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Relato de Caso
Terapia nutricional em paciente com tuberculose e gastrectomia: relato de caso
Terapia nutricional em paciente com tuberculose
e gastrectomia: relato de caso
Nutritional therapy in patient with tuberculosis and gastrectomy: a case report
Fabiane Valentini Francisqueti¹
Paulo Câmara Marques Pereira²
Unitermos:
Tuberculose. Gastrectomia. Desnutrição. Nutrição
parenteral.
Key words:
Tuberculosis. Gastrectomy. Malnutrition. Parenteral
nutrition. Glutamine.
Endereço para correspondência:
Fabiane Valentini Francisqueti
Unesp Botucatu- SP Rubião Júnior s/nº
CEP: 18618-970
Departamento de Doenças Tropicais e Diagnóstico
por Imagem
Anexo Vermelho- 3º andar
E-mail: [email protected]
Submissão
3/7/2011
Aceito para publicação
15/9/2011
1.
2.
Resumo
Introdução: Doenças infecciosas, como a tuberculose, causam um grau de hipercatabolismo
que, agravado pela anorexia, resulta na perda e no esgotamento de reservas energéticas,
particularmente em doentes que necessitam de internação. Além disso, processos cirúrgicos,
como a gastrectomia, também podem levar a quadros de desnutrição. Sendo assim, uma
adequada oferta nutricional, associada aos cuidados metabólicos, diminui o processo. A
escolha da melhor terapia nutricional depende da situação que envolve o paciente, objetivando
sempre o seu benefício. Relato do Caso: Descrição do caso de um paciente com tuberculose,
com desnutrição grave pós-gastrectomia e diarreia. Paciente recebeu, durante 21 dias, terapia
nutricional parenteral como complemento à alimentação, associada à glutamina via oral. Ao
final do período, o ganho ponderal foi de 2,3 kg, além de melhora de padrão bioquímico e
segue em acompanhamento ambulatorial, com evolução do padrão nutricional. Conclusão:
A terapia nutricional adequada no caso desse paciente com tuberculose e gastrectomia foi de
fundamental importância na recuperação do estado nutricional, além de ajudar na resposta
ao tratamento da doença.
Abstract
Introduction: Infectious diseases such as tuberculosis cause a degree of hypercatabolism,
which compounded by anorexia, resulting in the loss and depletion of energy reserves,
particularly in patients who require hospitalization. Furthermore, surgical procedures such
as gastrectomy may also lead to conditions such as malnutrition. Therefore, adequate nutritional support, and care associated with metabolic decreases the process. The best choice
depends on the nutritional situation involving the patient, aiming always to your benefit. Case
Report: Case description of a patient with tuberculosis, severe malnutrition and diarrhea
after gastrectomy. Patient received parenteral nutrition therapy as a complement to food,
associated with oral glutamine during 21 days. At the end of the period, weight gain was
2.3 kg, as well as improvement of standard biochemical and follow-up in outpatients with
developments in nutritional standards. Conclusion: The adequate nutritional therapy in this
patient with tuberculosis, and gastrectomy had fundamental importance in the recovery of
nutritional status and help in response to treatment of disease.
Nutricionista do Programa de Aprimoramento Profissional em Nutrição em Doenças Tropicais da Faculdade de Medicina de Botucatu- UNESP,
Botucatu, SP, Brasil.
Professor Adjunto do Departamento de Doenças Tropicais da Faculdade de Medicina de Botucatu- UNESP, Botucatu, SP, Brasil.
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Francisqueti FV & Pereira PCM
Introdução
fluidos e nutrientes em quantidades adequadas para manter
as funções vitais e a homeostase; recuperar a atividade do
sistema imune; garantir as ofertas protéica e energética
adequadas para minimizar o catabolismo protéico e a
perda nitrogenada. A escolha do método mais adequado
dependerá da situação que envolve o paciente. Portanto,
o melhor método é aquele que, considerando as diferentes
circunstâncias, proporciona menor risco e maior eficiência
para a obtenção do melhor custo-benefício2. Assim, o estudo
teve como objetivo relatar a importância de uma adequada
terapia nutricional na recuperação de um paciente com
quadro de tuberculose e desnutrição grave pós-gastrectomia.
