T −1 ) = x∗ ◦ T −1 ◦ T = x∗ . 48 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Assim, T ∗ é uma bijeção contı́nua entre os espaços de Banach Y ∗ e X ∗ , sendo contı́nuo, pelo Teorema da Aplicação Aberta. Logo, é um isomorfismo. Agora, se T é uma isometria, pelo que acabamos de fazer T ∗ é uma bijeção, e além disso, kT ∗ (y ∗ )k = sup |T ∗ (y ∗ )(x)| = sup |y ∗ ◦ T (x)| = sup |y ∗ (y)| = ky ∗ k, x∈BX x∈BX y∈BY pois T é uma isometria. Vemos então que T ∗ preserva norma. Destacamos o seguinte corolário, cuja demonstração é imediata usando o teorema anterior. Corolário 3.11. Se dois espaços normados são isomorfos ou isométricos, então seus duais têm a mesma propriedade. Observação 3.12. A recı́proca do corolário não é verdadeira. Dois duais podem ser isométricos sem que os espaços originais sejam isométricos. Por exemplo, o dual de c0 e de c são isométricos a `1 e portanto são isométricos entre si. Porém c0 e c são isomorfos, mas não isométricos. Veja os exercı́cios. 3.3 O Bidual def Seja X um espaço normado. O bidual é o espaço de Banach X ∗∗ = (X ∗ )∗ . Exemplo 3.13. O dual de c0 é (isométrico a) `1 . Por sua vez, o dual de `1 é `∞ . Então, o bidual de c0 é (isométrico a) `∞ . Um espaço normado X pode ser imerso canonicamente em seu bidual. Considere a aplicação natural iX : X → X ∗∗ definida por iX (x) = x̂, onde x̂(x∗ ) = x∗ (x), ∀x∗ ∈ X ∗ . iX : X → X ∗∗ está bem definida, pois sup |iX (x)(x∗ )| = sup |x∗ (x)| = kxk, x∗ ∈BX ∗ x∗ ∈BX ∗ por Hahn-Banach. Logo iX (x) ∈ X ∗∗ e kiX (x)k = kxk. Isso mostra também que iX : X → X ∗∗ é uma imersão isométrica. Salientamos que iX não é necessariamente sobrejetora. Discutiremos isso a seguir. Antes, vejamos uma aplicação desta imersão. 3.3. O Bidual 49 Teorema 3.14. (Completamento de um espaço normado) Seja X um espaço normado. Então existe um espaço de Banach Y e uma imersão isometrica T : X → Y com T (X) denso em Y . Além disso, Y com as propriedades acima é único a menos de isometria. Demonstração. Seja iX : X → X ∗∗ . Basta considerar Y = iX (X) e T : X → Y dada por T (x) = iX (x), ∀x ∈ X. Y é completo pois é fechado dentro do Banach X ∗∗ . Evidentemente T (X) é denso em Y e T é uma imersão isométrica. Para a unicidade, suponha que exista uma imersão isométrica R : X → Z com Z Banach e R(X) denso em Z. Considere a aplicação S = R◦i−1 : iX (X) → R(X), onde i−1 é a inversa a esquerda de iX . Então S é uma isometria, por ser composta de isometrias. Pelo teorema 1.45, S admite uma extensão contı́nuas S̄ de Y = iX (X) em Z = R(X). Como S preserva normas em iX (X), segue facilmente da continuidade de S̄ e da densidade de iX (X) em Y que S̄ é uma imersão isométrica, ou seja, kS̄(y)k = kyk, ∀y ∈ Y . Basta então verificar que S̄ é sobrejetora. Como Y é Banach, S̄(Y ) também é e portanto é fechado em Z. Como S̄(Y ) contém o denso R(X), devemos ter obrigatóriamente S̄(Y ) = Z, o que mostra que S̄ é sobrejetora. Um espaço Y como no teorema anterior (único a menos de isometria) é chamado de completamento de X e é denotado por X̂. Note que se X é Banach, então iX (X) é fechado e portanto iX (X) = iX (X). Então X é igual (isométrico) ao seu completamento. Temos a seguinte propriedade para o completamento. Proposição 3.15. Um espaço normado tem o mesmo dual que seu completamento. Demonstração. Claro que