VALTRA JOVEM Edição 9 vivem abaixo da linha de pobreza”, afirma ela. Para a agrônoma, é preciso entender as perdas advindas da mão de obra utilizada para produção: insumos agrícolas, transporte, embalagens, armazenamento, impactos e recursos ambientais, tudo isso é desperdiçado. “Considerando o desenvolvimento tecnológico, os produtos e os processos utilizados na produção de alimentos que existem, parte do resultado de tudo isso não pode ser o lixo”, acrescenta Carolina, que está desenvolvendo um trabalho de avaliações da qualidade póscolheita de frutas. “Acredito que o desperdício de alimentos possa ser combatido a partir de uma mudança comportamental, de uma reeducação, em que os alimentos sejam aproveitados integralmente e que sejam adquiridos em quantidades conscientes”, diz Aline Neves Martins, aluna do último ano de engenharia agronômica da Universidade de São Paulo (USP). Para ela, atitudes como essas podem ter um impacto positivo na matemática das perdas. Aos 23 anos, a estudante, que pretende atuar na área de produção vegetal, entende que a mudança na postura do consumidor e a correção das falhas dos processos produtivos, de transformação e de distribuição, estão entre os principais desafios da sua geração. Investir na capacitação para atuar em diferentes áreas relacionadas ao abastecimento de alimentos – como planejamento, manejo da produção, Participe! Compartilhe com a gente sua experiência. Deixe uma mensagem na Fan Page da ValtraGlobal ou envie e-mail. Sua participação poderá ser publicada na próxima edição da revista. /ValtraGlobal [email protected] Segurança alimentar, preservação dos recursos naturais, fome e desnutrição são desafios que precisamos enfrentar | Ano 4 | Fevereiro 2014 Produção e consumo consciente de alimentos desafiam as gerações Y e Z Andrea Fioravanti Reisdörfer transporte e armazenamento – é visto por Aline como uma boa oportunidade para transformar essa realidade. Assim como grande parte dos jovens na casa dos 20 anos, a estudante acredita que sua geração tem na internet um grande facilitador – possibilita não só a troca de conhecimentos sobre a produção e desperdício de alimentos, mas contribui significativamente com os movimentos de conscientização. “Estou finalizando dois trabalhos que visam avaliar o potencial do uso de produtos biológicos como um dos métodos para o manejo integrado de doenças de plantas. O objetivo é reduzir a dependência dos agroquímicos, preservar o meio ambiente e a saúde do trabalhador rural e do consumidor”, finaliza Aline. Alimentar os mais de sete bilhões de habitantes do planeta é um dos maiores desafios da raça humana hoje. A cada novo ano são muitos os avanços. A agricultura de precisão desenvolve e apresenta soluções que preservam melhor o solo e potencializam o plantio – aumentando, assim, o volume e a qualidade dos grãos e minimizando os custos de produção. O grau de conhecimento em relação à cadeia produtiva fica mais apurado e as técnicas de manejo cada vez mais bem aplicadas ao desenvolvimento das culturas. No entanto, um fator persiste, preocupa e demonstra uma vulnerabilidade que ainda não fomos capazes de resolver: o desperdício de alimentos e o impacto que isso representa para o clima e a biodiversidade do planeta. Será esse fato, debatido há décadas, um dos grandes desafios a serem enfrentados pelas chamadas gerações Y e Z? Nascidos nas décadas de 80 e 90, cresceram em um contexto social marcado pelo avanço econômico e tecnológico, no qual conceitos como responsabilidade social, preservação e reciclagem tornaram-se necessidades reais e imediatas. A questão é: como estão lidando com a situação? A resposta bem que poderia ser sintetizada no lema da campanha lançada em 2012 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), com o objetivo de colaborar para a redução do desperdício mundial de alimentos: pensar, comer, conservar. Gerhard Waller VALTRA JOVEM O número é 1,3 bilhão de toneladas e representa a quantidade de alimentos desperdiçados anualmente em todo o mundo. O índice impactante consta no primeiro estudo da FAO, divulgado em outubro de 2012, e analisa os efeitos globais do desperdício de alimentos. O viés da análise se deu a partir de uma perspectiva ambiental e focou nas consequências para o clima, uso da água e do solo e biodiversidade. A cada ano os alimentos produzidos, mas não consumidos, utilizam um volume de água equivalente ao fluxo anual do rio Volga na Rússia. Esses restos são responsáveis pela emissão de 3,3 milhões de toneladas de gases de efeito estufa na atmosfera do planeta e atingem o montante de 750 milhões de dólares por ano. “Todos nós – agricultores, pescadores, processadores de alimentos, supermercados, governos locais e nacionais e consumidores individuais – temos de fazer mudanças ao longo de toda a cadeia alimentar humana para