A tuberculose (TB) é uma doença infecto-contagiosa que
afeta principalmente os pulmões, mas também pode ocorrer
em outros órgãos do corpo, como ossos, rins e meninges, e
tem como principal agente causador a bactéria Mycobacterium
tuberculosis ou Bacilo de Koch (BK). Dentre os principais os sinais
e sintomas mais frequentemente descritos estão falta de apetite
e emagrecimento acentuado, tornando a TB uma doença altamente consumptiva, afetando diretamente o estado nutricional¹.
Pacientes gravemente doentes desenvolvem resposta
aguda a uma variedade de estímulos locais e sistêmicos,
que ocasiona aumento das necessidades energéticas e catabolismo protéico, ativação de citocinas, além de alterações
no sistema imune e trato gastrointestinal, caracterizando o
estado de estresse. A resposta de fase aguda ao estresse é,
provavelmente, designada para produzir energia e substratos
para a síntese protéica e reparação celular nos tecidos
viscerais – gastrintestinal, fígado, células imunes, etc. – e nos
locais acometidos pela doença ou em processo de cicatrização². Ocorre assim um hipercatabolismo, agravado pela
anorexia, resultando em perda e esgotamento das reservas
energéticas. O quadro clínico da doença leva à desnutrição
secundária, com redução das proteínas viscerais e índices
antropométricos, perda de massa magra e reserva de
gordura, prejudicando a recuperação da doença e influenciando negativamente a morbimortalidade dos pacientes3.
RELATO do caso
Paciente do sexo masculino, 55 anos, natural de Sertaneja- PR e procedente de Santa Maria da Serra- SP, onde
reside na zona rural. Casado, alfabetizado, e trabalha em
serviços gerais. Foi internado em abril de 2010 na Enfermaria
de Moléstias Infecciosas e Parasitárias (MIP) da UNESP/
Botucatu- SP, com quadro de tosse com expectoração amarelada, com piora nos últimos dias, associada à sensação de
fraqueza há 15 dias, sem febre. Paciente nega hipertensão
arterial, diabetes e dislipidemia. Tabagista há aproximadamente 30 anos (2-3 cigarros de palha/dia) e ex- etilista há
1 ano e meio. Em março de 2010, havia sido internado na
enfermaria de Gastroclínica – UNESP/Botucatu, referindo
cirurgia prévia de estômago há 1 ano e meio em decorrência
de úlcera duodenal, dor epigástrica associada à alimentação
que melhorava após vômito, inapetência, diarreia (mais de
6 episódios/dia), perda de peso de 20 kg após cirurgia,
fraqueza e inapetência.
Além de processos infecciosos serem responsáveis pelo
comprometimento do estado nutricional de indivíduos,
processos cirúrgicos também podem levar à desnutrição. A
gastrectomia consiste na retirada de parte ou de todo o estômago, refazendo o trânsito gastrointestinal através da anastomose com o duodeno (Billroth I - BI) ou jejuno (Billroth II - BII)4.