aqui “mesmo dual”significa “duais isométricos”. Como espaços isométricos têm o mesmo dual, é suficiente provar o resultado para completamento de X explicitado na demonstração do teorema anterior. Considere a aplicação S : iX (X) ∗ → X ∗ dado por S(y ∗ ) = y ∗ ◦ iX , onde iX é a imersão canônica de X em X ∗∗ . Claramente S é linear e está bem definida. Seja y ∗ ∈ iX (X) ∗ . Pela densidade de iX (X) em iX (X) temos que ky ∗ k = sup z∈Bi X (X) |y ∗ (z)| = sup |y ∗ (iX (x))| = sup |S(y ∗ )(x)| = kS(y ∗ )k, x∈BX o que mostra que S é injetora e preserva normas. x∈BX 50 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Resta mostrar que S é sobrejetora. Seja então x∗ ∈ X ∗ . A função x∗ ◦ i−1 é um funcional linear contı́nuo em iX (X). Logo, admite uma unica extensão y ∗ para iX (X). Assim, se x ∈ X, S(y ∗ )(x) = y ∗ ◦ iX (x) = x∗ (x), pelas definições de S e y ∗ . Logo, S(y ∗ ) = x∗ . Exemplo 3.16. c00 é denso em c0 que por sua vez é completo. Então c0 é o completamento de c00 . A imersão isométrica T : c00 → c0 do Teorema 3.14 é a inclusão. Pela proposição anterior o dual de c00 é igual ao de c0 . Então c∗00 = `1 . Vimos no Teorema 3.7 que o dual de um subespaço M de X pode ser visto como um quociente de X ∗ . A proposição seguinte nos mostra que o bidual de M pode ser visto como um subespaço do bidual de X. Denotaremos por M ⊥⊥ o subespaço (M ⊥ )⊥ ⊂ X ∗∗ . Proposição 3.17. Seja M um subespaço de um espaço normado X. Considere a isometria T : X ∗ /M ⊥ → M ∗ dada pelo Teorema 3.7. Então a aplicação S : M ⊥⊥ → M ∗∗ definida por S(m⊥⊥ )(T (x∗ + M ⊥ )) = m⊥⊥ (x∗ ) é uma isometria. Demonstração. Pelo teorema 3.6 a aplicação Q : M ⊥⊥ → (X ∗ /M ⊥ )∗ dada por Q(m⊥⊥ )(x∗ + M ⊥ ) = m⊥⊥ (x∗ ) é uma isometria. A aplicação T : X ∗ /M ⊥ → M ∗ a qual o enunciado se refere é dada por T (x∗ + M ⊥ )(m) = x∗ (m). Considere seu adjunto T ∗ : M ∗∗ → (X ∗ /M ⊥ )∗ , que também é uma isometria pelo teorema def 3.10. Então a aplicação S = (T ∗ )−1 ◦ Q : M ⊥⊥ → M ∗∗ é uma isometria. Além disso S(m⊥⊥ )(T (x∗ + M ⊥ )) = (T ∗ )−1 ◦ Q(m⊥⊥ )(T (x∗ + M ⊥ )) = T ∗ (T ∗ )−1 ◦ Q(m⊥⊥ ) (x∗ + M ⊥ ) = Q(m⊥⊥ )(x∗ + M ⊥ ) = m⊥⊥ (x). O Teorema anterior deve ser interpretado da seguinte forma: Considere M ∗ identificado com X ∗ /M ⊥ como no Teorema 3.7. Então há uma isometria que identifica M ∗∗ com M ⊥⊥ , a saber, a ação de um elemento m⊥⊥ ∈ M ∗∗ em x∗ + M ⊥ ∈ M ∗ é dada por m⊥⊥ (x∗ + M ⊥ ) = m⊥⊥ (x∗ ). 3.4. Espaços Reflexivos 3.4 51 Espaços Reflexivos Comentamos na seção anterior que a aplicação canônica iX : X → X ∗∗ não é necessariamente sobrejetora. De fato, se consideramos o bidual de c0 identificado com `∞ então iX : c0 → `∞ claramente não pode ser sobrejetora, pois c0 é separável e `∞ (veja a seção sobre espaços separáveis). Isto motiva a seguinte Definição 3.18. Um espaço normado é reflexivo se a imersão canônica iX : X → X ∗∗ for sobrejetora. A definição acima é devida a H. Hahn. Porém ele chamava tais espaços de regulares, um termo um tanto vago. É importante salientar que a definição de reflexividade exige que iX : X → X ∗∗ seja isometria e não que exista uma isometria entre X e X ∗∗ . Surge então a pergunta natural: Se há uma isometria entre X e X ∗∗ , será que X é reflexivo. Ou seja, a existência de uma isometria X e X ∗∗ implica que iX : X → X ∗∗ seja isometria? A