impedir que ocorra, desde já, o desperdício. Se isso não for possível, devemos promover a reutilização ou a reciclagem”, afirmou José Graziano da Silva, diretor-geral da FAO. Para ele, é inadmissível permitir que um terço de todos os alimentos produzidos seja perdido ou desperdiçado devido a práticas inadequadas, quando 870 milhões de pessoas passam fome todos os dias. Investir na formação acadêmica e social, especialmente dos 16,7% da população brasileira que tem entre 15 a 24 anos, segundo Estudo divulgado recentemente pela FAO indica que 54% do desperdício de alimentos no mundo ocorre na fase inicial da produção, manipulação póscolheita e armazenagem. Os 46% restantes ocorrem nas etapas de processamento, distribuição e consumo dados do IBGE, pode ser um caminho promissor para melhorar essa realidade. “Avançamos muito em relação a gerações anteriores. Existe uma compreensão maior, mas precisamos transformar essa preocupação em ações efetivas”, alerta José Otávio Menten, coordenador do curso de Engenharia Agronômica da Escola Superior Agronômica Luiz de Queiroz (ESALQ) da USP. O professor, que também responde pelo Departamento de Fitopatologia e Nematologia, entende que é preciso aliar à ciência mudanças comportamentais e apostar na interdisciplinaridade. Há mais de três décadas em sala de aula, ele destaca que, no passado, a formação dos estudantes da área de agrárias era técnica e voltada à produção. “Por exigência da sociedade, tivemos que incorporar temas ambientais às disciplinas. Para formarmos bons profissionais e mais preparados para lidar com a realidade, é fundamental termos na matriz de conhecimento conteúdos relacionados às áreas humana e ambiental”, afirma ele. O desperdício de alimentos é assunto recorrente em sala de aula. Entre os exemplos debatidos no âmbito acadêmico estão, por exemplo, as perdas de plantas frutíferas que, em alguns casos, podem chegar a 50% do total da produção. “As causas não estão apenas nas doenças, mas também em parte da colheita, no armazenamento e na forma de consumo dentro de casa. Por isso os projetos pedagógicos estão se modernizando. A sociedade demanda uma formação mais completa e capaz de enfrentar problemas complexos e que envolvem uma gama de fatores”, enfatiza. A formação das gerações que estão prestes a ingressar no mercado de trabalho inclui temas como logística, processo de armazenamento, debates sobre o longo e demorado caminho entre a produção e o consumo. “As gerações que estão sendo formadas saem das academias com informações para pensar e desenvolver soluções para as questões que envolvem a cadeia alimentar. Mas é preciso ter comprometimento com a causa”, analisa ele. Fazer com que esse conhecimento chegue especialmente aos pequenos produtores rurais, por meio de uma extensão rural mais adequada, é outra ação fundamental para minimizar as perdas. “Levar aos produtores o conceito do processamento dos produtos – ou seja, níveis intermediários de industrialização – é essencial nessa luta contra o desperdício. Principalmente quando se trata daqueles produtos mais deterioráveis para que possam, em um momento de excesso de produção, processar a matéria-prima e aumentar o tempo de disponibilização do alimento para o consumidor”, pondera José Otávio. Acredito que temos mais consciência e informação para mudar essa realidade Mestranda no Programa de Fitotecnia do Departamento de Produção Vegetal (ESALQ/ USP), Carolina Amanda Andrade, engenheira agrônoma, 26 anos, acredita que um dos principais fatores que diferem sua geração, no que tange à produção e desperdício de alimentos, é a atenção dispensada à segurança alimentar. “Antigamente visava-se aumentar a produção de alimentos. Hoje, o principal foco é aumentar a produtividade sem aumentar a área cultivada. Trata-se de uma visão mais sustentável do sistema”, enfatiza. Para Carolina, a questão do desperdício de alimentos segue essa mesma tendência de conscientização entre os jovens. A rápida e abrangente disseminação de informações por meio da internet, redes sociais, entre outros, é uma ferramenta que coloca sua geração em outro patamar. “O compartilhamento e o acesso à informação de maneira eficiente são grandes facilitadores”, garante ela. Ciente de que as causas do desperdício referem-se também às perdas decorrentes da falta de infraestrutura e investimentos no setor, a mestranda avalia que hoje a sociedade depara-se com o desafio de encontrar formas de desenvolver esse setor – em conjunto com entidades governamentais, institutos de pesquisa, universidades e iniciativa privada. “Sem dúvida é um dos nossos maiores desafios. Precisamos estar cientes do que é sustentabilidade. Mais ainda, compreender que o desperdício de alimentos vai além dos impressionantes números de alimentos que vão para o lixo e que poderiam alimentar pessoas que hoje