Diante do quadro, a hipótese diagnóstica para o paciente
foi: tuberculose pulmonar, fraqueza, inapetência, desnutrição
protéico-calórica, anemia megaloblástica e emagrecimento
secundários à má-absorção em consequência de gastrectomia há 1 ano e meio, diarreia crônica secundária à insuficiência pancreática e esteatose hepática grave. Dos órgãos que compõem o tubo digestivo, o estômago
exerce papel de reservatório de alimento. O alimento sofre aí
redução de tamanho em partículas menores através da digestão,
que é a mistura deles com o suco gástrico. Além disso, o estômago
modula a entrada quantitativa do quimo no tubo intestinal. Com a
retirada parcial ou total do estômago, há remoção de todo antro
e consequente diminuição na produção de gastrina e redução do
estímulo para secreção de pepsina, com prejuízo da digestão de
proteínas, principalmente colágeno. Ocorre, também, diminuição
da secreção de ácido clorídrico (HCl) e do fator intrínseco. Sendo
assim, qualquer alteração das funções do estômago pode levar
a danos no processo de digestão, prejudicando no delgado a
absorção dos nutrientes. Dentre as principais consequências
observadas pós-gastrectomia estão: anorexia, diarreia, síndrome
de Dumping, perda de peso, anemia (ferropriva ou megaloblástica), desnutrição protéico-calórica5.
Na avaliação nutricional de entrada na MIP, em abril/2010,
foram considerados os seguintes parâmetros antropométricos:
peso (kg), altura (m), Índice de massa corpórea (IMC), circunferência do braço (CB), circunferência muscular do braço (CMB),
dobras cutâneas do Bíceps (DCB), tríceps (DCT), subescapular
(DCSE) e suprailíaca (DCSI); foi feita também realizada uma
estimativa da porcentagem de gordura corporal por meio da
somatória das 4 dobras (DCB, DCT, DCSE, DCSI), usando os
valores propostos por Durmin & Womersley, 1974. Os valores
estão demonstrados na Tabela 1.
Sendo assim, a oferta nutricional adequada, associada
aos cuidados metabólicos, pode minimizar o processo. Os objetivos da terapia nutricional são: oferecer energia,
Para classificação do estado nutricional, foram considerados,
além dos parâmetros antropométricos, os critérios propostos por
Papini-Berto et al.4, que analisa também os valores laboratoriais
de albumina, linfócitos totais e hemoglobina.
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Terapia nutricional em paciente com tuberculose e gastrectomia: relato de caso
Peso (kg)
IMC (kg2)
CB (cm)
CMB (cm)
DCB (cm)
DCT (cm)
DCSE (cm)
DCSI (cm)
% de gordura
corporal
um teste de Bioimpedância, demonstrando porcentagem de
massa gorda de 11,5%, mostrando melhora em relação à
avaliação da gordura corporal de entrada, pelo método de
estimativa da somatória de dobras cutâneas.
Tabela 1 – Evolução nutricional do paciente
Avaliação 1 Avaliação 2 Avaliação 3 Avaliação 4
36,8
37,9
39,1
46,5
14,55
14,99
15,46
18,39
19,5
19,5
18,5
24,3
17,93
18,24
17,24
22,41
(percentil<5) (percentil<5) (percentil<5) (percentil<5)
2
3
2
3
5
4
4
6
6
–
–
–
2
–
–
–
9,5
–
–
Discussão
Uma das opções de terapia nutricional é a nutrição
parenteral, que consiste na administração intravenosa de
uma solução composta basicamente de carboidratos, aminoácidos, lipídios, vitaminas, visando à síntese ou à manutenção
dos tecidos, órgãos ou sistemas6. É indicada para pessoas
desnutridas ou com risco de desnutrição, quando a alimentação oral não é possível, quando a absorção de nutrientes
não é completa ou inexiste ou quando a alimentação oral
é indesejada7, tendo sido optada para este paciente devido
à má-absorção de nutrientes e ao fato do paciente não
responder ao tratamento nutricional via oral.