pergunta foi respondida negativamente por R.C. James em um artigo onde ele constroi um espaço de Banach J isométrico ao seu bidual, mas não reflexivo. No entanto, note que para um espaço ser reflexivo ele deve ser em particular isométrico ao bidual, que sempre é completo. Então todo espaço reflexivo é de Banach. Exemplo 3.19. Se X tem dimensão finita então, como vimos, X ∗ = X # . Sendo assim, X e X ∗ têm a mesma dimensão. Logo, a imersão canônica deve ser sobrejetora, pois é sempre injetora. Isso mostra que todo espaço normado de dimensão finita é reflexivo. Exemplo 3.20. Seja 1 < p < ∞ e q o conjugado de p. Considere as isometrias Tp : Lp [0, 1] → Lq [0, 1]∗ e Tq : Lq [0, 1] → Lp [0, 1]∗ definidas no exemplo 3.3. Seja i : Lp [0, 1] → Lp [0, 1]∗∗ a imersão canônica. Dado x∗∗ ∈ Lp [0, 1]∗∗ , temos que x∗∗ ◦ Tq ∈ Lq [0, 1]∗ . Logo, existe f ∈ Lp [0, 1] tal que Tp (f ) = x∗∗ ◦ Tq . Assim, dado x∗ ∈ Lp [0, 1]∗ , tomamos g ∈ Lq [0, 1] tal que Tq (g) = x∗ e obtemos Z ∗∗ ∗ ∗∗ x (x ) = x (Tq (g)) = Tp (f )(g) = f gdµ = Tq (g)(f ) = x∗ (f ) = i(f )(x∗ ). [0,1] Logo, i(f ) = x∗∗ e portanto i : Lp [0, 1] → Lp [0, 1]∗∗ é sobrejetora, sendo Lp [0, 1] reflexivo. Exemplo 3.21. De uma maneira bem parecida mostramos que `p é reflexivo se 1 < p < ∞. Deixaremos a demonstração como exercı́cio. 52 MAT5721 - Leonardo Pellegrini Veremos adiante que se p = 1 ou p = ∞ então nem Lp [0, 1] e nem `p são reflexivos. Antes vejamos algumas propriedades dos espaços reflexivos. Proposição 3.22. Se X é reflexivo, então todo elemento de X ∗ atinge sua norma. Demonstração. Seja ϕ ∈ X ∗ . Então, por Hahn-Banach, existe x∗∗ ∈ X ∗∗ de norma 1 tal que kϕk = |x∗∗ (ϕ)|. Como X é reflexivo, existe x0 ∈ BX tal que iX (x0 ) = x∗∗ . Assim kϕk = |iX (x0 )(ϕ)| = |ϕ(x0 )|. Exemplo 3.23. Considere c∗0 identificado com `1 da maneira usual. Tomamos o funcional (2−n )n ∈ c∗0 . Então k(2−n )n k1 = 1, mas se (αn )n ∈ Bc0 , então vemos que X X |(2−n )n (αn )n | = | αn 2−n | < | 2−n | = 1, n∈N n∈N pois (αn )n converge a zero. Logo (2−n )n não atinge sua norma. Como já sabemos, c0 não é reflexivo. A recı́proca da proposição anterior é verdadeira. Se X é um espaço de Banach o qual todo funcional definido em X atinge a norma, então X é reflexivo. O resultado foi demonstrado também por R.C. James, mas a demonstração não é simples e não a faremos aqui. Fica apenas o registro. Teorema 3.24. Seu espaço normado é isomorfo a um espaço reflexivo, então também é reflexivo. Demonstração. Sejam Y isomorfo ao reflexivo X e T : X → Y um isomorfismo. Então, como vimos, os adjuntos T ∗ : Y ∗ → X ∗ e T ∗∗ : X ∗∗ → Y ∗∗ também são isomorfismos. Temos que mostrar que a imersão canônica iY : Y → Y ∗∗ é sobrejetora. Seja y ∗∗ ∈ Y ∗∗ . Então existe x∗∗ ∈ X ∗∗ tal que T ∗∗ (x∗∗ ) = y ∗∗ . Como X é reflexivo, existe x ∈ X tal que iX (x) = x∗∗ . Assim, para todo y ∗ ∈ Y ∗ , y ∗∗ (y ∗ ) = T ∗∗ (x∗∗ )(y ∗ ) = x∗∗ ◦ T ∗ (y ∗ ) = x∗∗ (y ∗ ◦ T ) = iX (x)(y ∗ ◦ T ) = y ∗ (T (x)). Portanto, y ∗∗ = iY (T (x)). Teorema 3.25. Todo subespaço fechado de um espaço reflexivo é reflexivo. Demonstração. Seja M subespaço fechado de um espaço reflexivo X. Dado um elemento m∗∗ ∈ M ∗∗ , temos que mostrar que existe m ∈ M tal que m∗∗ (m∗ ) = m∗ (m), ∀m∗ ∈ M ∗ . 