11,5*
1- Avaliação de entrada do paciente
2- Avaliação após 1 semana de nutrição parenteral
3- Avaliação ao término da nutrição parenteral
4- Avaliação na última consulta ambulatorial
*porcentagem de gordura obtida por Impedância Bioelétrica
A recomendação protéica para pacientes adultos, em
condições normais, independente de idade e do sexo é de
0,8 g/kg/dia. Em condições metabólicas adversas, a necessidade pode ser aumentada para 1,2-1,5g/kg/dia,8 valores
que foram prescritos para o paciente em virtude do quadro
infeccioso. Com relação às recomendações de energia,
recomenda-se iniciar com 25kcal/kg/dia para pacientes em
cuidado intensivo, aumentando-se a necessidade após 2 a
3 dias7. Nesse caso, como o objetivo era ganho de peso do
paciente para recuperação de estado nutricional e o mesmo
apresentava-se estável, optou-se por iniciar a nutrição parenteral com um aporte calórico de 30 kcal/kg/dia, sendo essa
necessidade aumentada para 35 kcal/kg/dia, valor indicado
para ganho de peso.
No momento da internação, o paciente apresentava
contagem total de linfócitos de 1673 mm³ (normal de
1000 a 5000), hemoglobina de 9,1 mg/dl (valores esperados para homens de 14 a 18) e albumina de 1,3 g/dl
(3,5 a 5,0).
Sendo assim, apresentando um valor antropométrico e
dois valores laboratoriais abaixo dos percentis aceitáveis, o
paciente é classificado como desnutrido grave.
Durante os primeiros 18 dias de internação, o paciente
recebeu dieta via oral hipogordurosa, com suplementação
protéico- calórica, porém sem melhora de estado nutricional.
Diante disso, foi optado pela equipe manter a dieta via oral,
porém complementar a necessidade energética do paciente
com terapia nutricional parenteral (TNP), além de 5 g de
glutamina (via oral) devido ao quadro de diarreia grave.
A glutamina é um aminoácido, fonte primária de
energia para os enterócitos. Preserva a estrutura da mucosa
intestinal, melhora a função imune e diminui alterações
deletérias da permeabilidade intestinal de pacientes com
nutrição parenteral total9. A dose usada para o paciente
foi abaixo dos valores usados em outros estudos (em torno
de 0,14 g/kg/dia), mesmo assim com melhora do quadro.
Yalcin et al.11 afirmaram que valores em torno de 0,3 g/kg/
dia em terapia de re-hidratação oral reduzem a duração
da diarreia.
A TNP foi mantida durante 21 dias. Nos primeiros 15 dias,
o aporte calórico foi de 1000 kcal (30 kcal/kg de peso do
paciente) e de 1,2 g de proteína/kg de peso, apresentando
um ganho ponderal de 1,9 kg. Diante da estabilidade do
paciente, o aporte calórico na última semana foi aumentado
para 35 kcal/kg/peso e 1,5 g de proteína/kg/peso.
No final da nutrição parenteral, o ganho de peso foi de
2,3 kg, com melhora também nos padrões laboratoriais:
linfócitos de 2753 mm³, hemoglobina de 10,8 g/dl e albumina de 2,3 g/dl. Além disso, foi notada melhora do quadro
de diarreia, com redução no número de evacuações ao dia.
Conclusão
O caso relatado mostra a importância de uma adequada
terapia nutricional na recuperação do estado nutricional
do paciente com tuberculose e gastrectomia, além de ser
fundamental na melhora do estado geral. Reforça a ideia
de que a nutrição tem papel fundamental no tratamento de
qualquer pessoa, e que cada vez mais deve ser valorizada
junto à equipe.
Após 46 dias de internação, o paciente teve alta hospitalar
e segue em acompanhamento ambulatorial. Foram realizadas
3 consultas, sendo que, na última, o paciente apresentava um
peso de 46,5 kg, IMC de 18,39 kg/m², CMB de 22,41cm
(p<5), linfócitos totais de 2408 mm³, hemoglobina de 10,6
g/dl e albumina de 3,5 g/dl, revelou melhora do estado
nutricional. Além disso, na última consulta, foi realizado
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Portaria nº 272 de 08 de abril de 1998.
Local de realização do trabalho: Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, Botucatu, SP, Brasil.
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