3.4. Espaços Reflexivos 53 Considere a isometria T : X ∗ /M ⊥ → M ∗ dada por T (x∗ + M ⊥ )(m) = x∗ (m), usada no Teorema 3.7. Defina o funcional x∗∗ ∈ X ∗∗ por x∗∗ = m∗∗ ◦ T ◦ π, onde π : X ∗ → X ∗ /M ⊥ é a aplicação quociente. Como X é reflexivo, existe x ∈ X tal que x∗∗ (x∗ ) = x∗ (x), ∀x∗ ∈ X ∗ (∗). Afirmamos que x ∈ M . De fato, caso contrário, por Hahn-Banach, existiria um funcional m⊥ ∈ X ∗ que se anula em M mas não em x (note que ai usamos o fato de M ser fechado). Por (∗), x∗∗ (m⊥ ) = m⊥ (x) 6= 0 mas pela definição de x∗∗ , x∗∗ (m⊥ ) = m∗∗ ◦ T ◦ π(m⊥ ) = m∗∗ ◦ T (0 + M ⊥ ) = 0, chegando a uma contradição. Então x ∈ M . Assim, para todo m∗ ∈ M ∗ , se x∗ + M ⊥ = T −1 (m∗ ), m∗∗ (m∗ ) = m∗∗ T (x∗ + M ⊥ ) = m∗∗ ◦ T ◦ π(x∗ ) = x∗∗ (x∗ ) = x∗ (x) = m∗ (x) = iM (x)(m∗ ). Logo, iM (m) = m∗∗ . Corolário 3.26. Um espaço de Banach é reflexivo se, e somente se, seu dual é reflexivo. Demonstração. Suponha que X seja reflexivo. Temos que mostrar que a imersão iX ∗ : X ∗ → X ∗∗∗ é sobrejetora. Dado Φ ∈ X ∗∗∗ , tomamos ϕ = Φ ◦ iX ∈ X ∗ . Então, se x∗∗ ∈ X ∗∗ , existe x ∈ X tal que iX (x) = x∗∗ (pois X é reflexivo). Assim iX ∗ (ϕ)(x∗∗ ) = x∗∗ (ϕ) = iX (x)(ϕ) = ϕ(x) = Φ ◦ iX (x) = Φ(x∗∗ ). Logo iX ∗ (ϕ) = Φ e portanto iX ∗ é sobrejetora. Reciprocamente, se X ∗ for reflexivo, pelo que fizemos anteriormente X ∗∗ também será. Como X é Banach, iX (X) é fechado no reflexivo X ∗∗ e portanto reflexivo pelo teorema anterior. Consequentemente X é reflexivo por ser isométrico a iX (X). Exemplos 3.27. Sabemos que c0 não é reflexivo. Pelo corolário anterior c∗0 também não é. Consequentemente `1 ≡ c∗0 não é reflexivo. Analogamente, `∞ ≡ `∗1 não é reflexivo. Como `p é (isométrico a) um subespaço de Lp [0, 1] (veja os exercı́cios), então Lp [0, 1] também não é reflexivo se p = 1 ou p = ∞. 54 MAT5721 - Leonardo Pellegrini 3.5 Exercı́cios Duais e Biduais 1. Mostre que o dual de c também pode ser identificado com `1 . Conclua que dois espaços normados não isométricos podem ter duais isométricos. 2. Mostre que se X for separável então X ∗ será separável. A recı́proca é verdadeira? 3. Caracterize os elementos de c∗0 que atingem sua norma. Mostre que o conjunto de tais funcionais é denso em c∗0 . Isso é um caso particular do Teorema de BishopPhelps que diz que se X um espaço de Banach, o conjuntos dos elementos de X ∗ que atingem a norma é denso em X. 4. (a) Verique que a aplicação T 7→ T ∗ é uma imersão isométrica de L(X; Y ) em L(Y ∗ ; X ∗ ). (b) Mostre que não pode existir um isomorfismo de L(K; c0 ) sobre L(c∗0 ; K∗ ). Conclua que a imersão do item (a) nem sempre é sobrejetora, ou seja, existem operadores entre duais que não são adjuntos de ninguém. 5. Sejam X e Y espaços normados. (a) Dados x∗ ∈ X ∗ e y ∈ Y , mostre que a aplicação Tx∗ ;y : X → Y definida pela fórmula Tx∗ ;y (x) = x∗ (x)y é linear e contı́nua. Mostre ainda que kTx∗ ;y k = kx∗ kkyk. (b) Se X 6= ∅, mostre que L(X; Y ) contém um subespaço fechado isométrico a Y . (c) Mostre que se X 6= ∅ entãoL(X; Y ) é Banach se, e somente se, Y é Banach. 6. Se X é reflexivo e M é um subespaço fechado de X, mostre que X/M também é reflexivo. 7. Mostre que se existe uma aplicação linear contı́nua de um espaço reflexivo X sobre um espaço de Banach Y , então Y também é reflexivo. 8. Prove que um subconjunto A de um espaço normado é limitado se, e somente se, ϕ(A) é limitado em K para todo ϕ ∈ X ∗ .